Análise: Blood: Refreshed Supply é a versão definitiva de um remaster até então imperfeito

Título cult da década de 1990 recebe um novo tratamento para entregar seu verdadeiro potencial na atual geração.

em 05/12/2025
Entre os shooters que marcaram a saudosa década de 1990, poucos conseguiram imprimir tanta personalidade quanto Blood. Lançado em 1997 pela Monolith Productions, o jogo consolidou seu espaço ao misturar violência estilizada, humor negro e uma direção de arte inspirada no horror clássico popularizado no cinema da época, com obras como A Hora do Pesadelo, Cemitério Maldito e Sexta-Feira 13. Hoje, quase três décadas depois, Blood permanece como um dos títulos mais icônicos do gênero FPS dos anos 1990.

Blood: Refreshed Supply é a segunda remasterização do jogo, que já havia recebido tratamento similar em 2019 com Blood: Fresh Supply. Nesta nova versão da Nightdive Studios, boa parte do que faltava para que a equipe entregasse a experiência desejada foi finalmente implementada. Agora sim, podemos dizer que esta é a edição definitiva desse clássico sanguinolento do século passado.

Sede de vingança

Em Blood, o jogador assume o papel de Caleb, um pistoleiro morto-vivo que retorna dos mortos em busca de vingança contra a cabala liderada pelo deus Tchernobog. A premissa é simples, mas a força do jogo está na atitude do protagonista. Caleb é sarcástico, cruel e, por vezes, teatral.

Suas frases — que vão de referências a filmes de terror a provocações sangrentas — ajudam a construir um clima que transita entre o mórbido e o cômico, sempre com personalidade própria. É um estilo que lembra outro ícone da época, conhecido pelo mesmo nível de atitude, mas com mais carisma e popularidade: Duke Nukem.

O que realmente faz Blood se destacar é sua atmosfera. Cada fase funciona como um tributo ao cinema de horror, com cenários que incluem cemitérios enevoados, mansões assombradas, templos cultistas, hotéis decadentes e até um parque de diversões macabro. Tudo é construído com cuidado quase artesanal, explorando ao máximo as capacidades da Build Engine, motor gráfico amplamente utilizado no desenvolvimento de FPS daquela época.

A paleta sombria, combinada a uma trilha sonora discreta, porém inquietante, e ao design grotesco dos inimigos, completa a imersão. Blood abraça o exagero e o grotesco sem receio, entregando um espetáculo gore que marcou época e permanece vivo na memória dos jogadores que experimentaram sua versão original nos anos 1990.

Apesar da ambientação marcante, Blood nunca esquece que é um FPS clássico. O ritmo é acelerado e implacável, com inimigos numerosos, velozes e surpreendentemente agressivos, especialmente nos níveis de dificuldade mais altos, onde até um zumbi pode representar perigo real.

O arsenal é outro destaque da experiência. Além de clássicos como a shotgun dupla e a dinamite, o jogo aposta em opções incomuns, como um aerossol usado como lança-chamas improvisado e até um boneco de vodu.


Mesmo com limitações técnicas, o design das fases incentiva a exploração, recompensando atenção com segredos e apresentando uma verticalidade rara para a época. Cada mapa traz uma ideia, um truque ou uma ambientação própria, mostrando o empenho da Monolith em criar algo com identidade e evitar que o jogo fosse visto apenas como “mais um Doom”, onde devemos encontrar chaves, abrir portas e seguir adiante até o destino.

Sangue fresco

O legado de Blood se tornou ainda mais evidente com o lançamento de versões aprimoradas para PCs modernos. A primeira delas, Blood: Fresh Supply, mencionada no início da análise, trouxe o essencial para uma edição atualizada. A versão de 2019 adicionou suporte a resoluções mais altas, multiplayer funcional e opções de controle modernas, permitindo que novos jogadores conhecessem o clássico sem os obstáculos técnicos do passado.

Apesar de competente, essa edição não foi suficiente para a equipe da Nightdive Studios, o que levou ao desenvolvimento da remasterização definitiva: Blood: Refreshed Supply. A principal motivação para revisitar o projeto foi o acesso ao código-fonte original de 1997, algo que não estava disponível na primeira remasterização.

Em entrevista ao Xbox Wire, Samuel “Kaiser” Villareal, líder de desenvolvimento da KEX Engine na Nightdive Studios, comentou sobre o processo de engenharia reversa realizado no primeiro remaster:

“A engenharia reversa é extremamente demorada e propensa a erros, o que pode levar a vários aspectos do jogo aparentarem estranheza ou não se comportarem exatamente como nos lembramos.” [...] “Para jogos mais complexos, especialmente aqueles lançados no início dos anos 2000, é absolutamente imprescindível ter o código-fonte completo em mãos.”

Stephen Kick, CEO e fundador da Nightdive, complementou:

“É frequentemente difícil obter o código-fonte original de jogos clássicos. Muitas vezes, as cópias não existem mais ou as pessoas que ainda as possuem são difíceis de encontrar.” [...] “Sempre que descobrimos o código original, fazemos o possível para preservá-lo.”

Graças ao acesso ao código, o estúdio viu a oportunidade de realizar o trabalho da forma ideal, como explicou Larry Kuperman, vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios da Nightdive:

“Ter o código-fonte como base não só nos permite fazer uma remasterização fiel que corresponda ao original em termos de aparência e sensação, como também nos permite ver como os desenvolvedores originais projetaram o jogo.”

Assim, Blood: Refreshed Supply chega como a versão definitiva do clássico de 1997, oferecendo suporte a resoluções 4K em 120 fps, cutscenes totalmente remasterizadas, inteligência artificial aprimorada para os inimigos e diversas melhorias, como correções nos níveis originais, suporte a mods e dois novos cenários: Marrow, disponível no lançamento, e Death Wish, que será adicionado futuramente por meio de uma atualização gratuita.

Revivendo o gore

Assim como aconteceu com outros títulos que tive a oportunidade de analisar no GameBlast, como Star Wars: Dark Forces Remaster e Outlaws + Handful of Missions: Remaster, tive o privilégio de jogar o Blood original na época. Confesso que revisitá-lo trouxe uma boa dose de nostalgia. Era um período em que eu estava descobrindo o mundo dos jogos para PC e percebendo como eram diferentes das experiências nos consoles com os quais cresci.

Blood é um título marcante por sua violência gráfica e alta dificuldade. Nos níveis mais baixos, é relativamente acessível, mas nos mais altos beira o impossível, exigindo habilidade e reflexos constantes. Trata-se de um jogo rápido e frenético: ficar parado é praticamente um convite para morrer rapidamente nas mãos dos inimigos.

Assim como outros clássicos do gênero que vêm retornando ao mercado — muitos deles pelas mãos da própria Nightdive Studios —, Blood pertence a uma categoria com um público mais específico, composto em grande parte por jogadores que, assim como eu, têm interesse em revisitar essas experiências nos dias atuais. Ainda assim, representa também uma excelente oportunidade para que novas gerações conheçam esses títulos e seu legado.

Blood: Refreshed Supply traz vantagens além das melhorias visuais e técnicas. Uma das mais importantes é sua disponibilidade para consoles, algo ausente no remaster de 2019. Já no PC, a edição inclui um bônus particularmente interessante: a possibilidade de jogar a versão original de MS-DOS.

Ter essa opção foi uma surpresa bem-vinda. Diferentemente de remasters que alternam entre estilos com um simples botão, aqui temos acesso direto à experiência de 1997, com controles rudimentares e resoluções muito baixas. Arrisquei jogar um pouco essa versão, tentando não deixar a nostalgia pesar demais, pois é algo bastante datado — apreciado principalmente pelos mais saudosistas.

Blood: Refreshed Supply é, sem dúvida, um trabalho primoroso de remasterização, digno de apreciação pelos puristas de FPS no PC. Seja pelo valor histórico do jogo que representa, seja por ser um dos projetos mais bem executados da Nightdive Studios até o momento, trata-se de uma celebração respeitosa e competente de um clássico absoluto. 

Dando o sangue para preservar a história

Blood: Refreshed Supply consolida de vez o legado de um dos FPS mais influentes e distintivos da década de 1990. A Nightdive Studios demonstra, mais uma vez, domínio absoluto na arte de restaurar clássicos, entregando uma versão que respeita o material original, corrige antigas limitações técnicas e amplia o acesso do jogo para novas plataformas e novos públicos.

Ao mesmo tempo, mantém íntegra a personalidade sarcástica, sombria e frenética que sempre definiu Blood. Para veteranos, é a chance de reencontrar um ícone em sua melhor forma; para iniciantes, uma oportunidade rara de experimentar um clássico exatamente como deveria ter sido sentido há quase trinta anos.

Prós

  • Acesso ao código-fonte original, garantindo autenticidade real ao título de 1997;
  • Suporte a 4K, 120fps, cutscenes remasterizadas e melhorias técnicas gerais;
  • IA aprimorada e correções nos mapas originais;
  • Inclusão de novos cenários, como Marrow e o futuro Death Wish (disponível futuramente);
  • Disponível em consoles atuais pela primeira vez;
  • Versão original de MS-DOS incluída no PC como bônus.

Contras

  • A dificuldade elevada pode intimidar jogadores menos experientes;
  • Alguns elementos datados, como dinâmicas de jogo e gameplay, podem não agradar à nova geração de jogadores;
  • O design de certas fases pode ser confuso para quem não está habituado ao estilo dos FPS antigos.
Blood: Refreshed Supply — PC/PS5/PS4/XSX/Switch — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Heloísa D’Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela Atari
OpenCritic
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Alexandre Galvão
Fã de Castlevania, Tetris e jogos de tabuleiro. Entusiasta da era 16-bit e joga PlayStation 2 até hoje. Jogador casual de muitos e hardcore em poucos. Nas redes sociais é conhecido como @XelaoHerege
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