Blast Test

Heroes of the Storm (PC) é uma nova esperança no cenário de MOBAs

Mais recente lançamento da Blizzard, Heroes of the Storm aprimora e simplifica as mecânicas do já saturado gênero MOBA.


Desde a sua fundação, apesar de nunca trazer em seus games inovações notáveis, a Blizzard Entertainment sempre focou em criar versões acessíveis e aprimoradas de jogos pertencentes a gêneros considerados “hardcore”. Ela é excelente em “filtrar” tudo que eles trazem de complexidade desnecessária, criando assim portões de entrada definitivos para esses gêneros: títulos simples e intuitivos, mas ainda assim competitivos e extremamente divertidos.


Isso aconteceu com os jogos de estratégia em tempo real, quando ela trouxe Warcraft: Orcs and Humans, uma versão aprimorada de Dune II; com os MMORPGs, com o lançamento de World of Warcraft, que apesar de ter sido lançado há 10 anos ainda é um dos games mais jogados do gênero, deixando Everquest e outros contemporâneos pra trás; e, mais recentemente, Hearthstone usou e abusou da fundação estabelecida por Magic: the Gathering e trouxe uma nova cara aos Collectible Card Games.

Agora, mais do que nunca, essa habilidade da Blizzard é colocada à prova. O seu novo título, o MOBA (Multiplayer Online Battle Arena) Heroes of the Storm, pretende ser a versão acessível e simplificada de um gênero que é conhecido por ser extremamente complexo e com uma curva de aprendizado muito íngreme. Será que consegue?

Nota: Heroes of the Storm ainda está em estágio “technical alpha”. Os elementos descritos aqui podem mudar até o lançamento.

A Guerra das Estrelas

O fato de ser um título da Blizzard já traz uma vantagem enorme a Heroes of the Storm.. Ele possui personagens memoráveis das maiores franquias da empresa: Warcraft, Diablo e Starcraft. O elenco é composto por estrelas já consagradas pelos PC Gamers: Arthas Menethil, Jim Raynor, Diablo, Sarah Kerrigan (já transformada na Rainha das Lâminas), Illidan Stormrage (ou Tempesfúria, se você joga em português), entre muitos outros - todos retratados fielmente, com aparência e habilidades trazidas diretamente de seus títulos de origem.

E que aparência! A Blizzard é conhecida por não medir esforços na direção de arte, e isso não poderia ser diferente em um jogo que reúne as estrelas de seus jogos. O visual do game ainda precisa de um pouco de polimento - os personagens que vieram dos títulos mais recentes da empresa, como Starcraft 2 e Diablo III, possuem seus modelos importados diretamente de seus produtos de origem e não sofreram mudanças drásticas, mas outros são novos, desenvolvidos especialmente para HotS. E, ao contrário do que acontece em títulos com propostas similares, todos os personagens são esteticamente coesos com o mundo e ambientação. O trabalho que eles fizeram com a unificação da direção de arte de vários personagens de jogos distintos é fantástico, resultando em um estilo visual único e coerente.

Uther, o Arauto da Luz, personagem do mundo de Warcraft

A trilha sonora, assim como os personagens, carece da genialidade esperada pela Blizzard, mas cumpre com o seu papel. Como cada um dos títulos homenageados no jogo possui uma ambientação única, as músicas de Heroes of the Storm acabam se tornando um amálgama do melhor que a Blizzard pode oferecer, mesclando trilhas que variam do medieval épico de Warcraft ao barroco de Diablo, passando pelo rock progressivo de Starcraft. O resultado final é uma soundtrack eclética que, apesar de não inovar e nem ousar, consegue agradar todos os gostos.

Uma adição muito agradável é o esforço da Blizzard em localizar o jogo para o português. Quem já jogou os jogos mais recentes da empresa conhece o trabalho fenomenal de adaptação feito pela Blizzard para o nosso idioma, e eles mantiveram a qualidade com Heroes of the Storm. O título foi completamente traduzido, e conta com uma dublagem impecável, que contém várias vozes conhecidas para quem está acostumado com desenhos, filmes e seriados dublados. Mais uma vez, um trabalho de tradução impecável do pessoal da Blizzard.

Este não é o MOBA que você está procurando

Como é de praxe nos jogos do estilo MOBA, Heroes of the Storm coloca dois times de cinco jogadores em uma arena, cujo objetivo primário é destruir a construção principal (aqui chamada de Núcleo) do time oposto.

Cada jogador controla um único personagem, o seu herói. Dependendo do mapa, há duas, três ou até cinco rotas (as lanes) que ligam um Núcleo ao outro. Cada lane está protegida por torres, que atacam todas as unidades inimigas próximas. De tempos em tempos, um grupo de guerreiros fracos controlados pelo computador (as tropas) nasce e segue em direção às torres. Os jogadores precisam se unir às tropas e usá-las como bucha de canhão para destruir as construções de cada lane e liberar caminho até o núcleo da equipe oponente, que, quando destruído, garante a vitória ao seu time.

...Ok, talvez seja um pouco mais complicado do que isso.

Contudo, as semelhanças com outros jogos do gênero, como Dota e League of Legends, acabam aí. Heroes of the Storm tem uma curva de aprendizado muito mais suave e menos íngreme em comparação com seus concorrentes, simplificando algumas mecânicas e eliminando completamente outras:
  • Em MOBAs tradicionais, cada jogador possui a sua barra de experiência individual e independente dos outros. Em HotS, essa barra é compartilhada entre todos os jogadores do seu time - todos passam de nível ao mesmo tempo.
    Essa mudança faz com que nenhum jogador fique para trás, incentiva o trabalho em equipe e elimina a limitação de estratégias focadas na triangulação de divisão de XP.[1]
  • Também comum em games do gênero é o fato dos jogadores precisarem adquirir gold para comprar itens que melhoram os atributos dos seus personagens. Em HotS, não existem itens nem gold - a customização dos heróis é feita através de talentos, melhorias nas skills que são ganhas a cada nível adquirido.
    Isso diminui o efeito bola-de-neve[2], elimina a necessidade de farming[3] e facilita a inclusão de jogadores novos, que não precisam decorar milhares de combinações de itens e heróis.
  • Nos jogos das outras empresas, as torres que protegem as lanes costumam ter muita vida, e destruí-las acaba se tornando um objetivo por si só, forçando os jogadores a formular estratégias com esse propósito. Em HotS, as torres dão menos dano, têm menos vida e possuem munição, e quando esta acaba, elas não podem atacar até que sejam recarregadas (o que acontece automaticamente). Além disso, há várias outras construções além das torres, como as barricadas e portões (que não atacam, mas precisam ser destruídas para liberar a passagem) e fontes de cura (uma construção que permite que o herói se cure a cada 90 segundos).
  • Outra grande diferença de HotS está nos acampamentos e unidades neutras. Ao invés de darem apenas um punhado de gold e experiência, como é comum no gênero, limpar um acampamento de mercenários os faz se juntarem a você, indo em direção às lanes e atacando as construções.

Vocês vão tomar tanta porrada que vão virar meus aliados!
Mas Heroes of the Storm não se limita apenas a inovar nos elementos de gameplay. O título está recheado de novos mapas, e cada mapa traz uma mecânica totalmente nova que altera completamente as estratégias e o modo como as partidas são jogadas:
  • Em Clareira Maldita, itens chamados “tributos” surgem aleatoriamente no mapa e precisam ser coletados pelos times. Quando um time consegue coletar três tributos, seus adversários são amaldiçoados por alguns minutos, fazendo com que seus minions fiquem com menos vida e suas construções sejam incapazes de atacar.
  • As Minas Amaldiçoadas são dois mapas em um só. De tempos em tempos, o mapa padrão abre portais para um mapa subterrâneo, onde os heróis se enfrentam ao mesmo tempo em que eliminam mortos-vivos e coletam seus crânios. Quando todos os mortos-vivos são eliminados, dois Golems poderosíssimos (um pertencente a cada time) nascem e atacam o time oponente. A quantidade de crânios que um time coletou dos mortos-vivos define a força do seu Golem.
  • Um navio pirata é a mecânica principal da Baía do Coração Negro. Os jogadores precisam coletar moedas de ouro para entregar ao capitão Coração Negro. Essas moedas podem ser encontradas em baús de tesouro, nos corpos de mercenários derrotados ou até mesmo saqueadas de jogadores! Ao coletá-las, Coração Negro usa o seu navio para bombardear as construções do time oponente.
  • Condado do Dragão é o mapa mais tradicional, mas ainda assim tem uma mecânica interessante. Nele, os jogadores disputam o controle de duas estruturas posicionadas em pontos opostos do mapa, os santuários. Se um time controlar os dois santuários, um herói desse time pode se dirigir a uma terceira estrutura, a Estátua do Cavaleiro Dragão, e se transformar no Cavaleiro Dragão, um herói extremamente forte.
  • O modo de jogo mais recente, Jardim do Terror, funciona como uma mistura entre Clareira Maldita e Condado do Dragão. O mapa alterna entre um ciclo dia/noite; durante a noite, monstros terríveis aparecem no mapa e precisam ser derrotados para voltar ao dia. Enquanto isso, os jogadores precisam coletar sementes dos inimigos espalhados pelo mapa. Ao coletar 100 sementes, um herói pode se transformar em um Terror do Jardim, ficando extremamente forte e ganhando novas habilidades que causam grande estrago nas construções inimigas.
Todas essas mudanças são muito bem-vindas e deixam bem clara a preocupação da Blizzard em criar um game que incentive o trabalho em equipe em detrimento da habilidade individual. Em Heroes of the Storm, um herói sozinho, mesmo alguns níveis acima dos seus oponentes, não é capaz de “carregar” uma partida nas costas como acontece em Dota ou League of Legends. Ao incentivar a cooperação, os designers do jogo o tornam mais equilibrado e focado muito mais em estratégia em médio e longo prazo, e menos em táticas de combate imediatas.

Juntos venceremos!
Outra notável influência mais atual de game design é a quantidade de incentivos e recompensas. Cada mapa tem tantos objetivos e construções que os times estão a todo momento destruindo alguma coisa ou ganhando novos poderes, dando aos jogadores uma sensação de progresso constante. Mesmo na derrota, você nunca fica com a sensação de que não fez nada, ou que suas ações não fizeram diferença alguma no resultado final.

Contudo, essa facilidade de cumprir objetivos individualmente acaba incentivando um estilo de jogo pouco popular entre a comunidade, o rat. Nessa estratégia, um time nunca entra em confronto direto com o outro, ao invés disso se concentrando em conquistar objetivos neutros e atacar a base oponente em um momento em que os inimigos estão muito longe, incapazes de defendê-la. Isso não é uma falha de design per se. A estratégia possui pontos fracos e fortes, e é perfeitamente válida. Mas tem um efeito colateral potencialmente nocivo: diminui a quantidade de conflitos diretos entre os times, deixando o jogo mais entediante, tanto para jogar quanto assistir. E isso é um problema sério em um jogo que tem a pretensão de se tornar um e-sport.


Olhe como estamos nos divertindo!

Use a Força! (do dinheiro)


Heroes of the Storm é gratuito. Hoje em dia, isso significa que você pode adquirir conteúdo dentro do jogo com dinheiro real através de microtransações. Felizmente, a Blizzard estudou com calma os exemplos de sucesso de outros games freemium, e acertou em cheio na implementação de suas ferramentas de monetização.

Seguindo os precedentes dos MOBAs competitivos, Heroes of the Storm não é um pay-to-win. A sua loja não vende nenhum item que dá vantagem de gameplay. Todos os itens vendidos por dinheiro são cosméticos, que alteram a aparência do seu personagem ou de sua montaria (é, os personagens usam montarias no jogo). Esses itens cosméticos estão disponíveis apenas com dinheiro real. Os preços dos itens cosméticos são mostrados em reais, ao contrário da grande maioria dos jogos freemium, que adiciona uma nova moeda e vende os itens com valores nessa moeda fictícia - uma montaria custa R$ 14,99 ao invés de custar 600 RPs. Isso é uma vantagem enorme, pois não força o jogador a converter entre moedas e facilita o controle de suas compras. Ficar com pontos sobrando e não ter com o que gastá-los não acontece aqui.

Essa armadura é maneira, mas não vai te deixar mais forte...

Ao logar pela primeira vez na sua conta, você perceberá que apenas uma quantidade limitada de personagens está disponível para uso. Toda semana, uma seleção de dez heróis está liberada, e você pode testá-los livremente. Para adquirir definitivamente os heróis, é necessário comprá-los usando a moeda do jogo, o Gold. O Gold é persistente e vinculado à sua conta (e não ao seu personagem dentro da partida). Você adquire Gold quando sua conta passa de nível e cumprindo quests (meta-objetivos como “vença três vezes com Diablo” ou “jogue cinco partidas usando um herói de suporte”). O preço dos heróis não é proibitivo, e jogando três ou quatro partidas por dia um jogador consegue facilmente comprar um ou dois heróis por semana. O jogo libera também um modo de “teste” do herói, onde você joga em um mapa single-player contra o computador para testar o personagem antes de saber se ele faz ou não seu estilo de jogo. Logicamente, os heróis também podem ser comprados com dinheiro real, da mesma forma que os itens cosméticos.

Sua falta de fé é perturbadora


Apesar de ainda estar em alfa e precisar de polimento em algumas coisas, a Blizzard realmente conseguiu destilar o gênero MOBA em um título simples, mas muito agradável e extremamente competitivo.

Heroes of the Storm certamente apelará a uma gama de jogadores que até o momento não tinham interesse no gênero, com seus modos de jogo divertidos, mecânicas simplificadas e estética sensacional. Ainda não é um jogo definitivo, mas tem o potencial e o cacife para se tornar um dos melhores e mais populares e-sports no mercado.



Glossário

[1] - Em Dota e League of Legends, os jogadores ganham experiência derrotando os minions nas lanes. Quando há dois jogadores em uma mesma lane, eles dividem a experiência - ou seja, se um minion dá 60xp, cada jogador ganha 30xp. Isso gera uma triangulação, que força os jogadores a pensarem bem onde vão posicionar seus heróis - um herói que fica sozinho na lane ganha experiência mais rápido, mas está mais vulnerável; dois heróis juntos em uma lane ganham experiência mais devagar, mas estão mais seguros.

[2] - O efeito snowball (bola-de-neve) se refere a uma situação de jogo em que um personagem ganha muita experiência e gold cedo no jogo (normalmente matando vários outros jogadores de uma vez, em um curto intervalo de tempo). Com esse bônus de experiência e gold, ele acaba ficando bem mais forte do que os seus oponentes, o que torna eles mais fáceis de serem derrotados. Isso gera uma bola de neve - um herói mais forte mata seus inimigos com muito mais facilidade; matar inimigos dá XP e gold; XP e gold deixam seu herói ainda mais forte.

[3] - “Farming” (aportuguesado para “farmar”) é o ato de matar inimigos com o único propósito de ganhar gold. Em Dota e LoL, os inimigos dão experiência em área quando morrem, mas apenas o personagem que deu o ataque final saqueia o gold. Com isso, em determinados momentos, é muito comum ver os jogadores evitando confronto direto e se concentrando apenas em executar os minions do time adversário.

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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