Entrevista

Papetura (Multi): entrevistamos Tomasz Ostafin sobre sua obra de arte em videogame

Ele passou seis anos montando esculturas de papel para realizar seu sonho de criar um jogo.


Quando vi Papetura pela primeira vez, imediatamente soube que queria jogar e analisar aquela obra-prima artesanal. Se eu já esperava algo visualmente impressionante, finalizar o breve jogo superou as expectativas. Senti reverência perante um trabalho tão dedicado e bem-feito. Parecia algo cujo objetivo maior era simplesmente existir em toda sua elegância recortada em papel, como uma forma que, até onde sei, nunca foi feito assim antes.

Papetura junta-se a outros trabalhos de amor feitos por uma única pessoa em meio à enorme indústria de jogos. Esse tipo de projeto comprova, vez após vez, que não é só o vil metal que move o mundo, mas também a devoção humana em criar, expressar e ofertar ao resto do mundo aquilo que chamamos de arte.

Com esse pensamento, quis conversar com o arquiteto polonês Tomasz Ostafin, desenvolvedor solo do estúdio Petums, que criou Papetura. Eu queria saber mais sobre como ele deu vida ao papel que chegou às minhas mãos na forma de jogo.




GameBlast: Para começar, vamos aproveitar para te conhecer um pouco. Fale sobre você, sua relação com os videogames e como começou Papetura.

Tomasz Ostafin: Os jogos estão na minha cabeça desde que eu era pequeno, eu ficava grudado na tela, não importava que tipo de jogo fosse. Quando recebi a demo de The Neverhood, queria muito a versão completa, mas não foi tão fácil porque não estava disponível para venda no país onde moro [Polônia]. No entanto, eu consegui e este jogo decidiu o meu futuro; queria fazer parte dessa experiência de fazer o jogo e os mundos a partir de materiais físicos. O trabalho no Papertura começou logo depois que me formei na faculdade, e durante esse tempo eu estava aprendendo a fazer pequenos jogos em Flash.
The Neverhood (1996), jogo feito em claymotion, técnica que usa massa de modelar e argila.
GB: A seguinte pergunta talvez seja a mais importante: por quê? Eu mesmo posso imaginar uma razão suficiente, mas ainda tenho que perguntar diretamente a você por que se esforçar tanto para a maneira mais trabalhosa, detalhada, meticulosa e dedicada de fazer seu jogo?

TO: Acho que é apenas uma obsessão por stop-motion e uma vontade de fazer artesanato. Sempre gostei de esculpir, pintar, desenhar e criar, então tudo isso tinha que fazer parte do processo, e acabei criando um jogo feito de papel. Na época, eu não sabia que seria um processo tão exigente, talvez seja por isso que me aprofundei [na ideia].

GB: Como foi seu planejamento para o equilíbrio entre a complexidade da obra e a duração do produto final? A brevidade da aventura foi uma questão conceitual ou imposta por pura necessidade prática?

TO: Isso é algo que eu não percebi quando estava fazendo o jogo. A princípio, presumi que faria um nível do jogo em duas semanas, o que é bastante ridículo. Por causa disso, adiei a estreia provavelmente três vezes e também tive que cortar o conteúdo do jogo. O corte não foi planejado, mas necessário; posso dizer que cerca de 50% do conteúdo foram cortados. Também não foi uma decisão fácil, pois o roteiro, os quebra-cabeças e o design geral do mundo inteiro tiveram que ser reescritos.


GB: Como foi feito o Papetura, enquanto projeto? A visão artística, a estrutura, a mecânica e a história de Pape e Tura foram definidas desde o início ou mudaram ao longo dos anos? Você precisou refazer fundos para se adaptar às mudanças? Você precisou deixar alguma coisa de fora, dada a complexidade da produção?

TO: Você está certo, o jogo é baseado em algo. Esta é sem dúvida uma visão artística e um mundo que eu queria construir. É imediatamente aparente que a mecânica não é o aspecto principal do jogo; é mais uma experiência visual e musical. A visão artística foi seguida de uma história, mas, infelizmente, teve que ser abreviada muitas vezes. Na verdade, isso significa que o jogo tem uma lore mais profunda, que não é mostrada. Na hora de trabalhar nas esculturas de papel, eu sabia que elas tinham que ser fotografadas de uma vez por todas, então foi isso. Quando havia alguns pequenos elementos para consertar, eu fazia na pós-produção.



GB: Em 2015, Papetura contou com uma campanha de crowdfunding no Indiegogo, mas ficou aquém da meta. Como foi para você? Demorou para decidir seguir por conta própria ou foi algo imediato, sem lacuna de desenvolvimento e motivação?

TO: Hah, então ainda bem que não consegui arrecadar dinheiro. Seria um desastre porque superestimei totalmente minhas habilidades. Era um sonho de vida fazer jogos, infelizmente esse não é o caminho a percorrer. Fiquei desapontado, desanimado, mas, ao mesmo tempo, mostrei meu projeto para o mundo e recebi muito interesse. Graças a esse interesse, não desisti e planejei fazer Papertura com calma, depois do trabalho.



GB: Da concepção ao lançamento final em múltiplas plataformas, qual parte foi a mais difícil e qual lhe deu mais satisfação?

TO: Acho que todas as partes foram difíceis, tudo o que posso dizer é que fiquei menos estressado com gráficos e esculturas de papel. Era mais terapêutico, embora às vezes cansativo quando você tinha que cortar vários milhares de elementos semelhantes. Também é difícil manter-se motivado, especialmente ao longo de vários anos. A programação é meu calcanhar de Aquiles, então deixei os retoques finais para consoles para a publicadora Feardemic, que me ajudou e me aliviou de muitos aspectos da produção e marketing.



GB: Demorou seis anos para finalmente lançar Papetura. Durante esse tempo, o desenvolvimento era uma rotina constante ou havia pausas e momentos mais focados? A sua dedicação foi exclusiva ao jogo em algum momento?

TO: A motivação era difícil de manter, por isso, trabalhava no jogo sempre que tinha oportunidade. Às vezes, alguns dias seguidos com uma pausa para alguns dias de trabalho profissional. Foi só quando estava próximo do lançamento que dediquei os últimos seis meses para terminar o jogo. Naquela época, eu trabalhava 12 horas por dia, o que não era nada saudável.






GB: Você procurou o compositor Floex (Tomáš Dvořák) para a música de Papetura. Ele compôs de forma independente ou foi um processo criativo que vocês passaram juntos?

TO: Tomás é um compositor muito ocupado, então dei a ele total liberdade para criar a trilha sonora. No entanto, ele estava completamente envolvido e criou a música e a atmosfera exatamente sob medida para Papetura. Discutimos cada nível do jogo e como ele deveria soar. Às vezes, isso também afetava as decisões relacionadas à mecânica e à jogabilidade.








GB: Como foi o contato com sua publicadora conterrânea, Feardemic? Já havia uma intenção de levar o jogo para os consoles ou esse foi o papel deles?

TO: Estou trabalhando no port do jogo há mais de um ano desde o lançamento e precisava de ajuda. O tempo voou e o trabalho foi muito lento. Então, com um pouco de sorte e coincidência, estabeleci cooperação com a Feardemic, que cuidou do lançamento do jogo para todos os consoles. Sem eles, quem sabe, eu ainda poderia estar mexendo na portabilidade do jogo.








GB: A propósito, a Feardemic, como o nome diz, é especializada em títulos de terror. O que isso significa para sua visão de Papetura? Você descreveria seu jogo em gêneros?

TO: Visualmente, o jogo até combina com Feardemic. Papetura não é um jogo de terror, mas tem algo atmosférico que não entra em conflito com as premissas da publicadora. O jogo está no gênero de apontar e clicar em aventura de quebra-cabeça, então acho que precisa ser classificado.







GB: Quanto ao público, o que você tinha em mente? Apesar da jogabilidade simples e do fato de ser um jogo que não requer leitura, existe um botão de ajuda dedicado com dicas de progressão, o que permitiu que até meus filhos pequenos fizessem parte da aventura por conta própria. O que esse design de acessibilidade diz sobre sua intenção de público?

TO: Em primeiro lugar, queria que o jogo fosse acessível a todos, independentemente do idioma que falam. Até o menu do jogo não tem palavras, o que foi um desafio. O primeiro pensamento foi imitar a Amanita Design [estúdio de Machinarium e Samorost] e sua abordagem do assunto. Gostei, principalmente porque me lembro dos tempos em que jogava antes de saber ler. Que bom que seus filhos puderam brincar! Para ser sincero, não testei o jogo com crianças, então essas notícias me inspiram muito.




GB: Obrigado pelo lindo jogo e pela atenção. Há mais alguma coisa que você queira dizer?
Tomasz Ostafin: Muito obrigado por suas amáveis ​​palavras e por jogar Papetura! Espero criar um novo jogo em breve, você pode acompanhar o andamento do meu trabalho no Twitter @PapeturaGame. Divirta-se jogando!

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Imagens: Papetura, via Instagram e Youtube

Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies.
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