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Análise: Dusk Diver 2 (Multi) corrige problemas do primeiro, mas ainda tem margem para melhora

Ecoando a análise feita no Nintendo Blast sobre o primeiro título, sequência ainda se parece com Bleach, tanto para o bem quanto para o mal.


Há dois anos, tive a oportunidade de analisar o primeiro Dusk Diver no Switch. Minha impressão geral é que, embora ele seja um jogo divertido, uma sequência seria a oportunidade perfeita para aparar suas arestas a fim de torná-lo um produto mais redondo e consistente.


Anos depois, Dusk Diver 2 chega aos consoles novamente de forma tardia, visto que a edição de PC já tinha sido lançada no começo de 2022. Será que esse sucessor conseguiu se mostrar como uma evolução digna do potencial apresentado lá atrás?

De volta a Youshanding

Ximending é um bairro de Taipei, capital de Taiwan, conhecido por ser um centro urbano comercial que serve de abrigo para a contracultura local, da mesma forma que Shibuya, no Japão. O local também serve de ponte entre outras duas dimensões: Kunlun, o reino dos deuses; e a Chaos Dimension, lar de criaturas malignas conhecidas como Phantom. De tempos em tempos, esses três planos acabam se cruzando e gerando um quarto, Youshanding. 




Yang Yumo é uma estudante de Ensino Médio que, ao lado de sua amiga Lin, foi arrastada para uma crise de instabilidade entre tais realidades. Quando monstros Phantom atacam, Leo, um deus-guardião provindo de Kunlun e que trabalhava como defensor de Ximending, vem ao resgate das duas. Durante os acontecimentos, entretanto, Yumo acaba desenvolvendo seus próprios poderes espirituais e absorve, de forma não intencional, os poderes divinos de Leo. 

Coube a ela, então, durante os acontecimentos do primeiro Dusk Diver, servir como a protetora temporária de Youshanding enquanto Leo não recuperava seus poderes. Nesse meio-tempo, a garota acaba sendo a responsável por identificar e sanar o motivo da instabilidade entre os reinos, além de restaurar a força de outros guardiões de Kunlun, como Le Viada e Bahet.

Em Dusk Diver 2, Yumo retorna como uma estudante universitária que tenta se equilibrar como atendente da loja de conveniências local e protetora espiritual em constante aprendizado. Nesta nova iteração, a crise entre as realidades se dá por conta de mais fissuras no tecido dimensional. Coincidência ou não, elas surgiram no mesmo tempo em que um megaempresário apresenta um plano de revitalização de Ximending. 




A partir daí, se segue uma história suficientemente charmosa por conta dos temas que aborda e de seus personagens carismáticos, mas muito distante da estrutura de roteiro de um anime comum. Embora essa parte da campanha corrida seja compreensível em suas bases — instabilidade entre planos de existência e dedo óbvio do ricaço na situação —, jogadores novatos podem se sentir um pouco perdidos ao cair no meio das explicações, com nomes e menções a acontecimentos passados sendo referenciados a todo momento. 

Porradaria generalizada, mas agora com diversidade 

O combate é a verdadeira estrela de Dusk Diver 2. Enquanto o primeiro bebia de um estilo que valorizava a porradaria por volume, sendo frequentemente comparado a um musou, aqui ele segue uma linha tradicional para um beat’em up. Isso se traduz em um número menor de oponentes, mas que oferecem mais trabalho na hora do combate individual. A variedade deles aumentou, embora siga escassa, principalmente pela disposição das poucas espécies de inimigos ao longo de toda a campanha. 




O controle prático tem um fluxo muito mais ágil logo de início, sem precisar dos upgrades para que a ação comece a se tornar mais fluida e prazerosa. Uma adição muito valorizada é a possibilidade de “deslizar” de maneira automática entre um inimigo e outro, diminuindo o tempo que seria perdido se movimentando manualmente. Isso em adição à esquiva já presente anteriormente, que faz com que os inimigos se mexam mais lentamente por um curto período de tempo — como o Witch Time, de Bayonetta

Os medidores especiais também retornam. Enquanto um deles é utilizado para desferir técnicas distintas, há também o de power up que libera o poder latente de Yumo em uma transformação capaz de desferir golpes mais fortes e, dependendo do tamanho do combo, lançar um poderoso especial de finalização.

O que diferencia o combate de Dusk Diver 2, entretanto, é a possibilidade de alternar o controle entre a protagonista e os outros deuses de Kunlun. Antes restritos a assists, agora é possível assumir os Guardiões com o apertar de um botão. Cada um, então, tem seu próprio estilo de jogo. Leo, por exemplo, é um exímio porradeiro, enquanto Le Viada é uma atiradora que valoriza ataques a distância.




Nota-se que eles nem sempre são tão eficazes em sua função quanto a equilibrada Yang. Entretanto, essa simples possibilidade de alternância é muito bem-vinda no que diz respeito a evitar o tédio inerente à repetição da pancadaria nos mesmos inimigos infinitamente. Isso é algo que precisa partir da iniciativa do jogador, ao escolher outros modelos de jogo para trazer frescor ao gameplay

Os cenários estão bem mais elaborados do que os corredores enormes de Youshanding do antecessor. Agora, Dusk Diver 2 traz ambientações verdadeiramente tridimensionais que inclusive contam com plataformas móveis nos cenários, que pedem a atenção do jogador na hora de percorrê-los. Há também uma gama de ecossistemas diversos que dão fôlego à jogatina. 

É bom ver que, pelo menos nesse aspecto de combate, os desenvolvedores fizeram o dever de casa. O infortúnio, entretanto, reside na outra metade do jogo: os momentos de cotidiano.



A morosidade do mundo comum

A representação virtual de Ximending retorna em Dusk Diver 2 ainda maior e com localidades adicionais que podem ser acessadas do metrô da mesma forma que Yakuza. Embora o ambiente tenha mais detalhes na construção de seu mundo, nota-se a proeminente ausência de certas atividades paralelas.

Por exemplo, era possível aumentar o vínculo entre Yang e os guardiões de Kunlun indo ao cinema, onde eles assistiam a um filme e teciam certos comentários a respeito. Esse recurso, que fazia com que o jogador também se apegasse mais aos personagens, foi completamente limado. 




Além disso, as atividades paralelas, como as máquinas de gacha, também foram enxutas. Ironicamente, ainda há colecionáveis espalhados pela cidade a um nível desproporcional, como ilustrações e músicas para a galeria, além de vestimentas alternativas. Ainda, as missões opcionais se resumem a ir de um ponto a outro, comprar algo e entregar ao solicitante, ou derrotar um inimigo aleatório comum que o jogo coloca no seu caminho. 

Ademais, embora haja uma tentativa de valorizar o combate, o aparecimento aleatório deles pelas ruas de Ximending desequilibra um pouco a jogatina. Por renderem experiência, um jogador dedicado consegue evoluir os personagens com muita antecedência. Na prática, isso faz com que o andamento da campanha fuja da rota do gráfico de game flow, jogando Dusk Diver 2 no vale do tédio. 

Isso não é um problema sério, mas ainda precisa ser ressaltado porque não há mecanismos que impeçam que a experiência seja menos variável entre um jogador e outro. Para evitar um empecilho como esse, normalmente se coloca um limite de XP ou o próprio cálculo da escala de evolução acaba sendo mais íngreme.




Pense em Pokémon, onde certos monstrinhos de certa rota durante a história principal passam a render tão pouca experiência que você se sente compelido a avançar na campanha. Dusk Diver 2, então, acaba sendo vítima de seu próprio sistema pouco balanceado nesse critério. 

O tédio trazido pelas sequências em Ximending, portanto, acaba desequilibrando o fluxo geral da história. Ela até empolga nos momentos de ação, mas diminui o ritmo e perde o fôlego quando voltamos ao mundo concreto. Chega a ser poético como isso traz a mensagem subliminar de que o nosso mundo é chato por si só. No entanto, essa ideia dificilmente foi proposital e, caso tenha sido, é péssima e só trabalha contra o produto.

Muito mais redondo e refinado como produto

Fugindo um pouco das falhas de game design, nos demais aspectos técnicos, Dusk Diver 2 traz melhorias consideráveis em relação ao primeiro. Mais do que o manejo da jogabilidade do combate, os visuais também foram consistentemente aprimorados, contando com uma atenção muito maior aos detalhes.




É divertido ver que as roupas dos personagens ficam detonadas quando apanham demais, por exemplo. Os redesigns também deixam uma impressão positiva, trazendo uma aura de evolução natural, sem que eles perdessem a identidade dos originais.

A identidade visual, que já era incrível, ficou bem menos poluída e limpa nessa sequência, valorizando inclusive a tradução, que é bem menos falha do que também era um dos defeitos do antecessor. O maior problema da interface são os tutoriais. Não apenas eles são exagerados em quantidade, mas também perdem a mão na prolixidade ao trazer várias páginas de informação que poderiam ser resumidas em uma única tela. 

A trilha sonora, por sua vez, tem muita personalidade com seus temas eletrônicos, contribuindo para a construção da atmosfera moderna que o título evoca a todo momento. Além disso, é bom ouvir de novo algumas faixas do primeiro game depois de tanto tempo e perceber que elas ainda estavam bloqueadas na memória só esperando a nova oportunidade de brilhar. 



Aos poucos, é possível chegar lá

De um modo geral, Dusk Diver 2 melhora em vários aspectos do primeiro, com enfoque maior no aprimoramento da fluidez e diversidade do sistema de combate. Entretanto, outros aspectos periféricos, como as sidequests, variedade de inimigos e atividades paralelas, seguem sem apresentar melhorias significativas.

Isso torna o título desequilibrado, pois as sequências interessantes de combate dão lugar à enfadonha realidade cotidiana de Ximending. É um core loop que funcionou no primeiro jogo, mas não consegue convencer aqui. 

A impressão que se tem é que o estúdio tentou trazer um escopo maior do que consegue colocar em prática, seja por questões de limitações técnicas, orçamentárias ou de prazos de entrega. Quem gostou do primeiro Dusk Diver vai provavelmente ter uma impressão positiva deste segundo, mas ele ainda não chegou no ponto certo para furar a bolha e atingir um público mais amplo. 




O meu veredito para o primeiro Dusk Diver é que ele lembra Bleach, série de anime e mangá assinada por Tite Kubo. Isso se deve a ser um produto com várias ideias que ficam no limiar incrível, sem realmente cair de cabeça nesse sentimento.

Dusk Diver 2 continua fazendo valer essa impressão, tanto nos pontos positivos, como a identidade visual moderna e essa bagunça entre várias realidades distintas, quanto nos negativos, a exemplo da execução falha de algumas de suas ideias. É claro que a quantidade desses defeitos diminuiu de forma considerável, mas alguns seguem perceptíveis. 

Prós

  • Combate aprimorado e possibilidade de alternar entre personagens;
  • Apresentação gráfica infinitamente mais polida;
  • Mostra-se bem diversificado em relação aos ambientes das fases;
  • Fez o dever de casa para melhorar boa parte dos tropeços do primeiro jogo.

Contras

  • As sequências em Ximending deixam a desejar em relação às atividades oferecidas;
  • Mitologia relativamente confusa para quem começou pela sequência;
  • A falta de variedade de inimigos segue como um problema persistente.
Dusk Diver 2 — PS4/PS5/Switch/PC — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS4
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Idea Factory


É jornalista formado pelo Mackenzie e pós-graduado em teoria da comunicação (como se isso significasse alguma coisa) pela Cásper Líbero. Tem um blog particular onde escreve um monte de groselha e também é autor de Comunicação Eletrônica, (mais um) livro que aborda história dos games, mas sob a perspectiva da cultura e da comunicação.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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