Análise: Midnight Murder Club — divertido entre amigos, perigoso sozinho

Um multiplayer à moda antiga, sem progressão ou monetização, que exige companhia para realmente valer a pena.

em 28/08/2025

Midnight Murder Club chega com características curiosas. É o primeiro jogo inteiramente focado no online, distribuído pela PlayStation após o fiasco de Concord, e também o primeiro projeto do estúdio Velan depois do encerramento de Knockout City, outro título multiplayer. 


Esse histórico explica a cautela em seu lançamento, que contou com meses de acesso antecipado para polimento e feedback, além de lições aprendidas — como o cuidado em garantir algum valor offline. Mas esse caminho também trouxe ônus pesados, como a ausência de uma campanha de marketing que colocasse o título verdadeiramente no radar dos jogadores. 

O resultado é uma experiência que soa quase como um retorno a uma era passada dos multiplayers: monetização nula, ciclos de jogo objetivos e um design que não tenta ser eterno, mas, sim, entregar diversão direta e descomplicada.

Um passo no escuro

Embora o jogo seja dominado pela escuridão, sua proposta é clara: seis jogadores — cada um armado apenas com uma pistola, uma lanterna e uma faca — disputam em uma mansão sem luz. Uma bala basta para matar, e um feixe de luz basta para entregar sua posição.

A jogabilidade segue a mesma lógica de simplicidade. Com L2, você acende ou apaga a lanterna; com R2, atira; com R1, ataca com a faca; e com o △, sinaliza posições. Só isso. Mas é nessa limitação que nasce a tensão. Com a lanterna desligada, o HUD desaparece, o mapa some e até o contorno de aliados ficam invisíveis. Você se esconde do inimigo, mas corre o risco de atirar em um companheiro e acabar com ele, já que o fogo amigo é permanente. O jogo inteiro gira em torno desse sistema de risco e recompensa, tão simples quanto eficaz. 

Assim como a luz denuncia sua posição, cada passo ou disparo pode entregar o jogador no breu da mansão. Esse cuidado se amplia quando o microfone entra em cena: o jogo utiliza chat de voz por proximidade, o que transforma conversas em ferramentas de risco. Em grupo, esse recurso rende momentos caóticos e hilários, reforçando a proposta de ser um multiplayer de convivência, mais do que de competição.

Com o tempo, o medo do breu absoluto dá lugar à fluidez. O jogador aprende o mapa, passa a se movimentar com confiança e só acende a luz no momento certo do embate.

Mansão Wormwood

O coração de Midnight Murder Club é a Mansão Wormwood, o único mapa do jogo. E, apesar da limitação em quantidade, a qualidade é alta. A arquitetura exótica serve bem ao conceito, entregando corredores largos e ambientes abertos, que permitem a movimentação sem frustração — mesmo no escuro total —, evitando que o jogador passe a partida inteira tropeçando em móveis ou paredes. Frestas e janelas criam linhas de visão estratégicas, que possibilitam tiros precisos entre áreas, um detalhe que jogadores experientes exploram com maestria.

O tamanho do mapa, por outro lado, pode se tornar um problema. Em partidas com jogadores mais cautelosos, a extensão gera momentos de marasmo, com longos períodos sem encontros. É um espaço que equilibra tensão e oportunidade, mas também abre margem para partidas arrastadas.

As cartas de modificação ajudam a variar a experiência geográfica. Uma pode bloquear o segundo andar com barricadas, forçando confrontos apenas no térreo; outra transforma salas em discotecas iluminadas, com música e um campo claro de combate. São adições criativas, mas nenhuma altera a mansão de forma radical. 

Assim, a Mansão Wormwood acaba sendo uma faca de dois gumes. É excelente para que os jogadores rapidamente se familiarizem e se sintam confiantes na escuridão, sem sobrecarga de aprendizado. Mas essa mesma centralização limita a longevidade, pois mais mapas poderiam ampliar a variedade, exigindo, também, o domínio de múltiplos layouts, o que poderia comprometer a clareza da proposta. 

Modos de Jogo

Se o palco é a Mansão Wormwood, a peça acontece nos diferentes modos disponíveis. Como em todo multiplayer online, o “como” se combate é tão importante quanto o “onde”. Midnight Murder Club oferece uma lista variada — ainda que irregular — com um destaque claro que define a experiência.
  • Vale-Tudo – O clássico “cada um por si”, em que vence quem acumular mais eliminações. Funciona como um modo caótico e acelerado, entregando disputas agitadas, mas sem trazer nada além do básico do gênero;
  • Mata-Mata em Equipes – Outro pilar obrigatório, mas com um diferencial curioso: em vez de duas equipes, aqui são três duplas;
  • Roubo na Escuridão – O mais inspirado entre os modos extras. Cofres espalhados pelo mapa guardam tesouros que devem ser depositados em cofres que aparecem em três rodadas, cada uma mais disputada que a anterior. Na última, resta apenas um, forçando todos a um confronto inevitável. É o modo que melhor aproveita o design da mansão e recompensa planejamento;
  • Caça-Cabeças – Aqui, duas equipes se enfrentam: os Caça-cabeças devem destruir oito caveiras distribuídas em três salas, enquanto os Demônios tentam impedir. A ideia é boa, mas o balanço pende demais para o lado dos defensores, tornando o modo frustrante e pouco memorável;
  • Além da Meia-Noite – Adicionado no lançamento da versão 1.0, esse é o modo PvE cooperativo para até dois jogadores. A proposta é sobreviver por nove dias, cada um com tarefas e desafios crescentes, enquanto bots e eventos adversos tentam atrapalhar. Entre cada rodada, vantagens ofensivas ou defensivas são escolhidas, garantindo diversidade. É divertido, especialmente em dupla, mas curto e sem tanto apelo de repetição.
No fim, esses modos parecem existir mais para completar a lista do que para sustentar a experiência. Vale-Tudo e Mata-Mata em Equipes cumprem tabela; Caça-Cabeças decepciona; e Roubo na Escuridão, junto com Além da Meia-Noite, oferecem boas ideias. Todos eles servem, de fato, como complementos de luxo para o verdadeiro núcleo do jogo: o Modo Curinga.

O Curinga da Experiência

Tirando o modo PvE, que permite partidas solo contra a IA, o Curinga é o único modo competitivo que também oferece enfrentamentos contra bots. Isso já o coloca como peça central do jogo e da experiência.

A base é simples: três equipes de dois jogadores cada se enfrentam em mata-mata. O diferencial vem das cartas, que os jogadores escolhem antes das rodadas. Cada carta altera regras, arsenal ou condições de jogo, criando combinações que raramente resultam em partidas iguais. É aqui que Midnight Murder Club ganha vida.

As cartas se dividem em quatro categorias:
  • Brinquedos: adicionam ferramentas ao mapa, como manequins que confundem inimigos, coletes à prova de bala ou até metralhadoras em máquinas de venda;
  • Regras: conjunto transformativo, em que partidas podem virar um vale-tudo, mudar a formação de equipes para um 3 versus 3 ou até permitir que você se junte ao time que te eliminou;
  • Bênçãos: oferecem vantagens ou restrições curiosas, como aumento de velocidade enquanto a lanterna está acesa, bloqueios de áreas da mansão ou balas de festim, que transformam tudo em combate corpo a corpo;
  • Maldições: a categoria do caos. Cabeças gigantes para facilitar headshots, mortes que causam incêndios ou explosões de luz, e até regras que removem a chance de ressuscitar o parceiro.
Com 46 cartas no total, o desbloqueio é rápido e incentiva a experimentar as combinações mais insanas com amigos. O resultado são partidas imprevisíveis, que elevam a experiência.

Enquanto os outros modos soam como complementos, o Curinga concentra tudo o que torna Midnight Murder Club único. Ele praticamente substitui o “cada um por si” e o “mata-mata em equipes”, tornando-os irrelevantes. No fim, se o jogo tem valor, é porque esse modo o sustenta sozinho.

Acertos e Ausências

Tecnicamente, Midnight Murder Club é um acerto. Os gráficos são competentes, o sistema de iluminação cria uma atmosfera que brilha especialmente em telas OLED, e a trilha sonora, quando aparece, aposta em música clássica que combina com a ambientação. A jogabilidade é simples, responsiva e direta, enquanto a arquitetura da mansão mostra um design cuidadoso.

Outro acerto está na forma como o jogo foi pensado para sobreviver: diferente do destino de Knockout City, que morreu junto com seus servidores, aqui há suporte para bots e partidas privadas com amigos. É um esforço claro para preservar a experiência, mesmo quando a base online sumir.

E há a ausência que funciona como acerto: nada de monetização agressiva. Não existem passes de batalha, skins ou progressão artificial — apenas o jogo em si, nivelando todos igualmente. Isso dá um charme nostálgico, remetendo aos tempos em que jogos online eram diretos, sem artifícios. O problema é que, fora o desbloqueio rápido das cartas, não há qualquer sistema de progressão ou recompensas que incentive o jogador a continuar.

Mas logo as outras ausências pesam. A falta de bots em todos os modos limita o conteúdo solo, e não poder visualizar o deck de cartas fora das partidas é uma falha de usabilidade que não faz sentido.

E a mais grave: a ausência de jogadores. No momento desta análise, encontrar partidas públicas é praticamente impossível. O título se sustenta apenas em grupos de amigos, no caos controlado do modo Curinga contra bots ou em algumas rodadas do PvE. O resto da experiência simplesmente não existe sem uma comunidade ativa.

Essa ausência cria um paradoxo cruel, pois, quanto menos gente joga, menos atrativo o jogo se torna, e, quanto menos atrativo, mais difícil é que novos jogadores cheguem. É um ciclo que consome a vida de muitos multiplayers, independentemente da qualidade de suas ideias. 

Valor e Diversão

À meio de combater o problema da base de jogadores, Midnight Murder Club oferece uma versão de convidado: uma pessoa compra o jogo, e mais cinco amigos podem jogar juntos sem gastar nada. É uma solução viável e, sinceramente, necessária.

Juntar seis amigos já é um desafio nos dias de hoje. Se todos ainda tivessem que pagar o preço cheio, seria praticamente impossível justificar a compra. Nesse sentido, o passe de convidado é uma jogada inteligente e, talvez, a única forma de colocar o jogo na rotação de finais de semana entre amigos.

Para grupos fechados, funciona bem. Cada um entra, divide parte do custo e garante algumas boas horas de caos na mansão. É divertido, simples, direto.

O problema é que a diversão tem limites claros. Nem sempre o grupo completo vai estar disponível e, sozinho, o jogo perde muito do apelo. O que sobra é o modo Curinga contra bots — que, em alguns casos, chegam a ser mais divertidos do que enfrentar jogadores excessivamente cautelosos, cujas partidas se arrastam em silêncio até perder o encanto.

É frustrante, porque existe um mundo em que Midnight Murder Club consegue uma base estável, enchendo servidores com noites de partidas intensas. No entanto, tão perto do lançamento, esse mundo ainda não existe. Hoje, a diversão é restrita a quem consegue organizar manualmente um grupo de amigos ou se contentar com a inteligência artificial.

Bem-vindo ao clube Midnight

Mesmo olhando para um futuro utópico, com servidores cheios e partidas acontecendo a todo instante, a versão atual não sustentaria diversão por muito tempo. O teto de habilidade é baixo e não exige do jogador uma curva de aprendizado que o prenda.

É fácil imaginar a cena: um novato entra em um lobby repleto de veteranos, é derrotado seguidas vezes e, sem encontrar ferramentas de progressão ou incentivo para melhorar, acaba migrando para partidas contra bots. Essas cumprem bem o papel no curto prazo, mas logo a novidade desaparece e a experiência perde a luz, definitivamente.

Uma única mansão, um deck de 46 cartas e uma jogabilidade baseada em risco e recompensa são o maior trunfo do jogo. Só que também são seu algoz. O conjunto funciona, diverte, mas não evolui — e isso limita a longevidade, mesmo em um cenário perfeito de comunidade ativa.

No fim, Midnight Murder Club é um multiplayer de ideias originais, execução competente e momentos de diversão, mas que encontra seu valor quase exclusivamente em grupos organizados. Recomendado para amigos que buscam algumas noites de caos controlado, mas, para quem pretende jogar sozinho, o melhor conselho é esperar.

Prós

  • Jogabilidade simples e tensa, baseada em risco e recompensa;
  • Modo Curinga é criativo e garante partidas imprevisíveis;
  • Ótimo design da Mansão Wormwood, com arquitetura pensada para o escuro;
  • Passe de convidado, permitindo um grupo de amigos jogue com apenas uma compra.

Contras

  • Apenas um mapa, o que limita a variedade a longo prazo;
  • Modos extras pouco inspirados ou desequilibrados, vivem à sombra do Curinga;
  • Pouca longevidade, mesmo em cenário de comunidade ativa;
  • Dependendo do matchmaking, pode gerar partidas arrastadas; 
  • Base de jogadores nula para partidas publicas em seu lançamento. 
Midnight Murder Club — PC/PS5 — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PlayStation 5
Revisão: Mariana Marçal
Análise feita com cópia digital cedida pela PlayStation
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Matheus Oliveira
Entusiasta de games e cinema, sempre explorando novos gêneros e estilos enquanto acumula um backlog infinito. X e Instagram
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