Esta é a segunda parte da história de Lies of P: Overture. Na primeira, conferimos a linha central que ligou Carlo, Romeo e Lea ao seu nêmesis, Arlecchino. Desta vez, seguiremos os passos da Espreitadora Lendária pelo zoológico de Krat, vislumbraremos o papel da Alquimista Markiona no grande quadro da trama e daremos atenção a Rosaura e a uma mulher ainda sem rosto, mas essencial à história: Camille, mãe de Carlo.
Primeiro, devemos voltar ao começo de Overture, quando Krat ainda vivia sob uma doce ilusão de estabilidade e progresso. Devido a ocorrências da doença da petrificação, o Zoológico de Krat foi fechado pelas autoridades e o contato com o mundo exterior foi encerrado. Romeo, sentindo-se preparado, decidiu ir sozinho para investigar o que acontecia por lá. Ele queria poupar Lea, que se encontrava acometida daquela doença terrível e sentindo tantas dores que estava viciada em analgésicos, porém deixou uma carta avisando sua mentora sobre suas intenções.
Sem ter mais notícias do pupilo, Lea foi até lá por conta própria e encontrou um lugar devastado, tomado por cadáveres ensanguentados, Alquimistas e Carcaças de pessoas e animais.
Entendendo toda a história de Lies of P
Entendendo toda a história de Lies of P
O zoológico de Krat
O Zoológico de Krat foi criado tempos atrás pelo explorador conhecido como Coronel Little, que buscou reproduzir uma savana no local para que os cidadãos experimentassem suas aventuras exóticas com animais de diversas origens.
Não sei se o que atraiu os Alquimistas ao zoológico foi a diversidade de animais para seus experimentos, mas o fato é que a Ordem tentou comprá-lo. Como Little não quis vender sua propriedade, os oponentes forjaram sua morte para assumir o local, dizendo que ele foi devorado por seu amigo, o crocodilo Rex.
Filato, taxidermista e amigo de Little, assumiu o cargo de gerente e foi ordenado pelos Alquimistas a empalhar Rex, descobrindo no processo que não havia evidência de que o animal tivesse matado o coronel. Desconfiado de seus novos patrões, ele escreveu um bilhete com suas suspeitas e o escondeu no crocodilo antes de desaparecer misteriosamente (terá fugido ou foi morto pelos Alquimistas?).
(Uma breve digressão: será essa uma referência ao personagem Doutor Dolittle, que fala com animais? Ele foi criado em um livro de 1920 e, em uma de suas histórias, ajuda um crocodilo. A primeira adaptação para cinema, de 1960, foi protagonizada pelo ator Rex Harrison).
Markiona, a Titereira da Morte
Após a apropriação do zoológico, a Alquimista Markiona ficou como diretora do local, onde conduziu experimentos com títeres e Carcaças. No passado, ela havia sido uma Técnica da Oficina, onde era conhecida como criança prodígio e teve como mentora Camille, esposa de Geppetto.
Mais tarde, ela decidiu entrar para a Ordem dos Alquimistas e ganhou status de Iluminada por ter descoberto a Títere Criada Sagrada, uma títere desperta movida pelo Ergo de uma pessoa falecida. Esse experimento foi considerado uma continuidade da vida anterior e, portanto, um passo adiante na longa busca da Ordem pela imortalidade.
Markiona também alcançou o feito de burlar o Grande Pacto de obediência dos títeres para forçar mais deles a seguirem a vontade da Ordem. Ainda, criou sua própria linha de autômatos, conhecidos como Títeres Arche, um exército feito para colocar em prática os planos de Simon Manus de espalhar o elixir por Krat. Ela podia controlá-los diretamente por meio de um dispositivo implantado em sua mão, semelhante ao que o próprio Geppetto usava para manipular o Títere Anônimo.
Obcecada por dominar todos que a cercavam, Markiona ficou conhecida como a “Titereira da Morte” e se considerava uma rival de Lea, pois as duas eram importantes na disputa de poder entre Simon e Valentinus dentro da Ordem. O ódio entre elas fez a Espreitadora Lendária supor que o desaparecimento de Romeo no zoológico tivesse sido uma armadilha dos Alquimistas, assim como havia acontecido com Carlo antes.
Assim, Markiona se viu em um momento crítico. Primeiro, seus servos levaram a notícia de que havia um títere assassino à solta no zoológico, oferecendo risco à sua vida – mas ele era Arlecchino e seu alvo era Romeo, não Markiona. Segundo, Rosaura, a pequena títere que ela usava em sua pesquisa sobre como reproduzir e burlar o Grande Pacto, escapou, mobilizando os alquimistas em sua busca. Por fim, a Espreitadora Lendária foi vista no local e, à caça da titereira, massacrou muitos lacaios em seu caminho.
A líder do zoológico se protegeu na estufa com sua Títere Arche da Rainha, à espera do títere assassino ou de Lea. Para sua surpresa, quem a encontrou, porém, foi P, um mero desconhecido, que deu fim à vida da titereira dominadora.
Lea havia mudado de objetivo após encontrar a capa e o broche de Romeo em meio a um monumento macabro feito com inúmeros cadáveres cobertos de cera vermelha, como uma pista deixada para ela de que seu verdadeiro inimigo era Arlecchino. Talvez tenha sido o broche com o símbolo da família Monad que tenha indicado a Lea que seu próximo destino deveria ser o Casarão Rosa.
Ela partiu para o Hotel Krat, abaixo do qual ficava o Laboratório dos Zelotes. De lá, ela seguiria o bonde subterrâneo que atravessava a Relíquia de Trismegisto até o litoral, de onde seguiria até a mansão de sua família.
Camille, técnica genial, esposa e mãe amada
Antes das tragédias começarem, Geppetto tinha uma esposa chamada Camille. Aparentemente, eles viviam felizes com sua criança, Carlo. Ela também era uma técnica notável da Oficina e foi mentora de Markiona.
Um trabalho notável de Camille foi a Estátua da Santa Misericórdia (uma referência direta à estátua real Pietà, de Michelangelo). Além da virtuose artística, essa obra-prima encomendada pelos Alquimistas é um dispositivo que usa a Fruta da Moeda de Ouro para renovar aspectos de títeres e modificar suas capacidades.
Tragicamente, os Alquimistas detectaram que Camille era uma possível Audiente e, com participação direta ou indireta de Simon e Markiona, tentaram fazer experiências que a puseram em contato com o Braço de Deus, levando a mulher à morte.
Encobrir as verdadeiras causas da morte de Camille e a participação de Alquimistas foi um processo trabalhoso, levando até mesmo ao extermínio de toda uma equipe para encobrir a verdade ao fingir um vazamento de produtos químicos no laboratório onde ela estava trabalhando.
Valentinus, o Grão-Mestre da Ordem em Krat, não havia autorizado os experimentos, mostrando que a Ordem tinha rachas internas que, no futuro, levariam à ascensão de Simon. Para ele, era imprescindível que a relação com o influente Geppetto, o líder da Oficina, se mantivesse intacta e até ofereceu apoio naquele momento difícil. O viúvo ergueu uma estátua em homenagem à esposa diante da Ópera de Krat.
O próprio Valentinus era criticado por seus seguidores, que achavam que ele não tomava as ações necessárias para investigar e punir o extremismo dos experimentos de Simon e o perigo que ele representava à própria Ordem.
O Ergo de Camille foi implantado em uma títere de serviços domésticos, o que veio a produzir o resultado notável de despertar nela um ego consciente, uma espécie de transfusão de alma. Foi Markiona que a criou e friamente transferiu o Ergo de sua antiga mentora, sendo considerada a responsável pela descoberta do ego desperto na títere, o que lhe deu prestígio dentro da Ordem.
Para os Alquimistas, esse foi um passo a mais na sua busca pela imortalidade, e a nova Camille passou a ser conhecida entre eles como a Títere Criada Sagrada. No entanto, ela não era uma continuidade exata da esposa de Geppetto, tendo em si apenas traços dela, como o afeto por crianças para além do que foi programada. Mesmo considerada sagrada, isso significava apenas que a títere Camille era um objeto valioso para ser usado, desmontado e estudado, até que nada restasse dela.
Deve ter sido esse processo de Markiona que Geppetto aprendeu e chamou de Método do Demônio, usando-o para tentar trazer seu filho Carlo de volta da morte. Era preciso usar o corpo e o Ergo do falecido e usar como recipiente um títere o mais fisicamente parecido com ele.
Foi com esse intuito que o técnico, enlouquecido pelo luto, empenhou-se nos trabalhos que o levaram a criar P, um títere feito à imagem e semelhança de Carlo, livre do Grande Pacto e aperfeiçoado pelo Órgão P para ficar cada vez mais próximo de um ser humano verdadeiro – o repositório para o Ergo de Carlo.
Rosaura, a títere amiga
Um dos feitos de Camille foi a criação de uma títere criança para fazer companhia ao seu filho Carlo no internato do Casarão Rosa. Seu nome era Rosaura e ela era gentil, amável e sonhadora. Foi feita sem estar presa ao Grande Pacto como o restante dos títeres, o que permitiu que desenvolvesse uma provável consciência e sentimentos, tornando-se tão próxima ao menino que ele a desenhou como parte de sua família.
Rosaura também foi vítima de Markiona, que a estudou para descobrir como burlar o Grande Pacto e produzir títeres sob seu próprio controle. A prodigiosa técnica-alquimista teve sucesso e criou unidades às quais chamou de Títeres Arche, que obedeciam apenas aos seus comandos e seriam usados para os propósitos da facção de Simon.
Talvez por não considerar seus estudos terminados, ou por mero sadismo, a titereira manteve Rosaura presa em uma gaiola em seus aposentos do zoológico, até que a menina-títere foi despertada e libertada por uma borboleta branca.
Tudo indica que é de Lea que Rosaura fala ao mencionar a borboleta branca. À procura de sua inimiga, a Espreitadora Lendária passou pela oficina de Markiona na cúpula do jardim botânico e deixou uma mensagem de ameaça. No mesmo local estava a gaiola onde Rosaura estava presa e, sendo amiga de Carlo, Lea deve tê-la reconhecido, despertado e libertado. Afinal, a títere amiga também tinha o desejo de rever Carlo, e a borboleta branca permitiu que se tornasse realidade na pessoa de P, o títere que carrega o Ergo do rapaz falecido.
Ela tentou seguir Lea de volta ao Casarão Rosa, mas acabou ficando para trás e foi encontrada por P, por quem se afeiçoou de imediato. Por três vezes a adorável títere pediu ajuda ao novo amigo para seguir seu rumo de volta ao lar. Ao chegar lá, porém, a tragédia já havia devastado toda a vida dos moradores da mansão, então ela mudou de destino, desejando se encontrar com o novo amigo uma última vez.
A menina autômata seguiu até a prefeitura de Krat, onde entalhou seu voto de amizade em uma árvore e esperou pelo retorno de P, que a encontrou muitos anos depois, em seu próprio tempo, quando Rosaura estava em seus momentos finais.
Continua
Ainda há mais revelações de Lies of P: Overture pela frente. No último texto, veremos mais detalhes sobre a trama dos Alquimistas e os Espreitadores envolvidos, completando os bastidores da história da ruína de Krat.
Revisão: Alessandra Ribeiro
Captura de imagem de Rosaura por u/mooncentipedes (Reddit)