Até onde for preciso
Até onde uma mãe iria para salvar o seu filho? Em Death Howl, a resposta é simples, mas poderosa: até as perigosas entranhas do mundo espiritual, quantas vezes fosse preciso, até que o objetivo fosse alcançado.
Por isso, aqui, controlamos a caçadora Ro. Atormentada pelo luto por seu amado filho Olvi e guiada pelas vozes de outro mundo que ecoam em sua cabeça, ela toma uma decisão arriscada: transcender ao reino dos espíritos para trazer o seu primogênito de volta dos braços da morte.
É assim que a protagonista chega à mítica Floresta das Sombras Vivantes, e, pouco a pouco, descobre um mundo espiritual antigo, repleto de histórias e memórias suprimidas à espera de uma improvável redenção. Preparado para embarcar com ela nessa jornada?
Soulslike, não roguelike
Na prática, Death Howl é um jogo de construção de baralhos com foco na narrativa. Ao longo da campanha — que envolve visitar quatro reinos, totalizando mais de uma dezena de regiões distintas entre obrigatórias e opcionais —, acompanhamos a jornada de Ro em busca de seu filho Olvi, adentrando o plano espiritual e enfrentando criaturas míticas de crescente periculosidade.
Evocando o processo de luto materno, toda a ambientação do jogo é caracterizada por uma distinta sensação de melancolia. Curiosamente, durante a exploração, quase não há elementos de interface na tela, o que favorece a impressão de estarmos nos aventurando pelo completo desconhecido, guiados somente pelo propósito do amor entre mãe e filho.
E, seguindo na contramão das tendências recentes dos deckbuilders, Death Howl não é um roguelike — ou seja, não espere ver aqui mapas ou inimigos gerados aleatoriamente a cada partida. Na verdade, os próprios desenvolvedores definem o game como um “soulslike deckbuilder”: uma proposta ousada e, até onde sei, bastante original — honestamente, não me lembro de outro game que tenha se disposto a unir construção de baralhos com mecânicas popularizadas pela série Dark Souls.
O mais legal, no entanto, é que a combinação funciona: Death Howl se destaca por apresentar oponentes e combates de grande nível de dificuldade e localização fixa no mapa. Com vidas ilimitadas, falhar é parte crucial do processo de aprendizado sobre como usar bem o baralho à disposição, enquanto triunfar rende recursos valiosos para construir novas cartas, ainda mais poderosas que as iniciais.
Por fim, os locais mágicos conhecidos como bosques sagrados funcionam como as fogueiras da franquia Dark Souls, podendo ser usados tanto para viagem rápida quanto para recuperar completamente a vida da protagonista. A única ressalva? Todos os inimigos são ressuscitados quando você se cura, garantindo que o nível de desafio se mantenha elevado durante toda a jornada.
A arte da guerra
O combate de Death Howl se dá por meio de turnos, com cartas de golpes e movimentos precisando de mana para serem jogadas. Como o recurso mágico é escasso — mas renovável a cada turno —, é necessário bastante estratégia para poder sair com a vitória nos vários encontros pelo mapa.
Um deck pode conter até 20 cartas, e há muitas possibilidades de personalização para quem gosta desse recurso em deckbuilders — é possível até salvar baralhos diferentes e alternar entre eles rapidamente antes de algum combate. Outro ponto bem interessante é que as cartas são divididas entre reinos, fazendo com que seja necessário explorar (e completar eventuais sidequests) para ter acesso a ferramentas mais poderosas.
Já as arenas seguem o padrão grid de linhas e colunas, que me lembrou bastante um dos meus jogos favoritos de todos os tempos: Into the Breach. Felizmente, há bastante variedade de inimigos, e confesso que aprender como enfrentar todos eles (principalmente os chefes) de maneira efetiva se provou um desafio bastante interessante para o fã de estratégia em turnos que sou.
Logo, devo dizer que Death Howl se prova uma experiência bastante sólida e cativante naquilo que propõe. O único problema que enxergo é que talvez o seu nível relativamente alto de dificuldade possa afastar jogadores mais casuais. Do mesmo modo, quem prefere combater sucessivamente em vez de ficar explorando pode achar o desenrolar do game um pouco arrastado, mas não fiquei com essa impressão no fim das contas.
Porém, sou do time que defende que soulslikes (todos eles) se beneficiariam de opções avançadas de dificuldade. É o caso aqui, apesar da sensação de progressão ser bem estabelecida — além da construção de cartas mais eficazes, recursos como Totens equipáveis fornecem melhorias permanentes para a protagonista e tendem a facilitar um pouco a missão ao longo do gameplay. Tendo paciência e estratégia, portanto, dá para cumprir a tarefa de encontrar Olvi e trazer finalmente paz ao coração de Ro.
A beleza na tristeza
Esteticamente falando, Death Howl também se destaca positivamente. A pixel-art empregada é bastante detalhada e a já citada ambientação é um espetáculo à parte, principalmente no que tange à sensação de melancolia, característica inegociável de histórias que têm o processo de luto como força motriz.
Efeitos de distorção e transições suaves marcadas pelo esmaecimento completam o pacote visual e ajudam a reforçar a constante impressão de estarmos explorando um mundo mágico. A temática indígena também se prova bem-vinda ao fugir do lugar-comum quando o objetivo final é explorar a relação com ancestralidades e planos superiores.
Por fim, a aventura está localizada em português brasileiro — facilitando a compreensão das cartas e seus efeitos — e não foram encontrados nem bugs, nem crashes durante o período de análise, o que denota uma experiência bastante polida já no lançamento. Tudo isso firma Death Howl como uma jornada facilmente recomendável para quem se sente atraído por sua proposta.
Uma jornada pela vida após a morte que vale a pena experimentar
Ao unir elementos de gêneros aparentemente muito distintos e focar na narrativa como fio condutor para a jornada, Death Howl se prova um deckbuilder tão original quanto cativante. Embora sua dificuldade elevada possa assustar no início, com paciência e estratégia vale a pena adentrar esta melancólica jornada pela vida após a morte e constatar o poder do amor materno. Recomendado.
Prós
- O emprego de mecânicas características de soulslikes, como encontros fixos no mapa e inimigos que ressuscitam quando o protagonista se cura, é um grande diferencial do game e proporciona ar fresco a um gênero normalmente associado à progressão roguelike;
- A boa variedade de cartas e a opção de salvar diferentes baralhos personalizados vão agradar os jogadores que gostam de construir e experimentar diferentes decks;
- O combate em grids é divertido e lembra clássicos modernos do gênero, como Into the Breach;
- Estética e ambientação ímpares, que conseguem transmitir com rara perfeição as sensações de tristeza e melancolia características do luto;
- Localizado em português brasileiro.
Contras
- Tendo em vista o nível de desafio relativamente elevado, poderia contar com opções de dificuldade para acomodar quem prefere uma experiência mais suave nos combates;
- Graças ao foco na narrativa, o ritmo pode parecer um pouco arrastado para quem prefere ação em vez de exploração.
Death Howl — PC — Nota: 8.5
Revisão: Johnnie Brian
Análise produzida com cópia digital cedida pela 11 bit studios













