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Análise: Rhapsody III: Memories of Marl Kingdom (PC): de mãe para filha, o presente do amor

O terceiro jogo da série Rhapsody chega ao Ocidente pela primeira vez 23 anos após o seu lançamento no Japão.

Originalmente lançado para PlayStation 2 no Japão em 2000, Rhapsody III: Memories of Marl Kingdom é a terceira entrada da franquia Marl Kingdom, iniciada por Rhapsody: A Musical Adventure (PS). Como uma espécie de fandisk (expansão independente), ele complementa a narrativa de seus antecessores, explorando cenários adicionais antes, durante e depois deles.

Uma viagem por gerações

Rhapsody III é um RPG em formato episódico, sendo cada capítulo focado em um ponto bem diferente da história do Reino de Marl e sob a ótica de um grupo diferente de personagens. Por exemplo, começamos com um capítulo que se passa durante a jornada de Cornet para salvar o príncipe Ferdinand durante o primeiro jogo; vemos um epílogo direto de Rhapsody II em outro trecho da história; e há até um longo episódio que mostra o passado de uma personagem chamada Cherie, que é importante para os bastidores dos jogos anteriores.

De certa forma, Rhapsody III lembra o formato fandisk de visual novels; ou seja, ele expande a narrativa de seus antecessores em pontos bem variados em vez de servir como uma continuação direta e simples. Com essa conexão mais fraca entre seus próprios capítulos, trata-se de um tipo de experiência que acaba compensando muito menos para quem não teve contato com os anteriores, já que o jogador só teria como base os resumos oferecidos pelo próprio jogo.

Embora o mundo de Marl Kingdom continue muito vibrante e carismático, a estrutura mais simplificada dos capítulos prende a história em caixinhas. Por conta disso, apesar do tom cômico ainda ser mantido, o brilho da experiência mágica de conto de fadas é um pouco enfraquecido em partes da trama nas quais o mundo parece menos vivo.

Em termos estéticos, vale destacar que Rhapsody III introduz mapas 3D no lugar do 2D. Com um design bem mais detalhado, os ambientes agora evitam o problema recorrente da série de uma aparência muito similar que atrapalha o jogador na tarefa de se localizar. Mesmo com mapas aparentemente simples, o avanço é significativo e faz com que a gameplay seja bem mais compreensível em navegação, embora nem sempre haja muita liberdade para exploração.

Um verdadeiro exército de aliados

Assim como Rhapsody II, Memories of Marl Kingdom é um RPG baseado em turnos em formato tradicional; porém, o formato da party é um tanto atípico. Desta vez, podemos contar com até 16 personagens jogáveis simultaneamente, incluindo humanos, marionetes e monstros, que aqui são separados do segundo grupo explicitamente, dando-lhes mais independência.

Na prática, escolhemos as ações dos quatro personagens da linha de frente e os outros irão agir de acordo com a IA, sendo possível usar o mesmo mecanismo para definir as ações de todos também em modo “auto”. O jogador pode escolher entre pedir que eles economizem energia, focando em ataque e defesa básica, ou ajam sem parcimônia, o que geralmente implica no uso de golpes poderosos que custam SP. Essa barra é individual e limitada, assim como o HP, com os aliados da linha de trás podendo também ser atingidos por golpes.

Cada aliado adicional na mesma linha pode impactar os parâmetros de força do personagem da frente de forma similar às marionetes equipáveis de Rhapsody II. Dependendo da combinação específica de personagens em uma mesma linha, o jogador pode liberar golpes especiais. Um bom exemplo disso é colocar Kururu e Crea juntas ou a princesa com Cello; já o uso da garota com suas marionetes implica em poder optar pelo controle direto dos aliados secundários no lugar do seu turno.

O uso das marionetes, mesmo quando elas não são controladas diretamente pelo jogador, leva ao preenchimento da barra musical, uma mecânica também presente nos títulos anteriores. Gastando esses pontos, é possível usar técnicas especiais invocando doces como panquecas e bolos para esmagar os inimigos. Porém, ao contrário de Rhapsody e Rhapsody II, os personagens precisam aprender cada nível de Reward aumentando o seu próprio nível, como as magias e habilidades normais.

Além do impacto na força dos personagens, as linhas de batalha também funcionam como uma espécie de reserva de aliados. Caso o personagem da frente seja derrotado, o próximo da linha que ainda estiver vivo assumirá a posição a partir da próxima rodada. Uma vez concluído o combate, aliados mortos retornam com 1 ponto de HP.

Um detalhe importante é que, como estamos sempre trocando de protagonista, nosso nível de força regride algumas vezes durante a campanha. Com equipes novas, temos todo um retrabalho de treinar os personagens. Até podemos invocar monstros obtidos nos capítulos anteriores utilizando a mesma estátua de deusa que serve para regenerar HP e SP, mas apenas após o líder atual ter nível superior ao da criatura selecionada.

O primeiro Rhapsody era um jogo muito fácil e o segundo trazia uma evolução gradual confortável, embora com mais desafios. Isso muda completamente em Rhapsody III, que apresenta vários picos de dificuldade que exigem que o jogador dedique parte do seu tempo ao fortalecimento dos personagens, no que chamamos de “grinding”. Há até um item recorrente chamado Pheromone X que é utilizado para atrair mais monstros e em algumas ocasiões se torna praticamente indispensável para avançar, considerando as discrepâncias de força entre a equipe e os inimigos.

Ao derrotar um monstro, podemos encontrar um tesouro, mas ele não é obtido automaticamente. Para ter acesso ao item lá guardado, é necessário que outro aliado ataque o baú, só que isso só pode ser feito enquanto inimigos estão presentes, o que significa que, ao conseguir um tesouro apenas no final do combate, não teremos nenhuma chance de abri-lo, mesmo que, por exemplo, outros aliados ainda não tenham atacado naquela rodada.

Outro detalhe curioso é a interface de batalha, que esconde os elementos da tela caso o jogador escolha seus golpes manualmente. Uma vez fechada a seleção de comandos, não conseguimos mais ver o HP e SP dos aliados, que já tinha um resumo bem simplificado que só dava conta da linha de frente. Porém, isso não acontece se selecionamos a batalha automática, fazendo com que, ironicamente, seja possível ter uma visão mais clara do campo de batalha do que no modo manual.

Um relançamento no Japão, algo totalmente inédito no Ocidente

Embora lançado individualmente para PC, Rhapsody III faz parte de uma coletânea para PlayStation 5 e Switch chamada Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles, que inclui também seu antecessor direto. Se olharmos para o pacote apenas pelo lado da remasterização, vemos um trabalho bem básico. Não foi incluído nenhum tipo de extra adicional significativo, apenas filtros gráficos simples e, no caso de Rhapsody III, ajustes nas texturas para que o jogo tenha uma apresentação melhor.

Porém, esta é a primeira vez que ambos os títulos chegam ao Ocidente, embora seus lançamentos no Japão tenham ocorrido há mais de duas décadas. Com isso, há todo um esforço de tradução que não deve ser desconsiderado para pensar o pacote. Vale destacar também a dublagem em inglês, que cobre apenas os trechos de batalha e história principal, não se estendendo às canções ocasionais nem pequenos jingles, como o bordão musicado de Kururu e Crea.

No PC, além dos ajustes de volume, filtro e textura, podemos modificar os controles, o estilo do gamepad e a resolução. Não há nenhuma opção mais detalhada, sendo um formato geral de configuração que seria considerado bem básico para um jogo no sistema. Além disso, vale mencionar que só é possível ajustá-las no menu inicial.

Até mais, Marl Kingdom

Rhapsody III: Memories of Marl Kingdom
é uma conclusão digna para a série Rhapsody, amarrando várias pontas da trama como um grande presente aos fãs. Embora a tendência ao grinding e o formato episódico sejam potenciais gargalos para o aproveitamento do jogo ao compará-lo com seus antecessores, a experiência vale a pena para fãs de contos de fada e RPGs.

Prós

  • Um sistema de batalha bem completo, que combina elementos dos dois primeiros títulos, exigindo mais esforço do que os anteriores;
  • Possibilidade de auto-battle com opção de economia de energia;
  • Traduzido pela primeira vez para o inglês, com uma escrita bem agradável no idioma, cujo tom respeita o estilo do único que havia sido traduzido anteriormente;
  • O uso de ambientes 3D únicos resolve o problema de se localizar, que era comum nos antecessores;
  • Um mundo charmoso de conto de fadas com personagens cheios de carisma;
  • O ajuste das texturas faz Rhapsody III ter uma aparência muito boa considerando o quão datado ele é.

Contras

  • O formato que se assemelha a um fandisk faz com que o jogo seja contraindicado a quem não experimentou os anteriores;
  • A dublagem em inglês se resume às falas em batalha e da história principal e não há nem legendas para algumas canções em meio a diálogos;
  • Enquanto remasterização, adiciona pouco valor à experiência, tendo apenas filtros gráficos simples;
  • A forma de receber tesouros implica na possibilidade do jogador ficar sem eles se forem desbloqueados derrotando o último inimigo;
  • Incentiva o grinding, colocando picos desequilibrados de dificuldade em determinados pontos;
  • Não é possível ajustar as configurações fora do menu inicial;
  • Os níveis de HP e SP somem da tela durante a batalha se o jogador controlar os personagens manualmente.
Rhapsody III: Memories of Marl Kingdom — PC — Nota: 8.0
 Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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