Análise: The Flayed Man é um curto e frustrante point-and-click, mas que tem algum charme

Voltado para o terror interno, ele conversa sobre temas pesados, mas sua jogabilidade não permite ir além.




Desenvolvido pela Snoring Dog Games, The Flayed Man é um jogo point-and-click 2D focado em terror e quebra-cabeças. Lançado em 17 de abril de 2025, o título recebeu críticas positivas na Steam, destacando-se por sua narrativa temática, sua pixel art expressiva e sua abordagem introspectiva no gênero de horror. No entanto, sua jogabilidade falha em agregar valor à experiência final, tornando-se um ponto negativo em meio aos méritos do jogo.

Nesta análise sem spoilers, exploraremos detalhadamente cada um desses aspectos: desde os acertos na ambientação e na construção de tensão até as limitações mecânicas que comprometem parte do potencial da obra. 

Terror interno

Acordamos aos gritos em uma casa velha e abandonada. Não temos pele, nem língua: somos apenas músculos expostos, sangrando, perdidos e sem memória de quem fomos. O único caminho possível leva ao quintal dos fundos, onde uma criatura grotesca nos aguarda. Ela nos guia em direção ao próximo objetivo, prometendo devolver nossa língua.

É por meio dessa criatura e dos pensamentos fragmentados do Flayed Man sobre o mundo ao seu redor que o jogo explora temas como sofrimento e solidão. Após recuperarmos a língua, a mecânica do confessionário é liberada — e é nesse momento que mergulhamos nas nuances do perdão e na dor que nos define.




Com dois finais possíveis, a narrativa encerra de maneira impactante essa jornada de terror introspectivo, na qual o verdadeiro monstro não está nos cenários sombrios, mas nas feridas que carregamos.

Talvez o ponto mais negativo nesse aspecto é que o jogo não possui tradução em português, dificultando o acesso de algumas pessoas a essa narrativa tão intrigante.


Point-and-click frustrante

A palavra que define a jogabilidade de The Flayed Man é frustrante. Mesmo com a opção de ativar dicas antes de começar a jornada, as orientações são vagas e pouco intuitivas sobre objetivos e ações necessárias. Coletamos itens pelo cenário, mas a interação é prejudicada por falhas básicas: ao pressionar os botões do teclado, o inventário não é acessível, e só descobrimos depois de algum tempo que é necessário arrastar o mouse até o topo da tela para visualizá-lo — um sistema oculto que quebra a imersão.




Essa irritação permeia toda a experiência, principalmente nos quebra-cabeças de combinação de itens, que muitas vezes se resumem a tentativa e erro puro, sem lógica interna que justifique as soluções. A falta de feedback claro transforma desafios em obstáculos artificiais, mais próximos de uma tarefa maçante do que de um estímulo intelectual.

Felizmente, a jornada é curta (cerca de 20 minutos) e o sistema de salvamento instantâneo — acionável a qualquer momento durante a exploração da casa — facilita a obtenção de ambos os finais e todas as conquistas. É uma concessão necessária em um jogo que, apesar de suas ambições narrativas, falha em equilibrar uma boa história com desafios bem elaborados.


2D impactante

A escolha artística de The Flayed Man é intrigante. A pixel art minuciosa constrói cenários que alternam entre o sombrio e o grotesco, com detalhes anatômicos perturbadores (músculos expostos, texturas de feridas) que chocam sem recorrer a excessos. Essa estética calculadamente repulsiva paradoxalmente convida ao replay; já a composição de quadros ricos em simbolismo revela novas camadas narrativas a cada revisita.


Já o áudio cumpre seu papel atmosférico, mas sem ambições além do funcional e, em alguns pontos, como no confessionário, chega a ser genérico. A exceção fica por conta do grito inicial do protagonista: distorcido em bitrate baixo, ecoa como uma falha de transmissão, reforçando a ideia de que aquela realidade está corrompida.

No equilíbrio final, o jogo entrega uma identidade visual marcante que compensa suas limitações técnicas. É na combinação entre o horrífico íntimo e a beleza decadente de seus pixels que a obra encontra sua voz — mesmo que, em outros aspectos, ainda grite por polimento.


Vale a pena?

Sim, mas com ressalvas. The Flayed Man é uma jornada única no terror introspectivo, cujas qualidades narrativas e estéticas transcendem suas falhas técnicas. Ainda que a jogabilidade desajeitada exija paciência (quase um “pacto de tolerância” com o jogo), a experiência é justificada pela força de sua alegoria sobre dor e redenção.

Recomendo-o especialmente para fãs de horror psicológico dispostos a priorizar atmosfera sobre fluidez. É um daqueles títulos que, mesmo imperfeito, deixa marcas — como um corte que sara, mas que deixa cicatrizes visíveis. Para quem busca mais que sustos baratos, esta é uma obra que merece ser vivida, ainda que não exatamente “jogada” no sentido tradicional.


Prós

  • Narrativa introspectiva que explora dor, solidão e redenção com maturidade;
  • Pixel art detalhada e perturbadora, equilibrando grotesco e simbolismo visual;
  • Atmosfera imersiva com cenários que reforçam o horror corporal e a decadência;
  • Dois finais impactantes que dialogam com a ética do sofrimento;
  • Trilha sonora funcional, com destaque para o grito distorcido do protagonista;
  • Curta duração (cerca de 20 minutos) facilita rejogadas e a busca por conquistas;
  • Sistema de salvamento instantâneo elimina frustrações com progresso.

Contras

  • Jogabilidade frustrante, com inventário de acesso não intuitivo (arrastar o mouse para o topo da tela);
  • Quebra-cabeças dependentes de tentativa e erro, sem lógica interna consistente;
  • Ausência de tradução para português, limitando acesso a nuances textuais;
  • Áudio genérico em momentos cruciais (ex.: cenas do confessionário).
The Flayed Man — PC — Nota: 6.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Ives Boitano
Análise produzida com cópia digital cedida pela Snoring Dog Games
OpenCritic
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Matheus Bigai Ferreira
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