Análise: Zexion é um metroidvania “raiz”, exemplar em fazer uso da longa bagagem do gênero

A dificuldade é elevada, mas as muitas opções de assistência permitem ajustar a experiência às necessidades de cada um.

em 22/12/2025

Em certos meios, é a divulgação boca a boca que conta. O trabalho do crítico é representativo dessa visão — afinal, é o que fazemos nas análises: divulgação —, mas às vezes também é assim que uma obra primeiro chega aos nossos ouvidos.

É o caso de Zexion, um metroidvania retrô lançado em 2025, muito inspirado na mãe do gênero, Metroid, de NES, lá dos tempos remotos de 1986. Eu, que não sou saudosista dos 8-bits, provavelmente julgaria o jogo pela capa e não me interessaria pelo trailer ou por outras exibições. Ignorá-lo seria um grande erro para alguém que gosta desse tipo de jogo.

Foi ao ver repetidos louvores no Reddit r/metroidvania que entendi que Zexion era um agradável caso especial de jogo de desenvolvedor solo, que surpreende por sua qualidade, escopo e sólida confiança na execução de uma aventura intensa, inteiramente focada na gameplay de exploração e ação. O que mais eu poderia fazer, além de experimentar eu mesmo e adicionar minha humilde contribuição a essa divulgação “boca a boca”?

Vibes retrô nem sempre funcionam

Quero começar mantendo a opinião de que o lado audiovisual da experiência não me atrai, especialmente pela paleta de cores fortes, pelo caráter prosaico de boa parte dos cenários de fundo e pelos efeitos sonoros crus e estridentes que, em várias situações, soaram-me desconfortáveis e me fizeram diminuir o volume.

O formato de tela também é retrô: o antigo 4:3, complementado por bordas pretas. Logo deixei de perceber isso, e a falta de widescreen não prejudicou a experiência.

Tive também algumas gratas surpresas no lado visual ao longo da campanha, ao adentrar áreas de aparência alienígena que reforçaram muito bem a ideia de explorar as entranhas solitárias e estranhas de um mundo hostil, bem no estilo Metroid mesmo, além de enfrentar chefes enormes em pixel art detalhada, verdadeiras monstruosidades que parecem saídas de álbuns de metal dos anos 1980 e 1990.



No fim das contas, não foi a imersão estética que se mostrou o ponto forte de Zexion, mas sim a profundidade e o ritmo da exploração e das recompensas.

Planeta do tesouro

Logo na abertura, aprendemos que a perigosa arma Zexion foi banida após causar toda uma guerra interplanetária, eras atrás. Um exemplar dela, porém, foi localizado em certo planeta, o que levou a uma corrida de piratas espaciais em busca do artefato. A protagonista Natu, entretanto, precisa do poder da arma para tentar dissipar uma tempestade cósmica que ameaça seu planeta natal.

Fora a breve cena introdutória e o final mais elaborado — que já deixa gancho para uma sequência —, a narrativa é eficientemente minimalista e completamente silenciosa, sem jamais precisar parar para explicar qualquer coisa ou lançar mão de textos. É interessante como os encontros com os piratas são usados de forma sutil e eficiente para desenvolver uma sensação de perigo e urgência, incluindo algumas situações inesperadas e até pequenas reviravoltas.



O design do mundo, que é palco da aventura, é um grande destaque, estando bem acima da média dos metroidvanias. O mapa é grande, muito interconectado e com boa dose de abertura, sem nunca parecer que está nos guiando. Ao contrário: a sensação da exploração é que está toda sob nossa responsabilidade.

Entre habilidades de movimento, armas e melhorias, há muitos itens para encontrar, e a maioria deles dá sensação imediata de recompensa, como algo que valeu a pena o esforço. Em contrapartida, também há uma quantidade grande de recipientes de mísseis, que aumentam timidamente o número máximo que podemos carregar, funcionando como item abundante para tapar buracos na exploração.



Direto ao ponto

Em quinze minutos de jogo, eu já havia derrotado dois chefes e adquirido duas habilidades. Ao final da primeira hora, havia me deparado com um dos chefes multifases mais inesperados que já vi em ação 2D.

Em sua maioria, os chefes em Zexion são um show à parte e, certamente, pontos altos de uma já ótima campanha. Além de serem numerosos e variados, muitos deles surgem como surpresas instigantes, desdobrando-se em várias fases que encadeiam sequências de ação intensas. 

Alguns deles até caem rapidamente sob a mira dos mísseis, mas a regra geral é que são desafiadores, e houve algumas ocasiões em que eu recuei e preferi explorar outros locais antes de voltar para tentar a sorte novamente. Exceto pelo extravagante e longo chefe final, essas lutas são gerenciáveis e oferecem checkpoints entre as fases, permitindo-nos retornar, após a morte, até aquele ponto e com a vida cheia.



Mapear ou não mapear, eis a questão

Um design desagradável está no sistema de mapa, que, inicialmente, só nos permite ver algumas salas ao redor, o equivalente ao espaço do minimapa. Dessa forma, não podemos ficar de olho em áreas exploradas antes, o que prejudica o backtracking no começo de Zexion.

Ainda que essa abordagem para o mapa seja questionável, eu decidi mantê-la, pois já conhecia a polêmica e quis testá-la eu mesmo. Em alguns momentos, senti vontade de verificar o mapa completo para buscar outros caminhos possíveis, mas não me senti realmente prejudicado por ela. Além disso, o item que permite visualizar o mapa completo pode ser obtido razoavelmente cedo na campanha: eu o encontrei após quatro horas, mas creio que poderia tê-lo conseguido antes, se retornasse às áreas iniciais após obter algumas habilidades.

Em todo caso, para quem não gostar da ideia, basta ativar a opção “Map Unlock” no menu Assist, no momento em que quiser.



Difícil, mas aberto a adaptações

O menu Assist é profundo e merece um tópico à parte. Podemos diminuir a proporção de dano, interferir no estoque de mísseis e até criar save states, o que é especialmente útil em alguns segmentos longos, sem pontos de salvamento. Creia-me: muitos jogadores vão querer ativar a opção de “mísseis ilimitados” no chefão final.

Cheguei a ativar a invencibilidade aqui e ali, quando queria refazer um longo trecho apenas para conferir se já tinha o requisito para passar pelo obstáculo ao final dele. Isso, na verdade, é sintoma de um pequeno problema que aflige certos metroidvanias “raiz”: não há sistema de viagem rápida.



Como já disse, Zexion é profundamente interconectado e nos dá diversas habilidades de movimento. Entendo que um sistema de viagem rápida muito amplo prejudicaria o bom proveito dessa arquitetura engenhosa, mas isso não exime do peso do backtracking de atravessar o grande mapa de um lado para o outro. Para mim, a melhor opção seria a existência de uns poucos pontos de viagem bem posicionados, para reduzir o tempo gasto quando se quer ir de uma extremidade a outra.

No final de tudo, levei 16 horas para finalizar a campanha. Exceto por um bug no relógio, que reiniciou a contagem de horas e ainda me rendeu, imerecidamente, a conquista de finalizar em menos de três horas, não tive qualquer problema técnico.



Maturidade de 2025 nas profundezas do espaço de 1986

Zexion é um caso exemplar de maturidade de um gênero. Feito por uma única pessoa, esse metroidvania se inspira nos primórdios 8-bits em vários pontos, como a estética, o nível de desafio e a confiança de que deixar o jogador encontrar o caminho é parte importante da exploração.

Por trás disso tudo, porém, há uma bagagem refinada de conhecimento sobre como uma aventura desse tipo deve ser construída, como transformar chefões em sequências de ação espetaculares e como a experiência moderna é enriquecida ao dar ao seu público opções de ajustes para diferentes necessidades.



Prós

  • O design do mundo é engenhoso, variado e criativo, com grande abertura e muitos segredos a descobrir;
  • Excelentes lutas contra chefões, que se desdobram em múltiplas fases e se tornam sequências de ação intensas;
  • Muitas opções de assistência de gameplay, podendo calibrar diferentes aspectos da dificuldade e criar estados de salvamento.

Contras

  • Audiovisual em estilo 8-bits, com muitos cenários de fundo pouco detalhados, paleta de cores pouco atraente e efeitos sonoros estridentes;
  • Ausência de sistema de viagem rápida;
  • Falta de suporte ao português brasileiro.
Zexion — PC — Nota: 9.0
Revisão: Mariana Marçal
Análise produzida com cópia digital adquirida pelo redator
OpenCritic
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Victor Vitório
Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies. Veja minhas análises no OpenCritic.
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