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Análise: The Legend of Heroes: Trails to Azure (Multi): cicatrizes do passado e o esforço por um futuro melhor

Sequência de Trails from Zero é um dos melhores jogos da franquia.

The Legend of Heroes: Trails to Azure
continua o arco de Crossbell iniciado por Trails from Zero, sendo o quinto jogo da série Trails cuja narrativa conectada é um de seus principais atrativos. Embora tenha sido lançado originalmente para PSP em 2011 no Japão, este é o seu primeiro lançamento ocidental, tendo a NIS America usado a tradução de fãs do Geofront como base para sua versão.

O que temos aqui é um dos melhores jogos da franquia, com uma trama que progride de forma mais direta e interessante do que vários outros e que consegue amarrar bem as pontas que ficaram intencionalmente soltas no seu antecessor. Antes de entrar em mais detalhes, vale destacar apenas que Azure é um jogo totalmente não-recomendável para quem não jogou pelo menos Trails from Zero, mas cuja experiência ideal envolve também ter concluído a trilogia Trails in the Sky.

Uma conclusão digna

Após os eventos de Trails from Zero, a SSS ganhou uma grande reputação e seus contatos em várias instituições logo se mostrariam cruciais para lidar com os desafios que estavam por vir. Em Azure, finalmente vemos mais a fundo o peso político da situação em que Crossbell se encontra: um estado autônomo entre duas mega potências, mas cuja dependência dessas outras nações faz dela uma espécie de refém política.

Crossbell é uma potência econômica e suas relações diplomáticas sempre fortaleceram esse aspecto de sua autonomia, mas em termos políticos a sua posição é muito frágil. Tanto o Império de Erebonia quanto a República de Calvard estão de olho em anexar Crossbell a seus respectivos territórios, mas tentam manter a fachada de não-agressão devido aos acordos e tratados firmados.

Além dessa perspectiva macro ter um peso significativo para a trama, temos também a resolução de pontas soltas que a trama havia levantado em Zero, especialmente no que tange os eventos dos passados de KeA, Randy Orlando, Rixia Mao e do falecido Guy Bannings. Tanto os grandes eventos da trama quanto o detalhamento dessas histórias individuais dão a Crossbell uma conclusão digna, mesmo que apenas temporária.

Um combate maleável

Trails to Azure é um RPG baseado em turnos em que aliados e inimigos são dispostos em uma espécie de tabuleiro com grids. Como em um RPG tático, o posicionamento dos personagens importa, tendo em vista que os seus ataques possuem áreas de efeito específicas, sendo possível tirar vantagem do quão próximos indivíduos de um mesmo grupo estão.

Além dos ataques físicos básicos, é possível usar magias (Arts) e habilidades especiais (Crafts) para atacar, curar, oferecer suporte a aliados, enfraquecer inimigos, etc. Enquanto os Crafts são específicos de cada personagem e desbloqueados ao ganhar níveis, as Arts são um elemento maleável definido pelo equipamento de pedras preciosas conhecidas como Quartz e que por si só também garantem vantagens específicas, como aumentos de parâmetros (como ataque e evasão) ou adição de efeitos (ex: petrificação) nos ataques básicos.

Além das Quartz, temos também pedras ainda mais raras conhecidas como Master Quartz, cujos poderes são fortalecidos com o uso. Ao chegar no nível máximo de uma Master, o jogador libera uma Art muito poderosa que afeta toda a equipe. Comparável aos sistemas de Esper de Final Fantasy VI e Materia de Final Fantasy VII, os Quartz adicionam uma camada muito importante de maleabilidade para a equipe para além do equipamento de armas, roupas e acessórios.

Outro elemento fundamental é a ordem de turnos, que são individuais e dependentes do parâmetro de agilidade dos personagens. Dependendo do que aquela unidade faz, a espera para o próximo turno pode ser maior ou menor, mas o jogador também pode utilizar a técnica de S-Break (um Craft ativado fora do turno) para quebrar o ritmo e ativar uma habilidade muito poderosa de um de seus aliados.

Isso pode ser especialmente interessante porque cada turno está associado a uma espécie de roleta de bônus, que pode, por exemplo, fazer com que qualquer ataque seja crítico ou dar uma chance de matar instantaneamente quem for atingido. O S-Break permite tomar essa vantagem para si, evitando situações precárias por conta da sorte do oponente.

Ainda gostaria de destacar que alguns dos experimentos de Azure, como a questão da Master Quartz, seriam a base para os sistemas de Trails of Cold Steel. É bem fácil traçar a evolução dos sistemas da série desde Sky até Cold Steel 4, se mantendo uma estrutura bem similar na base da gameplay.

Os mesmos erros e acertos

De forma geral, Azure mantém os mesmos erros e acertos de Zero e, de certa forma, da série como um todo. Primeiramente, um dos aspectos mais importantes de Trails está nas quests opcionais, que são conteúdos secundários projetados para dar uma visão mais ampla de como funciona o continente de Zemuria e os vários detalhes da vida em Crossbell. Apesar disso soar bem extravagante, muitas delas são coisas mais simples de apoio à comunidade, como procurar um gato perdido.

O sistema também pode ser bem chato na exigência de envolvimento do jogador, já que várias missões são escondidas, assim como algumas cenas de desenvolvimento dos personagens e suas relações. O jogo até tenta minimizar isso um pouco com avisos frequentes de que “fazer tal coisa vai avançar a história e levar à perda de eventos opcionais”, mas é bem difícil saber se algo foi perdido sem o apoio de um guia. Essa situação é a mesma em praticamente todos os jogos da série lançados em inglês até agora.

Outro detalhe que precisa ser comentado é que a versão de PS4 é baseada diretamente no lançamento japonês (Ao no Kiseki Kai) enquanto as de PC e Switch foram adaptadas pela PH3 GmbH, empresa do conhecido modder Durante. O resultado é que há todo um esforço técnico bem significativo para fazer as melhores versões do jogo, mas usuários do PlayStation não terão acesso a essas melhorias, assim como foi o caso de Trails from Zero.

Embora o jogo não seja algo visualmente muito detalhado, as texturas e detalhes da interface foram melhorados nas versões de PC e Switch. Além disso, é possível acessar um log de mensagens e acelerar o combate e a navegação, detalhes que melhoram consideravelmente a qualidade da experiência de usuário. No PC, o menu de configurações é bastante detalhado, incluindo a escolha de método de anti-aliasing, ajustes de controles e botões mostrados na interface, entre várias outras coisas.

Porém, algumas imagens utilizadas durante a história parecem muito borradas, dando a impressão de que não foi feito um bom trabalho em adaptá-las para a resolução HD. Além disso, a câmera durante a exploração é fixa (mas ela é ajustável em batalha) e mal posicionada em alguns momentos, resultando em pontos de visibilidade ruim, algo especialmente incômodo tendo em vista que a trilogia anterior, Trails in the Sky, permitia o controle de câmera, mesmo tendo gráficos similares.

O futuro além da barreira

The Legend of Heroes: Trails to Azure mantém a boa qualidade de experiência da série e apresenta um final digno (embora temporário) para o arco de Crossbell, tendo melhorias significativas em seu lançamento para PC e Switch em comparação com a versão original de PSP. A expectativa agora é ver como o décimo jogo da série, Trails into Reverie, irá se aproveitar dos elementos desta história e do arco de Erebonia para construir uma resolução mais profunda e dar o pontapé para as próximas aventuras no continente de Zemuria.

Prós

  • Combate em turnos bem detalhado em que posicionamento e ordem de ataque importam e o jogador pode quebrar o fluxo usando S-Crafts e o sistema temporário de Burst;
  • Sistemas de Quartz e Master Quartz permitem maleabilidade para customizar o acesso a magias dos membros da equipe;
  • Trama envolvente que consegue amarrar as pontas soltas de seu antecessor e oferecer uma conclusão digna para a história de Crossbell;
  • Quests e conteúdos secundários ajudam a dar uma visão ampla da construção de mundo da série;
  • Menus de configurações gráficas e de outros elementos do jogo como controles são bastante detalhados na edição de PC;
  • Elementos de qualidade de vida, como o log e a possibilidade de acelerar em até seis vezes o combate e a navegação, fazem das versões de PC e Switch a melhor forma de aproveitar o jogo.

Contras

  • Trama bastante dependente dos eventos de Trails from Zero torna o jogo não-recomendável como ponto de entrada;
  • Esconde várias quests e cenas que podem ser totalmente perdidas se o jogador avançar para a próxima parte da história, mas tenta minimizar isso com avisos constantes;
  • Algumas imagens da história ficaram muito borradas, dando a impressão de descuido;
  • A câmera limitada acaba dificultando a visualização em alguns momentos mais breves.

The Legend of Heroes: Trails to Azure — PC/PS4/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC

Revisão: Heloísa D’Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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