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Análise: Resident Evil 7 biohazard (Multi) traz todas as formas de terror

Game resgata muitas das características que fizeram da franquia um dos grandes ícones do survival horror.



Apesar de não ter sido o primeiro game a provocar medo nos jogadores, Resident Evil é considerado um dos principais ícones do gênero survival horror. Quando o capítulo inicial foi lançado, em 1996, contava com uma fórmula de sucesso baseada em quebra-cabeças, racionamento de suprimentos e criaturas horripilantes. Entretanto, após o quarto jogo, a franquia acabou se perdendo ao focar mais na ação e menos na sobrevivência. Com as explosões e tiroteios assumindo o protagonismo, os capítulos cinco e seis da série principal, além dos spin-offs, foram mal recebidos pelo público e crítica.


Para tentar recuperar o prestígio e prometendo retornar às raízes, Resident Evil 7 biohazard foi anunciado pela Capcom na E3 de 2016. A impressão deixada pelo trailer mostrado no evento dividiu opiniões, afinal, como poderia ser a volta aos clássicos com uma mudança tão brusca como a visão em primeira pessoa? Eu fiquei do lado daqueles que não esperavam muita coisa do projeto, acreditando que esse seria um dos últimos suspiros da série que há 20 anos revolucionava o universo dos games. Para minha grata surpresa, e alívio, esse pensamento estava totalmente errado. O mais novo capítulo da franquia conquista facilmente um lugar entre os melhores jogos de terror.

O medo em suas diversas formas

Eu tomo sustos com Resident Evil desde meus 11 anos, porém nunca havia sentido medo durante as jogatinas. No máximo, alguns pulinhos da cadeira quando Nemesis fazia suas entradas inesperadas. Isso mudou completamente com RE7, que conseguiu me passar a sensação de angústia do começo ao fim. Explorar os cenários abandonados ouvindo passos atrás de você, portas fechando e o piso rangendo provoca um sentimento de que algo errado pode acontecer a qualquer momento. O clima tenso gera um enorme terror psicológico, ou seja, aquele que incomoda sem precisar recorrer aos estímulos visuais.
É comum ouvir o piso rangendo em outros cômodos enquanto exploramos a casa


A câmera em primeira pessoa tem papel fundamental na criação desse cenário, pois torna a experiência ainda mais horripilante. Só é possível enxergar aquilo que realmente está diante dos olhos do protagonista Ethan e virar-se para trás, às vezes, pode ser uma opção nada agradável. Se o modelo de visão acabasse sendo o mesmo usado nos games clássicos, dificilmente teríamos a mesma sensação de terror psicológico. Ver tudo o que acontece ao redor do personagem faz com que o jogador sinta-se mais como um espectador do que realmente fazendo parte da história.

Como se já não bastasse o estado de alerta constante, o game traz ainda outras formas de terror, como o jump scare. Serão variados os momentos em que algo acontece do nada, causando sustos capazes de fazer controles serem arremessados para longe. Explodir alguma coisa na tela sem nenhum tipo de aviso prévio é uma das maneiras mais banais de assustar o jogador, entretanto, se usada da maneira correta e sem exageros, a ferramenta é sempre interessante em tramas de terror. RE7 consegue explorar tal possibilidade de maneira sutil, recorrendo ao artifício do jump scare de maneira inteligente, sem apelar aos sustos gratuitos em cada sala visitada.

Uma característica marcante do título é seu elevado grau de violência. A franquia nunca se preocupou em esconder o sangue jorrando ou mostrar pessoas machucadas, mas o sétimo episódio se destaca por levar a brutalidade a um nível superior. A crueldade em algumas cenas é capaz de incomodar bastante quem é mais sensível, ao ponto de provocar enjoos e mal-estar. Não é atoa que o game é recomendável para maiores de 16 anos no Brasil. Porém, toda a selvajaria não é gratuita e combina bem com o cenário de loucura que é a casa da família Baker.
Sangue, muito sangue!

Um Resident Evil sem zumbis?

Sem ser estrelado por nenhum dos personagens já consagrados da série, RE7 coloca o jogador na pele de Ethan, um cara comum que parte rumo aos pântanos da Louisiana em busca de Mia, sua esposa. A garota estava desaparecida há três anos e as esperanças de que estivesse viva eram escassas. Porém, quando o protagonista recebe um vídeo mostrando sua amada pedindo socorro, não pensa duas vezes e parte em direção ao desconhecido. Ao chegar na casa dos Bakers, local onde supostamente Mia estava, as coisas começam a sair do controle e quando Ethan percebe o inferno em que está se metendo já pode ser tarde demais.

Sem a presença de figurinhas carimbadas, como Leon Kennedy, Jill Valentine ou Claire Redfield, o título abre espaço para apresentar novos personagens e trabalhar adequadamente a relação entre eles. As novidades atingem também os antagonistas da trama, temos poucas criaturas que querem partir Ethan ao meio e nenhuma delas lembra os zumbis que atazanaram a vida de quem jogou os clássicos da franquia. A falta dos mortos-vivos, na verdade, não traz impacto negativo nenhum para o game, pois Resident Evil nunca foi um “jogo de zumbis”, mas sim uma história sobre riscos biológicos. Tanto que a franquia é conhecida como Biohazard no Japão e só não tem esse nome no restante do mundo por problemas de licenciamento.

Não ter os mordedores acaba sendo positivo para RE7, que consegue ter uma identidade própria com seus vilões característicos sem perder a essência da franquia. Durante toda minha jornada pela Louisiana, eu sempre me senti jogando um Resident Evil, seja desviando de inimigos para poupar munição, mudando o caminho para não dar de cara com algum monstrengo ou brincando de esconde-esconde com certas criaturas mais parrudas que insistem em te perseguir ao melhor estilo Nemesis. Inclusive, nessa última situação, o game apresenta boas seções de stealth, que não chegam a ser tão elaboradas, mas ajudam a variar um pouco a jogabilidade. O único problema é que há pouca variedade de inimigos, com muitos deles se repetindo frequentemente.
Que tal passar as férias nessa aconchegante residência no interior da Louisiana?


Não foram somente os inimigos que me fizeram sentir jogando um Resident Evil clássico. O game resgatou em mim aquela sensação de alívio ao entrar em determinadas salas e começar ouvir uma calma música ao fundo, indicando que ali era um ponto seguro de salvamento e local em que existiam baús para fazer a gestão dos equipamentos que carregava. Outra característica da franquia que também está presente é a combinação de pólvoras ou ervas para criação de munição ou itens de primeiros-socorros, respectivamente.  A diferença é que agora, ao invés de unirmos dois materiais iguais para gerar um mais forte, devemos misturá-los a fluídos químicos para que possam ser aproveitados.

Mais um detalhe que remete aos títulos anteriores é o acúmulo de moedas espalhadas pelo cenário para compra de armas mais potentes ou melhorias da energia de Ethan. Algo que já havíamos visto com o mercador de Resident Evil 4. Mas nem só de recuperar mecânicas antigas vive o novo capítulo, entre as novidades mais interessantes estão os psicoestimulantes, pílulas que melhoram momentaneamente a percepção do protagonista, fazendo com que ele encontre itens no cenário mais facilmente.

E o que seria de um Resident Evil sem seus marcantes quebra-cabeça? Na jornada de Ethan eles estão presentes em uma quantidade até que razoável, porém não são tão complicados como muitos que desvendamos no passado. Quem já conhece a franquia deve atravessar a casa dos Bakers sem maiores problemas de ficar encalhado em alguns dos puzzles.

Depois de finalizado pela primeira vez, o game libera uma nova dificuldade, além de armas mais fortes. É difícil pensar que os jogadores enfrentarão os perigos dos pântanos da Louisiana somente uma vez, já que a trama não se fecha somente com uma jornada única. Nesse sentido, o fator replay é muito bem trabalhado e deve fazer com que Ethan reviva seus pesadelos mais de uma vez.
Temos quebra-cabeças, mas nenhum tão complicado

As limitações de um civil

Ethan é uma pessoa comum e sem nenhum tipo de treinamento, que parte totalmente despreparado para uma missão quase que suicida. As limitações do protagonista refletem diretamente na jogabilidade, ou seja, ele não é capaz de enfrentar nenhum inimigo em combates sem armas e sua mira é péssima. Demora um pouco para se acostumar com a pontaria e conseguir acertar os tiros nas cabeças das criaturas. Essa perspectiva de crescimento é interessante, já que jogador e protagonista evoluem juntos com o passar da história e vão se preparando para enfrentar monstruosidades ainda mais bizarras.

É um jogo para VR?

Uma das perguntas que ficaram no ar quando os primeiros detalhes do game foram revelados era se a experiência seria plenamente aproveitada somente por aqueles que têm o equipamento VR. Depois de jogá-lo posso responder que não, é possível curtir Resident Evil 7 sem a necessidade da realidade virtual. O título foi pensado para ser usado com essa tecnologia, motivo maior da escolha pela câmera em primeira pessoa, mas os óculos até que não fazem tanta falta.

A única influência sentida ao jogar na TV é que o game tem qualidade de 1080p e 60fps, obrigatória para jogos rodarem no PSVR, já que se forem diferentes disso causam mal-estar nas pessoas. Essa qualidade gráfica faz com que o título seja bonito, mas nada de excepcional. Aliás, bonito não é uma palavra muito adequada para nos referirmos aos cenários. Todos os ambientes são escuros, sujos e cheios de fungos ou insetos. É bastante nojento caminhar prestando atenção em todos os detalhes.

É claro que  jogar RE7 usando a tecnologia VR deve ser algo muito mais arrepiante e gratificante, mas a falta do equipamento não é desculpa para não aproveitar o game da maneira tradicional.
O que temos para jantar?

Bem-vindos ao hospício

Se o objetivo era voltar às raízes e recuperar as características que transformaram Resident Evil em um ícone do survival horror, esse novo capítulo da série cumpre seu dever com maestria. O sétimo episódio é o mais arrepiante de toda a série e consegue passar ao jogador toda a tensão vivida por Ethan durante sua busca por Mia. Reservando algumas surpresas, o enredo é digno dos bons filmes de terror no estilo found footage, em que a gravação é feita por um dos personagens e o espectador tem a sensação de estar dentro da trama. Resident Evil 7 biohazard é o game que os fãs da franquia aguardavam há, pelo menos, 12 anos.
Puxe a cadeira e vamos jogar!

Prós

  • Experiência extremamente assustadora;
  • Câmera em primeira pessoa funciona corretamente para criar o clima de terror;
  • Jogo funciona bem sem o VR;
  • Enredo explora de maneira interessante a relação entre os novos personagens;
  • Grandes incentivos para o fator replay;
  • Inova sem deixar de ser um Resident Evil.

Contras

  • Quebra-cabeças fáceis de serem resolvidos;
  • Pouca variedade de inimigos.
Resident Evil 7 biohazard — PS4 / XBO / PC — Nota: 9.5
Versão utilizada para análise: PS4
Revisão: Ana Krishna Peixoto

É jornalista e obcecado por games (não necessariamente nessa ordem). Seu vício começou com uma primeira dose de Super Mario World e, desde então, não consegue mais ficar muito tempo sem se aventurar em um bom jogo. Diretor de Redação do Nintendo Blast.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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