Jogamos

Análise: Death Trick: Double Blind (PC/Switch): em meio a truques e ilusões

Investigando um caso sob as perspectivas de dois personagens, temos um mistério envolvente em mãos.

Desenvolvido pela Misty Mountain Studio e publicado pela Neon Doctrine, Death Trick: Double Blind é um jogo de aventura e investigação criminal focado em um caso circense. Em meio a um espetáculo estonteante, as coisas podem não ser como parecem.

Duas frentes

Pouco tempo após o circo itinerante do Morgan chegar à cidade de Tulgey, uma grande tragédia acontece. A Incrível Hattie, estrela que comandava os espetáculos, foi assassinada e o grupo tem mantido o caso em sigilo, evitando apresentações e deixando os espectadores curiosos quanto ao seu “desaparecimento”.

Por conta disso, duas figuras acabam se envolvendo com a busca por respostas: Jackie e Jones. Jackie é uma mulher que também faz performances de magia e mostra para o dono um bilhete em que Hattie pede para ser substituída caso algo acontecesse. Com uma máscara e uma fantasia para a apresentação, ela decide investigar o caso enquanto se mistura com os outros da trupe.
Já Jones é um detetive contratado por Morgan, mas algo estranho aconteceu. Ele acorda praticamente pelado e sem seus pertences no meio do circo. Tudo indica que ele foi nocauteado e roubado, mas ele perdeu as suas memórias recentes e não sabe o que poderia ter o levado a essa situação.

A trama se desenrola intercalando as perspectivas dos dois personagens, cada um fazendo a sua própria investigação. Com apenas um dia para resolver o mistério, logo nos vemos na difícil tarefa de cercar os artistas circenses e descobrir os detalhes escondidos por trás de suas ações.
De forma geral, a história é bem intrigante e desenvolve muito bem os personagens, suas personalidades e dramas pessoais. Colocando-os contra a parede, devemos descobrir as suas motivações, as condições adequadas para o crime e os seus verdadeiros álibis.
 
O roteiro e até mesmo alguns elementos de gameplay são pensados para ludibriar o jogador até o momento em que a grande reviravolta vem à tona. Quando essa reta final chega, a história demonstra toda a sua engenhosidade, com uma resolução de caso que é especialmente empolgante se já tivermos conseguido notar as pistas anteriormente e parar para pensar em todos os detalhes de como as coisas se conectam.

Investigação tática

Em termos práticos, Death Trick envolve um modelo de tempo limitado para a investigação. Temos apenas algumas horas para encontrar os personagens, interrogá-los, vasculhar os ambientes e encontrar nossas pistas. Podemos usar as pistas verbais, objetos e pessoas como gatilhos de conversa diretamente ou através do sistema de Contradição para apontar  discrepâncias entre dois itens obtidos durante a conversa com um personagem relevante.
 
Diferentemente de outros jogos de detetive mais tradicionais, Death Trick: Double Blind não nos permite investigar o quanto quisermos. Temos um sistema de AP (sigla para pontos de ação em inglês) que define o quanto podemos explorar, sendo necessário gastar um ponto para cada tarefa executada. Quando ficamos sem pontos, o nosso turno acaba, passando para a próxima hora do outro personagem.
Em cada horário, apenas um grupo específico de personagens estará disponível nas áreas acessíveis (que são diferentes para Jackie e Jones). Além disso, até mesmo ir de um ponto a outro do mapa e vasculhar os ambientes gasta pontos. Graças a esses elementos, é fundamental planejar com cuidado aonde ir e o que fazer em vez de simplesmente atirar para todos os lados.
 
Embora seja um sistema bem diferente do que estamos acostumados em jogos investigativos similares, a proposta de um limite de ações nos abre uma margem de erro grande. Temos aqui um tempo limitado para concluir as nossas atividades, o que significa que a tendência é que muitas coisas fiquem para trás porque não tivemos a oportunidade de investigar.
Quando se trata de perder detalhes como perspectivas individuais, não há problemas, mas o mesmo não pode ser dito quanto a pistas relevantes e o efeito bola de neve que um erro de timing pode causar a longo prazo. Por conta disso, considero o jogo um tanto complexo como indicação para quem não tem muita familiaridade com o gênero ou queira algo mais casual.
 
Em particular, acho que seria um ganho para a proposta se houvesse pelo menos uma opção de dificuldade em que a exploração fosse livre e o gasto de AP fosse apenas para interrogar os personagens ou vasculhar as áreas. Dessa forma, poderíamos avaliar com mais cuidado as opções em vez de, por exemplo, não poder fazer algo mais significativo porque só de ir a outra região já gastaríamos nosso último AP.

É hora da performance

Em termos de questões técnicas, é interessante notar alguns pontos. Primeiramente, o jogo é bastante estiloso visualmente, trazendo um verdadeiro espetáculo de cores e pequenas animações. Como uma história de época nos Estados Unidos, temos cenários e figurinos que remetem ao passado ao mesmo tempo em que temos um contexto bem peculiar por conta do circo.
 
A interface também se apoia nessa questão de época, com tons entre o marrom e o cinza. Em alguns pontos da trama, podemos ver ilustrações em estilo quadrinhos em tom de cinza, o que é especialmente usado em momentos de revelação da backstory dos personagens. O uso do espaço da tela e de sequenciamento (com uma imagem por vez) nessas cenas é muito bem empregado para chamar a atenção do jogador.
Em termos de qualidade de vida, temos um extenso log que podemos abrir clicando na máquina de escrever, uma opção auto para que o texto passe automaticamente e um botão de skip para textos já lidos. Após certas conversas, liberamos também missões, que são descritas claramente em um menu próprio. Concluí-las permite ganhar experiência, o que pode ser usado para comprar mais AP, mas é necessário gastar pontos para ir até a área do clarividente e depois voltar.
 
Outro facilitador interessante para a experiência é que o jogo indica se há uma contradição para apontar entre as suas pistas. A exclamação do lado direito do menu de itens fica amarela para deixar claro que podemos executar essa ação. Daí, mesmo se não tivermos percebido ainda a resposta, podemos avaliar o que temos em mãos e, felizmente, contradições inexistentes não gastam AP, assim como algumas interações com os personagens nas quais perguntamos coisas que eles não sabem.
 
O que pode ser um incômodo em particular é o fato de que, além de não estar disponível em português, a tradução do jogo para o inglês inclui alguns pequenos errinhos de escrita. Geralmente são coisas de digitação ou erros bobos de conjugação, mas que podem causar distorções no entendimento. Felizmente, não notei nenhum erro muito grave.

Esforço e recompensa

Death Trick: Double Blind
é uma aventura de investigação criminal que chama a atenção com a sua trama bem escrita e o desafio estratégico da gameplay. Ao chegar ao final, é possível notar toda a qualidade do que foi construído até ali, mas o jogo pode não ser tão indicado para quem quer uma experiência de investigação casual, já que os erros na busca pela verdade podem gerar uma frustrante bola de neve.

Prós

  • Trama bem escrita, com especial destaque para a execução de uma grande reviravolta e subsequente resolução do caso;
  • Personagens curiosos, com detalhes mais desenvolvidos quando interagimos mais a fundo com eles;
  • Visualmente estiloso, cheio de cor e com alguns efeitos de animação bem aplicados.

Contras

  • Gastar AP só de se movimentar de um lugar para outro pode ser frustrante e limita consideravelmente a liberdade de exploração do jogador;
  • O texto em inglês tem alguns pequenos errinhos de escrita.
Death Trick: Double Blind — PC/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Neon Doctrine


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google