Blast from the Past

Street Fighter IV (Multi): a boa e velha pancadaria em nova cara

Em 1997, a Capcom lançou o último jogo canônico da série Street Fighter, logo, as expectativas dos jogadores com o anúncio de uma sequência eram perfeitamente justificáveis — em 2008 o mundo descobriu a que veio Street Fighter IV.

Sejamos francos: a Capcom é uma das desenvolvedoras menos atentas ao bem estar psicológico dos consumidores — sem ignorar alguns aspectos questionáveis em suas práticas comerciais, algumas das quais mencionarei neste artigo. Tudo bem que está em uma boa fase, “acertando a mão” em títulos como Resident Evil VII, Devil May Cry 5 e remakes de Resident Evil 2 e Resident Evil 3 — sem ignorar o reboot da série Devil May Cry que, convenhamos, ficou muito bom.


Por outro lado, séries igualmente aclamadas pelo público, tais como Mega Man, Dino Crisis e Breath of Fire parecem simplesmente não mais existir no catálogo de produtos da empresa. Tudo bem que a série principal do Blue Bomber  recebeu recentemente um novo título, mas foi algo realmente estonteante, como o frisson causado por Resident Evil 2? Nada provável. Street Fighter, por sinal, é uma das franquias da Capcom que sofrem com o humor da empresa. E é justamente num desses momentos de “brilhantismo” que Street Fighter IV se apresenta.

Uma década de espera é tempo demais, mas valeu a pena

A série Street Fighter, como muitos jogadores sabem, inaugurou nos arcades em 1987 e… é isso. Embora existissem personagens icônicos com Ryu, Ken, Sagat e Gen, havia outros que serviriam como “molde” para personagens futuros, como Mike e Geki. Foi apenas em 1991 que Street Fighter II: The World Warrior fincou os pés da Capcom como uma das maiores desenvolvedoras dos jogos de luta de todos os tempos, com suas máquinas arcade e ports para consoles reinando em absoluto por um bom tempo.

Foi nesse mesmo período que talvez a Capcom tenha desenvolvido o conceito que hoje conhecemos como DLC: o mesmo título, com a inclusão de novos personagens e algumas melhorias na jogabilidade — oferecendo ao público como se tratasse de um jogo completamente novo. É por essa razão que tivemos Super Street Fighter II: The New Challengers e Super Street Fighter II Turbo, por exemplo.
Quem resiste à introdução clássica de Street Fighter II?


A essa altura, desenvolvedoras como SNK e Midway disputavam a atenção dos consumidores com seus respectivos jogos de luta, no caso, Fatal Fury e Mortal Kombat. Em 1997, com a 5ª geração de consoles já em andamento, a Capcom lançou para os arcades Street Fighter III (consequentemente “portado” para os consoles). Não apenas o enredo (que canonicamente se passa após os eventos de Street Fighter V), mas também o protagonista, Alex, e o antagonista, Gill, causaram estranheza entre os jogadores, em especial pelo afastamento da relevância de Ryu e Ken, bem como pela ausência de diversos personagens icônicos, como Sagat, Blanka, E. Honda, Bison, Vega, Balrog e Chun-Li — esta última sendo a única dos antigos lutadores reinseridos nas constantes “atualizações” de Street Fighter III.

Após esse período, a série principal de Street Fighter sofreu um hiato que durou nada menos do que 11 anos, sendo o anúncio de Street Fighter IV recebido com certo alvoroço pela comunidade gamer, especialmente pela informação de que muitos dos lutadores clássicos estariam incluídos no título.

Lançado nos arcades, bem como nos consoles Xbox 360, PlayStation 3 e PC, Street Fighter IV possuía 16 personagens jogáveis (25 nos consoles), entre clássicos oriundos de Street Fighter II, bem como alguns presentes na série Street Fighter Alpha/Zero, dentre eles Sakura, Dan e Gen. O port para iOS trouxe ainda um 23º lutador: Dee Jay, também já conhecido de longa data dos jogadores.
Uma seleção de personagens respeitosa em Super Street Fighter IV.


Graficamente, o jogo mantinha o tom cartunesco oriundo da saga Alpha/Zero — igualmente visível em Street Fighter III —, contudo, possuía traços muito mais fortes e marcantes, dando a impressão de que os modelos dos personagens foram circundados por uma linha grossa de nanquim. Particularmente, acrescentava um tom mais maduro na arte, embora não perdesse o charme característico da série, em contrapartida aos jogos concorrentes que buscavam uma aproximação à realidade.

Os cenários, por sua vez, estavam mais detalhados e coloridos do que nunca, mesmo que a coloração se voltasse a tons mais escuros. A trilha sonora e efeitos sonoros, em mesmo sentido, são impecáveis e quase distraem o jogador durante os combates diante de sua vivacidade.

É claro que de nada adianta um produto visualmente lindo se a jogabilidade não for igualmente boa. Nesse aspecto, é importante para os jogadores, especialmente os de longa data, que os golpes e movimentos especiais mantenham um certo padrão de familiaridade, especialmente quando durante todo esse tempo de espera o público “requentou” a franquia com títulos há muito lançados.
Até mesmo a versão para iOS está bonita.


Quanto a isso, a Capcom acertou em cheio ao manter o padrão de praticamente todos os golpes dos lutadores com os quais os jogadores estavam familiarizados, incluindo novas mecânicas que aprimoraram o modo em se combater em Street Fighter. Dentre os novos movimentos, foram inseridos o Focus Attack, bem como o Ultra Combo.

O produtor Yoshinori Ono afirmou que pretendia entregar Street Fighter IV aos moldes de Street Fighter II no quesito sistema de combate. O movimento de aparar ataques  inserido em Street Fighter III foi retirada, contudo, arremessos de adversários pressionando ambos os botões de ataque leve ou as provocações — inseridas desde a série Alpha e inseridas em III — foram incluídas. As técnicas Super Combo, Armor e Armor Break também estão presentes.

As novidades, portanto, são vislumbradas no Focus Attack e no Ultra Combo. O primeiro consiste em apertar os dois botões referentes aos ataques médios, podendo inclusive ser carregado ao segurá-los por alguns segundos, que disparará um poderoso golpe com armadura que derrubará o adversário caso acerte — em contrapartida, o lutador fica completamente vulnerável por vários segundos se errar. Já o Ultra Combo é parecido com os já conhecidos Super Combos, mas muito mais poderosos e comumente utilizados para finalizações. O Focus Attack é comum a todos os lutadores presentes no jogo, utilizando-se os mesmos botões de ação. O Ultra Combo, por sua vez, possui uma série de sequências individuais.
Ultra Combo de Ken.


Três novas mecânicas de combate foram inseridas em Ultra Street Fighter IV: Red Focus Attack, que além de exigir que o jogador pressione os botões de ataque médios, insere o botão de soco fraco para que seja executado; Ultra Combo Double, que permite que os jogadores escolham seus Ultra Combos, embora causem menos dano, além de Delayed Wake Up e (movimento em que o lutador se ergue rapidamente após uma queda) e Quick Standing (movimento que faz o lutador demorar a se erguer), equivalente ao Tactical Recovery de Capcom vs. SNK 2.

Além das típicas barras de HP, há uma segunda barra permanente no canto inferior da tela, referente ao “especial”, que possui três “cargas”, as quais são preenchidas quando se realiza golpes especiais ou quando o personagem sofre dano.

Os modos de jogo são basicamente os mesmos da maioria dos jogos de luta: Arcade, Versus (incluindo modo online), Training e especialmente para Super Street Fighter IV 3D Edition (3DS), há o Dynamic View, onde a câmera se posiciona por cima dos ombros do lutador. Ultra Street Fighter IV, por sua vez, inseriu dois novos modos de jogo: um que oferece a possibilidade em treinar online com jogadores do mundo todo e Team Battle, no melhor estilo The King of Fighters.

Outro aspecto interessante se refere à inserção de novos lutadores em cada uma das versões de Street Fighter IV: de 25 lutadores (16 nos arcades) para 35 personagens em Super Street Fighter IV, aumentando para 39 no Arcade Edition e 44 em Ultra Street Fighter IV. A maior surpresa foi o port de Super Street Fighter IV para o 3DS, que recebeu todos os 35 personagens jogáveis nos consoles de mesa.

Mais 12 anos se passaram, ainda vale a pena?

Sejamos sinceros: após o fiasco que foi o lançamento de Street Fighter V, com a disponibilização de um jogo visivelmente inacabado tão somente para oportunizar aos pro players que treinassem para o Evolution Championship Series é, no mínimo, um tremendo desrespeito com jogadores casuais que oferecem suporte anos a fio à Capcom.
Gill retornou em Street Fighter V Champion Edition: "uau".


A despeito desta “falha” ser corrigida com a disponibilização de DLCs — que invariavelmente culminou em um Arcade Edition, seguido de Street Fighter V Champion Edition —, o último título lançado da saga Street Fighter alterou, e muito, a forma como jogadores de longa data conhecem o jogo. Uma das grandes “sacadas” de Yoshinori Ono sobre Street Fighter IV foi justamente a de manter o jogo tão próximo quanto possível de sua jogabilidade de Street Fighter II, talvez o mais popular e conhecido jogo da saga.

Os mais de 22 personagens existentes em Street Fighter IV (que incluem basicamente todos os jogadores antigos e amados por milhares de jogadores, mas sem ignorar outros importantes lutadores oriundos de outras séries) são mais do que suficientes para satisfazer os mais saudosistas. Isso inclui a jogabilidade acessível, mesmo com as novas mecânicas de combate inseridas. Em outras palavras, caso o jogador esteja minimamente adaptado a Street Fighter II, ele conseguirá se divertir com Street Fighter IV. Isso é tudo o que esperamos de um jogo: diversão — e isso faz com louvor. 


Revisão: Farley Santos

Mineiro, apaixonado por livros, música, filmes, discussões, Magic: The Gathering e, claro, jogos eletrônicos.
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