Discussão

Qual o futuro do embate entre Steam e Epic Games?

Vamos discutir sobre essa disputa no mundo dos jogos de computador.



Com sua grande diversidade de opções e opiniões, são poucas as unanimidades no universo dos games. Dentre os possíveis membros deste seleto grupo, certamente um deles é a plataforma Steam, com seu quase domínio do mercado dos computadores. Mas esse “quase” cada vez mais parece aumentar, sobretudo com o crescimento da concorrente Epic Games. Nesta matéria, vamos falar um pouco sobre cada uma delas e debater sobre o estado atual e do possível futuro desta disputa.

Como tudo começou

Antes do advento da internet, games de computador precisavam ser adquiridos via mídias físicas. Disquetes, CDs e DVDs foram, por um bom tempo, a forma mais comum de se obter esses produtos. Posteriormente, a chegada da rede mundial de computadores permitiu aos jogadores terem acesso a títulos de forma totalmente digital, revolucionando o mercado.

Uma das primeiras empresas que ofereceram uma forma sistemática para obter games de forma online foi a Stardock. Através do seu serviço chamado Stardock Central, lançado em 2001, ela oferecia acesso a uma plataforma digital com diversos produtos, incluindo programas, filmes, músicas e games. Foi então que, a partir de 2003, começou o grande boom de plataformas digitais. E, entre elas, estava a Steam, da produtora Valve Corporation.
Antes de ter tantos jogos, a Steam já tinha sucesso graças a jogos como Dota 2
Inicialmente, a plataforma Steam, lançada em setembro de 2003, oferecia somente jogos da própria Valve, contando com nomes de peso como Half-Life, Dota 2 e Counter Strike. Dado o sucesso da sua plataforma até o momento, em 2005 a empresa começou a negociar com outras empresas para expandir a sua biblioteca. Várias companhias começaram a aderir a Steam; em 2007, por exemplo, tivemos as produtoras Eidos Interactive, com jogos como Tomb Raider e Hitman, e Capcom, com títulos como Devil May Cry 3 e Lost Planet.
A quantidade de jogos na Steam é assustadora
A partir daí, o crescimento foi assombroso. Cada vez mais produtoras e games famosos aderiram a plataforma. Segundo dados de janeiro de 2019, a Steam tem mais de 30 mil títulos diferentes, sem contar DLCs, vídeos e outros materiais. Além de uma biblioteca impressionante, a plataforma também tem um público imenso: são mais de 90 milhões de usuários mensais, sendo que aproximadamente 47 milhões utilizam o serviço diariamente.

A todo vapor

O reinado da Steam parecia inabalável. Com sua vasta biblioteca e sistema robusto, comprar e colecionar jogos na plataforma parecia a melhor opção disponível para os jogadores. Mas apesar de ser a maior protagonista do mercado, várias concorrentes conseguiram, de uma forma ou outra, abocanhar partes interessantes do segmento de games para computador. Dois exemplos bastante interessantes são as plataformas GOG.com e Origin.
Para se manter no mercado, a GOG.com se atualizou ao longo dos anos
A primeira, inicialmente chamada de Good Old Games (ou “bons e velhos jogos”), começou em 2008 com um enfoque bastante claro. Ele consistia em proporcionar aos jogadores a oportunidade de obter games antigos, incluindo títulos mais obscuros e de difícil acesso. Dada a dificuldade de rodar estes jogos em computadores modernos, sobretudo pelas grandes mudanças que os sistemas operacionais receberam ao longo dos anos, a GOG.com não somente oportuniza a venda, mas também restaura e atualiza os programas para as tecnologias atuais.
Além do fantástico The Witcher 3: Wild Hunt (Multi), a GOG.com também conta com títulos como Warcraft e Diablo
Recentemente, a GOG.com, que pertence a CD Projekt, começou a oferecer jogos mais modernos, como BioShock (Multi) e Shovel Knight (Multi). Já a plataforma Origin chegou em 2011 como uma forma “exclusiva” da produtora Eletronic Arts, dona do sistema, trazer os seus títulos. Logo, vários títulos novos de peso como FIFA, Need for Speed e Battlefield só podem ser encontrados nessa plataforma.
A Origin chegou com muita força no mercado graças a sua biblioteca
É importante frisar que apenas “novos” títulos são exclusivos da Origin, visto que vários games anteriores a 2011 ainda estão disponíveis em outras plataformas. Basta procurar na Steam, por exemplo, por títulos como Need for Speed Undercover (Multi) e Battlefield: Bad Company 2 (Multi). Desde o começo de 2018, a Origin também começou a oferecer jogos de outras produtoras, tais como Batman: Arkham Asylum (Multi) e Lego Marvel Super Heroes (Multi), da Warner Bros. Games.
Grandes games estão disponíveis na Origin
Mesmo com esses competidores de peso, a Steam ainda parecia absoluta por trazer um pacote mais completo. Embora grandes empresas como Eletronic Arts possam até se dar ao luxo de lançarem sua própria plataforma, pois possuem um leque de grandes jogos próprios para começar e muitos recursos para financiar uma expansão, isso não parecia ser suficiente frente a já consolidada estrutura da loja da Valve.

Por outro lado, o nicho atendido pela GOG.com, embora interessante, não atinge uma grande fatia do mercado. Até porque a Steam também possui um bom número de jogos mais antigos, assim como novos. Isso sem contar o seu poderoso sistema, cheio de recursos interessantes para os jogadores. Ou seja, a Steam parecia ser inatingível. Até que surgiu uma nova plataforma no mercado, uma opção chamada Epic Games Store.

New challenger approaching

Plataforma da empresa Epic Games, ela foi lançada no fim de 2018 com um propósito claro: se tornar uma referência no mercado de jogos digitais. E desde o princípio, a Epic Games tomou um decisão importante para atrair produtoras: ao contrário da Steam, que fica com 30% do valor de cada venda, a empresa mais nova cobra apenas 12%. Uma medida impactante, sobretudo para as produtoras menores.

A companhia também é proprietária e desenvolvedora da Unreal Engine, um motor gráfico de bastante sucesso na indústria dos games. Nomes como Mortal Kombat 11 (Multi), Mass Effect (Multi), Batman: Arkham City (Multi), Borderlands 2 (Multi) e Yoshi’s Crafted World (Switch) são só alguns exemplos de jogos desenvolvidos com a Unreal Engine. E a Epic Games também faz uso desse fator para alavancar a sua plataforma.
A Unreal Engine está presente em vários títulos de peso
Ela também abre mão de uma taxa de 5% sobre as vendas dos games que vai para a dona do motor gráfico. Logo, além de incentivar a venda de jogos na sua plataforma, a Epic Games ajuda a expandir a Unreal Engine ainda mais. Além desses atrativos, certamente o título Fortnite é outro grande trunfo da empresa nesta disputa milionária.
Fortnite: líder do seu segmento e um dos maiores do mercado em geral
Tudo porque Fortnite é um sucesso absoluto de crítica e público. Estima-se que a produtora teve aproximadamente 3 bilhões de lucro em 2018, e, embora não se tenham dados percentuais da participação do game neste valor, é consenso geral que ele é o maior responsável. Afinal, o game conta com 250 milhões de jogadores e é o jogo líder no número de streamings. Com um número tão grande de fãs, a Epic Games Store acaba sendo promovida indiretamente.

Um embate épico?

Apesar de todas essas qualidades, a Epic Games Store ainda está muito atrás da Steam. Logo, creio que possíveis comparações com, por exemplo, a disputa entre a Sega e a Nintendo nos anos 90, sejam exageradas. Basta olhar para o quesito games: mesmo possuindo exclusivos interessantes, a absurda quantidade de jogos da concorrente dilui o apelo drasticamente.
Para se manter relevante, Fortnite tem atualizações e eventos constantes, incluindo até um crossover com os Vingadores
Além do já citado Fortnite, temos outros exclusivos como Tom Clancy’s The Division 2 (também disponível no Uplay, a plataforma da Ubisoft), Detroit: Become Human e Borderlands 3. Para obter essas exclusividades, a empresa faz acordos diretos com as produtoras. Esta política, entretanto, serve apenas como forma de promover a plataforma, que num futuro espera atrair jogos naturalmente.

Devido a essa discrepância nos jogos, acredito que o seu maior trunfo seja o incentivo financeiro às produtoras, que ao trazerem seus jogos para a Epic Games Store recebem uma fatia maior dos lucros. Mas este processo de transição deve ser relativamente lento, já que dificilmente jogos já à venda na Steam serão migrados para a concorrência.
Fortnite Battle Royale é a versão gratuíta do original que ampliou o público do game
Como uma forma de resposta a política da Epic Games Store, a Steam promoveu uma mudança nas divisões dos lucros: para vendas maiores de 10 milhões, o percentual da Steam cai dos 30% padrão para 25%, sendo que acima de 50 milhões ele cai para 20%. Embora interessante para as grandes produtoras, essa medida tem pouco impacto nas menores. Assim, pouco a pouco poderemos ter um “pólo” de jogos indies na Epic. Outro ponto importante é que a base instalada é muito grande na loja da Valve.

Logo, irá demorar um pouco para que os jogadores se acostumem com a ideia de trocar ou adicionar esta nova plataforma. Afinal, muitos reclamam que é mais cômodo concentrar toda a sua biblioteca em um só lugar. Creio, entretanto, que seja mais um questão de costume do que de dificuldade. Caso a Epic Games Store consiga melhorar sua estrutura e catálogo, não vejo grandes barreiras para que os jogadores utilizem ambas.
O contrato de exclusividade de Borderlands 3 com a Epic Games Store gerou algumas críticas dos jogadores que queriam o título na Steam
Isso se deve ao fato que uma das maiores críticas que se faz é a diferença no nível entre os dois sistemas. Enquanto a plataforma da Epic Games ainda trabalha para obter serviços básicos como salvamento na nuvem e carrinho de compras, a Steam vai mais além com a utilização de troféus, transmissões ao vivo, entre muitas outras vantagens. Em outras palavras, será preciso muito trabalho para que as duas estejam no mesmo nível nesse quesito.

No fim das contas, o maior indicativo que esta disputa vai continuar a se tornar mais forte está nos investimentos da Epic Games. Outro exemplo dessa política é um programa de incentivo para a produção de jogos, onde a empresa disponibilizará 100 milhões de dólares para novos títulos. Para obter a verba, basta a submissão de um projeto adequado para avaliação, sem quaisquer exigências de exclusividade.

Com isso a produtora espera difundir sua imagem no mercado, potencializando futuras parcerias. Por enquanto, a Steam não precisa se preocupar tanto: o mercado ainda é seu, tanto nos quesitos de qualidade quanto de quantidade. Mas ela precisa ficar atenta, pois as medidas a médio/longo prazo da sua concorrente logo podem começar a ter efeito, tornando a disputa mais acirrada.
Mais uma competidora no mercado
Lembrando sempre que, além dos participantes atuais desta disputa, novos desafiantes podem surgir no futuro. O serviço de chat com foco em games Discord lançou a plataforma Nitro, que oferece vários jogos para os usuários por uma taxa mensal ou anual. A poderosa Google recentemente anunciou o serviço de games por streaming Stadia, que pode revolucionar a forma com que jogamos no computador. A Apple também vai entrar na disputa com a Apple Arcade. Ou seja, este mercado está em constante atualização e pode mudar rapidamente.

O que esperar do futuro?

Mesmo que o mercado conte com outras plataformas relevantes, tal como a Origin e sua poderosa proprietária Eletronic Arts, tudo aponta para que, num futuro mais breve, tenhamos uma disputa entre principalmente duas lojas digitais. Por um lado, a Steam é soberana, contando uma biblioteca invejável e um sistema bastante completo. Por outro lado, a Epic Games está chegando forte, oferecendo alguns títulos de peso exclusivos e diversos incentivos para as produtoras aderirem a ela. Seja como for, o negócio é esperar para ver o que futuro dirá, sempre torcendo para que o maior vencedor sejam os jogadores.
Uma competição que ainda está longe de terminar
E você, leitor? Como você acha que esta disputa irá prosseguir? Teremos algum vencedor? Deixe a sua opinião.

Revisão: Diogo Mendes

é produtor de conteúdo sobre games desde 2016 e um grande fã da décima arte, embora não tenha muito tempo disponível para ela. Seus games favoritos (que formam uma longa lista) incluem: KH, Borderlands, Guitar Hero, Zelda, Crash, FIFA, CoD, Pokémon, MvC, Yu-Gi-Oh, Resident Evil, Bayonetta, Persona, Burnout e Ratchet & Clank.
Também encontra-se no Twitter @MatheusSO02 e no OpenCritic.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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