Análise: Earthion é um jogo de navinha digno dos melhores dos anos 1990

Novo jogo da Ancient foi pensado para o Mega Drive e já pode ser visto como um destaque no gênero.

em 09/08/2025
Acho fascinante a cena de desenvolvimento de jogos para plataformas antigas em tempos recentes. De vez em quando surge alguma produção inédita de NES, Neo Geo, Dreamcast e Game Boy que testa os limites esperados dessas plataformas.


Dentre os sistemas mais prolíferos está o Mega Drive, que até recebeu um SDK (kit de desenvolvimento) moderno e dedicado a ele. A ferramenta é tão boa, que até empresas como a M2 já a utilizaram em algum momento.

Yuzo Koshiro, compositor lendário de Streets of Rage, junto com sua empresa Ancient e a Limited Run Games, voltou para produzir uma nova aventura para o 16-bits da Sega com Earthion. O jogo de nave veio com grande expectativa, dada a recheada biblioteca do gênero na plataforma, mas será que se compara aos clássicos de outrora?

Salvando a Terra à moda antiga

Em Earthion, precisamos atravessar oito etapas no comando da nave YK-IIA, conduzida pela pesquisadora ambiental Azusa Takanashi, que tem a missão de evitar uma invasão extraterrestre proveniente do lado oculto da lua. Após perder seus pais em um desses ataques, ela se une à força Earthion para acabar com os malfeitores.

Com rolagem horizontal, o jogo é bastante clássico e de fácil compreensão para os fãs do gênero. Podemos adquirir tiros diferenciados e aprimorá-los coletando cristais verdes de inimigos derrotados, além de tomar cuidado para não sermos atingidos por uma chuva de projéteis.

A diferença de Earthion é que ele parece uma experiência projetada para console desde o começo. Nossa aeronave não é destruída com um único acerto, pois possui um escudo que se regenera se não sofrer danos por alguns segundos.

Ademais, existe um sistema de melhorias que podem ser transferidas para partidas futuras por meio de password. Ao evoluir de nível com um item de upgrade, é possível expandir a barra de tiro e escudo do veículo, elevar o limite máximo de nível de cada arma, ganhar uma vida extra ou até mesmo obter um disparo especial para a próxima missão.

E é nesse contexto que Earthion oferece uma variedade de "builds". É crucial escolher entre aumentar a vida ou a quantidade de slots para armas, pois conseguir um upgrade implica sacrificar espaço na HUD. A liberdade de optar por mais poder de fogo ou resistência depende da preferência do jogador.

Embora tenhamos uma barra de vida, Earthion continua sendo um shoot 'em up baseado em aprendizado. Mesmo não sendo um bullet hell, há momentos em que a quantidade de balas voando pela tela assusta, exigindo o máximo de nossos reflexos.

É normal começar levando alguns golpes até entender como as armas funcionam, e vamos aprendendo junto ao padrão dos inimigos e ao manuseio do veículo. É gratificante observar a YK-IIA, toda poderosa e equipada com nossas habilidades, pronta para enfrentar qualquer desafio que surgir.

Earthion também oferece quatro níveis de dificuldade diferentes. O modo fácil é altamente recomendado para quem deseja iniciar de forma tranquila, com menos inimigos na tela. Por outro lado, a dificuldade difícil e, especialmente, o modo fera, que apresenta o maior nível de desafios, são extremamente complicados.

A questão em relação à acessibilidade reside nos créditos limitados e no sistema de password para implementar as melhorias em partidas futuras. Ao menos hoje em dia é simples anotar as senhas, mas isso pode ser um incômodo para quem não quer mergulhar tão fundo na nostalgia.

O jogo também inclui alguns recursos bem interessantes. Para proporcionar uma maior durabilidade à curta campanha principal, temos um modo desafio com algumas provas específicas a serem vencidas. Também é possível acessar versões de desenvolvimento anteriores, incluindo o protótipo inicial, no qual controlaríamos um mecha em vez de uma nave.

Comida nova em panela velha

Como mencionado, Earthion foi feito para rodar no próprio Mega Drive, então esse lançamento para PC (e consoles, futuramente) roda o game num emulador próprio. Assim, podemos observar que fizeram o máximo para nos impressionar com o que pode ser feito no console, como o alto uso de parallax e animações da nave manobrando para simular gráficos 3D poligonais.

O uso de cores é outro ponto notável de Earthion. Mesmo com a limitação de 64 cores simultâneas, o título exibe cenários vibrantes e detalhados, incluindo elementos interativos e efeitos de distorção. A área da batalha contra o chefe da fase 4, por exemplo, destaca-se pela criatividade no uso do hardware.

No entanto, não é suficiente apenas ser bonito; um jogo de nave também precisa permitir que os jogadores leiam os projéteis facilmente em meio ao caos. Nesse aspecto, Earthion acerta na legibilidade dos ataques inimigos, porém alguns cenários e terrenos me deixaram confuso em determinados momentos, principalmente na quinta fase.

O lançamento para plataformas atuais oferece várias opções para personalizar a exibição na tela, como filtros de imagem, ajuste da intensidade de scanlines, alteração de brilho, contraste, saturação, moldura da tela, entre outros. Acabei optando pela forma mais simples, com pixels limpos e proporção 4:3 sem bordas, mas as alternativas estão à disposição para quem quiser.

E como estamos falando de uma obra encabeçada por Yuzo Koshiro, temos uma trilha espetacular para acompanhar o tiroteio espacial. Com uma atmosfera mais aventureira reminiscente de Gradius e R-Type, as músicas são cativantes e energizantes, perfeitamente adequadas para o gênero.

Desde o início, podemos apreciar o trabalho excepcional no YM2612, o chip de som do Mega Drive. Samples em grande quantidade e relativamente limpos, uso harmonioso das capacidades FM e alguns toques nostálgicos de orchestra hit em determinados trechos, semelhante ao que a Konami empregava em seus jogos das décadas de 1980 e 1990.

O tempo dirá se essas melodias de Koshiro ficarão na minha cabeça como as de Streets of Rage e Etrian Odyssey, mas é inegável que o mestre ainda continua em forma com tecnologia antiga. Apenas sei que ouvirei o tema das fases 3 e 5 várias vezes por um bom tempo — e espero que toda a trilha chegue aos serviços de streaming de música o quanto antes.

Por último, os efeitos sonoros, que também são importantes em jogos de nave, são agradáveis de ouvir, e há uma quantidade considerável de vozes digitalizadas com a típica rouquidão do Mega Drive.

Vale ressaltar que existem algumas opções de filtragem para o áudio, permitindo simular o som dos modelos iniciais ou finais do Mega Drive. No entanto, optei por não aplicar nenhum filtro passa-baixa (ou low pass, que atenua tons agudos característicos de som FM), já que sou mais acostumado com a saída de áudio remanescente das revisões posteriores do YM2612.

Um astro especial

Com um visual atemporal, trilha sonora marcante e uma jogabilidade que incentiva novas tentativas, Earthion é um dos melhores jogos de navinha noventista, além de um curioso destaque contemporâneo feito para um console de quase 40 anos. 
 
Estava com vontade de jogar um jogo de navinha mais clássico, sem apelar para o bullet hell, que é tão popular atualmente, e a Ancient matou essa saudade. Espero ter a oportunidade de jogá-lo um dia no próprio Mega Drive e recomendo-o enfaticamente aos fãs do gênero.

Prós:

  • Jogabilidade que estimula novas partidas com "builds" diferentes;
  • Visual atraente, aproveitando ao máximo as capacidades do Mega Drive;
  • Trilha sonora estelar, com músicas emocionantes e inesquecíveis;
  • Diversas alternativas de filtros de imagem e áudio, personalizando a experiência retrô de acordo com a preferência do jogador;
  • Localização em português, ainda que não há muitos textos para traduzir.

Contras:

  • O lado retrô pode ser um problema para novos jogadores, dado o sistema de créditos e password;
  • A campanha é muito curta.
Earthion — PC/PS4/PS5/XSX/Switch — Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia cedida pela Limited Run Games
OpenCritic
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Alecsander "Alec" Oliveira
Estudante de enfermagem de 25 anos, está nesse mundo dos joguinhos desde criança. Fã de games com vibe mais arcade e arqueólogo de velharias, mas não abandona experiências mais atuais. Acompanha a mídia de podcasts, dublagem e ouvinte assíduo de VGM. Pode ser encontrado como @AlecFull e semelhantes por aí.
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