Análise: Date Everything! nos permite namorar com objetos em um dating sim excêntrico e criativo

Primeiro jogo da Sassy Chap Games conta com escrita divertida e personagens cativantes.

Se por acaso você olhou para um ventilador refrescando um dia de calor e perguntou: “nossa, eu namoraria você”, Date Everything! é a solução para esse desejo. Por mais bizarro que isso possa parecer, essa é a proposta do jogo de estreia da Sassy Chap Games, em que devemos nos relacionar com objetos personificados. Será que essa ideia inusitada se sustenta?

Expedientes inusitados

Em Date Everything!, encarnamos uma pessoa que começou seu trabalho em home office numa grande empresa de tecnologia. Tudo parecia perfeito para começarmos nossa jornada como proletário, mas no mesmo dia foi instaurada uma IA que consegue fazer nossa função sem esforço. Não somos demitidos por isso, contudo, ficamos sem função na empresa.

No entanto, não vamos ficar à mercê do tédio, pois somos “presenteados” com um misterioso par de óculos conhecido como dateviator, que consegue dar personalidade e corpo para qualquer objeto ao usá-lo. Claro que algo com tanto poder cair nas mãos de uma simples pessoa desencadeia situações diversas com o CEO da empresa, dono original do apetrecho, além de outros mistérios.

A partir da obtenção do dateviator, nosso dia a dia foca em conhecer os objetos. Com 100 deles para descobrir, nosso objetivo é adquirir algum tipo de vínculo com eles — seja inimizade, amizade ou um envolvimento amoroso de fato — numa estrutura de dating sim misturada com visual novel.

A cada dia podemos conversar cinco vezes com algum objeto, e somos jogados numa casa de dois andares. Assim, podemos conhecer cada figura aos poucos ou aprofundar nossa relação com alguém em especial através de um sistema de escolhas convencional.

Cada objeto tem uma aparência e personalidade completamente distintas. Alguns podem ser mais fáceis de se relacionar por já gostarem de você desde sempre, enquanto outros podem ser mais fechados ou mesmo esnobes com sua presença ali. Assim, podemos entrar na vibe de alguém ou sermos verdadeiros com quem seríamos na vida real — a liberdade das abordagens é dada ao jogador.

Há um sistema de atributos que vai escalando conforme conversamos e moldamos nossas abordagens, definindo o grau de empatia, esperteza, charme, humor e moral, parecido com os status sociais de Persona. O problema em Date Everything! é que leva muito tempo para evoluir cada classificação e só aproveitamos isso de fato no New Game+.

Conhecendo os partidos

Toda a qualidade de Date Everything! está na presença dos seus personagens e, principalmente, no texto. Eu estava meio reticente se eles seriam óbvios demais em moldar a personalidade de cada item, mas o jogo vai além de como representá-los.

Por exemplo, a personagem que representa o ventilador é retratada como uma fã obcecada por nosso personagem, fazendo uma analogia com o fato de estar sempre mirando na nossa direção ao soprar o vento, além de fazer um trocadilho com "fan" — que em inglês significa tanto ventilador quanto fã. Já o representante da Air Fryer é uma espécie de padre que prega contra o uso de óleo e outros tipos de gordura para frituras.

No geral, a qualidade do texto é excelente e o principal foco de Date Everything! — embora varie conforme o quão interessante é cada personagem. As piadas são boas, a maioria dos objetos rende boas conversas, e há algumas interações entre diferentes personagens ao mesmo tempo, rendendo momentos bem divertidos — especialmente se forem antagônicos.

A diversidade entre eles é outro ponto alto, abrangendo aspectos como etnia, identidade de gênero, representação de nacionalidades, tipo físico e por aí vai. É pouco provável que não encontremos ninguém que atinja os gostos pessoais do jogador.

Para facilitar essa caça ao relacionamento e deixar o ritmo mais natural, há um sistema de missões chamado Roomers. Alguns encontros acabam nos trazendo uma dica de outro objeto ligado, seja com ele aparecendo antes de o encontrarmos ou por indicação de alguém. As missões não são tão óbvias, mantendo a parte de mistério ao encontrar os interesses amorosos, mas ajudando um pouco nas buscas.

Nossa exploração na casa ocorre em primeira pessoa e é bem simples e fácil de entender, já que estamos apenas olhando os cenários e escolhendo com o que interagir. A única parte mecânica que incomoda é que há um leve atraso de comando ao andar e mexer o mouse. Não atrapalha a jogabilidade, mas incomoda inicialmente.

É provável que um jogador comece pelos objetos mais óbvios, mas dá para encontrar alguns dentro de armários, gavetas e caixas. Por exemplo, há um saco de brinquedos sexuais ao lado da cama que só descobri após ter me tocado de que dava para interagir com as coisas dessa forma.

Assuntos com conteúdo

E falando nesses brinquedos, Date Everything! não esconde que é um jogo com assuntos mais adultos. Nada é tão explícito, e inclusive é possível escolher o que queremos ver ou não por uma função dos óculos.

Dos casos interessantes, o próprio saco de objetos adultos pode ter a conversa totalmente amenizada caso optemos por isso. Já a ventilador tem uma personalidade que pode ser um gatilho para aqueles que são sensíveis ao tópico de stalkers; logo, o diálogo com ela pode ser pulado sem problemas. Skylar, a personagem que representa o dateviator, sempre pergunta se está tudo bem antes de seguir em frente.

O loop de jogabilidade pode ficar um tanto repetitivo com o tempo, mas o jogador pode seguir seu próprio ritmo sem problemas. Podemos consultar uma agenda, a Date-a-Dex, para ver os personagens que conhecemos a qualquer momento, conversar com Skylar para receber orientações e voltar para determinado cômodo para pegar algum conteúdo novo.

Mesmo sendo um título bastante extenso, Date Everything! conta com vários finais e, inclusive, podemos terminar a campanha a qualquer momento se estivermos satisfeitos, bastando sair pela porta da casa. Caso fiquemos, há revelações e momentos bem interessantes para quem quer se aprofundar nesse universo.

Para deixar a extensiva leitura menos cansativa, todos os diálogos, incluindo narração, são acompanhados por um excelente trabalho de dublagem em inglês e contam com um elenco conhecido, como Roger Craig Smith, Liam O’Brien, Neil Newbon, Debra Wilson, Laura Bailey e Ashly Burch.

Infelizmente para nós, brasileiros, Date Everything! pode se tornar um tanto inacessível devido à ausência de localização. Como o jogo é praticamente todo baseado em textos que brincam com gírias, regionalismos e trocadilhos, o entendimento completo pode ser comprometido para quem não entende muito da língua inglesa — que, inclusive, é a única que o título disponibiliza.

Visualmente, Date Everything! não faz tanto para se destacar, mas cumpre seu papel. Como o ambiente em que estamos é apenas a casa, ela é detalhada o suficiente para colaborar com a proposta da jogabilidade e simples o bastante para a parte técnica.

Por outro lado, as artes dos personagens são interessantes e possuem diversas reações diferentes para ilustrar as interações. É bem legal ver como adaptaram elementos que definem os objetos de maneira antropomórfica, seja de forma totalmente humanoide ou fazendo alguma piada, como o da lava-louça ou o do pato de borracha.

Um relacionamento duradouro

Date Everything! é uma ideia muito maluca que resultou em um dating sim interessante, com bastante conteúdo e personagens cativantes, tanto pelo texto divertido quanto pelos visuais inusitados e criativos. Mesmo que o loop de jogabilidade possa se tornar repetitivo e que haja pontos a serem polidos nos controles, é aquela experiência única que apenas jogos indies podem nos proporcionar. 

Só espero que recebamos mais localizações em diversos idiomas no futuro e não apenas em português.

Prós:

  • Escrita divertida, contando com bom humor e boas sacadas com a temática de namoro com objetos;
  • Personagens majoritariamente interessantes de dialogar, incluindo momentos de interação entre eles;
  • Designs criativos ao adaptar objetos em formas humanoides;
  • Vários finais e muito conteúdo para New Game+;
  • Excelente dublagem em inglês, contando com atores e atrizes de renome.

Contras:

  • A ausência de tradução de textos para português prejudica a experiência para quem não possui um conhecimento intermediário de inglês;
  • Leve latência de comandos é um tanto incômoda;
  • A estrutura da jogabilidade pode se tornar repetitiva em longas sessões de jogo.
Date Everything! — PC/PS5/XSX/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Heloísa D'Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela Team17
OpenCritic
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Alecsander "Alec" Oliveira
Estudante de enfermagem de 25 anos, está nesse mundo dos joguinhos desde criança. Fã de games com vibe mais arcade e arqueólogo de velharias, mas não abandona experiências mais atuais. Acompanha a mídia de podcasts, dublagem e ouvinte assíduo de VGM. Pode ser encontrado como @AlecFull e semelhantes por aí.
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