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Análise: Oninaki (Multi) — uma jornada sobre vida e morte como nunca vista antes

Proteja o mundo dos vivos e dos mortos em uma trama repleta de reviravoltas e combates no estilo RPG de ação.


Abordar assuntos como vida e morte trazem a tona um debate delicado, principalmente na sociedade ocidental. O time da Tokyo RPG Factory em parceria como o estúdio Square Enix deixa os panos quentes de lado e mergulha com tudo nesse tema tão controverso, mas ao mesmo tempo tão presente no nosso cotidiano. Embarque em uma aventura de auto-descobrimento e ajude a manter o equilíbrio no mundo dos mortos em Oninaki.

Vigilantes do outro mundo

Em Oninaki encaramos uma realidade em que a ideia de reencarnação é totalmente difundida e presente no cotidiano da civilização. O palco principal da trama ocorre em Szaka, o último resquício de uma grande cidade em um mundo aparentemente desolado por alguma catástrofe. Nela, as pessoas vivem de forma a focar e se preocupar mais com sua próxima vida ao reencarnar do que com o presente em si. Assuntos tais quais "serei rico em minha próxima vida?" ou "poderei reencontrar meu amado ao despertar?" permeiam a mente da população. O fato é que, assim como na vida real, em Oninaki não importa o quão concebida a ideia de morte e reencarnação esteja, ninguém está preparado para encará-la, seja quem morre ou seus entes queridos.


Ao morrermos, nosso espírito é levado para o Beyond the Veil que seria uma espécie de espelho do mundo dos vivos com um visual mais soturno, onde as almas permanecem até que possam reencarnar. Contudo, nem todas as almas estão garantidas de passar para a próxima vida. Assim como na vida real, no jogo muitas pessoas acabam morrendo de forma prematura e inesperada ou após uma velhice carregando alguma mágoa não resolvida. As Lost Ones são as almas de pessoas que ficam presas e incapazes de reencarnar enquanto carregarem um sentimento que as prendam naquela realidade. Da mesma forma, é dito que não se deve ficar de luto por alguém falecido, pois tais sentimentos prenderiam a alma daquele ser.
O Beyond the Veil lembra uma versão do mundo invertido da série Stranger Things


Quando essas almas permanecem por muito tempo nesse estado, elas podem ficar descontroladas e se tornar criaturas horrendas conhecidas como Fallen. Nessa situação a única forma de finalizar seu sofrimento é eliminando o ser para que ele parta em sua jornada na próxima vida.
 
Para manter a ordem e o equilíbrio no mundo dos vivos e dos mortos, os watchers são criados sob o comando direto dos soberanos de Deto. Os membros desse grupo são guerreiros seletos após um rigoroso treinamento. Dentre suas principais habilidades está a capacidade de atravessar o véu que separa a realidade dos vivos da dos mortos para ajudar as Lost Ones a reencarnarem e, também, colocar fim à ameaça dos Fallens.



Não conheci o outro mundo por querer

Nesse contexto, encarnamos o personagem Kagachi, um jovem que teve sua infância traumatizada pela morte de seus pais. Mesmo com a ajuda de sua amiga Mayura e seu pai Kujo, um watcher veterano, Kagachi se torna um adulto blindado a sentimentos afetivos. Sob a tutela de Kujo, ele se torna um watcher de primeira junto com sua amiga de infância.



Por estar entre a elite da equipe militar, Kagachi é capaz de estabelecer um vínculo com almas específicas para aumentar ainda mais o seu poder de batalha.

No jogo encontramos a alma de antigos guerreiros na mesma situação dos Lost Ones, contudo, mesmo com um ressentimento muito forte, essas almas não sucumbiram ao processo de transformação para se tornarem Fallens. Denominados como daemons, esses seres não se recordam de sua vida passada, porém, podemos estabelecer vínculos com eles. Ao fazer isso, é possível desbloquear fragmentos de sua vida passada para entender o contexto por trás de cada daemon encontrado.



Aisha é a primeira a criar esse vínculo com Kagachi — e uma das minhas preferidas durante o meu gameplay. O jogo traz uma grande variedade de daemons, mas fiquem tranquilos, pois encontrá-los pelo mapa não é uma tarefa árdua. Aprender sobre o passado de cada um deles foi uma experiência interessante e que me deixou com um gosto de “quero mais” por apenas contar como cada um chegou naquela condição. Seria interessante se cada um tivesse uma espécie de missão secundária para ajudá-los a extinguir o sentimento negativo, por exemplo. 



Mestre das armas

Em Oninaki o combate se dá através das características do daemon que utilizaremos. Para cada vínculo estabelecido com um novo aliado, ganhamos sua arma característica para utilizar durante os combates enquanto o daemon estiver em cena. A variedade de armas é alta, agradando a todos os gostos para gameplay. A lista de armas vai desde os clássicos como a katana e a lança até os mais exóticos como uma foice (a minha preferida) e um par de canhões gigantes.
Com sua daemon Dia, Kagachi abandona o combate corpo-a-corpo para assumir um par de armas de fogo.


Cada arma pode ser aprimorada com upgrades em troca do descarte de outros equipamentos. Fora isso, podemos equipá-las com pedras chamadas shadestones que são encontradas ao matar as criaturas no mapa. Elas conferem melhorias específicas como aumento no ataque, maior poder das habilidades, a chance de envenenar o inimigo, entre outras opções.

Incrementando ainda mais o elemento RPG no jogo, cada daemon possui uma árvore de habilidades própria. Podemos adquirir melhorias para os status, poder dos golpes e até novos ataques especiais. Alguns desses upgrades ficam fixos mesmo que você esteja utilizando outro daemon no momento, bastando que o espírito dono daquela habilidade esteja na equipe, que pode ser composta por até quatro daemons. Na medida que gastamos os pontos adquiridos no combate em melhorias, nosso companheiro sobrenatural sobe de rank, podendo chegar até o nível 10.



Encontrar todos os daemons, escolher os seus favoritos para maximizá-los e descobrir mais sobre seu passado é um dos maiores atrativos do jogo. Embora o jogo mencione que cada dungeon trará vantagens para determinado tipo de espírito guerreiro, a verdade é que um daemon bem treinado supera qualquer obstáculo. Se preferir, você pode escolher um para focar o jogo inteiro e não terá grandes problemas para enfrentar os inimigos.

Juiz, juri e executor

Como watcher embarcaremos nas mais variadas missões, porém, em todas elas teremos situações difíceis de se conceber por tratar de assuntos delicados e que provocam uma certa reflexão no jogador. Temos desde tarefas mais simples, como ajudar a alma de um garoto a dar um último adeus para seus pais antes de partir, até questões mais complexas, como investigar uma seita suspeita de provocar suicídios em massa.

Em todas elas, Kagachi se mostra indiferente aos sentimentos alheios, estando ali apenas para cumprir seu papel e finalizar a situação o mais rápido possível, mesmo que isso signifique tirar a vida de pessoas inocentes a contragosto de sua parceira, Mayura, que se comove com a necessidade das almas encontradas e tenta ao máximo flexibilizar a situação. Não é algo corriqueiro no título, mas em determinadas situações o jogo nos dará a opção de decidir a ação de Kagashi. São poucas ocasiões, que determinam apenas o desfecho da missão atual sem trazer grandes consequências colaterais, pois em se tratando de ética, Oninaki não economiza tempo em nos colocar em situações complicadas.



Durante as quests entraremos em dungeos repletas de criaturas no melhor estilo Diablo (PC/PS), Ragnarok (PC) e afins. Durante a fase, podemos alternar entre a realidade dos vivos e dos mortos, sendo que em cada uma encontraremos diferentes tipos de inimigos para enfrentar.

Estando no Beyond the Veil, podemos encontrar algumas almas pedindo ajuda. São pequenas missões secundárias e que garantem pontos de habilidade no final. São tarefas simples como levá-las para rever um ente querido ou local específico pela última vez. Em alguns casos, elas estarão em ponto de se tornarem fallens pedindo apenas que encerremos o seu sofrimento de uma vez.



E por falar no mundo dos mortos, seu visual faz um belo contraste com o mundo dos vivos trazendo cores mais escuras. Apesar do jogo não ter gráficos muito detalhados se  compararmos com grandes títulos da geração atual, o trabalho com cores e a iluminação dos cenários foi um tema muito bem trabalhado pelos desenvolvedores.

A trilha sonora é ausente em boa parte do jogo, entrando em momentos chave, principalmente em combates contra chefes, trazendo belas sequências instrumentais, característica forte de RPGs da Square Enix, que cumprem bem o papel em dar ritmo na batalha.
Oninaki esbanja um charme próprio através de cores vibrantes e uma iluminação que traz suavidade para o cenário


No desafio de estabelecer a ordem entre as duas realidades, encontraremos diversas criaturas em nosso caminho. Os mapas são repletos de inimigos simples, cada um com seu padrão de ataques e movimentação. Durante o trajeto também encontramos versões maiores conhecidas como sight stealers. Essas criaturas são responsáveis por trazer escuridão ao mundo dos mortos, nos impedindo de transitar por ele até que elas sejam eliminadas. Ao final de cada quest encontraremos os famosos chefões. No geral, são criaturas gigantescas e que conferem uma dificuldade elevada, principalmente aos jogadores despreparados.


Para amenizar o desafio, na medida que eliminamos os inimigos no mapa um percentual de afinidade é preenchido. Ao ultrapassar a marca dos 100%, podemos utilizar um modo chamado manifested onde esse medidor de afinidade passa a ser consumido enquanto Kagashi assume uma aura vermelha que o deixa mais rápido, mais forte e seus ataques ganham diversos bônus que podem ser elevados dependendo dos tipos de habilidades adquiridas.



A situação do personagem passa a complicar ainda mais com acontecimentos que o levam a questionar o sistema que rege a vida das pessoas e o surgimento do Night Devil, um ser sombrio e repleto de ódio com o único objetivo de liberar sua fúria sobre o reino, levando Kagashi a medidas drásticas na companhia de Linne, uma misteriosa garotinha que parece capaz de transitar entre ambas as realidades. São inúmeros acontecimentos em Oninaki que mantêm a trama sempre aquecida com assuntos pesados e que costumam chocar a muitas pessoa. Cabe ao jogador fortalecer o elo com seus daemons e desvendar os segredos do enredo.
A criatura conhecida como Night Devil parece disposta a destruir o resquício de humanidade presente no mundo


Apesar de ser um pouco travado no começo, a movimentação e velocidade de ataque de Kagachi sobem conforme ganhamos experiência de combate e aumentamos o vínculo com nossos daemons. O jogo pode se tornar fácil demais para os jogadores mais experientes no gênero à medida que ganhamos novos poderes e pegamos o jeito de sua mecânica de combate. Em minha experiência, o desafio diminuiu consideravelmente, mesmo trocando para a dificuldade maniac. Ainda assim, seu enredo original repleto de questões delicadas e reviravoltas podem prender os amantes de uma boa história.
Prepare-se para devastar hordas de inimigos com habilidades poderosas


O game não traz um modo new game +, muito comum nos RPGs de ação da atualidade.Isso é um fato estranho, já que o jogo oferece múltiplos finais. Ao completar a campanha, podemos iniciar a partir do último save antes de enfrentar o último chefe, facilitando a tarefa de descobrir os outros finais e quesito obrigatório para quem busca todas as conquistas. Fora isso, o título traz um modo semelhante ao rift de Diablo III (Multi) chamado Sanctum of Reborn, onde entramos em dungeons visitadas durante a campanha de forma aleatória com inimigos randomizados.



A ideia é matar o máximo de inimigos possível até liberar a passagem para o próximo mapa — fica a dica aqui para alternar entre o mundo dos vivos e dos mortos, pois no Beyond the Veil acessamos portais para locais isolados no mapa - ao chegar na quinta dungeon encontramos um ponto para salvar o jogo, pois aqui teremos um chefe para enfrentar iguais ao da história principal. E assim segue a ordem do modo: a cada quatro dungeons completadas, encontramos uma quinta com um save point e um boss fixo. Essa opção é perfeita para aqueles que desejarem completar os cem por cento com todos os daemons além de conseguir os melhores equipamentos para o Kagachi. 

Bancando o detetive espiritual

A trama de Oninaki é sem dúvida o ponto alto de todo o jogo. Não se engane pelos gráficos que remetem a versões de animação japonesa em miniatura, o enredo aqui confere tamanha seriedade que poderá surpreender até os jogadores mais acostumados com acontecimentos dramáticos. Apesar da baixa dificuldade, seu combate oferece bastante diversidade devido a quantidade de daemons, seus equipamentos e habilidades peculiares. Infelizmente o jogo não conta com legendas em português, um ponto crucial para ajudar em sua popularidade.



Ainda assim, ele se mantém como uma opção interessante para uma geração que carece de títulos do gênero com essa visão isométrica e representa um belo passo na carreira da Tokyo RPG Factory que caminha à passos curtos, porém, em curva ascendente na tarefa de se estabelecer como referência na indústria e resgatar os clássicos RPGs de antigamente.

Prós

  • Trama forte e original;
  • Jogabilidade diversificada através dos daemons;
  • Trilha sonora excelente em pontos específicos do enredo.

Contras

  • Baixa dificuldade com o passar do jogo;
  • Falta de legendas em português. 
Oninaki - PS4/Xbox One/PC/Switch - Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: PS4
Análise produzida com cópia digital cedida pela Square Enix
Revisão: Giba Hoffmann

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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