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Impressões: Octopath Traveler: Champions of the Continent (Mobile) faz jus à franquia e foi bem adaptado para plataformas móveis

O título não deixa a desejar em relação ao Octopath Traveler original, e agradará tanto aos novatos quanto aos fãs dos jogos do Team Asano.


Desenvolvido pelo Team Asano (Square Enix) em parceria com o estúdio Acquire, e publicado também pela Square Enix, Octopath Traveler: Champions of the Continent é um JRPG free-to-play com artifícios de gacha, gameplay de turno inspirado na série Bravely Default, ambientação medieval e estilo visual em HD-2D e uma narrativa ramificada convergente que serve de prequela para Octopath Traveler (2018). O jogo, lançado no Japão em outubro de 2020, continua recebendo atualizações que aprimoram sua experiência e expandem sua história, de modo que este artigo não é uma análise, mas apenas impressões do conteúdo de lançamento em sua versão Ocidental (julho de 2022).

Esta prequela conta novamente com conceito e produção de Tomoya Asano, além de com o mesmo estúdio parceiro, mesmo escritor de cenário (Kakunoshin Futsuzawa) e mesmo compositor (Yasunori Nishiki) de Octopath Traveler, mas agora está sob a direção do trio Yasuhiro Kidera, Hirohito Suzuki e Hiroshi Marumoto. O jogo vem com três principais objetivos: servir tanto como uma base contextual quanto uma porta de entrada para a série; adaptar o estilo HD-2D e a experiência narrativa e de gameplay dessa IP para plataformas móveis; e criar um JRPG mobile sustentável free-to-play que se saia melhor do que a tentativa anterior do Team Asano — Various Daylife (MC) — que está para ser excluído do Apple Arcade.

Narrativa fragmentária, ramificada e convergente que é superficial e rica ao mesmo tempo

Do ponto de vista do design narrativo, Champions of the Continent conta com uma premissa semelhante, e não à toa sob os cuidados do mesmo escritor, mas Futsuzawa dessa vez procurou simplificar a experiência, tanto em termos de número de tramas quanto em termos de desenvolvimento de personagens. Enquanto o Octopath Traveler original possui oito histórias que se conectam e personagens centrais que são desenvolvidos com peso em escolhas, em Champions of the Continent partimos de três tramas paralelas e dezenas de personagens com um desenvolvimento mais superficial, linear e fragmentário.

Formalmente falando, podemos entender a narrativa de Octopath Traveler como ramificada em três subtramas (cada qual com 3 capítulos) que convergem e que juntas levam a uma trama comum (capítulo final), encerrando o enredo principal de lançamento do game. Cada subtrama está relacionada a um diferente conceito (Riqueza, Poder e Fama) que move seus respectivos vilões: Herminia, a "Bruxa da Ganância"; Tytos, o "Herói"; e Auguste, o "dramaturgo".


Os vilões e alguns outros personagens possuem voice acting parcial com uma boa interpretação dramática (particularmente em japonês), mas, infelizmente, as vozes são apenas ocasionais e o texto, embora com sensibilidade em seus diálogos, não aprofunda esses conceitos muito além dos estereótipos relacionados a eles. Ademais, também pode ser decepcionante aos fãs do original que o roteiro aqui seja mais formulaico e linear — as poucas escolhas possuem peso praticamente nulo no fluxo da história.

Por outro lado, a conexão tardia entre as três tramas é bem amarrada — talvez melhor do que o Octopath Traveler original — e possui um bom desfecho (provisório) que abre caminho a mais conteúdos que estão por vir. A experiência certamente também despertará curiosidade nos jogadores para o título original, embora as conexões com ele não sejam tão fortes.


Quanto aos personagens, eles são muitos, e estão em constante expansão, mas os principais inicialmente são os portadores do anel: Millard, Sofia, Gilderoy, Fiore, Lynette, Theo, Viola e Scarecrow. O jogador inicia com um desses, podendo arranjar outros para sua party via “roletas” (mecânicas de gacha) sob o custo de rubis, os quais podem ser adquiridos por quests, tarefas diárias, conquistas ou simplesmente comprando por dinheiro real.

Além disso, vale ressaltar que cada personagem possui ilustração, voz e pixel art próprios. Há três categorias de personagens, os quais são classificados por estrelas (3★, 4★ e 5★) limitando, assim, o nível máximo que eles podem alcançar. Personagens de 3★, por exemplo, são capazes de atingir, no máximo, nível 40; já os de 4★ e 5★ têm limite de 60 e 80, respectivamente. Isso passa a ser bem importante só mais ao final do jogo.

Outro ponto é que a obtenção de um personagem de certo tipo de influência (em riqueza, poder ou fama) dará ao jogador pontos de influência em diferentes proporções (+10 pontos para 3★, +15 para 4★ e +20 para 5★). O desenvolvimento narrativo de cada personagem e sua influência é fragmentado, cada qual em uma série de quests opcionais que podem aumentar a influência do time nessas classificações.

Level design simplificado, mas combate aprimorado e expandido

O trio de diretores de Champions of the Continent conseguiu guiar uma excelente adaptação de gameplay da série para plataformas móveis. Do ponto de vista do level design, por exemplo, a movimentação foi simplificada de forma precisa, confortável e interessante, sempre andando ou correndo em trilhos/caminhos (alguns, secretos) que frequentemente acompanham o design de tapetes ou estradas; e também é possível se teletransportar para pontos de locais já mapeados.

Outro grande acerto de level design para mobile está na combinação entre encontro visual e encontro aleatório/randômico. Embora haja encontros aleatórios a céu aberto que quebrem o fluxo da aventura, eles não são tão frequentes e as transições para batalha são muito rápidas. Ademais, os chefes (secretos ou não) no mapa sempre são visíveis e passivos, de modo que o jogador possa optar enfrentá-los quando quiser.


Por outro lado, a parte de gameplay narrativo sofreu uma defasagem em relação ao original. As poucas opções de diálogo são de pouco ou nenhum peso para os eventos da trama e, diferentemente do Octopath Traveler original, não há habilidades para interagir de forma mais dinâmica com a exploração na cidade e com os diálogos.

Quanto ao combate, a base mecânica foi conservada: há batalha por turno tradicional com um sistema de ações análogo ao Boost Point (BP) da série Bravely Default, também desenvolvida pelo Team Asano, de modo que é possível acumular pontos de ações para fazer ataques simultâneos ou magias mais fortes. Também se mantém o sistema de Octopath Traveler de fraquezas dos inimigos com determinados elementos (trovão, gelo, fogo e luz) e armas (lança, espada, faca, arco, cajado, leque, machado e livro) relativamente às classes fixas dos personagens (clérigo, cavaleiro, caçador etc.). Foram feitas poucas modificações nesses aspectos, mas é um ponto que pode ser ampliado em futuras atualizações.



O aspecto mais interessante, que se beneficia da pluralidade do elenco do jogo, é o fato de o gameplay permitir oito personagens em combate, no lugar de quatro. Você possui uma formação de grupo dividida em dois, quatro na linha de frente e quatro na linha de trás. Apenas quem está na frente pode executar ações ou sofrer dano direto, mas, enquanto isso, as unidades da linha de trás recuperam pontos de vida, de magia e de boost. Tudo isso torna o gameplay mais dinâmico e estratégico, embora, em contraposição, tenham optado por abrir mão do uso de consumíveis durante a batalha.

Por fim, a parte de customização também foi simplificada, mas está bem implementada com sistema de confecção dos equipamentos. Há apenas um slot para arma, um para vestimenta e um para chapéu, enquanto que a evolução dos atributos é automática, e as magias são distribuídas em uma hierarquia de árvores de habilidades (ativas e passivas). Essas escolhas de design preservam a marca da série ao mesmo tempo em que priorizam o gerenciamento de personagens do grupo, extraindo o melhor do potencial de cada um.

Belo HD-2D para mobile e com uma trilha sonora melhor do que nunca

Para finalizar, algumas palavras sobre o audiovisual. Como mostrei longamente em um artigo para o Nintendo Boy, e também como comentei em minhas análises de Triangle Strategy (Switch) e Live A Live (Switch), a técnica HD-2D possui uma fórmula básica (perspectiva, pixel art, certos efeitos de luz, etc.), mas que está sendo paulatinamente aprimorada e levemente alterada a cada nova reiteração. No caso de Champions of the Continent, no entanto, não se trata de aprimoramento, mas apenas de uma boa adaptação.

Considerando que a equipe de desenvolvimento projetou o jogo para celulares de diferentes especificações — muitas das quais inferiores ao Switch — e tendo sistemas operacionais não especializados em jogos, naturalmente os gráficos estão menos polidos e o ambiente menos detalhado, mas o jogo está com uma boa performance e muito bonito para celular ou tablet. Além disso, três mudanças são salientes.

Primeiramente, a interface foi simplificada — com exceção dos menus para lidar com gacha — e possui ícones maiores para melhor manuseio em tela. Em segundo lugar, é visível que há uma ênfase em cenários mais limitados e fechados, embora ainda haja ambientações naturais. Por fim, optou-se por uma câmera sempre fixa e mais aproximada aos personagens do grupo, o que facilita a jogabilidade em tela menor.



Enquanto isso, não houve nenhum retrocesso em som. No caso da trilha sonora, está tão boa quanto a premiada OST de Octopath Traveler, mas também com pouca novidade. Várias músicas do título original estão de volta, embora também haja algumas novas composições de Nishiki.

Como já disse em entrevista, o compositor continua com seu estilo homofônico complementar ao HD-2D de mesclar uma base orquestral moderna sólida e exuberante a uma melodia destacada e fácil de apreciar (à moda da era 16-bits). Contudo, podemos destacar também que nessa versão de mobile há uma maior ênfase em instrumentação orquestral e vocal clássico, com maior consistência no estilo das peças e sempre com boas transições, que é um dos destaques do trabalho de Nishiki, como foi muito bem analisado no 8-bit Music Theory.

Um Octopath Traveler para fãs e novatos

Embora com uma narrativa mediana, pouca novidade musical, gráficos um pouco inferiores ao título original e simplificação significativa em level design, Octopath Traveler: Champions of the Continent traz bons gráficos para mobile, aperfeiçoa e expande o gameplay de combate em aspectos interessantes e, acima de tudo, adapta muito bem todos seus níveis de design para plataformas móveis. A longo prazo, é possível que as mecânicas de gacha e o level design possam desgastar esse título, mas, ao menos no momento, é recomendável tanto a fãs de Octopath Traveler quanto a novatos na série que gostem de propostas de “clássico moderno” à moda das demais produções do Team Asano.

Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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