Análise: Borderlands 4 — todos os caminhos de Kairos levam ao caos…e à diversão

Uma revolução em mundo aberto, equilibrando grandes acertos e tropeços de design.

em 25/09/2025

Borderlands 3 não é muito bem lembrado pelos fãs por conta de sua história — mais especificamente, seus vilões, que tiveram a ingrata missão de suceder Handsome Jack, um dos antagonistas mais icônicos dos últimos 20 anos da indústria dos games. No entanto, vale destacar que o terceiro capítulo trouxe virtudes que muitas vezes se sobressaem diante de seus erros. A aventura intergaláctica apresentou a melhor jogabilidade da franquia e praticamente esgotou as possibilidades de evolução dentro do molde que definia a série até então.


É importante ressaltar esse ponto, pois Borderlands 4 surge como uma resposta direta a seu antecessor, atacando diretamente todos os pontos que deixaram uma marca negativa na série e a expandindo para novos horizontes. Se o terceiro episódio foi a evolução da fórmula, o quarto é a revolução, abrindo uma nova era para a franquia.

A revolução da franquia e em Kairos

Borderlands 4 se passa seis anos após os eventos de seu antecessor, levando os Vault Hunters ao planeta Kairos, até então fora do radar da política intergaláctica que permeia a saga. O planeta vive sob o domínio do tirano Timekeeper, e cabe ao protagonista liderar a revolução que os habitantes locais tanto esperavam.

A premissa não é das mais originais. Quantas vezes já não assumimos o papel de forasteiro que lidera uma rebelião contra um ditador em jogos como Far Cry? Mas, aqui, o jogo utiliza esse arquétipo para contar uma história mais contida e direta, sem os excessos do antecessor. Foram deixadas de lado as participações especiais forçadas de personagens icônicos e a tentativa constante de criar momentos maiores do que o necessário. A trama em Kairos funciona quase como um soft reboot, um ponto de partida para essa nova fase da franquia, mas preserva as características que tornam a série tão querida.

Os novos personagens são bem escritos e guiam o jogador de maneira natural e divertida ao longo da narrativa. Já os veteranos retornam em papéis mais pontuais e significativos, evitando os erros de descaracterização grotesca que mancharam o último capítulo.

O risco de corrigir o rumo da história ao mesmo tempo em que se introduzia o mundo aberto era enorme, mas o resultado foi positivo. Ao focar em um único conflito local, os roteiristas encontraram o respiro necessário para retomar o eixo narrativo. Ainda assim, o jogo consegue oferecer liberdade ao jogador, dividindo o mapa em três áreas principais, cada uma com sua narrativa central. O jogador pode escolher a ordem em que enfrentará esses arcos até que tudo se conecte e conduza ao clímax.

Apesar de mais contida, a narrativa corrige erros do passado e volta a alinhar a série com uma promessa feita 11 anos atrás em Borderlands: The Pre-Sequel. É um pouco frustrante que esse ponto narrativo ainda não tenha se concretizado em tantos anos, mas, agora, com os rumos de Borderlands 4, cresce a esperança de que finalmente veremos esse arco tão aguardado pelos fãs ser abordado futuramente de forma digna e épica.

Vault Hunters entram em cena

Timekeeper mantém tudo sob controle — uma tirania que literalmente controla a mente dos cidadãos, em que a ordem absoluta é a prioridade máxima. E ninguém melhor do que os Vault Hunters para trazer o caos a esse planeta.

Os protagonistas mantêm o nível elevado de qualidade da franquia, garantindo diversão independentemente da escolha. Nunca os Vault Hunters estiveram tão destacados quanto nesta aventura. Uma das evoluções mais notáveis em relação aos jogos anteriores é a presença ativa do personagem do jogador. Se, em Borderlands 3 ele era literalmente invisível nas cutscenes, aqui não só aparece em todas, como participa delas com falas próprias e cheias de carisma. É um salto imenso em relação aos Vault Hunters mudos do original de 16 anos atrás.

No controle do caos

Essa integração maior da personalidade dos protagonistas reforça outro ponto: nunca foi tão divertido controlar um Vault Hunter. A jogabilidade atinge um novo patamar, embora venha com um detalhe incômodo — a configuração inicial do controle é excessivamente lenta, obrigando o jogador a ajustar manualmente a sensibilidade. Feito isso, o jogo revela a melhor experiência de combate que a série já ofereceu.

As novidades de movimentação, como o gancho e o planador, agregam bem ao conjunto. Mas até o básico impressiona. Atirar, usar habilidades e improvisar em meio ao caos nunca cansa, e o design de mundo aberto oferece oportunidades constantes para confrontos caóticos.

Os inimigos que habitam Kairos são, em sua maioria, interessantes, ainda que a variedade não acompanhe totalmente o tamanho da experiência. Subchefes de missões secundárias deixam de receber a atenção especial e acabam esquecíveis. Em compensação, os chefes principais e dos Vaults são memoráveis e garantem os melhores momentos do jogo.

As armas, pilar fundamental da franquia, atingem aqui seu ápice em quantidade e variedade, mantendo a tradição. O ponto fraco fica para a classe de rifles de precisão, que raramente se comportam como snipers de verdade.

O mundo aberto torna os veículos essenciais para locomoção, mas apenas isso. A clara influência de Mad Max que inspirou o primeiro jogo praticamente desaparece. Usar os veículos é funcional, mas sem brilho, desperdiçando o potencial que o ambiente aberto poderia oferecer para expandir esse elemento que já foi tão importante para a série.

As atividades de um Vault Hunter

Como em todo jogo de mundo aberto, a geografia precisa ser preenchida com atividades que prendam o jogador. A Gearbox fez uma boa transição do estilo tradicional de side-quests da série para esse novo formato.

As atividades básicas do gênero estão todas aqui: capturar torres, dominar bases, resolver pequenos puzzles e encarar desafios de movimentação que limitam as ações do jogador, como transportar itens sem poder usar veículos ou habilidades. Essas tarefas funcionam como a camada de repetição necessária para dar vida ao mapa. E, atendendo a um pedido antigo da comunidade, a funcionalidade de repetir chefes foi adicionada de maneira simples e direta, facilitando o grind por itens lendários.

Mas o destaque, como sempre, está nas side-quests. Seguindo o padrão de excelência da franquia, elas apresentam personagens passageiros, mas memoráveis, e narrativas curtas com tons variados, que vão do humor ao absurdo. Só nelas, o jogador encontra dezenas de horas adicionais de conteúdo, reforçando a sensação de que o mundo de Kairos é denso e cheio de personalidade.

“Tudo se quebra”

Com uma mudança de fórmula tão drástica, algumas decisões polêmicas eram inevitáveis. Muitas funcionam bem, mas outras prejudicam a experiência.

A mais notável é a substituição do minimapa por um radar na parte superior da tela. A ideia seria aumentar a imersão, mas o resultado é o oposto. Sem o mapa tradicional, o jogador fica refém do sistema de marcação de caminho do ECHO-4: ao pressionar ^ no d-pad, surge uma linha temporária indicando a direção até o objetivo. O problema é que ela dura poucos segundos, obrigando o jogador a repetir o comando constantemente (às vezes, mais de cinco vezes antes de chegar ao destino). Para piorar, o recurso tem tempo de recarga, o que torna a navegação ainda mais irritante.

O radar em si também não ajuda. Ele carece de clareza, não distingue bem os ícones e tampouco informa a distância dos inimigos. O resultado é uma usabilidade confusa, que em nada contribui para a tão buscada “imersão”.

Apesar do problema mais gritante estar na navegação, a inconsistência se espalha para outros aspectos da interface.

Em um looter shooter, o inventário é uma das telas mais acessadas durante a experiência. Nos jogos anteriores, ele nunca foi perfeito, mas tinha identidade visual marcante. Em Borderlands 4, essa identidade se perde: a interface foi claramente inspirada em Destiny, mas sem a mesma eficiência. Filtros que se resetam a cada ação, cliques desnecessários para acessar informações básicas e uma falta geral de organização tornam o gerenciamento cansativo e pouco prático.

A coleta de equipamentos também sofre. Ainda que o fluxo de loot seja satisfatório, navegar pelo inventário é um atrito constante. O único acerto notável é a marcação automática de itens como “lixo”, que permite vendê-los rapidamente em qualquer estação com apenas um clique. É um detalhe pequeno, mas que facilita bastante o ganho de dinheiro durante a jornada.

No geral, a interface de usuário não acompanha o mesmo nível de qualidade do resto da experiência. 

Lindo e expansivo

O visual icônico da franquia permanece intacto. O cel shading nunca esteve tão bonito, agora com traços mais finos que diferenciam este capítulo do traço mais exagerado do anterior. A preferência pelo estilo pode variar de jogador para jogador, mas a qualidade técnica é inquestionável. O resultado é um dos jogos mais coloridos e visualmente agradáveis dos últimos anos, consolidando-se como um dos destaque visuais da geração. 

Jogando no PlayStation 5 no modo performance, com o modo offline ativado, não encontrei problemas técnicos graves durante mais de 50 horas de campanha. O modo qualidade, por outro lado, é visivelmente mais pesado, tornando-se uma opção quase supérflua para quem valoriza a fluidez.

Além do salto gráfico, Borderlands 4 também é o maior em termos de conteúdo de lançamento. São mais de 90 missões secundárias, além de um robusto endgame para se aventurar sozinho ou em coop. Porém, há uma penalização para os jogadores completistas: ao atingir o nível máximo (50) antes do fim da campanha, a experiência extra não é convertida em progressão para as árvores de especialização, liberadas apenas após os créditos. Isso desestimula quem prefere explorar tudo antes de concluir a campanha principal.

Embarque no caos

Ao deixar de lado a escala intergaláctica de seu antecessor para focar no mundo aberto de Kairos, Borderlands consegue reinventar-se sem perder a identidade. É uma revolução calculada, que moderniza a experiência sem abandonar o DNA de caos e irreverência que sempre definiu a série.

A narrativa mais contida corrige erros do passado e cria um novo ponto de partida tanto para veteranos quanto para novatos. O carisma dos Vault Hunters, agora plenamente integrados à história e à jogabilidade, dá vida a cada missão. E quando o tiroteio começa, a jogabilidade refinada se consolida como o verdadeiro coração da experiência — poucos jogos conseguem oferecer uma jogabilidade tão satisfatória e viciante. 

Apesar de falhas de navegação e interface, Borderlands 4 é, sem dúvida, um novo caminho ambicioso e extremamente divertido para franquia. Para quem sempre amou o caos estilizado da série, a aventura em Kairos é imperdível e, para quem chega agora, é o melhor ponto de entrada desde o primeiro jogo.

Prós

  • Narrativa mais contida e bem estruturada, que corrige erros do passado;
  • Vault Hunters integrados de forma ativa na história e nas cutscenes;
  • Jogabilidade refinada, com tiroteios caóticos extremamente satisfatórios;
  • Visual cel-shading magnífico, colorido e vibrante;
  • Conteúdo robusto no lançamento, oferecendo dezenas de horas de diversão.

Contras

  • Sistema de navegação pouco funcional, com radar e marcações frustrantes;
  • Inventário e menus disfuncionais e sem personalidade;
  • Veículos subaproveitados, sem a relevância que já tiveram na série. 
Borderlands 4 — PC/PS5/XSX — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PlayStation 5
Revisão: Beatriz Castro 
Análise feita com cópia digital cedida pela Gearbox Software / 2K
OpenCritic
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Matheus Oliveira
Entusiasta de games e cinema, sempre explorando novos gêneros e estilos enquanto acumula um backlog infinito. X e Instagram
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