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Análise: Brothers: A Tale of Two Sons Remake (Multi) mantém o encanto, mas também as limitações

Controle os irmãos sozinho ou coopere com mais alguém.


A versão original de Brothers: A Tale of Two Sons foi lançada em 2013 com bom sucesso de crítica e de público, tornando-se para muitos uma memória querida que ainda pode ser jogada em todas as principais plataformas atuais.

O trajeto do jogo parecia satisfatoriamente encerrado há muito tempo, então a notícia de que o título receberia um remake em 2024 criado no Unreal Engine 5 veio de forma inesperada e sem grande clamor. A dúvida que veio junto no pacote é comum nesse tipo de projeto: é realmente necessário recriar um jogo visualmente?

Certamente essa questão é muito importante na indústria cultural como um todo e na nossa forma de consumir arte e entretenimento, mas por hoje vamos nos ater a Brothers e modificar o viés com outra pergunta. Sendo necessário ou não, o remake já existe; vale a pena jogá-lo?



Lá e de volta outra vez

Os irmãos do título estão em situação desoladora: perderam a mãe não faz muito tempo e o pai está sucumbindo a uma doença horrível, cuja única salvação, segundo o médico, está em uma árvore longínqua. Os meninos não hesitam em deixar o vilarejo e se aventurar pelo mundo, tudo em nome do pai.

Essa história não tem palavras conhecidas, uma vez que o pouco de dublagem existente é em um idioma fictício e sem legendas. As cenas, a ambientação e as ações falam por si só e dão conta de transmitir a narrativa e, especialmente, a carga emocional.

O conto dos dois filhos é como um grande conto de fadas: duas crianças adentram as terras selvagens, repletas de panoramas belos, assustadores e, às vezes, as duas coisas ao mesmo tempo. Lá, elas conhecem seres mágicos, alguns amigáveis e outros perigosos. Também como nos contos, o perigo é real e vemos os protagonistas morrerem nas mãos das criaturas grotescas, ainda que a violência gráfica seja superficial.




O novo visual, criado na Unreal Engine 5, aposta em algo que tende ao fotorrealismo. Isso o torna bastante diferente do original, que era mais cartunesco, e, devo dizer, ainda funciona bem. As duas formas cumprem bem seu papel, mas o aspecto do mundo novo é muito mais rebuscado e bonito, especialmente na vegetação detalhada e no jogo de luz e sombra, o que muito contribui para a atmosfera melancólica em seus tons pálidos e crepusculares.

Acho bom que a desenvolvedora italiana Avantgarden Games tenha optado por mudar a base estética, dando ao remake mais do que um ar de melhoria gráfica, mas também de releitura visual. A movimentação dos personagens, porém, tem momentos pouco naturais, sem alcançar o mesmo patamar de melhoria que o restante da parte técnica recebeu.



Amigo estou aqui

Sabe quando compramos algo sem pesquisar direito? Anos atrás, eu apenas assumi que Brothers: A Tale of Two Sons era um jogo cooperativo e comprei para jogar com minha esposa, mas estava redondamente enganado: todo o design é bolado para uma pessoa dividir consigo mesma o controle dos dois irmãos protagonistas.

Mesmo assim, como experiência, ainda soava algo que implorava para ser jogado em dupla, refletindo na relação entre os jogadores a dinâmica conjunta que era vista na aventura. A ausência dela parecia uma contradição interna.



Na verdade, o jogo original já trazia essa possibilidade na versão de Switch, lançada em 2019. Em outras plataformas, porém, é preciso dar um jeitinho nas opções de acessibilidade para obter o resultado: nos consoles Xbox deve-se acionar o modo Copiloto e, no PS5, o Controle Auxiliar. Ambos têm a mesma função de deixar um segundo controle ajudar o primeiro, compartilhando todos os comandos e, assim, evitando que duas pessoas tenham o incômodo de jogar segurando as metades de um único dispositivo (eu tentei, anos atrás, e não foi bom).

Esses recursos servem para mostrar como o público entendia que o jogo original merecia uma versão cooperativa. A contradição permanece, ainda que de outra via. Afinal, o design solo precisou ceder e se adaptar aos desejos de intenções diferentes. Há perdas e ganhos em modificar o uso sem alterar a estrutura.

Um efeito é que a gameplay fica simples demais quando cada pessoa só controla um dos irmãos, o que pode ser um incentivo para incluir crianças e pessoas com menos prática em videogames e um incômodo para os que preferem algo mais engajante. A maior parte da interação está em manobrar os garotos de forma complementar e síncrona, o que pode exigir pensar momentaneamente para entender o que cada um deve fazer, mas nada que quebre a cabeça.




A graça da intenção original de um jogador é a coordenação de usar as duas mãos em tarefas paralelas sem dar um nó na cabeça. O benefício do cooperativo vai mais pro lado emocional de partilha de objetivos e de tempo de qualidade perante uma história sobre a força da união fraternal.

Em todo caso, a gameplay solo já não era profunda e servia mais ao fluxo da aventura que às mecânicas criativas, então achei que jogar junto é, no geral, uma forma de enriquecer a obra como um todo. Portanto, é bom que o remake tenha implementado essa função nativamente e incentive a jogar de ambas as maneiras.

Se em 2013 a ideia de fazer dupla consigo mesmo era novidade suficiente para destacar Brothers, o mesmo não pode ser dito em 2024. O próprio diretor do jogo, Josef Fares, lançou depois outros títulos que levaram a dualidade mais a fundo com A Way Out e It Takes Two; esse último, um espetáculo singular de ideias e mecânicas caprichadas, ao ponto de ofuscar seu antecessor nesse quesito e, de maneira mais contundente, também o jogo dos irmãos.




Brothers, que é propriedade da 505 Games e não tem mais ligação com Fares, tem no remake uma releitura limitada que seria melhor aproveitada se renovasse aspectos da gameplay para acompanhar designs mais modernos e atender melhor à possibilidade da jogatina em dupla. A nova versão preferiu o espaço seguro de reproduzir fielmente, digamos assim, o jogo 11 anos mais velho.

Colocando dessa forma, podemos pensar corretamente que este é um remake desnecessário, mas precisamos complementar esse pensamento: se o Brothers original permanece valendo a pena pela soma de tudo o que é, o mesmo pode ser dito de seu remake. Quem já possui a versão de 2013 não tem muitos motivos além do multijogador nativo para adquirir a nova, mas os jogadores de primeira viagem terão nela a melhor forma de adentrar esse mundo de fantasia.

Cara nova, mesmo coração

Brothers: A Tale of Two Sons Remake perde a chance de ser uma releitura mais relevante e criativa, atendo-se apenas à repaginação visual. No fim das contas, o conto da união entre dois irmãos para salvar o pai se mantém encantador e aconchegante, uma história que pode ser aproveitada jogando solo ou a dois. Mesmo que a segunda opção deixe a gameplay ainda mais simples, a melhor maneira de entrar na fantasia fica ao gosto de cada pessoa.



Prós

  • A narrativa de conto de fadas sem palavras continua encantadora e sombria;
  • Os gráficos refeitos são bonitos e se diferenciam do estilo original;
  • A adição do modo cooperativo nativo condiz com a narrativa e com o que o público esperava do jogo;
  • A simplicidade da gameplay a torna acessível até para quem não tem hábito de jogar videogames.

Contras

  • Havia mais motivos para recriar outros aspectos do jogo original do que apenas o visual;
  • Não há adições ao jogo em si;
  • A movimentação dos irmãos não está à altura do novo realismo gráfico;
  • Certos trechos de jogabilidade caem na monotonia das mecânicas e da falta de desafio real.
Brothers: A Tale of Two Sons Remake — PC/PS4/PS5/XBO/XSX/Switch — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS5
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela 505 Games

Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies.
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