Blast from the Past

Gunstar Heroes (Mega Drive): 30 anos de tiros e explosões em um dos melhores jogos do 16-bits da Sega

A explosiva aventura de Red e Blue marcou a história dos games e iniciou o legado da talentosa desenvolvedora Treasure.


O Mega Drive possui um belo catálogo de jogos de ação que exploravam o potencial de seu processador Motorola 68000, que permitia mais informações acontecendo ao mesmo tempo na tela. O slogan Blast Processing, usado pela Sega, buscava amplificar esse fator para o público perante o poderio de hardware do concorrente direto, o Super Nintendo.

Gunstar Heroes era um desses games que buscavam extrair o máximo que o hardware do Mega Drive podia proporcionar. Lançado em 10 de setembro de 1993, foi a primeira produção lançada pela Treasure e se tornou um dos grandes clássicos do console da Sega.

Um tesouro chamado Treasure

A Treasure é uma companhia fundada por Masato Moegawa, programador que anteriormente trabalhava na Konami e esteve envolvido com algumas produções da empresa como Super Castlevania IV e Contra III: The Alien Wars. Ele, juntamente a outros desenvolvedores, apresentou os conceitos iniciais de Gunstar Heroes à Konami, que recusou as ideias. Frustrado pela falta de liberdade criativa dentro da empresa, Moegawa e outros funcionários insatisfeitos se demitiram e fundaram a Treasure em 1992.
Masato Moegawa, fundador da Treasure.
Vendo o Mega Drive como a plataforma ideal para Gunstar Heroes, a Treasure buscou a Sega para publicar o novo game, que ficou um tanto receosa com o fato de a empresa ainda ser iniciante no ramo dos videogames, mas a contratou para desenvolver um game usando a licença da rede de fast food McDonald's. Não demorou muito para a Sega aprovar o desenvolvimento de Gunstar Heroes devido aos esforços do estúdio na aventura protagonizada por Ronald McDonald, e a Treasure separou seu time em dois para cobrir os dois projetos.


A Treasure desenvolveu vários títulos ao longo dos anos, trabalhando com a Nintendo em produções como Wario World e Sin & Punishment, com a Konami em Gradius V (ironicamente), e com a própria Sega em jogos de Bleach para DS, além de desenvolver suas próprias produções.

Duas histórias, um mesmo mal

Em Gunstar Heroes, o jogador assume o controle de Red e Blue, os irmãos Gunstar, que precisam derrotar um império maligno liderado por Colonel Red — sim, tem dois Red nessa história, por algum motivo. O objetivo do vilão é usar Golden Silver, um robô energizado com gemas místicas que sugou os recursos de vários planetas anos antes dos eventos do jogo, mas foi selado. Após descobrir a localização das gemas, Colonel Red sequestrou Green, irmão de Red e Blue, o submeteu a lavagem cerebral e espalhou o terror pelo planeta Gunstar 9. Agora, cabe aos irmãos Gunstar resolver toda essa situação.

O enredo acima é da versão internacional, enquanto a história da versão japonesa é diferente. Golden Silver é um deus da destruição que ameaçou a Terra há muitos anos. No entanto, ele foi impedido por quatro heróis: Red, Blue, Green e Yellow. Eles selaram a ameaça na lua e, temendo seu retorno, entraram em sono criogênico.

Muitas eras se passaram em paz até que o General Grey surge em busca dos quatro cristais que conferem poder a Golden Silver. Ele envia seus subordinados para procurar nos supostos locais, e o líder dessa unidade de escavação é o Dr. Brown, que acaba encontrando os quatro heróis do passado adormecidos. Green, que sofre de amnésia após acordar, é enganado por Grey, deixando para os heróis Red e Blue a missão de salvar o planeta da possível destruição.

A combinação faz a diferença



Sendo um run 'n gun, o objetivo é atirar em tudo e todos pelo caminho enquanto desvia de perigos e pula algumas plataformas, mas Gunstar Heroes mexe nessa fórmula. Red e Blue contarão com quatro tipos de armas que agem de formas diferentes: Force, arma que atira em rápida velocidade, como uma metralhadora; Lightning, um laser que atravessa tudo pelo caminho; Chaser, que persegue os alvos, mas possui baixo dano; e Fire, um lança-chamas a curta distância com alto poder destrutivo.
Ao iniciar o game, o jogador tem a opção de escolher entre Free Shot (atirar andando) ou Fixed Shot (atirar parado, garantindo precisão), e uma arma para começar.
A magia da gameplay está no sistema de combinações, no qual cada arma pode ser encontrada durante as fases e combinada com outra para dar um tiro diferente. Force com Fire atirará esferas explosivas, Lightning com Fire resultará em uma espécie de sabre de luz, Lightning com Chaser transformará o tiro em um laser teleguiado em alta velocidade, e assim por diante. São 10 combinações que mudam o combate de acordo com o gosto do jogador.

Quer uma arma poderosa que trará risco e recompensa? Lightning com Fire é a pedida; ou está atrás de uma arma mais convencional? Force com Force vai obliterar tudo no caminho, sabendo mirar bem.

E não é apenas nos tiros que Gunstar Heroes se diferencia no gênero, já que as próprias fases são um show à parte. É possível selecionar as quatro em qualquer ordem, como em Mega Man, e mostram bastante criatividade entre elas. O estágio da floresta é bem tradicional, com bosses no caminho e set pieces, enquanto a fase do hangar vira um jogo de tabuleiro com uma seleção de desafios variados em cada casa.

Red e Blue podem contar com alguns movimentos adicionais como defender, agarrar algum inimigo (ou aliado) e arremessá-lo para longe, se pendurar em plataformas, dar ataques aéreos e deslizar no chão. Todas essas possibilidades deixam o título com uma jogabilidade bastante ambiciosa, ainda mais para 1993, e tudo isso permite jogatina cooperativa para dois jogadores.

Provando a possibilidade no impossível

Como se não bastasse a jogabilidade de Gunstar Heroes já ser muito boa por si só, a Treasure viu o hardware do Mega Drive e abraçou-o como nenhuma outra desenvolvedora na época. Aqui vemos um game colorido, com uso de dezenas de sprites ao mesmo tempo em tela ou mesmo um inimigo inteiro construído de sprites diferentes, além de efeitos que simulam técnicas que, na teoria, o 16-bits da Sega não seria capaz de fazer, como efeitos de rotação de background, redimensionamento de sprites e até mesmo alguns truques de 3D em certos momentos.
Seven Force possui sete formas diferentes que vão se alternando aleatóriamente a cada derrota, sendo necessário destruir uma quantidade específica de formas dependendo da dificuldade escolhida. É um showcase técnico incrível para o Mega Drive.
Porém, é claro que nem toda essa ambição vem sem defeitos, já que em momentos intensos o Motorola 68000 acaba sofrendo um pouco com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, e slowdowns aparecem para retardar um pouco o frenesi. A parte boa é que, além de serem raros, esses momentos não atrapalham em nada a jogabilidade e, com a adrenalina no alto, acabam se tornando até uma espécie de “efeito cinematográfico” na ação.



O componente sonoro também contribui com a qualidade geral de Gunstar Heroes, com uma trilha sonora marcante composta por Norio “NON” Hanzawa — nome que apareceu em outros jogos da Treasure, como Bangai-O e Yu Yu Hakusho: Sunset Fighters —, que casa perfeitamente com cada momento agitado e emociona com um dos melhores temas de encerramento dos 16-bits. Já os barulhos de explosões, tiros e vozes, entre outros, são agradáveis de ouvir e não se tornam irritantes em nenhum momento durante a jogatina, tornando-se um exemplo de bom uso do chip sonoro FM do Mega Drive.

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Aventuras portáteis e relançamentos

Em 1995, o Game Gear recebeu um port nas mãos da M2. Essa versão possui diversos comprometimentos para rodar numa plataforma mais fraca, como menos inimigos em tela, fps menor, comprometimentos por tamanho de tela, algumas fases cortadas e trechos adaptados — como a fase da mina sendo num jetpack ao invés de num carrinho, mas toda a gameplay base de Gunstar Heroes está presente e é impressionante ver a ação rolar num 8-bits portátil.



O primeiro relançamento de Gunstar Heroes ocorreu no PlayStation 2, apenas no Japão, pela coletânea Sega Ages 2500 Series Vol. 25: Gunstar Heroes Treasure Box, junto de Dynamite Headdy e Alien Soldier, e uma versão protótipa como bônus. Posteriormente, o game apareceu de forma emulada nas lojas online do PlayStation 3, Xbox 360, Wii via Virtual Console, iOS, Android e Steam, mundialmente.

Gunstar Heroes também foi lançado no 3DS pela coletânea Sega 3D Fukkoku Archives 3: Final Stage. Rodando nativamente no portátil da Nintendo, o run 'n gun recebeu um modo novo intitulado Gunslinger, no qual a troca dos tiros poderia ser feita livremente apertando um botão. Essa versão foi lançada separadamente no Ocidente em formato digital para o console.

Por fim, o game recebeu uma continuação: Gunstar Super Heroes, lançado para o Game Boy Advance em 2003. Ambientado no futuro com reencarnações dos heróis do Mega Drive, o título do GBA utiliza muitos dos conceitos e fases apresentadas no jogo original, com novas ideias como momentos baseados em clássicos da Sega, como After Burner e Flicky, dois finais, novos recursos para combate a curta distância, a possibilidade de carregar tiros, além de usar e abusar do hardware do videogame.
 
Infelizmente, o sistema de combinações de armas e o modo co-op foram removidos, o campo de visão era prejudicado devido ao tamanho da tela do portátil e, no geral, não é tão divertido quanto o título original.

Uma aventura estelar

A Treasure conseguiu se provar logo em sua primeira produção, trazendo não só um dos grandes clássicos do console da Sega, como também um dos grandes clássicos da história dos videogames como um todo. Gunstar Heroes é um grande exemplo de jogo de ação com bastante diversão, inspiração, criatividade e charme. O pontapé inicial para o legado de uma empresa extremamente talentosa.

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli

Estudante de enfermagem de 24 anos, está nesse mundo dos joguinhos desde criança. Fã de games com vibe mais arcade e arqueólogo de velharias, mas não abandona experiências mais atuais. Acompanha a mídia de podcasts, dublagem e ouvinte assíduo de VGM. Pode ser encontrado como @AlecFull e semelhantes por aí.
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