Yoko Taro é um dos nomes mais peculiares da indústria dos videogames. Ele é conhecido por sua postura excêntrica e suas narrativas ousadas e emocionantes que marcaram a história dos jogos eletrônicos. Criador das séries Drakengard e NieR, suas obras são frequentemente associadas ao niilismo, existencialismo e a fragilidade da condição humana, sempre apresentadas de formas belas e lúdicas.
O início da carreira
Yoko Taro nasceu em 6 de junho de 1970, em Nagoya, na província de Aichi, Japão. Criado em maior parte pela avó, dado que seus pais eram muito atribulados, Taro sempre demonstrou personalidade introspectiva e sensibilidade para observar o mundo ao seu redor. Em entrevista, ele relatou que a morte de um amigo em uma acidente influenciou sua visão de mundo, o que se refletiria em seu trabalho posterior.
Antes de entrar para a indústria dos videogames, ele estudou na Universidade de Artes de Osaka, na qual se especializou em cinema. Essa qualificação futuramente serviria de base para a abordagem narrativa de seus jogos, conhecidos pelas suas múltiplas perspectivas, linhas temporais e finais alternativos que alteram a percepção que o jogador tem da história.
Na indústria dos jogos eletrônicos, ele iniciou sua carreira na Namco, trabalhando como designer de CG até ser transferido para a Cavia Inc. Foi nesta desenvolvedora japonesa que ele finalmente teve a oportunidade de liderar um projeto autoral.
Estilo e filosofia
O estilo de Yoko Taro é conhecido por ser provocativo, emocionalmente denso e desconcertante. Sua filosofia de game design é radical: ele coloca a narrativa acima da jogabilidade e costuma utilizar os sitemas para causar desconforto e reflexão. Fazendo o uso de jogos como ferramentas para provocar empatia através do papel ativo do jogador na história, muitos de seus títulos obrigam aqueles que os jogam a cometer atos questionáveis e enfrentar consequências inesperadas.
Obcecado por múltiplos finais e repetições, Taro os utiliza não só como mecânicas de gameplay, mas como instrumentos narrativos poderosos. Em NieR: Automata, por exemplo, o jogador tem a opção de apagar o próprio save para ajudar um jogador desconhecido em um gesto simbólico de sacrifício.
Drakengard e a estreia como diretor
Lançado em 2003 para PlayStation 2, Drakengard (Drag-on Dragoon no Japão) foi o projeto de estreia de Yoko Taro como diretor e roteirista. O jogo de ação com elementos de RPG surpreendeu os jogadores com sua narrativa sombria, personagens perturbados e um mundo devastado pela guerra e a loucura. Caim, o protagonista, é um anti-herói movido pela vingança, cujas atitudes são marcadas mais por ódio e rancor do que por heroísmo.
Drakengard rompeu com os padrões de jogos de fantasia tradicionais ao abordar temas complexos e polêmicos, como abuso, incesto, canibalismo e genocídio. Essa ousadia pode ter chocado muitos jogadores, mas mostrou Taro como um autor visionário sem medo de explorar tabus. A recepção do jogo foi mista pelo público e pela crítica, mas obteve uma base cult que cresceu com o passar do tempo.
A sequência do jogo, Drakengard 2 (2005), teve menos envolvimento de Yoko Taro, que não dirigiu o projeto. Com isso, o título teve um tom menos sombrio, o que gerou críticas de fãs do primeiro jogo. Taro retornou à série em 2013 com Drakengard 3, para PlayStation 3, trazendo ao jogo seu estilo narrativo ousado, dessa vez com protagonistas femininas violentas e moralmente ambíguas desafiando o conceito comum de heroísmo.
NieR e o reconhecimento global
Antes de alcançar reconhecimento global, Yoko Taro já havia estabelecido sua marca com NieR Replicant e Gestalt, lançados originalmente em 2010. Ambos compartilham a mesma história base, mas diferem em personagens e relacionamentos. Ambientados em um mundo decadente onde fantasia e ficção científica se encontram, ambos os títulos são sátiras dos JRPGs tradicionais, criticando ao mesmo tempo em que celebram os clichês do gênero.
A verdadeira consagração de Yoko Taro viria em 2017, com NieR: Automata. Desenvolvido pela Platinum Games e com direção de Yoko Taro, o jogo combina combates dinâmicos com narrativa profunda. NieR: Automata se passa em um mundo pós-apocalíptico que existe em uma linha temporal diferente de Drakengard, porém no mesmo universo. Este mundo é habitado por androides e formas de vida mecânicas que questionam sua razão de existir.
Os androides 2B, 9S e A2, protagonistas de NieR: Automata, se tornaram ícones, não apenas pelo seu design, mas também por suas jornadas trágicas e dúvidas sobre o significado da humanidade. O jogo desafia seus jogadores com várias camadas narrativas, nas quais o verdadeiro significado da história só é revelado depois de reinterpretar os eventos por diferentes rotas.
Sucesso crítico e comercial, NieR: Automata vendeu mais de 9 milhões de cópias ao longo dos anos. Foi aclamado por sua trilha sonora e narrativa com o uso de metalinguagem e quebra da quarta parede. Yoko Taro se tornou um nome amplamente reconhecido fora do Japão, ainda que com sua icônica máscara de Emil, símbolo de NieR.
Mídia expandida: teatro e literatura
Embora seja mais conhecido como diretor e roteirista de jogos eletrônicos, Yoko Taro também explora outras formas de expressão artística que complementam os universos que cria. Suas histórias não estão presas a um único meio: o teatro e a literatura complementam seu universo.
Um dos exemplos principais é o conjunto de peças teatrais que se passam no universo de NieR: Automata. A primeira, YoRHa Stage Play foi lançada em 2014, 3 anos antes do lançamento de NieR: Automata, e conta a história da primeira missão da androide A2. Essa mesma peça já foi relançada em 4 versões diferentes (inclusive uma com o elenco todo masculino), cada uma com pequenas mudanças na história; pessoalmente, prefiro a versão 1.2, que é musical. Além das diversas versões, ela foi adaptada na forma de conto, mangá e foi uma parte importante do anime NieR: Automata 1.1a.
Além de YoRHa Stage Play, outras peças de sucesso que se passam no universo de NieR: Automata são YoRHa Boys e YoRHa Girls. YoRHa Boys se passa antes de NieR: Automata e explica porque a maioria dos androides YoRHa são do gênero feminino. Enquanto YoRHa Girls é uma versão alternativa de YoRHa Boys, mas com os gêneros trocados.
Outros trabalhos de destaque são os Drama CDs de NieR Replicant que contam a história dos personagens do jogo anos antes da história principal. Eles são muito populares no Japão e frequentemente acompanham as edições especiais do jogo. Mesmo com essa expansão em diversas mídias, todas as obras mantêm sua unidade temática. A morte, a memória, a culpa e a espiral de violência e renascimento estão sempre presentes.
Seus trabalhos mais recentes foram os concertos End of Data, que expandiram o final de NieR: Automata, dando um novo desfecho para 2B e 9S. Além dos concertos, recentemente foi lançado um novo conto chamado Undecided Option que aborda alguns eventos após os finais de NieR Replicant, NieR: Automata e NieR Re[in]carnation.
Projetos futuros e legado
Em meados de 2024, foi anunciado que ele estaria envolvido em um novo projeto não divulgado, o que aumentou as expectativas dos fãs sobre uma possível continuação das histórias do universo de NieR. Ele já declarou em entrevistas que pretende parar de fazer jogos tristes, mas sempre acaba retornando às antigas questões filosóficas e temas melancólicos.
Yoko Taro é um nome consolidado entre os diretores e roteiristas de videogames. Em um meio muitas vezes preso a fórmulas comerciais convencionais, ele insiste em tratar jogos como uma forma legítima de arte e abre espaço para experimentações ousadas e pouco convencionais.
Seus jogos, em vez de oferecerem puro escapismo, confrontam o jogador com dilemas éticos e desconfortáveis. E isso o torna tão singular: as experiências criadas por Taro permanecem com o jogador depois que os créditos finais sobem. Experiências tristes, porém intensamente humanas.
Revisão: Farley Santos