Chronicle

PlatinumGames: Como um estúdio japonês trouxe de volta a esperança para a comunidade gamer

Conheça a história do estúdio fundado por ex-funcionários da Capcom que conseguiu a façanha de unir os críticos, os jogadores e a própria indústria em um só tom.


O cineasta Ang Lee, em entrevista ao dramaturgo e jornalista Neil Norman, descreveu seu filme, Crouching Tiger, Hidden Dragon, como um Combination Platter (prato de combinações). O termo, então,se tornou recorrente nos estudos de mídia para descrever produtos da indústria cultural que conseguem agregar em uma única obra múltiplas referências, tanto ocidentais quanto orientais, a fim de agradar tanto o mercado asiático quanto o dos países ao oeste.


Apesar de O Tigre e o Dragão (como o filme de Ang Lee ficou conhecido por terras tupiniquins) pouco nos importar, o conceito de Combination Platter é extremamente pertinente para a compreensão do que faz o estúdio japonês PlatinumGames ser tão diferente de outros do mesmo tamanho, que geralmente prezam por um mercado específico, como somente o japonês ou exclusivamente para o americano. Quando isso acontece e o jogo acaba sendo exportado para o outro lado do mundo, ele muitas vezes tem sua imagem completamente retrabalhada a fim de agradar essa nova audiência.

No caso da Platinum, muitos dos jogos já são concebidos tendo em mente essa diversidade de mercados para, no fim, ajudar a criar um novo panorama e fazer com que a ideia de “estúdio japonês” ou “desenvolvedores japoneses” parassem de carregar o estigma de serem algo tão específico e exótico. Um exemplo que serve de comparação é como o gênero RPG tem como derivado o chamado JRPG, que seria aquele tipo de role-playing game com características específicas consequentes da identidade cultural japonesa aplicadas em seu conceito. Segundo Kenichi Sato, CEO do estúdio, o objetivo da Platinum é “colocar o melhor do Japão na indústria internacional de games, mergulhando de cabeça na produção de games únicos que surpreendam e deleitem  os jogadores”, ou seja, unir o melhor de dois mundos no intuito de criar as melhores experiências em entretenimento digital.

Assim, para entendermos um pouco do que faz a PlatinumGames tão especial em seu ideal visionário, é necessário compreender um pouco de sua formação e crescimento desde seus tempos mais remotos, quando ex-funcionários da Capcom se juntaram no intuito de criarem algo único de forma autônoma.


Antecedência espiritual com a Clover Studio

A Clover Studio era inicialmente conhecida  como Team Viewtiful, uma equipe específica do Capcom Production Studio 4 — onde Shinji Mikami produziu ou dirigiu títulos como Killer7 (PS2/GC) e Resident Evil 4 (Multi) — responsável pela criação e desenvolvimento do primeiro Viewtiful Joe (GC/PS2). Na direção dessa até então nova propriedade intelectual, estava o jovem Hideki Kamiya, o diretor por trás do  primeiro Devil May Cry (PS2), ao lado de Atsuhi Inaba na produção.  Lembre-se desses nomes, eles serão importantes a partir daqui.

Viewtiful Joe era um estiloso beat ’em up em progressão lateral em que Joe precisa resgatar sua namorada Silvia da organização Jadow, uma organização maligna que pretende dominar a Movieland (espécie de mundo alternativo onde habitam os personagens fictícios ilustrados em filmes no mundo de Joe). Para tal, com o auxílio de um mecanismo chamado V-Watch, o herói se transforma em Viewtiful Joe, seu alter ego. O título conta com forte influência dos heróis de Tokusatsu, aqueles live-actions de heróis fantasiados como Jaspion, Jiraiya e Kamen Rider.

No intuito de facilitar o desenvolvimento de Viewtiful Joe 2 (GC/PS2), a Capcom separou o Team Viewtiful e formalizou tal time em um estúdio próprio, a Clover, que também foi responsável por Viewtiful Joe: Red Hot Rumble (GC/PSP) e Viewtiful Joe: Double Trouble! (DS). É notável também que Mikami foi transferido para a Clover Studio após entrar em atrito com a empresa japonesa por conta do port de Resident Evil 4 para o PlayStation 2, o qual era contra após ter bancado, na época, a sua exclusividade para o Gamecube. Dessa forma, percebia-se que a relação da gigante japonesa com o game designer já estava se desgastando.

Depois do sucesso que foi Viewtiful Joe (a ponto de ter inclusive ganhado uma adaptação em anime), a Clover precisava seguir em frente com novas IPs. Assim foram lançados Okami (PS2/Wii) e, apenas cinco meses depois, God Hand (PS2). Enquanto o primeiro recebe recorrentes ports em HD, seja para PlayStation 3, PlayStation 4, Xbox One, PC e, mais recentemente, Switch, o segundo recebeu apenas uma reedição como um clássico do PS2.
A aventura é épica por sua narrativa, visual e jogabilidade ímpares, e colocar uma obra destas à disposição de jogadores da geração atual é oferecer a oportunidade de jogar algo que não se encontra em qualquer franquia ou empresa de jogos. Por isso, Okami deve não somente ser lembrado como um clássico de duas gerações atrás, mas também como uma aventura épica e totalmente contemporânea.

(Arthur Maia, em análise da versão HD para o GameBlast)
Okami é uma aventura épica à The Legend of Zelda em que o jogador controla a deusa do sol Amaterasu em uma jornada para salvar Nippon e se tornou conhecido por incorporar a mecânica do pincel celestial — cujos desenhos feitos com ele alteram a realidade do jogo. God Hand, por sua vez, é um intenso e frenético Beat’em Up em que Gene, o portador do nome "God Hand", precisa enfrentar o Rei Angra que pretende dominar o mundo com seu exército de demônios. Ressalta-se que tal título veio no intuito de resgatar a ideia de combates mano a mano perdidas numa contemporaneidade em que os protagonistas de games de ação acabam preterindo os próprios punhos em detrimento de outras armas, como é o caso das séries God of War e Devil May Cry. God Hand também gerou controvérsia por causa de sua dificuldade elevada para os padrões da época, o que ocasionou algumas análises negativas provindas de veículos que enxergaram isso como um defeito.

Com o lançamento dos dois títulos em 2006, nota-se que houve pouco planejamento por parte da Capcom, visto que, apesar de Okami receber boas notas da crítica, o fato de ambos os jogos saírem praticamente juntos aparentemente sufocou a promoção publicitária um do outro, resultando em baixas vendas e, consequentemente, no fechamento da Clover Studio. Segundo o comunicado da empresa divulgado na época, “a Clover Studio cumpriu seu objetivo ao desenvolver softwares de videogame únicos e criativos. Contudo, no intuito de promover uma estratégia que se concentra na administração de recursos de determinados negócios para aprimorar a eficiência do poder de desenvolvimento de toda a Capcom, a dissolução do estúdio foi sugerida e passada para a diretoria”.


O surgimento da Platinum e sua parceria com a Sega

O fim da Clover Studio colocou Kamiya, Mikami e Inaba na rua. Naquela mesma altura, outro desenvolvedor havia largado a Capcom por estar frustrado com o fato de não conseguir exercer alguma liberdade por resumir seus trabalhos apenas a relegações da empresa. A Platinum, então, surge da união da ODD. Inc, marca criada por Minami, e da SEEDS Inc, fundada pelo trio. Na nova firma, Minami passou a ser o encarregado das questões administrativas e burocráticas, enquanto os outros três assumiriam a direção criativa.

Recém-formada e ainda sem a capacidade de lançar títulos por conta própria, a Platinum conseguiu fechar em 2008 um acordo com a Sega para o desenvolvimento de quatro diferentes IPs. A primeira delas foi Madworld (Wii), lançado em 2008. O game conta a história da participação de um homem chamado Jack Cayman em um ultraviolento jogo de battle royale com toda uma cidade de arena. Pense em Jogos Vorazes, mas lançado justamente alguns meses antes do primeiro livro sair.

Madworld era um Beat’em Up ousado que fugia do estereótipo comum de jogos infantis e casuais atrelado aos títulos do Wii. Sem um poder de processamento gráfico avantajado, a PlatinumGames optou por seguir uma linha de visual mais artístico ao determinar o seu contexto em uma ambientação noir, com o visual completamente branco e preto, além do vermelho para o sangue dos inimigos e, em poucas ocasiões, o amarelo para as onomatopeias, fazendo homenagem ao clássico Sin City, de Frank Miller.

O segundo jogo da PlatinumGames foi Infinite Space (DS). Lançado em 2009 no Japão e em 2010 no ocidente, tratava-se de um RPG espacial em que o jogador poderia construir sua própria nave, bem como determinar como seria formada a sua tripulação. Apesar de não ser um dos trabalhos de referência do estúdio, é notável que sua influência nos trabalhos de Arthur C. Clarke (mestre inglês da ficção científica) trouxe alguma identidade ao título. O game não vendeu muito bem no ocidente, mas acabou esgotando logo em seu lançamento no Japão.

De 2009 para 2010 também seria lançada a verdadeira menina dos olhos da Platinum. Bayonetta (Multi) é considerado hoje um dos carros-chefes do estúdio. Bebendo da experiência adquirida desde Devil May Cry, passando por God Hand e Madworld, Bayonetta é a epítome dos jogos de ação e consolidou a violência exagerada — quase cômica —, humor questionável e gameplay frenético que exige muita habilidade técnica do jogador como elementos integrantes do DNA da PlatinumGames. É interessante ressaltar que o próprio Kamiya, na época, alegou que o título seria responsável por revolucionar um gênero que a própria equipe (aqui conhecida como Team Little Devils) tinha criado na Capcom com DMC.

Curiosamente, apesar de ter feito sucesso com a crítica e com aqueles que jogaram o game, Bayonetta foi um fracasso de um ponto de vista corporativo. O primeiro problema diz respeito ao processo de produção do jogo em si, considerando o perfeccionismo da Platinum em relação ao título e que pode ser observado por uma faixa de comentários making of feita pelos developers e que foi dividida em sessenta e nove vídeos.  A questão é que, segundo relatos, Kamiya exigia tanto da equipe que ela ficou sobrecarregada, frustrando todo o time de produção, que ao fim do desenvolvimento perdeu a paciência e quase desistiu de trabalhar com isso, mas que, ainda bem, mudou de ideia depois da repercussão positiva dos jogadores.

Outro problema enfrentado por Bayonetta foi a sua versão do PlayStation 3. Sendo desenvolvida com maior propriedade para o Xbox 360, a versão de PS3 de Bayonetta acabou tendo sua performance prejudicada por uma baixa taxa de quadros — principalmente nas fases de moto —, carregamento de fases demorado e uma série de outros problemas resultantes de uma otimização ruim. Por fim, é interessante pensar que, tal como os títulos da Clover Studio, apesar de Bayonetta logo se tornar um clássico, as vendas ficaram abaixo do esperado, mesmo que o jogo fosse, naquele momento, o mais vendido da PlatinumGames até então.

O quarto projeto da parceria entre a Platinum e a Sega veio sem muito alarde. Vanquish (PS3/X360/PC) foi lançado em 2010, e era um jogo de tiro em terceira pessoa em que o jogador precisa resgatar uma estação espacial dos Russos, cujo governo sofreu um golpe de Estado e o novo grupo no poder desafiou a soberania dos Estados Unidos. Com mecânicas que dão uma nova dinâmica aos third-person shooter ao dar uma importância maior na movimentação do personagem, Vanquish foi desenvolvido direto para o PlayStation 3 para evitar eventuais problemas com o port. Foi também o único trabalho desenvolvido pelo Shinji Mikami enquanto trabalhava na Platinum, que se separou do estúdio e abriu o seu próprio: Tango Gameworks, onde trabalhou em The Evil Within (Multi).
Como é característico da Platinum, a profundidade das mecânicas não é imediatamente aparente. É possível, em geral, jogar Vanquish apenas atirando de locais seguros e usando os joelhos-foguete para ir de uma mureta para outra. No entanto, isso rapidamente torna-se repetitivo e é natural que o jogador queira explorar o que mais o jogo tem a oferecer, e é aí que a jogabilidade começa a brilhar. O legal de Vanquish é tentar ser ofensivo em vez de defensivo. Em várias situações, o jogador vai morrer e, na próxima vez, jogará um pouco melhor. Eventualmente, o objetivo deixa de ser apenas sobreviver a cada confronto, mas sim derrotar todos os inimigos de maneiras estilosas ou divertidas, da forma que o jogador preferir. São essas características que dão aos jogos da Platinum um nicho de fãs tão fiel, e Vanquish não foge disso.

(Renan Greca, em análise para o Gameblast)
Depois desses quatro jogos, a parceria com a Sega foi estendida para um último quinto título extra: Anarchy Reigns (X360/PS3), que trouxe de volta Jack Cayman e expandiu o universo de Madworld. Apesar de deixar de lado a estética noir, o game traz uma campanha diferenciada que acompanha dois personagens diferentes e até mesmo rivais cuja narrativa acaba se cruzando em determinados pontos.

Anarchy Reigns foi um fracasso de vendas tanto no ocidente quanto no oriente, quando lançado em 2012 para 2013. Aparentemente, a parceria de ambos já parecia desgastada e era a vez da PlatinumGames ir atrás de novos horizontes.


Licenciamentos e parceria com a Nintendo

Depois de encerrada a parceria com a Sega, o próximo trabalho do estúdio foi com uma IP já consolidada. Após um período de pré-produção conturbado, Metal Gear Solid Rising caiu nas mãos da Platinum em 2011, com o duvidoso subtítulo Revengeance, após Inaba ter questionado Kojima a respeito do progresso do jogo em questão. É notável como os vícios da franquia Metal Gear tiveram  que se adaptar ao estilo gameplay visceral da Platinum, como exigir  a diminuição do tempo de cutscenes em detrimento de jogabilidade mais intensiva, além de trabalhar com a ideia de fazer o game acessível até mesmo àqueles que nunca jogaram nada da franquia.

Metal Gear Solid Rising: Revengeance (Multi) chegou em 2013. O jogo foi um sucesso e finalmente a Platinum teve um produto que vendeu dentro das expectativas, de acordo com o Kojima. Isso além de conseguir angariar uma legião de fãs ardorosos pelo título, responsáveis pela disseminação de memes próprios derivados, como a questão das Nanomáquinas e o próprio discurso de Monsoon sobre memes.

Nesse meio tempo, a Platinum esteve atrás de alguém que financiasse um projeto próprio: Bayonetta 2. Depois de uma série de negativas de várias produtoras — o que é justificável, visto que o primeiro jogo vendeu menos do que o esperado — a Nintendo acabou sendo a única a apostar no game, com a condição de que o estúdio também produzisse uma IP própria e nova para o Wii U. Surgia The Wonderful 101 (Wii U).

Com uma temática levemente próxima a de Viewtiful Joe, o jogo conta com um gameplay singular em que o jogador controla um grupo de heróis, todos simultaneamente, e, com uma mecânica similar à de Okami, utiliza desenhos na tela do Gamepad para fazer a pequena multidão tomar diferentes formas, como a de um punho, uma espada ou até mesmo uma bomba capaz de parar o tempo. Um fato curioso que a ideia original para a IP seria um título crossover com a mesma pegada de Super Smash Bros., com personagens da própria Nintendo interagindo ao mesmo tempo em tela para os desafios propostos, mas ela logo foi descartada quando perceberam que seria complicado criar uma única fórmula capaz de criar sincronia entre todos os personagens como Smash foi capaz.
The Wonderful 101 é diferente de tudo o que você já viu. O título conta com uma aventura ousada e jogabilidade criativa, características reforçadas por uma atmosfera exagerada, inusitada e colorida. O combate pode ser intimidador em um primeiro momento, mas uma vez dominadas as mecânicas de batalha é fácil mergulhar e se divertir na sua complexidade e variedade. Alguns pequenos problemas, como a bagunça visual e desenhos reconhecidos erroneamente pelo GamePad, atrapalham a experiência de jogo. Por sorte estes detalhes são facilmente contornados. The Wonderful 101 é sim uma experiência caótica, mas também desafiante, divertida e única.

(Farley Santos, em análise para o Nintendo Blast)
The Wonderful 101, apesar de não fazer um sucesso estrondoso, seja com a crítica, seja com as vendas, conseguiu, de forma notável, angariar um público próprio fiel, tornando-se uma espécie de videogame de nicho, que não agrada a todos, mas com certeza tornou-se favorito de um número seleto de jogadores.

Depois de preencher os requisitos da Nintendo, Bayonetta 2 (Wii U/Switch) finalmente entrou em produção. Segundo o diretor do jogo, Yusuke Hashimoto, trabalhar sob a tutela da empresa é algo único. De acordo com ele, houve total liberdade criativa e a Big N só estava agindo como uma observadora que aponta alguns problemas de forma ocasional, mas é interessante como o padrão de qualidade da empresa acabou melhorando o produto final. Segundo Hashimoto, “se tem algo que aprendemos ao trabalhar com a Nintendo é que não podemos disfarçar as fraquezas da jogabilidade central com gráficos levemente mais bonitos adicionando mais cutscenes ou coisa do tipo. A primeira e principal preocupação é justamente o núcleo do jogo e a qualidade do gameplay. Eles realmente ficaram em cima disso, e dá um pouco nos nervos trabalhar com quem é tão perfeccionista até esse ponto”.

Lançado em 2014, Bayonetta 2 foi um sucesso de crítica, mas também não estourou em vendas, dando um retorno ainda menor do que o primeiro título, independente do fato de que, nos lotes iniciais, ambos acabaram sendo vendidos numa única caixa em esquema de promoção. Além disso, Bayonetta 2 ainda sofreu alguma represália de alguns fãs que não ficaram satisfeitos com o jogo ser exclusivo de Wii U, o que levou Kamiya a realizar ácidos comentários em relação a essa repercussão ao explicar que o ele só não saiu para outras plataformas porque ninguém quis financiá-lo.
O primeiro jogo de Bayonetta chamou atenção em sua época, mas não foi suficiente para bancar sozinho uma continuação. Com a ajuda financeira da Nintendo, a SEGA e a Platinum conseguiram fazer com que Bayonetta 2 exercesse esse papel, tirando a sombra da “continuação fracassada” e garantindo sua posição como um dos melhores jogos de Wii U lançados este ano.

(Gilson Peres, em Análise para o NintendoBlast)
No mesmo ano, a PlatinumGames lançou dois jogos licenciados de franquias conhecidas. O primeiro foi The Legend of Korra (Multi), baseado na segunda série de Avatar, exibida pela Nickelodeon; e Transformers: Devastation (Multi). Enquanto o primeiro recebeu uma repercussão negativa da crítica, é notável que os fãs da série acabaram gostando do produto e ignorando o fato de praticamente não haver nada além de uma mirrada campanha principal, o gameplay, apesar de simplista — principalmente em relação a títulos anteriores do estúdio —, acabou caindo na graça de jogadores menos exigentes. Transformers, por sua vez, foi elogiado como um trabalho competente, embora tenha recebido críticas devido à curta campanha e jogabilidade repetitiva.


Expandindo o mercado e de olho no futuro

Depois da parceria bem-sucedida com a Nintendo — pelo menos em relação à evolução técnica do estúdio — a Platinum foi confirmada como a produtora de Scalebound, RPG de ação exclusivo para Xbox One. Ao mesmo tempo, o estúdio também foi anunciado como co-desenvolvedor de Star Fox Zero (Wii U) ao lado da Nintendo EPD, o que mostrou que ambas as empresas acabaram ficando próximas uma da outra e dividiam um sentimento de confiança em relação a projetos futuros. Aproximadamente no mesmo período, o desenvolvimento de NieR: Automata (PS4/PC) teve início. Sob a supervisão da Square Enix, a ideia era trazer um gameplay mais dinâmico ao spin-off da série Drakengard, e a Platinum acabou sendo requisitada para a tarefa.
Sem dúvida é curioso que a Nintendo, cujo objetivo é tornar seus jogos o mais acessível possível, tenha lançado Star Fox Zero com a característica tradicional dos jogos da PlatinumGames — parecer impossivelmente complexo à primeira vista mas então se tornar extremamente divertido após pegar o jeito. Mas, independente dos motivos que levaram a isso, o resultado de Star Fox Zero é inegável. É um jogo divertidíssimo e muito bem feito, mas isso não será percebido por muitos que o jogarem, se estes não conseguirem se acostumar com os controles ou esperarem uma experiência muito mais nos moldes de 2016.

(Renan Greca, em análise para o NintendoBlast)
Star Fox Zero teve um desenvolvimento sem problemas e, em seu lançamento, uma repercussão bem morna da imprensa e fãs, principalmente porque o Wii U já se mostrava em seus últimos suspiros, e naquela altura, ninguém mais colocava fé no aparelho. Scalebound, por sua vez, foi sumariamente cancelado depois de ser adiado de 2016 para 2017. Phil Spencer, vice-presidente executivo da marca Xbox, deu a entender que a descontinuação do projeto se deu por divergências criativas: “se falarmos especificamente de Scalebound, adoro o senhor Kamiya, adoro a Platinum, trabalharia com eles num segundo jogo, penso que fazem um grande trabalho. O que estava a ser feito não funcionou para nós, e penso que falo coletivamente”. No entanto, nenhuma justificativa oficial foi dada, restando apenas suposições.

O ano de 2016 também recebeu o lançamento de Teenage Mutant Ninja Turtles: Mutants in Manhattan (Multi), com produção da Activision. Foi um título que ninguém recebeu bem, ninguém conseguiu ver algum valor nele, de fato, visto a recepção medíocre. O jogo das Tartarugas Ninja, no fim das contas, se mostrou tão irrelevante que sua existência sequer é lembrada direito quando se fala do estúdio, principalmente depois do que viria a seguir, no começo de 2017, quando NieR: Automata chegou ao mercado.

Contando a história de um futuro pós-apocalíptico resultado de uma guerra entre humanos e máquinas, o título foi um marco por unir o melhor gameplay que a Platinum podia oferecer em conjunto da capacidade já reconhecida da Square-Enix em contar histórias. O jogo conseguiu o feito impressionante de atingir novas camadas de complexidade tanto na jogabilidade em formato de RPG quanto em enredo, que levantou uma série de questões sociais e filosóficas suscitadas pela sua história, além de contar com uma qualidade técnica impressionante tanto na apresentação visual quanto sonora. Dada sua qualidade quase inquestionável, acabou sendo indicado a uma série de prêmios de Game of the Year ao fim de 2017, mesmo que ofuscado pelo fenômeno que foi The Legend of Zelda: Breath of the Wild (Switch/Wii U).
Mais que qualquer outra coisa, NieR:Automata mostra o poder da mídia de videogames como poucos outros jogos. Ele aproveita características únicas dos games para contar uma narrativa fora de comum. Como é característico de seu diretor, é uma história sem vencedores e sem finais felizes, que fazem o jogador considerar qual é a motivação de tudo que ocorre, mas ainda assim querer continuar jogando até o primeiro, segundo, terceiro, quarto e quinto finais. Os pontos fracos do gameplay fazem da experiência algo menos do que perfeito, mas o conjunto da obra é original demais para ser ignorado.

(Renan Greca, em análise para o GameBlast)
Para o futuro, a Platinum se aliou novamente à Nintendo para a produção de Bayonetta 3 no Switch, além de ter Granblue Fantasy Project Re:Link (PS4), uma nova versão de Granblue Fantasy, um RPG tático lançado para mobile em 2014, mas agora com jogabilidade hack and slash, além de Lost Order, o primeiro projeto para Android e iOS da empresa, ambos em colaboração com a Cygames e com lançamento previsto para 2018. É notável que Inaba já manifestou que a vontade da Platinum é produzir e lançar seus  jogos de maneira própria, sem depender de outras publishers.


Um jeito platinado de ser

É interessante pensar que a PlatinumGames carrega algo que muitos estúdios hoje tentam, mas nem todos conseguem: identidade. É difícil observar uma empresa que consegue ser praticamente uma unanimidade no meio gamer, sendo querida pelos jogadores, impressionante para a crítica especializada e confiável para as produtoras. Por mais piegas que possa parecer, isso tudo acaba sendo resultado de muito amor nutrido pelos games e pelo que eles podem parecer por parte de toda a staff da Platinum.

Além de revolucionar uma indústria, o estúdio conseguiu algo tão importante quanto e que não pode ser esquecido: resgatar a essência do que é jogar videogame, ou seja, se divertir. A Platinum mostrou que esse não é um objetivo impossível. Na verdade, nas pouquíssimas vezes que ela não conseguiu isso, provavelmente sequer tentou fazê-lo. Esse respeito por todas as esferas da comunidade foi possível por entender o que é um jogo e entender o que os jogadores gostam e querem. Apesar de se impressionarem com facilidade por enredos complexos e visuais estonteantes, os jogadores querem é um gameplay refinado e reproduzido através de tiro, porrada e bomba. De preferência, com chefes de tamanho colossal e um alto grau de dificuldade.

Revisão: João Paulo Benevides

É jornalista formado pelo Mackenzie e pós-graduado em teoria da comunicação (como se isso significasse alguma coisa) pela Cásper Líbero. Tem um blog particular onde escreve um monte de groselha e também é autor de Comunicação Eletrônica, (mais um) livro que aborda história dos games, mas sob a perspectiva da cultura e da comunicação.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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