Editorial: sobre clickbait e sensacionalismo em jornalismo de games

Abordamos um assunto que gerou certa polêmica semana passada.



Semana passada, eu publiquei uma notícia sobre como um diretor da THQ Nordic, Reinhard Pollice, expressou decepção sobre o hardware do Nintendo Switch. Parecia ser apenas uma notícia corriqueira, pois pessoas da indústria reclamando dos consoles pouco poderosos da Nintendo não é exatamente novidade. E, sejamos sinceros, nenhuma empresa tem obrigação em fornecer suporte a qualquer maluquice que a Nintendo invente — podemos achar que uma delas está equivocada e perdendo dinheiro, mas com certeza foi uma decisão feita considerando todo o planejamento financeiro da corporação.

Eis minha surpresa quando, poucas horas depois, os comentários da notícia explodiram. No momento em que escrevo, ela conta com 196 comentários, uma quantidade sinceramente impressionante para algo relativamente pequeno assim. A maioria dos comentários estão dentro do esperado: alguns criticam a THQ Nordic por ter poucos jogos ou ser "preguiçosa", outros concordam com o ponto de que a Nintendo vive em um mundo próprio.

O que eu não esperava eram comentários criticando a integridade da notícia em si. Descobri isso quando nosso editor-chefe, Sérgio Estrella, mandou uma mensagem avisando de que tínhamos sido acusados de clickbait por aquela notícia. Não acreditei que poderia ser uma acusação séria — o título, "THQ Nordic está decepcionada com o poder do Switch" é exatamente o que a notícia descreve. Sérgio, então, me mostrou uma captura de tela contendo comentários em um grupo do Facebook, no qual a notícia foi compartilhada, fazendo a acusação e atacando a integridade do Nintendo Blast. Segundo ele, o próprio administrador do grupo, que compartilhou a notícia, instigou um ataque contra nós.

Afinal, o que é clickbait? É a arte de criar manchetes misteriosas para notícias que instigam um leitor a clicar para saber o que de fato é a notícia. Geralmente, elas contêm palavras-chave importantes para chamar a atenção de quem está casualmente lendo o Facebook ou o Twitter, mas omite a verdadeira notícia. Veja um exemplo recente, de uma outra publicação:


A notícia verdadeira é simples: Daniel Craig considera reprisar o papel de James Bond. Trocando "Daniel Craig" por "Ator" e colocando a imagem de dois outros ex-Bond na capa, a publicação busca fazer o leitor clicar na notícia para saber qual desses atores voltará a fazer o papel. Para a publicação, eu presumo, dizer que o Bond atual continuará sendo o Bond não é interessante o suficiente e, desta forma, o leitor pode vir a acreditar que um Bond clássico retornará às telas.

Compare com a nossa chamada para a notícia sobre o comentário da THQ Nordic:


OK, "golpe" pode ser um pouco forte, mas o restante da chamada é bastante clara: uma empresa third-party está decepcionada com o hardware do Switch. Alguém pode vir a dizer que "decepcionada" é incorreto, porque a fonte original nunca usa tal palavra, mas igualmente posso dizer que "estar um pouco triste" é uma maneira educada de demonstrar decepção.

Como adendo, devo deixar claro que o Blast pode ter publicado outras notícias que chegam mais próximo de um verdadeiro clickbait. Em vários desses casos, pode ter sido um erro inocente — às vezes, é incrivelmente difícil elaborar um título claro para uma notícia. Podemos discutir sobre cada caso individualmente; este texto é especificamente sobre o da THQ Nordic.

O comentário que mais me afetou, no entanto, foi o que citou um site em espanhol, Nintenderos, fazendo três alegações: primeiro, que o Nintenderos foi a fonte original da notícia (não foi); segundo, que eu (representando o Nintendo Blast) desaprendi a traduzir (leio inglês perfeitamente bem); terceiro, que nós "adulteramos" a matéria do Nintenderos para dar à notícia um viés negativo ou "anti-Nintendo", gerando então o tal clickbait (que não há).

As três alegações beiram ao absurdo. Na notícia, citei o gamesindustry.biz, que é indubitavelmente a fonte original da notícia, pois é a reportagem que contém a entrevista original com Pollice. O Nintenderos ter veiculado a mesma notícia de maneira similar não é apenas uma coincidência, é um fato quase inevitável: sites dedicados à Nintendo publicam notícias relacionadas à Nintendo. Curiosamente, o Nintenderos complementou a notícia de maneira similar, citando alguns jogos da THQ Nordic, mas novamente isso não é surpreendente.

O principal motivo da alegação é mostrar como o Nintenderos publicou a notícia com um viés positivo, dizendo que a "THQ Nordic espera suportar o Switch em tudo que for possível", que também não é uma interpretação errada. Pollice afirma que a equipe sempre "procura onde for possível" apoiar o Switch (na notícia original, eu traduzi esse trecho um pouco diferente, mas o significado geral é o mesmo). Em seguida, ele diz que está triste com o poder do Switch, que é a frase que baseou a minha manchete.

Eu optei pela frase mais negativa porque parece representar melhor o sentimento geral da entrevista. No parágrafo da matéria original anterior às duas frases citadas acima (que não foi traduzido nem no Nintendo Blast, nem no Nintenderos), Pollice afirma que Battle Chasers "tem sido um desafio para rodar bem no Switch" e Elex "demanda demais atualmente". Isso apenas corrobora o fato de que a equipe da THQ Nordic gostaria de ter visto um console mais poderoso e, ao meu ver, torna a minha manchete mais realista que a do Nintenderos.

Achar que um redator do Nintendo Blast "adulterou" uma notícia para ser negativa é, no mínimo, má vontade. Escrevemos para o Blast porque curtimos os consoles e os jogos da Nintendo, e cada um de nós deseja que o Switch obtenha o maior sucesso possível. Ao mesmo tempo, não podemos nos iludir com esperanças exageradas ou demandar que empresas apoiem a Nintendo sem argumentos embasados.

Naturalmente, sendo clickbait ou não, a notícia teve o efeito viral ao ser compartilhada por pessoas criticando nosso trabalho. Chega a ser um pouco irônico. Mas, disso tudo, surge algo positivo. Aos leitores que chegaram ao Blast através de um link compartilhado com a acusação de clickbait: sejam bem-vindos e confiram nossas outras matérias.

Revisão: Ana Krishna Peixoto
Colaboração: Equipe GameBlast


Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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