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Capcom: acompanhe a trajetória de um dos maiores ícones da indústria dos jogos (Parte 1)

Em uma relação de amor e ódio com seu público, relembre os jogos que marcaram gerações.

São poucas as empresas que conseguiram ser tão presentes na vida de todos aqueles que tiveram contato com jogos eletrônicos de alguma forma. Seja no arcade ou nos consoles de mesa, a Capcom esteve presente em todas as plataformas ao longo dos anos, quebrando recordes e estabelecendo padrões. Por uma profunda admiração a esse legado, é uma honra compartilhar com vocês um pouco dessa história.

Dos arcades para a casa das pessoas

A Capcom é fruto de separações e fusões de outras empresas, estabelecida em 1979 através da I.R.M. Corporation com o propósito de desenvolver arcades para o mercado interno do Japão.

Com o seu nome alterado para SANBI em 1983, obtiveram sua primeira subsidiária chamada Capsule Computer. Inauguraram sua primeira máquina de entretenimento eletrônico através de moedas, mas em um layout mais próximo ao de máquinas de jogos de azar do que o arcade como conhecemos.

Little League e Fever Chance, primeiros modelos arcades da empresa

Somente em maio de 1984 que teríamos o primeiro jogo lançado nos moldes de um arcade. Vulgus é o clássico jogo de aeronave: controlamos uma espaçonave que se movimenta sempre na vertical, onde devemos desviar de projéteis e abater as aeronaves inimigas. Mais tarde, em outubro, foi sucedido por 1942, um jogo nos mesmos moldes e o primeiro título da empresa a receber uma continuação.

1985: um cavaleiro seminu e a decisão perigosa

Um ano de decisões ousadas para a Capcom. Inicialmente a empresa teve um momento confortável com o lançamento de jogos como Commando e o icônico Ghosts’n Goblins, o primeiro jogo de aventura em plataforma da empresa. Nele controlamos o carismático Sir Arthur e, armados de sua brilhante armadura e lança medieval, teremos que resgatar a princesa do terrível Demônio, no melhor estilo Super Mario Bros.

Sir Arthur ficou famoso pelo seu carisma. Após receber o dano, o bravo cavaleiro perde sua armadura, ficando apenas de cueca.

O jogo apresentava um nível de dificuldade absurda, dentre elas: o fato de precisar de uma arma específica para derrotar o último chefe, o fato de não contar com continue nos arcades e a obrigação de recomeçar o jogo ao passar da última fase, pois tudo não passava de uma ilusão do vilão. 

1985 ficaria marcado na história da Capcom, não pelo seu recente jogo, quase impossível, do cavaleiro seminu, mas pela decisão da empresa de entrar no mercado de consoles de mesa. Uma decisão que para qualquer especialista da época seria taxada de suicida devido a crise dos jogos eletrônicos de 1983: más decisões por parte da Atari e ameaça crescente por parte da popularização dos computadores domésticos. 

De fato, teria sido suicídio se não fosse pela mente criativa de Shigeru Miyamoto com o advento da Nintendo através do Nintendo Entertainment System (NES), dando novos ares para a indústria de consoles de mesa.

A lenda viva dos jogos eletrônicos, Shigeru Miyamoto. Se você joga video game da forma que joga hoje, agradeça a esse visionário.

Com o NES trazendo uma nova proposta totalmente simplificada, criativa e interativa na maneira de se jogar, a Capcom encontrou o terreno fértil que precisava para expandir seus títulos para além dos arcades. 

Sem perder tempo, ela tratou de trazer seus títulos mais famosos do arcade para o console da Nintendo. O resultado se mostrou positivo, pois enquanto os jogos contribuíram ainda mais com a fama do “Nintendinho”, a Capcom se tornava a prova viva de que momentos de crise podem se tornar momentos de oportunidade.

1987: briga de rua e um simpático robô

Hoje os jogos de luta são um gênero indispensável em qualquer plataforma. Nem sempre esse cenário foi realidade. Em agosto de 1987 a estrada para isso seria encurtada com o lançamento de Street Fighter.

A ideia de escolher entre uma dupla de artistas marciais (Ryu e Ken) e sair pelo mundo em busca dos mais fortes foi muito bem-vinda pelo público. Fora o conceito chamativo, era  a primeira vez que um jogo utilizava vários botões para diferenciar a intensidade, nesse caso, dos golpes. Os ataques especiais foram outra inovação que padronizou o futuros dos jogos de luta, afinal, a coisa mais comum nesse tipo de jogo, é a famosa combinação de baixo, frente e soco (hadouken).

A ideia de sair pelo mundo lutando com outros oponentes serviu de inspiração para outros jogos e filmes.

Apesar de inovador, o título acabou sendo engolido pela estrondosa fama de seu sucessor. Ainda assim, sua contribuição para o universo dos jogos é notável e deve ser reconhecida. 

As mentes-chave na criação do jogo, Takashi Nishiyama e Hiroshi Matsumoto, deixariam a Capcom poucos anos depois, ingressando na SNK. Onde contribuíram no desenvolvimento de jogos como Art of Fighting e The King of Fighters. Mostrando que os grandes rivais tem mais em comum do que imaginamos.

O rival Art of Fighting bebeu da mesma fonte de Street Fighter

Os negócios para Capcom iam a todo vapor, mesmo iniciando sua jornada com os arcades, ela já era vista entre as maiores produtoras de conteúdo para consoles e um dos pilares para a Nintendo. Em dezembro, esse patamar seria ainda mais sólido através da contribuição de Keiji Inafumi, co-criador de uma das séries mais icônicas da empresa nipônica: Mega Man.

Inspirado no anime Astro Boy, Mega Man conta a história de um futuro em que a humanidade convive pacificamente com robôs. Ameaçado pela mente maléfica do Dr. Wily, o bondoso Dr. Light não vê outra saída senão construir dois robôs: Rock e Roll. Transformando Rock em um robô de combate em resposta aos planos de dominação de seu antigo parceiro.

Mega Man rapidamente conquistou seu espaço como um dos títulos mais queridos dos jogos de plataforma.

Embora não tenha alcançado o retorno necessário em sua primeira tentativa, a ideia era promissora e incentivou a equipe na produção de continuações. Hoje, Mega Man é sem dúvida uma franquia de sucesso, sendo o título com a maior quantidade de spin-offs do mundo.

1989: um ano de grandes mudanças

Em 1989, frente aos enormes sucessos e ao futuro promissor que empresa tinha pela frente, a antiga Capcom fundiu-se com a SANBI, iniciando um forte processo de expansão pela Ásia, Europa e América do Norte nos anos que viriam.

O nome Capcom seria o utilizado para a nova empresa. Com uma breve menção a sua antiga subsidiária, o nome também remete a ideia de uma cápsula rígida, protegendo o patrimônio da corporação contra plágios e, por dentro, repleta de entretenimento para seus consumidores.

No mesmo ano seriam lançados títulos como Bionic Commando, um jogo de plataforma que causou certa estranheza ao público pela substituição do pulo por um gancho acoplado no personagem. O título causou mais polêmica do que sucesso, sofrendo censura em alguns países pelo uso indiscriminado de figuras do nazismo.

Com o apoio de três desenvolvedores da Capcom e um mangaká do estúdio Kikaku’s Manga, um novo conceito foi desenvolvido e o personagem Strider nasceu fruto dessa parceria conjunta. Mesmo não sendo um título exponencial, até hoje o personagem é bem visto pelo público, principalmente nos jogos de luta.

Embora não tenha feito tanto sucesso em seu título solo, Strider virou presença garantida nos jogos da série versus

Ao final de 89 , um novo título beat ‘em up seria lançado, redefinindo e popularizando a Capcom em um dos gêneros mais famosos do arcade. Final Fight chegou em dezembro e, mesmo não sendo pioneiro na área, o título revitalizou o gênero, servindo de inspiração para outros que viriam, como Streets of Rage e Captain Commando

Até hoje é considerado por muitos como o melhor beat ‘em up de todos os tempos, sendo portado para o SNES em 1990. Um detalhe curioso sobre a popularidade do jogo: o ator Robin Williams deu o nome de Cody Williams ao seu filho, referência a um dos protagonistas do jogo.

Um ninja sagaz, o prefeito brutamontes e um brigão de rua: Guy, Haggar e Cody fizeram história em um dos maiores “comedores de ficha” de todos os tempos.


1991: a explosão de um hadouken

Com um time liderado por Yoshiki Okamoto e dois artistas iniciantes: Akira Yasuda e Akira Nishitani. O grupo recebeu a difícil tarefa de resgatar um título não tão difundido nos arcades: Street Fighter. Em seu próximo lançamento, a equipe não só trouxe de volta um título de sucesso, mas foi responsável por popularizar todo um gênero ao redor do mundo.

Street Fighter II chegou aos arcades trazendo maior simplicidade nos comandos, uma grande variedade de personagens carismáticos, com todo um background por trás de cada um, e uma trilha sonora acelerada que incitava ritmo ao jogo.

A famosa abertura é conhecida por muitos e, sim, até hoje você se pergunta quem são os dois lutadores

Poucas continuações são tão bem sucedidas que passam a sensação de serem o primeiro título de uma franquia. Muitos tiveram seu primeiro contato somente em Street Fighter II e sequer cogitaram a existência de seu antecessor. 

De fato, é impossível mensurar o tamanho do sucesso alcançado, que consagrou não só a franquia, mas os jogos de luta como um todo. Tamanho foi o seu sucesso, que até hoje o game recebe remasterizações para os consoles da nova geração.

Quem nunca se envolveu em uma disputa de hadoukens? Ken e Ryu, os eternos rivais nos jogos de luta

De tudo um pouco

A Capcom foi uma das poucas empresas que conseguiram ser bem sucedidas em diversos tipos de plataforma, de arcades a portáteis. E nos mais variados gêneros, passando por beat ‘em ups, luta, esportes e até mesmo puzzles. Muito se deveu a sua política expansionista que lhe garantia muitas equipes atuando simultaneamente.

Em 1993 seria dado o primeiro passo no fértil solo dos RPG’s com o lançamento do primeiro Breath of Fire. Embora o jogo não seja o título de maior dominância do gênero, ele facilmente figura entre os melhores e mais requisitados pelos fãs.

Breath of Fire não revolucionou o gênero, mas trabalhou bem suas características e até hoje deixa saudades nos fãs

Como se não bastasse explorar ao máximo a indústria dos jogos, as animações entraram na mira da empresa. Em 1994, impulsionados pelo estrondoso sucesso de Street Fighter II, a Capcom lançou a primeira versão animada do jogo. Com a receptividade positiva por parte do público, outras versões foram produzidas, inclusive, uma série animada para a TV.

A série animada foi transmitida em diversos países nos anos 90, inclusive no Brasil

E se uma animação veio bem a calhar, por que não um filme? Essa foi a ideia dos executivos da Capcom na época, que aproveitaram o impulso das vendas para atrair um elenco de respeito. Atores como Jean Claude Van Damme e Raul Julia fizeram parte do elenco. Mesmo com uma crítica massiva por parte de especialistas e dos fãs, o filme foi um sucesso de bilheteria e arrecadou três vezes o custo de sua produção.

O filme contava com Van Damme no papel de Guile e Raul Julia como Mr. Bison, papel que lhe rendeu uma premiação póstuma

1994: o efeito Excelsior!

O ano que ficou marcado pelo início de uma parceria lucrativa com a Marvel. Seu primeiro projeto veio através de um simples beat ‘em up chamado X-Men: Mutant Apocalypse para o Super Nintendo. Embora o jogo não tenha sido tão expressivo, ele bebeu da enorme popularidade que os X-men viveram nos anos 90. Deixando claro para ambas as empresas onde apostarem suas fichas.

A equipe de mutantes fez um estrondoso sucesso nos anos 90 nas mãos do talentoso Jim Lee. Evidente que a Capcom não perderia essa oportunidade

Motivados pelo potencial da ideia, somado ao histórico com Street Fighter. X-Men: Children of the Atom ganhou vida, colocando personagens icônicos da franquia de mutantes para lutarem entre si. O jogo foi muito bem recebido pelo público, mas ainda não foi suficiente para saciar a Capcom.

Children of Atom trouxe uma nova jogabilidade acelerada, com muitos combos e especiais bem elaborados

Foi quando a Capcom teve a brilhante ideia de criar um jogo colocando seus famosos personagens de Street Fighter contra os X-Men. O jogo chegou primeiro aos arcades, com versões posteriores para os consoles. O título não só foi extremamente bem sucedido, como também criou uma nova e querida vertente nos jogos do gênero: a luta dinâmica por equipes. Dando margem para outras continuações de grande sucesso até os dias de hoje.

A nova série permitiu um elenco nunca antes imaginado e virou febre entre jogadores casuais e profissionais

1996: a redefinição do horror

O até então desconhecido, Shinji Mikami, deu as caras para trazer um dos jogos mais assustadores e revolucionários já criados. Resident Evil não só serviu de exemplo, como redefiniu o gênero de horror e sobrevivência, virando um sinônimo para ele. 

O marketing realizado pela Capcom foi certeiro, ajudando a promover uma das melhores experiências no estreante PlayStation. O título fez as vendas dispararem, estabelecendo um novo gênero e franquia na indústria, além de se tornar um verdadeiro “system seller”.

O primeiro título da franquia de zumbis pegou todos de surpresa e rapidamente conquistou uma legião de fãs pelo mundo

Fica difícil colocar em uma escala o quanto Resident Evil viria a influenciar a indústria do entretenimento como um todo. Sua narrativa repleta de mistérios e uma jogabilidade peculiar, estranha até certo ponto, seriam reutilizadas por diversas produtoras e nos mais variados gêneros. 

Muito deles foram títulos de renome, como o Dino Crisis, oriundo da mesma mente criadora de sua fonte inspiradora.

Como seria a fusão entre Resident Evil e Jurassic Park? Provavelmente foi o que se passou na cabeça do Shinji Mikami em 1999, quando surgiu com o inesperado Dino Crisis. Encaramos aqui a agente especial Regina em uma missão até a misteriosa ilha Ibis, em busca do paradeiro de um famoso cientista. 

A princípio, tudo indica que teremos um jogo de ação até descobrirmos que a ilha está repleta de dinossauros vindos do famoso filme de Steven Spielberg, rapidamente somos levados a uma nova esfera do survival horror.

Dino Crisis, com sua protagonista ruiva e seus inúmeros dinossauros, conquistou um público fiel que até hoje espera por um novo título

A Capcom teve uma verdadeira época de ouro desde a sua criação até o final dos anos 90. Sem deixar de enfatizar o seu mérito, afinal, foram muitas decisões estratégicas que exigiram criatividade e ousadia em momentos difíceis na história da indústria. Será que essa fórmula de sucesso se manteria nos próximos anos? Não deixe de conferir na segunda parte deste especial.

Revisão: Raphael Barbosa

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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