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Análise: Full Throttle Remastered (Multi) traz uma breve e estilosa jornada

A versão atualizada do clássico da LucasArts traz melhorias e funcionalidades.

Eu me lembro muito bem de ficar olhando meu irmão jogar Full Throttle. Se estávamos em 1995, 1996 ou 1997, não sei. A memória já não vai ser capaz de lembrar detalhes menos importantes. Mas ela me mostra, com exatidão, que eu ficava maravilhado, mesmo sem entender parte do que estava acontecendo pela limitação da língua. De qualquer forma, um quadro geral do enredo sempre ficou na minha cabeça, e eu permaneci lembrando com clareza a resolução dos puzzles.


Como o Full Throttle não era nosso, só ele jogou. Os outros títulos do gênero, no entanto, eu também experimentava, e fiquei tão fã do negócio que quem ganhou o Grim Fandango uns anos depois fui eu e não ele. Boa época. Nunca joguei Full Throttle entre aqueles anos e o lançamento de sua versão remasterizada.


Eu tenho gostado bastante das adições e dos “bônus” que geralmente vêm com essas remasterizações dos jogos da antiga LucasArts nos quais Tim Schaffer trabalhou. Poder jogar com os comentários é um exercício bem bacana para quem já terminou o jogo. Outro ponto bem interessante é a transformação para o formato widescreen.

O mais bacana, porém, é poder alternar entre o visual original e o remasterizado. Isso se dá com um simples toque, e é um ótimo exercício para ver como nossa memória prega peças na gente, além de, também, dar-nos a oportunidade de jogar como quiser. A versão original ainda é competente, mas, já que a remasterizada está à disposição, vale a pena seguir com ela.
Versão original.

Por fim, há ainda um botão responsável por mostrar na tela quais são os pontos de interação. Vejam, existe algo relacionado aos antigos adventures e que frequentemente é considerado, com acerto ao meu ver, um problema de design: o pixel hunting. Com gráficos não tão nítidos como os possíveis hoje em dia, por vezes os jogadores ficavam passando o mouse em tudo para ver o que era passível de interação. De um ponto de vista ideal, o jogador deveria compreender o cenário e a partir daí buscar esses pontos de interesse.

Alguns jogos deram essa solução para o problema (deixar claro quais são os pontos de interação), mas hoje isso é melhor contornado através de outras construções visuais ou mesmo propostas de mecânica. De qualquer forma, é bom ver que está presente em Full Throttle Remastered.
Versão remasterizada, quando acionamos o botão para evidenciar os pontos de interação.

Ainda sobre questões dessa nova versão, a adaptação ao controle é bem competente, fazendo com que seja fácil navegar pela “roda de ação” do Ben, assim como interagir nas outras situações do jogo. Falando no menu de interação do jogo, Full Throttle é um dos últimos adventures daquela era e já flertava bastante com a transição ao 3D (que nunca ocorreu de fato), propondo-se a trazer situações novas e diferentes para um gênero que já tinha muitos anos e o qual havia tido sua última revolução formal há mais de dez anos.

Os adventures eram um gênero já antigo, e pouco havia mudado na forma de se jogá-los desde, basicamente, o primeiro King’s Quest (1983). Existem bons vídeos e textos que fazem essa discussão sobre o gênero e suas mudanças (e em como a transição ao 3D não trouxe mudanças estruturais importantes).

De qualquer forma, Full Throttle buscava novas formas de interação além de seus puzzles, bem como simplificou o menu de verbos que encontrávamos em jogos como Day of the Tentacle. A novidade em suas mecânicas veio com os confrontos sobre motos, que lembram o saudoso Road Rash.

Neles devemos espancar adversários em suas motos, para então conseguir a sua arma. É um ciclo dentro do título no qual devemos travar esses combates para ter acesso aos itens que vão nos fazer progredir no puzzle do momento. É um momento bem interessante que casa bem com a temática do jogo; por mais que não seja lá tão fluído, consegue quebrar um pouco o ritmo do point-and-click.

O ritmo dos puzzles de Full Throttle é bem dinâmico. Não se trata de um título longo, sendo possível terminá-lo em um único período do dia. Mas, para além disso, Full Throttle consegue parecer rápido. Nosso objetivo a longo prazo é estabelecido logo após o “prólogo” do jogo, e o título consegue sinalizar muito bem quais são nossas missões de curto prazo. Você nunca fica perdido, e isso é importante para que os puzzles façam mais sentido e para que o enredo esteja sempre presente.


O título escorrega um pouco, porém, na sinalização desses puzzles, na forma como ele deixa dicas para o jogador. Em alguns momentos a situação é um tanto trivial, e em outros a resolução é indicada de forma sutil até demais. Mas, no geral, o título consegue balancear bem seus puzzles. Também o faz já que em dois de seus principais ciclos nos são dados objetivos múltiplos para resolver um problema. Isso dá a possibilidade do jogador não precisar ficar empacado em um momento sem mais nada para fazer no jogo.

Talvez o melhor ponto de Full Throttle seja como ele dá respostas para o jogador. A forma como ele vai te dando um retorno sobre as tentativas de resolver algo e como deixa claro o porquê de algo não ser a solução para o momento. As situações também fazem sentido dentro da lógica interna daquele mundo e a posição de seus personagens.


Controlamos Ben, o líder dos Polecats, uma gangue de motoqueiros em um Estados Unidos futurista e levemente distópico. Ele acaba ficando no meio de uma briga entre dois sócios da única empresa que ainda fabrica motos. O jogo deixa bem claro que o conflito é entre a paixão do fundador e a racionalidade de seu sócio, que está sempre em busca de um lucro maior. Desse embate surgem as situações que vão fazer Ben realizar essa jornada pelas estradas para chegar até o encontro dos acionistas da empresa e desmascarar o grande vilão da história.

Full Throttle constrói um interior bem interessante, com seus tipos povoando pequenas cidades e bares. Aqui não há um grupo muito grande de personagens como em outros títulos do gênero. Aliás, existem poucos lugares que vamos encontrar. Full Throttle não se constrói por um grande número de interações e um desenvolvimento longo de história e personagens: ele é muito mais sucinto.


Os personagens que existem também não são muito desenvolvidos, havendo um número surpreendentemente pequeno de interações e diálogos mesmo com os mais importantes deles. Talvez o jogo seja realmente uma jornada seca e rápida de Ben, apenas alguns dias na vida de um cara casca grossa em um mundo não tão feliz assim.

E aí que volta a memória. Eu me decepcionei tanto com os puzzles quanto com o enredo de Full Throttle e seus personagens. O jogo não é desagradável ou ruim em momento algum e traz sua dose de novidades e propostas para o gênero, mas não é possível colocá-lo no mesmo patamar de Grim Fandango, Day of the Tentacle, Monkey’s Island 2 e tantos outros mais recentes, como Machinarium, Samorost 3, Firewatch e Life is Strange.


Não há nada em sua trama ou seus diálogos que me tenha sido muito memorável neste segundo encontro e poucos puzzles que tenham se destacado para mim. Mas Full Throttle ainda é uma das principais peças dessa história, e foi bem interessante retornar a ele depois de tanto tempo.

Prós

  • Bom trabalho de remasterização e adaptação ao widescreen;
  • Alternância fácil entre a versão original e a remasterizada;
  • Ambientação interessante e estilosa.

Contras

  • Enredo e personagens apresentados e desenvolvidos de forma seca e rápida.
Full Throttle Remastered - PS4/PC/PS Vita - Nota: 7.5
Plataforma utilizada para a análise: PS4
Revisão: Bruno Alves

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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