Jogamos

Análise: Left Alive (PS4/PC) é para esquecer que está vivo

Jogo, que se passa no universo de Front Mission, falha em suas mecânicas e toda a parte técnica.

Left Alive foi anunciado na Tokyo Game Show de 2017, como um spin-off da franquia Front Mission. Na sua produção, estão nomes como Toshifumi Nabeshima (diretor da série Armored Core); Yoji Shinkawa, (designer de personagens de Metal Gear Solid); e Takayuki Yanase (designer de mechas em Ghost in the Shell: Arise, Mobile Suit Gundam 00 e Xenoblade Chronicles X).


Tudo isso sob a batuta da Square Enix. Vendo todos esses fatores, dava para apostar que um jogo promissor estaria por vir. Contrariando qualquer previsão, infelizmente, o que temos é um amontoado de erros e ideias até interessantes mas executadas de forma horrenda.

Uma guerra  perdida

Como já mencionado, Left Alive se passa no mundo de Front Mission, mas não é necessário que o jogador tenha qualquer conhecimento anterior da série. A ação se passa no ano de 2127 e duas nações do Leste Europeu vivem um estado de tensão: as repúblicas de Ruthenia e Garmoniya. O ponto de maior conflito é na cidade de Novo Slava, onde se passam os principais eventos.

O exército de Garmoniya efetua um ataque surpresa, tomando a região e sem dar qualquer chance de contra ataque às tropas de Ruthenia. É no meio dessa guerra relâmpago que jogamos com três sobreviventes do conflito.

Os protagonistas são Mikhail Alexandrovich Schwarov, piloto novato de Wanzer (os mechas do jogo); Olga Sergeevna Kalinina, atualmente uma agente da polícia de Novo Slava, mas que já foi uma piloto de Wanzers por Garmoniya; e Leonid Fedorovich Ostermann, um líder rebelde que era dado como morto.



Cada capítulo o jogador usa um dos heróis para cumprir uma linha de missões. Dos três, Olga é, de longe, a personagem mais interessante, mas no geral dá para aceitar o trio. A trama varia de alguns clichês bem previsíveis para momentos até curiosos. O pessoal que conhece melhor o universo de Front Mission deve sacar alguns nomes que são citados.

O jogo até tenta se aprofundar, com documentos que podem ser coletados e explicam melhor o contexto daquele cenário. Mas os outros problemas do game acabam minando essas opções, e particularmente me fizeram pouco importar em querer saber mais. Sendo sincero, se o único ponto baixo de Left Alive fosse sua trama, eu daria glória aos céus.



Vale aqui um último comentário sobre o sistema de escolhas. Em diversos diálogos o jogo permite queo jogador escolha entre algumas alternativas de fala. Dependendo do que for decidido, itens podem ser ganhos e desfechos de histórias podem ser diferentes. É um aspecto interessante até.

Minha crítica é que essas opções costumam aparecer no meio de diálogos dublados. Porém a fala referente a escolha, e somente esta, não é pronunciada pelo protagonista, quebrando consideravelmente uma eventual imersão. Por duas vezes eu cheguei até a me confundir, achando que algum bug tinha comido alguma fala.

Um mundo quebrado

Left Alive é um jogo focado totalmente na furtividade. Independente do personagem, você sempre estará se esgueirando pelos cantos e evitando confrontos para avançar pelo cenário. E digo que, se tudo que se propôs a fazer ele fizesse bem feito, poderíamos ter um ótimo “sucessor espiritual” de Metal Gear. Infelizmente o game escorrega feio na parte mecânica.

Aliás, o que torna Left Alive ainda pior é que ele existe em um mundo pós Metal Gear Solid V. A última obra de Hideo Kojima na Konami é uma aula de gameplay e deveria servir de referência para qualquer outro jogo que pretendesse implementar mecânicas furtivas. Darei aqui dois exemplos de falhas cruciais.

A primeira é a ausência de ataques furtivos, o que para um jogo de stealth faz muita diferença. A única forma de apagar um inimigo sem fazer (muito) barulho é usando canos, pás, ou outros itens do tipo no cenário. Se estivéssemos jogando com civis, até entenderia, mas os três personagens são soldados treinados! Como não são capazes de efetuar um ataque do tipo?



Isso nos leva à segunda falha. Falta uma firmeza no processo de mirar e atirar, tornando difícil acertar os inimigos. Em contra partida, a mira deles é bem melhor e mais forte que a sua. Entendo que o jogo queira punir o jogador ao ser pego, mas já que ele me dá o recurso de armas, que me deixe usá-las de forma adequada. E novamente, falo de personagens que não tem desculpa no roteiro por não terem perícia com uma arma.

Vale aqui o comentário sobre a inteligência artificial dos inimigos, que é horripilante de tão desnivelada. Há momentos em que soldados brotam do nada e te seguem de forma implacável. Em outros, ao ter que recarregar a arma, o inimigo simplesmente vira as costas e sai correndo até um local seguro. Senti um problema também na percepção: nunca tinha certeza se um soldado iria ou não me ouvir atirando ou tomando uma ação. Para situações muito semelhantes, às vezes eles me percebiam, às vezes não.

Outro problema grave está em identificar os inimigos pelo mapa para definir uma estratégia. Para começo de conversa não há nenhum tipo de marcação que auxilie a reconhecer alvos. A única coisa que em teoria deveria ajudar é a voz da Inteligência Artificial que te acompanha, mas ela só atrapalha. Sempre que um inimigo entra no “raio de ação” do herói, o computador começa a repetir “an enemy is approaching” que traduzindo fica “o inimigo está se aproximando”.



Além da voz não parar de falar, repetindo a mensagem inúmeras vezes, o termo é usado tanto para o inimigo que vem na sua direção (ciente da sua presença ou não), como para quando você vai até ele  ou de qualquer outra forma de aproximação. Ou seja, o jogador não sabe se a mensagem é referente a um soldado que de fato é uma ameaça ou a algum outro que esteja passando no outro lado da parede.

Ainda poderia falar do sistema de criação, que têm uma vasta lista de opções, mas com poucos itens que realmente valem a pena. Ou talvez dos constantes picos desnecessários de dificuldade e desequilíbrio na distribuição de itens. Mas acredito que vocês já entenderam o tamanho desse enrosco chamado Left Alive.

Oh, não posso esquecer dos Wanzers. Em poucos momentos podemos pilotar os mechas mas a decepção permanece a mesma. A câmera não ajuda e a falta de uma interface decente para saber o status do robô faz falta.


Já vi isso antes, não?

No quesito gráfico, Left Alive seria um bom jogo de PlayStation 3 ou de lançamento do PS4, no máximo. Texturas que demoram para carregar são algo bem rotineiro no game. Os cenários em si também não tem muita inspiração. A única parte que salva é a arte do Yoji Shinkawa.

Boa parte da ação se passa em um mesmo espaço físico, a cidade de Novo Slava, e eu até gosto desse conceito de trabalhar o mesmo espaço por diferentes ângulos. Não veria problemas em usar novamente os mesmos cenários, desde que houvesse contexto para isso. De certa forma até existe, mas os desenvolvedores poderiam ter caprichado mais no level design, com mais rotas alternativas ou mais pontos de interesse. Alguns pontos parecem só repetições simplórias — esgotos da cidade, estou olhando para vocês.

Merecemos ser salvos?

Durante os capítulos, além da missão principal, surgem objetivos paralelos que consistem em localizar sobreviventes e guiá-los para o bunker mais próximo. No papel, ideia interessante. Na prática, uma fonte infinita de dor de cabeça. Isso porque os NPCs possuem uma rota definida, que geralmente passa pelas vistas de algum inimigo.

O que implica em ter que entrar em combate, e acho que por tudo que falei você não quer isso. O ruim é que não é possível fazer o refugiado nos seguir, ele sempre vai seguir a mesma rota. No máximo podemos ordenar quando ele deve andar ou não. Mas em resumo, algo que poderia agregar mais é um adicional que é melhor ser ignorado.

Deixados para morrer

Digo com tranquilidade que Left Alive era um dos jogos que eu tinha grande expectativa para 2019. Com vários grandes nomes envolvidos e trazendo de volta um universo que estava de lado já há algum tempo, tudo indicava que poderíamos ter algo memorável. Porém o resultado é uma sequência de falhas e tropeços, especialmente na parte técnica.

Um gameplay chato e quebrado, com picos desnecessários de dificuldade e falta de um balanceamento melhor no design são erros críticos. Adicione a isso uma inteligência artificial falha e um level design que deixa a desejar. Em resumo, passe longe desse título. A melhor coisa a fazer é deixá-lo descansar em paz.

Prós

  • Design de personagens.

Contras

  • Carregamento de texturas;
  • Dificuldade desnivelada e muitas vezes exagerada;
  • Mecânicas furtivas não são fluidas;
  • Falta de precisão ao atirar;
  • Missões secundárias;
  • “An enemy is aproaching”.
Left Alive — PS4/PC — Nota: 4.0
Plataforma usada para análise: PlayStation 4

Revisão: Raphael Barbosa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Square Enix


Formado em Game Design, desistente da Matemática Aplicada e atualmente cursando Jornalismo. Ainda aguardo o retorno triufal da Sega, fã de Metal Gear, Dark Souls e várias coisas vindas lá do Japão.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google