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Análise: Victoria 3 (PC) oferece uma oportunidade única de reescrever a história mundial

Após um longo hiato, o novo jogo da saga mostra que a franquia Victoria ainda tem muita lenha a queimar.

Anunciado quase que de surpresa no ano passado, Victoria 3 (PC) é o mais recente jogo da longeva franquia Victoria, cujo último lançamento havia ocorrido no final da década passada.


Passados mais de dez anos após a segunda entrada da saga, portanto, o novo game da Paradox Interactive tem a missão  tanto de fazer justiça ao legado da série quanto de apresentá-la a um novo público nos computadores pessoais. Com isso em mente, será que a espera de mais de dez anos valeu a pena? Prepare os seus livros de história e confira a seguir em nossa análise!

Um legado pra lá de histórico

Nascida em 2003 com Victoria: An Empire Under the Sun (PC), a franquia Victoria é uma legítima representante do gênero conhecido em inglês como grand strategy ou grand strategy wargame. Entendidos como um subgênero ou uma variação do gênero de estratégia, jogos de grande estratégia são caracterizados por englobarem longos períodos cronológicos e possuírem várias camadas complexas. 

Com isso, o objetivo apresentado não é somente o de vencer uma guerra ou conquistar um território, como é usualmente comum em outras obras — frequentemente o jogador necessitará gerenciar seu patrimônio, leis, recursos, contratos, relações internas e externas, dentre outros assuntos.

Por sua complexidade e por tocarem em áreas de conhecimento variadas como geografia, história, economia e política, jogos de grande estratégia podem inclusive ser utilizados para fins educacionais. Paradox Interactive, a produtora da estrela desta análise, é uma das mais conhecidas do gênero, com obras excelentes como Crusader Kings III (Multi), Europa Universalis IV (PC) e os Victoria anteriores em seu portfólio.

Por isso e pelo tempo desde o último título da franquia, era grande a expectativa em torno desta sequência. Felizmente, após um tempo considerável com o título, posso finalmente dizer que a espera valeu a pena e temos aqui uma obra que deverá agradar os fãs do gênero.

Os ecos da revolução

Victoria 3 é um jogo sobre assumir, desenvolver e moldar um país da Era Vitoriana, com foco principal em sua economia e política. Isso significa que você moldará uma sociedade a partir da sua imaginação, enquanto supera obstáculos internos e externos à sua nação.

Aspectos cruciais como política, economia, diplomacia e guerras são ferramentas à sua disposição, mas que devem ser empregadas com prudência. Como toda ação tem uma reação, saiba que os seus atos impactam diretamente a sua população, que tem necessidades e desejos próprios e está disposta a tentar influenciar você.

Na prática, portanto, Victoria 3 é um simulador dinâmico — imagine um grande tabuleiro com diversas peças em movimento contínuo. Todas as suas decisões têm algum impacto, esperado ou não, e o caráter intencional desse fato demonstra uma sutil genialidade nos sistemas que compõem o game da Paradox.

Aliás, tamanha é a riqueza do tabuleiro e das interações entre as peças disponíveis que não há uma única maneira de “vencer” em Victoria III. Independentemente do país que você escolher, todo jogo terá exatamente um século de duração in-game (de 1836 a 1936). Defina seus objetivos ou escolha um dos sugeridos e veja o que você consegue criar. Para todos os efeitos, este é um daqueles títulos em que a jornada é mais importante que o destino; já os erros, mesmo os mais graves, fazem parte da experiência.

Domínio absoluto

Dentro do recorte de 100 anos, então, o jogador escolherá uma nação e tentará, por meio de todos os muitos recursos à sua disposição, alcançar as metas desejadas, sejam elas auto impostas ou fornecidas anteriormente pelo jogo. 

Há três objetivos primários em Victoria 3 que acabam impactando na forma como a aventura se desenrola: domínio econômico, hegemonia e sociedade igualitária.  No caso do primeiro, o objetivo é controlar a maior parte da economia global, de modo que o desafio é expandir a produção, o alcance e a influência do seu mercado frente aos desafios do século.

Já quando o assunto é hegemonia — um dos mais divertidos de jogar —, o resultado pretendido é a dominação completa da população global: seja por conquista ou expansão territorial, a maior parte do mundo deve estar dentro de suas fronteiras quando o século findar-se. 

Por fim, quando o estilo escolhido for a sociedade igualitária, o objetivo será montar a sociedade mais ideal e realizada possível, ao melhor estilo “todo o poder emana do povo”. É mais difícil do que parece.

Cada um dos objetivos primários possui um rol de nações recomendadas para que o jogador inicie seu jogo — caso a meta seja o domínio econômico, por exemplo, convém controlar os Estados Unidos, a Grã-Bretanha ou o Brasil, ao contrário da hegemonia, que é mais apropriada para a Prússia ou o Xogunato Japonês.

Ainda assim, reforçando o caráter sandbox da obra, é possível tentar a sorte com qualquer uma das mais de 100 nações que compunham o mundo no período histórico em questão. Para os que gostam de ditar as próprias regras, é inclusive possível ajustar a dificuldade e a agressividade da IA, o surgimento ou não de nações fantasiosas, e a possibilidade de trocar de país em dado momento (modo Ironman). Com elevado grau de personalização, a experiência de Victoria 3 é moldável, mas sem nunca prejudicar sua identidade original. Em um jogo deveras complexo como esse, isso sempre será um ponto positivo.

Me ensine a História como ela é

Falar em complexidade em um game de grande estratégia é sempre complicado, pois de um lado há a parcela hardcore do público que demanda cada vez mais sistemas e subsistemas, e, do outro, os novatos que podem se ver perdidos ou intimidados com a quantidade de menus e seções diferentes na tela.

O segredo, portanto, reside em tornar a experiência o mais acessível possível sem prejudicar sua profundidade. O último grande jogo da Paradox, o excelente Crusader Kings III, conseguiu esse feito através de um tutorial rico e bem explicativo e um valioso recurso in-game onde era possível passar o mouse sobre termos destacados nos menus e diálogos para ver o que significavam.

Ambos os avanços retornam em Victoria 3, o que garante que este terceiro jogo é também o mais acessível da franquia até agora; mesmo com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo no mundo virtual do game, é relativamente fácil se organizar e se localizar — principalmente quando aprende-se a usar o menu inferior de “Olhares”, que, como o nome insinua, ressalta as informações mais relevantes no mapa, como rotas de comércio e tropas posicionadas, em um clique.

Feitos os elogios, é preciso falar daquilo que talvez seja o grande elefante branco na sala do jogo: o seu sistema de combate. Infelizmente, a experiência atual de Victoria 3 nesse quesito é rasa, para dizer o mínimo. Basicamente, você irá dar ordens aos seus subordinados como avançar ou esperar, criar uma rota de fornecimento de armas e… aguardar que tudo se resolva enquanto tenta não morrer de tédio.

Inclusive, a facilidade com que normalmente se resolvem os conflitos talvez explique a ausência deles em larga escala em uma partida comum de Victoria 3. Esqueça as grandes guerras históricas acontecendo enquanto você desenvolve sua nação — por bugs ou escolhas dos desenvolvedores, esse será um fato incomum; se você quer guerra, terá que procurar ativamente na maioria dos casos.

É basicamente o único problema grave de um jogo que diverte e, muito importante, transborda potencial. Esse último ponto é importante, pois, como os veteranos bem sabem, a Paradox costuma oferecer grandes quantidades de suporte pós-lançamento, inclusive gratuito, aos seus títulos. Eis que no primeiro comunicado sobre planos a curto prazo, realizado no início de novembro, foi citado que o sistema de combate será um dos que receberão melhorias.

Assim como Europa Universalis IV e o próprio Crusader Kings III evoluíram muito desde os seus lançamentos originais, a fundação está estabelecida para que Victoria 3 torne-se em breve um dos exclusivos de PC mais elogiados de todos os tempos. Não que a espera seja necessária, porém: a experiência do dia 1 (ou ano 1), já é muito recomendada, especialmente para os fãs do gênero e os novatos que desejam reescrever a história do mundo em um dos períodos mais interessantes da trajetória da humanidade.

Só a vitória interessa

Victoria 3 é rico, vasto e sobretudo cativante. Embora seu sistema de combate raso destoe do restante da obra, moldar nações inteiras é divertido o bastante para entreter por um bom tempo. Seja você veterano ou novato em jogos de grande estratégia, saiba que a mais nova proeza da Paradox não desaponta em sua missão  principal de conceder ao jogador a liberdade necessária para reescrever parte considerável da história mundial como desejar.

Prós

  • Representa de forma consideravelmente rica um dos períodos cruciais para o desenvolvimento do mundo moderno;
  • Apresenta um grande tabuleiro reagente às ações alheias;
  • Dá liberdade para que o jogador crie seus próprios objetivos ou jogue conforme os prontos;
  • Tutorial completo e recurso de dicionário virtual tornam a experiência acessível até para novatos no gênero;
  • Mais de 100 nações controláveis;
  • Suporte ao português brasileiro.

Contras

  • Sistema de combate é raso e não empolga;
  • Grandes guerras são incomuns;
  • Pode se tornar repetitivo com o tempo.
Victoria 3 - PC - Nota: 8.0
Revisão: Camila Cerineu
Análise produzida com cópia digital cedida pela Paradox Interactive

é bacharel em Produção Cultural pela UFF e estudante de Comunicação Social pela FSMA. Na infância, ganhou um Super Nintendo dos pais e, desde então, nunca mais deixou o mundo dos games. Ainda sonha em ser um Mestre Pokémon.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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