Analógico

Não perca nem um segundo e saiba mais sobre viagens no tempo no mundo dos games

A ideia de poder mudar o passado, alterar o futuro e manipular o destino da história sempre fascinou a mente humana. Quem não gostaria de... (por Unknown em 21/06/2013, via GameBlast)


A ideia de poder mudar o passado, alterar o futuro e manipular o destino da história sempre fascinou a mente humana. Quem não gostaria de corrigir um erro, ter feito algo diferente e ser capaz de mudar sua vida completamente? O assunto gera muitas discussões e diversas teorias (das mais simples às mais bizarras). Será que o tempo é imutável ou ele pode ser modificado? E se for possível mudar o passado, quais seriam as consequências de tais alterações no futuro ou, será mesmo que o futuro seria alterado? Essas e muitas outras perguntas já tentaram ser respondidas por muitas mentes sedentas de conhecimento e imaginação, mas o universo dos games talvez tenha sido um dos territórios onde essa ideia tão fantástica mais floresceu e conseguiu criar as teorias e situações mais interessantes (além de provocar uma grande dor de cabeça para compreendê-las).

O tempo é senhor de tudo

Bem, para começar, deixamos claro que nesse texto não iremos abordar o aspecto prático muito menos científico da viagem no tempo. Existem conceitos físicos e matemáticos muito complexos por trás da ideia portanto, vamos apenas explicar e discutir mais sobre o desenvolvimento desses conceitos da forma que são abordados no mundo da ficção científica. E, quando se fala em ficção, a primeira referência à viagem no tempo vem de um dos mais ilustres escritores desse gênero literário que floresceu no século XX: H. G. Wells. Na sua obra clássica, “A máquina do tempo” um cientista constrói uma máquina fantástica que lhe permite voltar ao passado e ir para o futuro. O livro rendeu grandes ideias para as futuras gerações, além de duas adaptações para o cinema muito interessantes. Daí em diante, o conceito foi utilizado e explorado ao máximo por diversos ramos da cultura, passando da literatura às telas de cinema em “De volta para o futuro” e até figurando em séries como Doctor Who, Lost e Heroes.

Apenas se concentrando, o nerd Hiro Nakamura é capaz de manipular o tempo e espaço e, até se teletransportar para o meio de Nova York
Mas afinal de contas, por que esse tema fascina tanto as mentes inquietas? O que tem de tão interessante em poder viajar no tempo? De certa forma, a razão pelo gosto da psique humana em imaginar tal possibilidade talvez venha de uma das consequências diretas de se ter a capacidade de viajar no tempo: a sensação de onipotência (e a consequência onisciência e onipresença). Ao controlar e manipular o tempo ao nosso favor, poderíamos ser capazes de controlar nosso próprio destino, o de outras pessoas, do mundo e, quiçá, do universo inteiro. A sensação de poder é tão grande que a ficção científica não cansa de dar exemplos para demonstrar que tal poder é demais para pobres mortais. Normalmente, uma vez que o personagem possui tal habilidade, algo terrível acontece, e ele acaba provocando mais problemas do que consertando aqueles que desejava consertar desde o começo. Exemplos de futuros apocalípticos, realidades paralelas bizarras ou paradoxos improváveis são apenas alguns dos efeitos colaterais ocasionados pela viagem no tempo praticada sem moderação.

Na franquia "O Exterminador do Futuro", uma máquina assassina é enviada do futuro para o passado para eliminar um líder da resistência ainda jovem e garantir a vitória dos robôs. Olha o paradoxo aí gente!
 Além de ser explorada em filmes e séries, a viagem está muito presente no mundo dos games. Certamente, um dos exemplos clássicos que vem à cabeça de muitos jogadores ao se falar desse assunto é Ocarina of Time. O título que já recebeu o mérito de ser um dos melhores (se não o melhor) jogos de todos os tempos abusou das ideias da viagem no tempo através dos deslocamentos temporais do herói Link utilizando a lendária Ocarina of Time. No entanto, além dos outros jogos da franquia de Zelda que exploraram o tema, temos outros exemplos, como as infinitas linhas de tempo e universos de Bioshock Infinite e até mesmo o poder de viajar no tempo que possui o vilão principal da série Kingdom Hearts,  Xehanort, tornando-o capaz de alterar os eventos no passado para que seus planos diabólicos se tornem realidade.

Link e Xenahort: detentores de poderes extraordinários para viajar no tempo, eles podem modificar seus destinos, mas vão encarar as boas e más consequências disso

 Uma ideia, várias perspectivas

 Tamanha é a complexidade dos assuntos sobre a viagem no tempo, que a ficção costuma organizar as diversas ideias em três grandes teorias. Importante notar que apesar de cada uma abordar o assunto de maneira diferente, todas elas podem interagir entre si, sendo que em um cenário hipotético da ficção, o tempo pode agir de acordo com uma ideia e, de repente, simplesmente começar a funcionar seguindo outra teoria. Assim sendo, a seguir apresentamos as três principais teorias da ficção para a viagem no tempo, além de exemplos delas em games:
CUIDADO: O texto a seguir contém spoilers para quem não jogou Ocarina of Time, Skyward Sword, Okami ou Bioshock Infinite. Leia por sua conta e risco!
Linha de tempo fixa: Nessa teoria, a viagem no tempo não tem muito sentido. Na verdade, ela apenas serve para vislumbrar o passado ou o futuro ou ainda, para garantir a consistência da linha temporal. Tudo porque, no caso de uma linha de tempo fixa, qualquer acontecimento do passado, presente ou futuro já é pré-determinado, ou seja, já aconteceu, acontece ou vai acontecer, tornando a linha de tempo imutável e o destino estático. Em Okami, logo no início da aventura, o jogador conhece a lenda sobre a derrota do terrível Orochi que foi vencido pelo herói chamado Nagi e um lobo branco misterioso. Anos mais tarde, quando um novo mal volta a assombrar a terra do sol nascente, Amaterasu renasce na forma de um lobo branco e, um pouco mais tarde, a deusa reencarnada volta ao passado para descobrir que havia sido a mesma encarnação dela que derrotou Orochi e renasceu no  futuro. Essa abordagem da viagem no tempo não agrada muitas pessoas, pois ela exclui quase completamente o livre-arbítio dos indivíduos ao colocar os seres em um universo com acontecimentos pré-estabelecidos e ordenados. Por outro lado, nessa teoria qualquer tipo de ação e reação fazem sentido entre si e evita-se, assim, a ocorrência de paradoxos temporais.

Quem diria que a deusa Amaterasu reencarnada em um lobo branco é a mesma do passado e do presente?

Linha de tempo dinâmica: Nessa situação a viagem no tempo para o passado provoca mudança drásticas no futuro. Qualquer alteração provocada no passado não cria outra linha de tempo, mas muda a linha de tempo original do viajante. Ocarina of Time é um bom exemplo disso. Cada ação de Link no passado provoca alterações no futuro, como no caso em que nosso herói volta ao passado para drenar a água do poço em Kakariko Village, obtendo a Lens of Truth e, podendo assim, explorar o Shadow Temple no futuro. A história de Skyward Sword e Majora’s Mask contém mais exemplos dessa teoria. No primeiro título, Zelda viaja ao passado e sela seu espírito e corpo no Sealed Temple para garantir que o selo que prendia o terrível Demise resistiria por anos. Séculos mais tarde, Link a reencontra no mesmo local, presa em seu próprio selo. Já no segundo game, cada ação de Link durante os três dias antes de a lua cair contra Termina são preservadas ao retornar ao passado.

As ações no passado de Zelda, em Skyward Sword e de Link, em Majora's Mask, provocam grandes alterações no futuro

O problema desse tipo de teoria é que ela cria muitos paradoxos. E, se você tem alguma dúvida sobre afinal de contas, o que é um paradoxo temporal, lembre-se sempre do exemplo clássico do “Paradoxo do Avô”. Imagine um rapaz que viaja ao passado e mata seu avô. Imaginando que exista apenas uma linha de tempo, ao fazer isso seu próprio pai não nasceria e ele também, por consequência, não existiria. Mas se o jovem nunca existiu de fato, como ele pode voltar ao passado e matar seu próprio avô? Realmente não dá pra imaginar porque alguém iria matar o próprio avô e apagaria sua existência mas esse é um bom exemplo de como um paradoxo pode arruinar uma história, o tempo e até o próprio universo. Nesse caso, imagine como Link poderia ter aprendido a Song of Storms quando no futuro, o tocador lhe conta sobre um garotinho que, há anos atrás, tocou uma música estranha que fez chover e, depois de aprender a canção, o herói volta no tempo e toca a melodia para que o homem a aprenda para lhe ensinar no futuro? Confuso, não é?

Uma canção muito paradoxal
Multiversos: Essa teoria utiliza outro ideia da viagem no tempo, os universos paralelos. Nesse contexto, nosso universo seria apenas um dentre os muitos que existem (ou podem existir, ou ainda, que existirão). Assim, ao viajar no tempo, independentemente de ir para o passado ou para o futuro, o viajante iria para outro universo, com outra linha temporal. Nessa nova realidade, muitas coisas podem ser diferentes e algumas podem ser iguais (constantes e variáveis). Qualquer alteração temporal nesse universo provocaria uma nova brecha temporal, ou seja, criaria outro universo (sendo assim, qualquer ação, por menor que fosse, criaria outro universo, onde o processo se repetiria, gerando uma reação em cadeia). Em Bioshock infinite, é exatamente isso que acontece. As tears que cercam Columbia são buracos temporais para outros universos. Podendo manipulá-las, Elizabeth é capaz de ir para outras realidades.

Mesmo com poderes limitados, Elizabeth pode abir portais para outros universos, tanto no passado quanto no futuro
A jovem não sofre qualquer efeito ao fazê-lo, porém qualquer outra pessoa começa a sofrer sangramentos nasais e a ficar confusa. Isso acontece porque a mente do indivíduo começa a entrar em conflito com as memórias dele mesmo, só que nesse outro universo. É aquela velha história de “dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar”, ou seja, as memórias começam a colidir e a mente automaticamente começa a criar novas memórias para se adaptar a essa nova realidade. A teoria dos multiversos é tão complexa que, logo no final do jogo, podemos ver o mar de portas, no caso os inúmeros faróis que simbolizam cada um universo diferente.

Infinitas portas, infinitos mundo. Só nos resta escolher
Um problema de termos tantas possibilidades é que, muitas vezes ao se atravessar tantos universos fica impossível retornar ao universo original e, nunca se sabe quando uma pequena alteração pode afetar um ou mais universos ou acabar criando mais outras realidades.São tantos universos possíveis, que o tempo acaba se parecendo mais com um oceano repleto de infinitas possibilidades, do que um rio com bifurcações para o passado e o futuro de outras realidades. Ou seja, o tempo se torna uma entidade estática, onde tudo acontece ao mesmo tempo, sem distinção de passado, presente ou futuro. Mas, em caso de dúvidas sobre tantas realidades, lembre-se sempre das palavras sábias de Rosalind Lutece sobre uma simples moeda: “A mesma moeda, diferentes perspectivas”.

Pois é. As linhas de tempo de Bioshock Infinite são realmente confusas

A questão não é "o que" mas sim "quando"

 É interessante perceber que além dessas grandes teorias acerca da viagem no tempo, a ideia de manipular o tempo é obtida através de diferentes artefatos nos filmes, séries e games. Na maioria das vezes, o deslocamento temporal é permitido através de uma máquina, artefato ou instrumento fantástico (no caso de “O Exterminador do Futuro”, “De volta para o Futuro”, ou “Ocarina of Time). Já em outros casos, uma única pessoa é detentora de um poder capaz de manipular o tempo (o nerd japônes Hiro em “Heroes” ou a carismática “Elizabeth” de Bioshock Infinite são exemplos disso). A viagem no tempo também ainda pode ocorrer por causa de algum evento bizarro ou acontecimento extraordinário (nesse caso a viagem temporal confusa que acontecia na ilha de “Lost” e as misteriosas Tears espalhadas pela cidade Columbia em Infinite servem como exemplos).

A Ocarina of Time e as Tears: instrumentos de viagem temporal inusitados da ficção
Com tantas ideias e teorias, realmente não dá pra imaginar qual seria a mais certa ou precisa sobre a viagem no tempo. E, como o assunto está sendo abordado sob o olhar da ficção, podemos imaginar que todas, uma ou nenhuma está correta. Mas, o importante é saber que, apesar de toda a confusão, alterações, universos e paradoxos que a viagem temporal pode causar, o Guia do Mochileiro das Galáxias nos avisa que, o maior problema da viagem no tempo é a gramática, pois conjugar as frases se torna quase impraticável. Apesar disso, se aderirmos à teoria das múltiplas realidades dos “irmãos” Lutece de Bioshock Infinite, ao percebermos o tempo como ele realmente é, ou seja, uma linha onde passado, presente e futuro acontecem ao mesmo tempo, qual seria a razão para os gramáticos trabalharem? Então, provavelmente, você, leitor, já leu irá ler esse texto que será havia sido escrito. Ou algo parecido com isso.

"Viveu, vive, viverá. Morreu, morre, morrerá." Na concepção de tempo dos "irmãos" Lutece, isso tudo já aconteceu, acontece, acontecerá

 Capa: Vitor Nascimento
Revisâo: Samuel Coelho



Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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