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Análise: Final Fantasy XVI (PS5) é uma arriscada busca de renovação para a franquia

O 16º capítulo da longeva franquia da Square Enix é uma virada de chave em tudo que já vimos na série até então.


Anunciado em setembro de 2020, Final Fantasy XVI marca o 16º episódio da série principal da notória franquia de RPG, criada pela então Squaresoft em 1987. Após mais de três décadas de existência, é natural buscar renovação para algo que permaneceu tanto tempo no mercado. Isso pode ocorrer por meio de reboots, remakes ou pela introdução de novas abordagens dentro de um produto.

O gênero JRPG já foi considerado um dos mais cultuados na indústria dos jogos, com os títulos da série Final Fantasy sendo expoentes nessa área. Muitos jogos independentes deste gênero se inspiraram nesses jogos. No entanto, com o passar do tempo e a mudança dos gostos dos jogadores, a jogabilidade lenta e estratégica dos RPGs por turnos foi perdendo espaço para uma abordagem mais voltada à ação, acompanhada de narrativas mais densas e elaboradas.

Dentro da própria franquia, já existem exemplos bem-sucedidos dessa nova abordagem para com os consumidores, como o notório Final Fantasy VII Remake e Stranger of Paradise: Final Fantasy Origin. Esses dois títulos se destacam por seu foco na ação, visando atrair o perfil atual da maioria dos jogadores, mas ainda preocupados em trazer uma narrativa que engaja o jogador para segurá-lo o máximo de tempo neste mundo.

Final Fantasy XVI aposta em uma abordagem que se concentra em dois aspectos distintos da experiência: uma narrativa bem escrita e elaborada, comparável a roteiros de séries de grande orçamento exibidas em canais fechados; e uma jogabilidade focada na ação, com um tom cinematográfico que chama a atenção dos fãs de jogos deste gênero.


Esses dois aspectos são como uma lâmina afiada de dois gumes, capazes de causar impacto tanto positivo quanto negativo para aqueles que não estão preparados para mudanças. Dito isto, é hora de conhecer um pouco mais sobre essa revolução na franquia apresentada em Final Fantasy XVI.

Sangue, fogo, vingança e redenção

Final Fantasy XVI se passa em Valisthea, um território habitado por reinos distintos que têm em comum sua relação com a magia dos Cristais. Os minerais são utilizados indiscriminadamente por todas as classes da civilização, tanto para tarefas simples e triviais — como lavar roupas, cozinhar e cuidar dos animais — quanto para fins militares em cruzadas e campanhas.

Nossa jornada por este mundo fantástico segue os passos do jovem Clive Rosfield, primogênito do Duque de Rosaria, cujo reino está situado a oeste. O rapaz é o irmão mais velho de Joshua Rosfield, que nasceu para ser o novo Dominante da Fênix, o Eikon do Fogo.
Joshua Rosfield, Dominante da Fênix, o Eikon do Fogo
Os Eikons são criaturas fantásticas que dominam diferentes elementos, como fogo, gelo e terra. Sua presença na terra só é possível graças aos humanos conhecidos como Dominantes, que assumem o papel de seus hospedeiros. Os Dominantes são temidos ou idolatrados, dependendo da cultura de cada região de Valisthea.

Como exemplos de Dominantes que trazem esperança e inspiração para a população, temos o já mencionado herdeiro do ducado de Rosaria, Joshua, e o príncipe herdeiro do Sacro Império de Sanbreque, Dion Lesage, Dominante do Bahamut, Eikon da Luz. Por outro lado, Hugo Kupka, Dominante do Titã, Eikon da Terra, é um líder de guerra temido da nação de Dhalmekia, situada ao sul. Barnabas Tharmr, Dominante de Odin, Eikon da Escuridão e Rei de Waloed, é outro personagem que inspira medo no coração de seus adversários.

Clive e Joshua possuem um amor fraterno incomparável, estando dispostos a dar a própria vida um pelo outro. Devido ao fato de Clive não ter sido abençoado pelo Eikon do Fogo, o jovem treinou arduamente durante sua juventude para se tornar o Primeiro Escudo de Joshua, o cavaleiro real responsável pela proteção pessoal do Dominante da Fênix.
Clive Rosfield, aos 15 anos
Em uma noite que antecedia um importante rito de passagem para que o jovem Joshua assumisse seu papel como protetor do reino como Dominante, soldados do Império de Sanbreque realizam um ataque surpresa e cometem um massacre que tira a vida do Duque Rosfield, pai dos irmãos, desencadeando a fúria de Joshua, que manifesta a Fênix.

Misteriosamente, surge um segundo Eikon do Fogo, e as duas criaturas travam uma batalha colossal que resulta na morte de Joshua. Clive, acreditando que seu irmão foi assassinado, cai em desespero e é dado como escravo para os imperiais por sua própria mãe, que sempre teve aversão ao filho que não foi abençoado com a dádiva de ser o Dominante do Eikon do Fogo.

A trama se desenrola durante o período em que Clive atua como um Portador, um membro de uma casta excluída e sem direitos entre o povo de Valisthea. Treze anos após o incidente que tirou a vida de seu irmão, Clive é enviado para o campo de batalha após receber informações de que a Nação do Ferro está em posse da Dominante de Shiva, a Eikon do Gelo.


A batalha culmina na descoberta de que a Dominante é Jill Warrick, amiga de infância de Clive, o que faz com que ele deserte, tornando-o um traidor do Império. Durante sua jornada de fuga, Clive e Jill conhecem Cidolfus "Cid" Telamon, Dominante de Ramuh, o Eikon do Trovão, e líder de um movimento de resistência que visa proteger os Portadores e Dominantes, acreditando que eles também têm o direito de viver e morrer como desejarem.

Neste período, Clive descobre mais sobre a existência do segundo Eikon do Fogo, Ifrit, e que, por algum motivo, foi escolhido como seu Dominante. Utilizando o poder infernal da criatura, o jovem Rosfield tem a oportunidade de mudar o curso da história de Valisthea, unindo-se a Cid para eliminar os principais causadores do sofrimento dos cidadãos dos reinos: os Cristais-Máter.

A trama se desenvolve por mais cinco anos até assumirmos o papel de Clive Rosfield em um momento decisivo na história de Valisthea. O ex-nobre que buscava vingança pela morte do irmão agora é líder do grupo anteriormente liderado por Cid e pretende pôr fim ao legado dos cristais, que motivaram inúmeros conflitos entre as nações deste mundo, enquanto seu próprio destino ainda reserva mistérios que revelarão algo muito maior para sua história.

Entre tramas e combates

Final Fantasy XVI rompe com o estilo tradicional de JRPG que consagrou a série e traz uma experiência de RPG de ação com ênfase na narrativa e jogabilidade aprimorada. No papel de Clive, o jogador pode explorar as várias regiões de Valisthea à medida que a história se desenrola. Embora pareça um mundo aberto, FFXVI apresenta diferentes regiões que não estão diretamente conectadas em um único mapa.
Valisthea, uma terra em constante conflito pelo poder
Cada região possui seu próprio mapa, e o jogador pode explorá-las livremente para concluir missões principais e secundárias. As missões principais impulsionam a história, enquanto as secundárias incentivam a exploração e oferecem recompensas extras de experiência e habilidades. Entretanto, muitas das localidades são vazias e com poucos pontos de interação, passando uma estranha sensação de muito a explorar, mas com pouco para realmente ver.

A força de FFXVI reside na sua história e jogabilidade. O enredo é excepcional, com personagens marcantes e momentos emocionantes, cheios de adrenalina, raiva e surpresas. O roteiro se assemelha às grandes séries de televisão, como Game of Thrones, com conflitos entre reinos em busca de poder absoluto e desenvolvimento de tramas e personagens que até podemos arriscar dizer que foram inspirados no universo de George R. R. Martin.

FFXVI aborda temas mais maduros e controversos, como violência gráfica, nudez, homossexualidade e tortura, o que é incomum na série. O jogo se destaca por sua história impressionante, rivalizando com títulos que também exploram esse aspecto, como The Last of Us, Uncharted e Star Wars Jedi: Survivor, para citar algo mais recente.

A jogabilidade equilibra a carga dramática do jogo. Desenvolvido por Ryota Suzuki, responsável pelas mecânicas de combate de Devil May Cry 5 e Monster Hunter: World, o combate em FFXVI oferece uma experiência satisfatória ao controlar Clive no campo.

Além do poder da Fênix, Clive descobre que pode absorver as essências de outros Dominantes e adicionar habilidades baseadas em seus Eikons ao seu repertório de técnicas especiais. Elas podem ser aprimoradas usando pontos de habilidade obtidos em batalhas e missões.

O sistema de combate é fluido e permite ao jogador combinar até três conjuntos de habilidades dos Eikons. Cada um deles oferece vantagens distintas, como maior mobilidade, dano de atordoamento, área de efeito, defesa, dentre outros. Com prática, o jogador pode executar combos devastadores ao combinar técnicas normais com habilidades eikônicas adquiridas ao longo da história.


No entanto, a limitação na quantidade de técnicas alocadas nos espaços de ação requer experimentação para encontrar a combinação ideal que se adapte ao estilo de jogo e torne a jogabilidade mais fluida. Felizmente, é possível realocar pontos de habilidade para criar uma configuração de combate quase perfeita.

Devido ao foco na ação, alguns elementos de RPG foram simplificados. A tela de equipamentos é enxuta, facilitando o processo de equipar Clive. Não há muitos detalhes em relação a afinidades elementais, taxas de crítico ou técnicas passivas, por exemplo. FFXVI prioriza a ação em seu gameplay.

Algumas atividades secundárias são monótonas e pouco interessantes, como missões simples de coleta ou derrota de inimigos com poucas recompensas. Por outro lado, as caçadas, outra atividade paralela do jogo, são mais desafiadoras e estão alinhadas com o foco na ação de FFXVI.


Outro ponto de destaque na experiência de FFXVI, ainda sobre o combate, são os colossais embates entre os Eikons. No comando da forma manifestada de Ifrit, somos levados a impressionantes batalhas que, grosseiramente falando, lembram muito as lutas entre bijuus de Naruto Shippuden: Ultimate Ninja Storm 4. Milagrosamente, o PS5 consegue processar cenas de cair o queixo em tempo real, reforçando novamente o foco do jogo: a ação desenfreada quando ela realmente precisa estar ali.

A trilha sonora primorosa de Masayoshi Soken chega para encapsular toda essa experiência narrativa e de jogabilidade com trilhas épicas e contagiantes, ao mesmo tempo que reinventa algumas coisas para deixar nossa experiência memorável. A seguir você confere Find the Flame, a música tema de Clive. Uma composição que consegue transmitir uma energia que nos passa todo o calor da ação durante as principais batalhas do jogo.


Embora tenha abandonado algumas tradições da série, FFXVI ousou sair de sua zona de conforto para oferecer uma experiência nova e adequada à nova geração de consoles e jogadores.

Por falar em nova geração…

Desenvolvido exclusivamente para o PlayStation 5, é esperado que Final Fantasy XVI entregue uma experiência digna da nova geração de consoles em termos de gráficos, desempenho e outros detalhes técnicos. O resultado é impressionante, embora ainda existam algumas questões que podem incomodar os jogadores mais atentos a esses aspectos.

Destaca-se aqui a velocidade extremamente rápida de carregamento, com tempos extremamente curtos ao realizar viagens rápidas ou iniciar o jogo. Não há telas de carregamento ou indícios de que o trabalho do console esteja sendo mascarado de alguma forma.


Graficamente, FFXVI é impressionante. Os detalhes nos personagens e cenários são surpreendentes, mesmo para aqueles que não jogam no modo de resolução mais detalhado. No modo de desempenho do PS5, algumas seções em áreas mais abertas podem apresentar dificuldades em manter uma taxa de quadros alta e constante, mas em comparação com outras experiências deste ano, esse problema é menos perceptível.


As funcionalidades do DualSense são aproveitadas ao máximo durante o jogo. O uso dos gatilhos motorizados proporciona imersão em situações como abrir portas ou acionar alavancas, além de transmitir a sensação de aceleração ao montar um Chocobo.
Torgal, o fiel companheiro de Clive, sempre merece um momento de carinho
O feedback háptico também é utilizado de forma intensa, transmitindo desde impactos até o sutil aperto de um abraço diretamente para as mãos do jogador. Nesses e outros detalhes, fica claro que o jogo, exclusivo do console até o final do ano, foi desenvolvido levando em consideração as capacidades únicas do PlayStation 5.

Uma brasa ardente em uma franquia lendária

Final Fantasy XVI se arrisca ao trazer uma abordagem nova para uma franquia com mais de três décadas de existência, reinventando parte de sua mitologia para oferecer uma experiência única e revolucionária, atendendo às necessidades da nova geração de consoles e jogadores.

Em suma, FFXVI é exatamente o que a franquia precisava para se manter relevante nos dias de hoje em termos de narrativa, jogabilidade e méritos técnicos. Embora os fãs nostálgicos possam discordar, este jogo é um digno sucessor do legado dos cristais que começou em 1987.



Prós

  • Enredo primoroso, com personagens bem desenvolvidos em uma trama envolvente e marcante;
  • Jogabilidade com foco na ação, com combates cheios de adrenalina e aspectos cinematográficos de encher os olhos;
  • Trilha sonora esbanja capricho e emoção;
  • Árvore de habilidades maleável, permitindo uma constante experimentação de combinações de técnicas de combate;
  • Performance no PlayStation 5 satisfatória, com tempos de carregamento super rápidos, gráficos ricos em detalhes e funcionalidades do DualSense bem aproveitadas.

Contras

  • A ilusão de mundo aberto possui uma exploração bem limitada;
  • Algumas missões secundárias são pouco desenvolvidas, tornando essa atividade maçante;
  • Limitação do número de habilidades eikônicas para uso em combate pode ser um incômodo;
  • Queda na taxa de quadros em situações pontuais, mesmo em modo performance.
Final Fantasy XVI — PS5 — Nota: 8.5
Revisão: Heloísa D’Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia adquirida pelo redator

Fã de Castlevania, Tetris e jogos de tabuleiro. Entusiasta da era 16-bit e joga PlayStation 2 até hoje. Jogador casual de muitos e hardcore em poucos. Nas redes sociais é conhecido como @XelaoHerege
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