Se na virada de 1999 para 2000 a grande preocupação era que o Bug do Milênio pudesse se tornar realidade, alguns meses mais tarde o público dos videogames presenciou o lançamento de um título que entraria para a sua história, trazendo a temática da tecnologia como um de seus grandes pilares: Deus Ex. Lançado para PC em junho de 2000, a narrativa transporta os jogadores para o ano de 2052, em um futuro distópico onde forças ocultas agem para assumir o poder global.
Warren Spector criou o conceito do que viria a ser Deus Ex ainda em 1994, chamado Troubleshooter, quando ele ainda trabalhava no estúdio Origin Systems, mas o projeto acabou não avançando para produção. Em 1997, outro precursor de Deus Ex, Shooter: Majestic Revelations, começou a ser desenvolvido, dessa vez com Spector já no estúdio Ion Storm. Surgia, naquele momento, um conceito de enredo mais detalhado, além do design do protagonista, JC Denton.
O jogo foi renomeado para Deus Ex em março de 1998, e Warren Spector explicou que escolheu esse título para “brincar com o termo literário Deus Ex Machina (que significa ‘Deus surgido de uma máquina’ em latim)". Na trama, JC Denton, que é um agente nanotecnologicamente modificado da Coalizão Antiterrorista das Nações Unidas (UNATCO), se vê em meio à disputa dos Illuminati e do Majestic 12 pelo poder global. O mundo está mergulhado no caos, enfrentando uma praga de alta letalidade, a Morte Cinzenta, enquanto sua cura, nomeada Ambrosia, encontra-se cada vez mais escassa.
O protagonista JC Denton trabalha na UNATCO junto de seu irmão Paul Denton, sendo ambos nanotecnologicamente aprimorados, e agindo sob a supervisão de Joseph Manderley. Além deles, outros personagens fundamentais na história são: Morgan Everett, um membro de alto escalão dos Illuminati; Bob Page, CEO corporativo e atual líder do Majestic 12; Tracer Tong, um hacker aliado das Tríades de Hong Kong; a IA Daedelus e seu sucessor Ícarus; e Walton Simons, recém-nomeado Diretor da Agência Federal de Gerenciamento de Emergências (FEMA).
Um enredo de reviravoltas
Após a NSF atacar a Ilha da Liberdade, um carregamento de Ambrosia é roubado e levado para Nova York, e cabe a JC rastreá-los para recuperar a remessa de Ambrosia. Eventualmente, Denton descobre que seu irmão se tornou um desertor, trabalhando como infiltrado da NSF dentro da UNATCO após saber que a Morte Cinzenta era uma doença causada pelo homem, e usada para fins de poder e controle populacional.
Como punição pela deserção, Simons ativa um interruptor de desligamento, que dá a Paul apenas 24 horas de vida. Ordenado por Manderley para eliminar Tracer Tong em Hong Kong, JC encontra o esconderijo de Paul em Nova York, onde consegue mais detalhes sobre as operações da UNATCO, o que leva seus empregadores a atacá-lo. O interruptor de morte de JC também é ativado, e Paul pode escapar ou ser morto pelos agentes de Simons.
Destruindo o construtor universal criador do vírus e roubando os planos da Ambrosia, JC é enviado por Tong para a base restante dos Illuminati, em Paris, onde encontra Morgan Everett, que explica que a Morte Cinzenta foi planejada como uma ajuda para os aprimoramentos, mas acabou roubada e reaproveitada por Page e Simons. Assim, para impedir que Page produza mais Morte Cinzenta, JC concorda em defender a Base da Força Aérea de Vandenberg, onde um grupo de desertores do Majestic 12 está escondendo um segundo construtor universal, contra um ataque de Simons.
JC aprende com os cientistas de Vandenberg que Daedalus é uma IA aliada de Everett. Everett tenta derrotar o Majestic 12 usando Daedalus, mas Page contra-ataca com seu sucessor Icarus, em um processo que transforma as duas IA's em uma nova entidade, denominada "Helios", que acaba assumindo o controle da comunicação mundial. No fim, JC Denton viaja para a Área 51, onde deve derrotar Page, que está em processo de fusão com Helios para ganhar o poder global.
A escolha está nas suas mãos
A vinda de Deus Ex ocorreu em um momento em que a indústria dos games caminhava para experiências mais lineares. No entanto, a obra não apenas seguiu na contramão dessa tendência, como também apostou em uma narrativa complexa, entregando nas mãos dos jogadores a capacidade de decidir como abordar diversos aspectos da experiência. As armas podem ser personalizadas por meio de modificações, enquanto o protagonista pode ser aprimorado com dispositivos de nanotecnologia que concedem diferentes capacidades super-humanas.
Cada área central do jogo conta com uma variedade de missões que são apresentadas ao jogador através de NPCs, e que podem ser aceitas ou ignoradas. Alguns objetivos estão vinculados à história principal, enquanto outros são objetivos secundários exclusivos da respectiva área. Também são dadas mensagens curtas que direcionam o jogador para diferentes objetivos. Além disso, cada ambiente também possui objetos interativos, como computadores e teclados, e certos objetos do jogo podem ser carregados ou arremessados, desde pequenos itens como caixas até corpos humanos.
A interação com NPCs é outro ponto de destaque, oferecendo múltiplas possibilidades de diálogo. Cada escolha impacta simultaneamente o desenrolar da história e a jogabilidade, e, desse modo, permite diferentes abordagens em cada missão. É possível tanto se infiltrar sem ser visto quanto adotar uma estratégia mais direta, usando armas e avançando com força total. Por fim, o poder de decisões do jogador se manifesta ao proporcionar distintos finais para o jogo.
Impactos futuros
Deus Ex vendeu mais de um milhão de cópias até 2009, recebeu diversas premiações — incluindo o prêmio de Melhor Jogo de PC pela British Academy of Film and Television Arts (BAFTA) em 2000 — e continua presente em várias listas de melhores jogos da história do PC. Como parte de seu legado, tornou-se uma referência definitiva no gênero de jogos imersivos, influenciando grandes sucessos, como Prey, Dishonored e Cyberpunk 2077.
Nos anos seguintes, consolidou-se como franquia. Após o lançamento do primeiro game para PlayStation 2 em 2002, veio a sequência Deus Ex: Invisible War, em 2003, que não teve o mesmo sucesso do antecessor. Após um período de hiato, a franquia retorna pelas mãos da Eidos Montreal com duas prequelas: Deus Ex: Human Revolution (2011) e Deus Ex: Mankind Divided (2016), sendo este o último título principal da série até o momento. Vale a menção a Deus Ex: The Fall, lançado para Android e iOS em 2013 e para PC em 2014, além de Deus Ex GO, jogo de quebra-cabeça por turnos lançado para mobile em 2016.
Se você nunca jogou Deus Ex, vale a pena experimentar esse clássico do PC dos anos 2000. Mesmo com gráficos um pouco datados e algumas mecânicas rígidas para os padrões atuais, trata-se de um game atemporal. Ele oferece uma liberdade de escolha rara até hoje, assim como uma narrativa rica em conspirações e dilemas que podem impactar o futuro da humanidade.
Revisão: Thomaz Farias








