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Análise: A Little to the Left (PC) retrata o relaxamento e a frustração de organizar coisas

Coloque ordem na bagunça neste título indie simultaneamente charmoso e irritante.


Para alguns, ajeitar objetos e deixar tudo bem alinhado é uma atividade prazerosa e meditativa; já para outros, essa é uma afazer estressante e exaustiva. A Little to the Left é um título indie que transforma a arrumação de coisas em um simpático puzzle. Os desafios são curtos e intuitivos, e uma atmosfera aconchegante torna a experiência bem tranquila. Porém, algumas decisões questionáveis e soluções obscuras fazem com que as tarefas sejam mais frustrantes do que deveriam.

Empilhando, arrastando e ordenando para resolver quebra-cabeças

Em cada um dos puzzles de A Little to the Left, precisamos manipular objetos para deixar a cena completamente arrumada. Na maior parte das vezes, o que precisa ser feito é fácil de descobrir: alinhamos quadros tortos, organizamos um conjunto de lápis de acordo com o tamanho, guardamos inúmeros itens nos compartimentos corretos de uma caixa de ferramentas, e assim por diante. Os comandos são intuitivos, bastando usar o mouse para pegar e arrastar coisas.


Conforme avançamos, os enigmas ficam mais elaborados e exigem maior observação. Para organizar alguns cartões postais, por exemplo, é necessário conectar elementos em comum entre eles, enquanto um conjunto de copos ilustrados demanda alinhar diferentes desenhos para criar uma cena. Alguns dos puzzles, inclusive, contam com mais de uma solução — ser criativo e atencioso é essencial para encontrar as possibilidades.

O jogo conta com mais de 75 puzzles, que podem ser completados em aproximadamente duas horas. Fora isso, há a “arrumação diária”, que oferece diariamente uma versão alterada de algum dos estágios da campanha. Completar esses desafios provê medalhas e é um incentivo para revisitar o jogo todos os dias.



A satisfação de limpar e ajeitar

A Little to the Left me conquistou com sua simplicidade e charme. Pode parecer banal empilhar pratos, organizar livros ou separar diferentes categorias de objetos, mas a atmosfera suave e descomplicada torna a atividade relaxante. Há de tudo um pouco: limpeza de superfícies, ajeitar itens de acordo com suas características físicas, observação e replicação de padrões, e muito mais. Boa parte dos estágios podem ser completados em segundos, o que deixa a arrumação ágil.

Particularmente, gostei muito dos puzzles mais elaborados que extrapolam o conceito e entram no campo da fantasia. Em um estágio, arrastamos estrelas para completar constelações no céu; em outra situação, precisamos inclinar quadros para fazer rolar um objeto que viaja pelas cenas retratadas nas ilustrações. Ao manipular peças de um jogo de xadrez, precisamos observar as sombras dos objetos para inferir a organização correta. Além de mecanicamente criativos, esses quebra-cabeças também são visualmente interessantes.


Complementando a experiência, temos uma atmosfera agradável com muito uso de tons pastéis e elementos que lembram ilustrações com giz de cera. É tudo muito colorido e com ótimo contraste cromático, e os objetos se deformam e mexem, trazendo um aspecto tátil ao jogo — adorei arrastar e manipular as coisas. Há até um leve aspecto narrativo: aparentemente a origem da bagunça é um gato, que chega a participar tirando os itens do lugar. A trilha sonora minimalista e suave reforça a sensação constante de relaxamento.

As chateações ao tentar ser organizado

É clara a intenção do jogo em oferecer uma experiência tranquila; afinal as mecânicas e puzzles são simples. Entretanto, A Little to the Left apresenta vários elementos que deixam as coisas bem irritantes, comprometendo a satisfação de tentar organizar a bagunça.

Para começar, há uma forte repetição de ideias. No decorrer da campanha, são inúmeras as vezes em que ordenamos itens de forma crescente, alinhamos objetos ou organizamos coisas dentro de caixas. A variação é puramente visual, sem mudanças no desenvolvimento dos puzzles: em um estágio alinhamos chaves; em outro, colheres; em um terceiro, pedras, sempre com a mesma solução. Por causa disso, a sensação de repetição é inevitável.


Outra questão negativa é o desenvolvimento de alguns dos quebra-cabeças. É muito comum não ter dicas claras o suficiente para encontrar a solução, o que acaba exigindo tentativa e erro. Muitas resoluções, inclusive, são extremamente obscuras e praticamente impossíveis de serem encontradas sem utilizar o recurso de ajuda, que mostra como resolver o estágio. Várias vezes, mesmo com o auxílio, não foi fácil terminar certos estágios.

Um exemplo claro está nas fases em que inúmeros objetos estão espalhados pela tela e precisamos organizá-los em um padrão específico. O problema é que não há indicação do que precisamos fazer, o que demanda testar as possibilidades às cegas. Para piorar, na maior parte das vezes há somente uma única solução com os itens em posições específicas — coisas em locais invertidos, por exemplo, não são aceitas como corretas, mesmo com a cena completamente organizada.


A soma desses problemas gera frustração, indo de encontro à intenção de oferecer uma experiência relaxante. Particularmente, acredito que o jogo seria mais agradável com a inclusão de elementos para auxiliar nas resoluções e dicas mais explícitas nos enigmas abstratos.

O encanto e o marasmo da arrumação

A Little to the Left transforma arrumação e organização de objetos em um simpático puzzle. Pode não parecer, mas é divertido e relaxante alinhar quadros, guardar metodicamente itens em caixas e limpar mesas, principalmente por causa das mecânicas simples e dos enigmas intuitivos. Cores suaves e uma trilha sonora leve complementam a atmosfera de tranquilidade.

O jogo tem como objetivo ser calmo e contemplativo, mas certos pontos vão de encontro a essa filosofia. Alguns quebra-cabeças têm soluções obscuras, os estágios mais abstratos são desnecessariamente complicados e algumas ideias são reutilizadas com frequência, atrapalhando a experiência, que deveria ser relaxante.

No mais, A Little to the Left é exatamente como a atividade de arrumar: ora recompensador, ora irritante.

Prós

  • Puzzles simples e com mecânicas intuitivas;
  • Boa variedade temática dos quebra-cabeças;
  • Atmosfera aconchegante com visuais e música suaves.

Contras

  • Algumas ideias são reutilizadas várias vezes sem mudanças significativas;
  • Presença constante de tentativa e erro;
  • Muitas soluções e lógicas obscuras tornam alguns puzzles frustrantes.
A Little to the Left — PC — Nota: 6.5
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Secret Mode

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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