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Análise: Solar Ash (Multi) nos desafia a deslizar velozmente por um universo exótico

Cenários impossíveis e cenas de ação imponentes são os destaques do novo jogo dos criadores de Hyper Light Drifter.


Em Solar Ash, para impedir a destruição de um planeta, precisamos adentrar um buraco negro e explorar um lugar distorcido. O segundo trabalho do estúdio indie Heart Machine (responsável por Hyper Light Drifter) é uma aventura de ação 3D com foco na fluidez: patinamos e saltamos com agilidade por localidades surreais. A jogabilidade acelerada, em conjunto com localidades interessantes, ideias inventivas e atmosfera bem construída, resultam em uma aventura sem igual. Porém, o subdesenvolvimento de certos conceitos e problemas com algumas mecânicas impedem que o jogo alcance seu real potencial. 

Em uma missão desesperada

O fim de um planeta se aproxima com o aparecimento do Ultravoid, um imenso buraco negro que já consumiu inúmeros astros da galáxia. Para tentar contornar essa ameaça, foi criado o Starseed, um dispositivo que supostamente é capaz de destruir buracos negros. Para ativá-lo, porém, é necessário adentrar a anomalia, em uma missão extremamente perigosa e imprevisível.

Para isso, foi montado um grupo de indivíduos de expertises diversas, que ficaram conhecidos como voidrunners. Tudo parecia correr bem, até que as comunicações com o grupo foram perdidas. A esperança é Rei, a última voidrunner da equipe. Ela decide entrar no Ultravoid para concluir a missão e tentar descobrir o que aconteceu com seus companheiros. A tarefa não será nada fácil: o interior do vazio está repleto de perigos e mistérios.


No controle de Rei, exploramos o Ultravoid em uma aventura de ação 3D. O mundo dentro dessa dimensão paralela é exótico, contando com oceanos de nuvens, construções distorcidas e muitos elementos que desafiam as leis da física. O terreno é traiçoeiro, mas a protagonista tem à disposição alguns recursos que facilitam a tarefa: ela desliza rapidamente por estruturas com os seus patins, alcança locais distantes com a ajuda de seu gancho e é capaz de saltar novamente no ar.

Em cada área, o objetivo é reiniciar uma entidade de IA dos voidrunners para ativar os nós de energia do Starseed. Para isso, precisamos limpar pontos de corrupção, representados por gosma preta com olhos, espalhados pelos cenários. Esses momentos funcionam como pequenos puzzles de navegação em que é necessário acertar alvos em sequência em um curto intervalo. Os desafios são variados, muitas vezes exigindo escalar estruturas ou executar saltos complicados com rapidez.


Depois de purificar toda a corrupção de uma região, Rei enfrenta um monstro gigante chamado Remanescente. Nesses confrontos, a heroína escala a criatura e precisa atacar seus pontos fracos em sequência, de maneira parecida aos puzzles do solo. Esses trechos são mais direcionados à ação, demandando avançar com velocidade enquanto golpeamos e saltamos. Cada batalha tem três fases de dificuldade crescente, e cair ou não ser rápido o bastante significa refazer o trecho desde o início.

Desbravando uma dimensão de configuração incomum

Solar Ash me instigou com sua agilidade estilosa. Patinar pelo universo bizarro do Ultravoid é empolgante, principalmente por causa da velocidade da ação: são comuns as sequências em que precisamos deslizar por uma construção flutuante enquanto saltamos, derrotamos inimigos e usamos o gancho para mudar de direção no ar. Os comandos são intuitivos e é fácil usar a inércia para alcançar locais de difícil acesso.

A exploração é, de longe, a melhor característica do jogo. Os objetivos ficam marcados na tela quando utilizamos um radar, mas a dificuldade é justamente conseguir chegar a esses locais — raramente as rotas são óbvias, demandando experimentação e atenção. Os cenários contam com muitos elementos interessantes que enriquecem o ato de desbravar, como barras para deslizar, construções complexas e plataformas com múltiplos caminhos. Há, inclusive, conteúdo opcional escondido que exige ainda mais destreza para ser alcançado.


O mundo é dividido em áreas fechadas, cada qual com conceitos próprios. Em uma cidade afundada nas nuvens, o desafio está em usar corrimões para alcançar locais altos. Em uma série de ruínas flutuantes, precisamos saltar com precisão enquanto enfrentamos inimigos. Em uma caverna com um templo, usamos esporos para abrir portas e ativar certas estruturas. Já em uma área tomada por um lago de ácido, é necessário tomar cuidado para não morrer intoxicado.  

Apreciei os cenários surreais e de arquiteturas impossíveis, mas eles também são fonte de problemas. Nas áreas mais complexas, é comum ficar perdido, pois nem sempre há dicas claras de como devemos prosseguir — muitas vezes, eu consegui avançar por puro acaso. Além disso, a falha é custosa: errar saltos resulta em refazer longos trechos de plataforma, pois, às vezes, os checkpoints estão distantes. Atalhos ajudam a mitigar esses problemas, mas não são suficientes para acabar com a irritação.



Enfrentando titãs em confrontos sem igual

Fora os momentos de exploração, Solar Ash tem grande ênfase nos momentos de limpeza de corrupção e nos embates contra os chefes. Para mim, esses trechos trazem identidade ao jogo com suas ideias interessantes, mas faltou um pouco mais para tornar a experiência imperdível.

Eu gostei da ideia de acertar alvos em sequência para dar fim à gosma negra, principalmente por exigir patinar rapidamente, escalar, saltar e usar o gancho de maneiras criativas. Porém, com o passar do tempo, a variedade se mostra reduzida e esses puzzles se tornam repetitivos. Para piorar, há muita tentativa e erro, pois nem sempre os passos são claros e o tempo para resolvê-los é apertado. No fim, eles se tornaram um pouco cansativos.


Já as batalhas contra os monstros gigantes são estonteantes, afinal elas têm um ar cinematográfico e épico — a câmera abusa de ângulos dramáticos para mostrar a pequena Rei deslizando pela criatura imensa. O embate em si é uma variação mais ágil dos puzzles do solo, lembrando uma corrida de obstáculos de patinação, e é incrível conseguir fazer uma série de movimentos estilosos em sequência em cenas visualmente impressionantes.

O problema é que esses trechos acabam sendo mais difíceis do que deveriam por uma série de motivos. Para começar, é complicado julgar com clareza as distâncias por causa do ângulo da ação, o que resulta em erros ao saltar. Para piorar, constantemente a câmera se move para posições que dificultam ver o próximo alvo. Por fim, nesses momentos, os controles de patinação se tornam meio escorregadios, facilitando falhas.


Acontece que, nesses embates, errar significa cair do monstro e ter que recomeçar o trecho desde o início. Além disso, conforme avançamos no combate, ele fica mais difícil, imprevisível e com menos espaços para erros. Junte isso ao limite de tempo e mudanças bruscas dos obstáculos e o resultado é frustração — muitos dos combates eu só consegui vencer com insistência e memorização. As batalhas contra os chefes são ótimas quando funcionam com fluidez, mas faltou melhor balanceamento para diminuir a irritação.

A beleza inusitada do vazio

Um dos pontos mais notáveis de Solar Ash é a sua ambientação simultaneamente vibrante e melancólica. O universo do jogo encanta com suas construções exóticas e cenários estranhos, e a paleta de cores, que abusa de tons de magenta, verde e rosa, ajuda a construir a sensação de estranheza desse mundo. Uma trilha sonora eletrônica minimalista e suave reforça o tom de mistério e solidão.

É interessante também o esforço na construção da história. A dimensão dentro do Ultravoid é desolada e Rei está basicamente sozinha nessa jornada. Anotações deixadas pelos companheiros desaparecidos dão maior contexto aos fatos, e uma criatura misteriosa questiona as ações da protagonista — o que de fato aconteceu ali? Mesmo simples, a trama envolve e tem algumas reviravoltas interessantes. Destaco a dublagem de Rei, a voz traz personalidade à heroína.



Patinação surreal

Solar Ash é uma aventura 3D que aposta na agilidade e ação estilosa para oferecer uma jornada de ritmo acelerado. É fascinante patinar velozmente resolvendo puzzles de navegação por cenários exóticos, principalmente por causa da criatividade instigante das áreas. Além disso, os embates contra os monstros imensos são notáveis por serem visualmente impressionantes.

Os conceitos são sólidos e o universo é belo, no entanto, a execução deixa a desejar. A presença constante de tentativa e erro, câmera errática, progressão repetitiva e outros problemas mancham a experiência como um todo. No fim, Solar Ash é uma aventura razoável, mas longe de inesquecível.

Prós

  • Boas mecânicas de ação e plataforma 3D com foco em patinação ágil;
  • Cenários repletos de elementos curiosos que instigam a exploração;
  • Batalhas contra chefes criativas e visualmente estonteantes;
  • Ambientação estilosa e bela.

Contras

  • Muitos momentos de tentativa e erro irritantes;
  • Puzzles e situações repetitivas;
  • Câmera problemática, em especial nos momentos mais frenéticos;
  • Algumas vezes a progressão é obscura e obtusa.
Solar Ash — PC/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Annapurna Interactive

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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