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Análise: Anuchard (Multi) resgata o passado em um agradável RPG de ação

Inspirado em clássicos de outrora, este título indie aposta demais na simplicidade de ideias.


Anuchard parece ter vindo direto da década de 90 com seu colorido visual em pixel art e ideias principais descomplicadas. Na pele de uma jovem armada com um sino, exploramos calabouços e resolvemos puzzles em uma simpática aventura de ação com toques de RPG. A atmosfera retrô, um mundo pitoresco e mecânicas simples são os principais atrativos do título, no entanto a simplicidade geral incomoda a ponto de comprometer a experiência.

Tentando restaurar uma terra gloriosa

Segundo as lendas, Anuchard era um reino sem igual. Abençoado por cinco guardiões mágicos, a ilha flutuava nos céus e seus habitantes tinham uma vida calma e deslumbrante. Um dia, no entanto, tudo mudou: os seres protetores desapareceram misteriosamente, e sem seu suporte mágico, Anuchard caiu em direção à Terra. Dessa catástrofe, restou somente uma pequena vila conhecida como Orchard, que passou a ser o único bastião da humanidade.


A magia remanescente do reino flutuante afetou os destroços, o que criou um calabouço repleto de monstros e mistérios. Livros antigos dizem que os guardiões dormem nas profundezas dessa complexa masmorra, e acordá-los é a única maneira de restaurar Anuchard. Inúmeros aventureiros adentraram o local em busca de pistas ou tesouros, porém todos eles retornaram à vila na forma de uma estátua de pedra. Diante desse perigo, o calabouço se tornou uma área proibida, por mais que muitos ainda insistem em se arriscar lá.

A esperança surge quando uma garota é escolhida pelos poderes divinos para ser a nova Bellwielder, uma figura mítica que usa um sino mágico para explorar o calabouço, resgatar as almas daqueles que foram transformados em pedra e acordar os guardiões. Com isso, começa uma jornada perigosa para restaurar Anuchard e descobrir os motivos de sua destruição.



Luta e puzzles em uma jornada tranquila

A aventura da escolhida se desenvolve principalmente nos calabouços, em uma estrutura de RPG de ação. O objetivo normalmente é encontrar a alma de um dos habitantes que virou pedra ou então derrotar um chefe. Para avançar, a protagonista precisa resolver puzzles e enfrentar inimigos. O caminho é majoritariamente linear, mas há alguns segredos — ficar atento aos detalhes sutis dos cenários é essencial para encontrar esses elementos escondidos.


No combate, a garota ataca com Audros, o sino lendário. Além de golpes normais com a arma inusitada, a heroína é capaz de lançar os inimigos ao rolar em direção a eles. Essa técnica é essencial, pois muitos monstros têm barreiras especiais que só se quebram quando eles são arremessados em direção a obstáculos dos cenários, como paredes e árvores. Para cuidar dos ferimentos, é possível fincar no solo um bastão mágico chamado Spire que recupera a vida da protagonista.

Fora dos calabouços, exploramos a vila de Orchard, que oferece algumas atividades. Com recursos obtidos nas masmorras, podemos liberar novas habilidades ou expandir o vilarejo. Já na cabana do chef de cozinha, diferentes ingredientes podem ser combinados em pratos sofisticados que dão alguma vantagem temporária, como aumento de vida ou alteração do combo básico da arma. Por fim, missões opcionais podem ser encontradas nestes momentos de interlúdio.



Os atrativos e os problemas de uma aventura despretensiosa

Anuchard tem mecânicas bem descomplicadas, o que resulta em uma experiência agradável e acessível, mas também bastante irregular.

Na parte da ação, temos um combate simples e acessível focado em atacar com a sequência normal ou então lançar inimigos nos obstáculos para quebrar seus escudos. Com o avançar da jornada aparecem novos tipos de monstros que exigem estratégias levemente diferentes, assim como pequenas variações de ataques e habilidades. Já os chefes são um pouco mais complexos, às vezes apresentando elementos de puzzle mais interessantes.


É divertido lançar os monstros pelos cenários, mas isso cansa por vários motivos. O maior problema é que os embates não evoluem, bastando utilizar sempre as mesmas estratégias para completar as arenas de batalha, que têm desafio baixo. Também não ajuda o fato de que o repertório de movimentos da protagonista não se expande, o que torna as estratégias bem limitadas. Até há uma tentativa de trazer alguma complexidade com Spires alternativos e leves alterações de combos por meio das receitas, mas o impacto é bem tímido.

Já no campo da exploração, o jogo é um pouco mais desenvolvido, principalmente em relação aos puzzles. Boa parte dos enigmas consiste em apertar botões para abrir portas, porém nem sempre a solução é trivial. Muitos desses dispositivos, por exemplo, só podem ser ativados por uma esfera de energia capaz de atravessar barreiras mágicas, o que nos força a lançá-la — o desafio é acertar o ângulo ou correr para fazer movimentos adicionais. Os puzzles ficam cada vez mais complexos, mas nunca sendo difíceis demais ou frustrantes.


Fora dos calabouços, podemos utilizar recursos para desenvolver diferentes aspectos do mundo. Assim como as outras características do jogo, esta é uma atividade de baixo impacto, pois a maioria das melhorias é cosmética — achei muito mais vantajoso utilizar os itens para liberar alguma das poucas habilidades especiais para a heroína em vez de colocar flores em um canteiro.

Em um cativante universo retrô

De longe, a melhor característica de Anuchard está em sua ambientação. Explorar esse mundo me fez lembrar de RPGs clássicos do PlayStation por causa do visual colorido que remete os destaques do gênero lançados na década de 90. A trama e a temática podem ser um pouco batidas em alguns aspectos, mas inúmeros personagens expressivos e pitorescos trazem vida ao universo do jogo. A música complementa essa atmosfera com ótimas composições que combinam instrumentos reais e chiptune.

Fica bastante clara a intenção de criar uma aventura inspirada no passado, mas alguns detalhes incomodam. Salvar o progresso, por exemplo, é feito de forma manual e somente em um único local, o que se torna desagradável conforme novas localidades são desbloqueadas. O combate até tem um conceito interessante, mas ele acaba estagnado com sua simplicidade. Por fim, faltou um pouco de ousadia e criatividade na hora de montar os calabouços, que acabam sendo parecidos demais. É possível se divertir com Anuchard, mas é necessário estar disposto a relevar boa parte dos problemas.



Divertido, porém básico demais

Anuchard é um curioso RPG de ação inspirado nos clássicos. O jogo aposta em combates descomplicados e puzzles intuitivos para criar uma aventura ágil e acessível. Além disso, o mundo cativa com sua atmosfera colorida e personagens pitorescos. No entanto, a simplicidade geral atrapalha: as mecânicas e conceitos pouco se desenvolvem no decorrer da jornada, tornando a experiência estagnada. No fim, Anuchard tem algum charme, no entanto não consegue explorar seu total potencial.

Prós

  • Combate ágil e com mecânicas acessíveis;
  • Calabouços com desafios agradáveis e intuitivos;
  • Universo retrô cativante e repleto de personagens interessantes.

Contras

  • Mecânicas de combate limitadas e que não evoluem durante a aventura;
  • Baixo desafio, com batalhas fáceis e puzzles simples;
  • Algumas decisões de design são inspiradas demais no passado.
Anuchard — PC/XBO/XSX/Switch — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela Freedom Games

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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