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Análise: Banchou Tactics (PC): um RPG tático de briga de delinquentes japoneses

RPG estratégico da Secret Character traz um contexto diferente das fantasias usuais, mas não acrescenta ao gênero.

Desenvolvido pela tailandesa Secret Character, Banchou Tactics é um RPG tático com um conceito atípico para o gênero. Em vez de um grande épico de fantasia, temos a história de jovens adolescentes japoneses que fazem parte de grupos de delinquentes. Embora o conceito seja interessante, uma grande variedade de problemas técnicos e escolhas pouco inspiradas pesam contra a experiência.

Uma guerra juvenil

No Japão, existe uma forte cultura de delinquência estudantil explorada em obras audiovisuais variadas como mangás, animes e séries de TV. Traços e estereótipos disso perpassam várias obras e, em termos de jogos, um de seus principais expoentes é a série de beat’em ups Kenka Bancho, sendo o termo “Bancho” (ou “Banchou”) tipicamente associado aos líderes desses grupos.

Em Banchou Tactics temos um olhar diferente para esses conflitos de gangues juvenis, agora como um RPG tático. Controlamos o jovem Arashi Taiga, um rapaz ruivo que tem cara de poucos amigos e age de forma rude, mas as suas atitudes às vezes parecem um pouco de impostação em vez de ele ser genuinamente durão.

Logo começamos a conhecer os outros caras que compram briga com Arashi e, aos poucos, o jovem se torna uma grande referência no colégio Minato. A história vai evoluindo em função das disputas com essas gangues rivais conforme vários incidentes forçam Arashi a agir. Seja pelo grupo inimigo buscar ativamente encontrá-lo para tirar satisfação, seja por um momento de descontração que acaba levando a discordâncias, no fim das contas, tudo acaba sendo resolvido nos punhos.

A estrutura narrativa de Banchou Tactics é dividida em capítulos como se fosse uma série de mangá ou anime. Temos frequentemente escolhas possíveis que surpreendentemente afetam o desenrolar da trama, os aliados obtidos, as batalhas vistas e recursos desbloqueados.

Dito tudo isso, infelizmente a trama em si é um tanto simplista. Jogando, tive a sensação de que os personagens, suas motivações e as disputas pareciam muito genéricos. Dentro do tópico “delinquentes juvenis japoneses”, tudo que é apresentado é lugar comum e exatamente o esperado do gênero, o que talvez agrade algumas pessoas que amam demais os seus estereótipos, mas em geral é pouco criativo e acaba sendo maçante.

Punhos e táticas

Como o próprio nome indica, Banchou Tactics é um jogo estratégico no formato “tático”. Podemos movimentar uma equipe de até seis personagens em um grande campo de batalha quadriculado. Podemos movimentar nossos aliados e escolher uma ação para terminar o nosso turno, com opções como atacar, usar golpes especiais ou passar a vez (Wait).

Caso qualquer uma dessas ações seja selecionada, o jogador passa o turno para o próximo personagem da lista que aparece no canto inferior da tela. Enquanto as outras ações podem ser canceladas a menos que sejam finalizadas, a última opção (esperar sem fazer nada) exige que o jogador selecione uma direção e termine sua vez. Na prática, isso significa que um pequeno erro selecionando Wait sem querer não pode ser revertido.

Cada unidade aliada ou inimiga é caracterizada por um tipo sanguíneo (A, B, AB ou O) que define suas forças e fraquezas contra os outros tipos. Esse sistema também limita alguns dos vários acessórios que são desbloqueados ao longo do tempo e afetam os atributos dos personagens. Na prática, porém, alguns personagens como o próprio protagonista são tão poderosos que basta gastar o BP obtido ao fim de algumas batalhas para aumentar seus pontos de ataque e eles se tornam máquinas de matar inimigos de qualquer tipo ignorando esse sistema.

Dentro das batalhas, movimentar-se e realizar golpes normais enche um pouco a barra de energia que é gasta para os ataques especiais, permitindo que os personagens realizem movimentos mais elaborados como chutes à distância ou múltiplos socos. Cada ação em batalha fora a espera leva a pontos de experiência que são calculados ao final, tendo destaque golpes que levam à morte de inimigos poderosos e sendo levado em conta a diferença de nível de força entre as unidades envolvidas no combate. Dessa forma, se utilizarmos mais um aliado, ele será mais valorizado na pontuação final.

Caso o jogador ainda queira treinar mais, é possível usar o menu Fight Club para explorar os mapas novamente e se preparar para o próximo capítulo. A campanha segue uma ordem linear bem definida, só sendo possível refazer um desses “episódios” após terminar o jogo, então esse sistema de treino garante a chance de avançar com facilidade mesmo para um jogador que tenha feito escolhas muito ruins na evolução de seus personagens.

Erros incompreensíveis

Infelizmente, as batalhas possuem várias decisões de design estranhas que trazem à tona problemas já corrigidos há décadas no gênero tático. A primeira delas diz respeito à visibilidade das informações. Embora cada unidade tenha suas informações em um menu próprio e seja possível ver mais ou menos quem é quem na lista de ordem de turno, o jogo não mostra os detalhes dos inimigos quando movimentamos o cursor por cima deles durante os momentos de movimentação ou ataque.

Assim, a tendência é que o jogador precise clicar em um inimigo e depois conferir se o tipo dele está correto para atacar com segurança. Isso pode significar refazer ações desnecessariamente enquanto jogos que conseguem dar esse feedback visual para o jogador durante a seleção do ataque evitam esse tipo de retrabalho.

Da mesma forma, logo quando começamos o combate, nossos personagens já são colocados automaticamente no campo de batalha. Isso significa que não definimos diretamente o seu posicionamento, sendo possível que uma parte do início do combate seja gasta só para ajustar suas ordens trocadas em relação ao que seria mais vantajoso naquela distribuição específica de peças inimigas.

Não temos também informações sobre os golpes especiais ao abrir o menu exceto pela quantidade de dano/cura e pela área de alcance. Para técnicas de buff ou com efeitos secundários, por exemplo, ficamos no escuro quanto ao que fazem até as usarmos exceto pelo Knockback (arremesso do inimigo em direção a outras unidades no sentido oposto ao atacante).

Embora haja uma grande quantidade de “fases”, havendo até mesmo versões alternativas para alguns capítulos, é importante destacar que os mapas são majoritariamente simples. Os inimigos se dispõem em corredores e basta avançar até eles e atacar, não tendo nenhuma estratégia interessante de como usar o terreno ou formas significativas de interação.

Outro problema técnico são bugs variados. No meu tempo com o jogo, tive momentos em que meu clique não era reconhecido e, inclusive, presenciei alguns crashes. Porém, quando falamos também de decisões de design como as mencionadas anteriormente, a sensação de Banchou Tactics é a de uma equipe de desenvolvimento que não entende de fato os elementos primordiais de um bom jogo de estratégia, ignorando elementos como “definir a posição dos aliados” ou “deixar sempre visível ao jogador as informações necessárias para suas tomadas de decisão”. É como reinventar a roda, trazendo problemas que já haviam sido superados em dezenas de outros títulos do gênero.

No aspecto audiovisual, temos uma atmosfera charmosa de delinquência adolescente graças ao belo uso de personagens 2D em ambientes 3D e a uma trilha sonora que tende ao rock. Porém, mesmo aqui, os problemas são notáveis, com escolhas econômicas a ponto de o jogo nem fazer animações de abrir e fechar portas, mostrando os personagens atravessando ambientes sólidos, além de ter poucas músicas que são repetidas à exaustão. Até mesmo o texto em inglês sofre com alguns errinhos ocasionais.

Abaixo do ideal

Embora tenha uma ideia curiosa e que chama a atenção, Banchou Tactics é um jogo que deixa muito a desejar quando falamos de RPG estratégico. Temos mapas simplórios demais, uma história que muitas vezes parece genérica dentro do arquétipo de delinquentes juvenis, um desbalanceamento muito evidente no nível de força dos personagens, e vários erros gritantes de qualidade de vida que dão a entender que a equipe de desenvolvimento deveria ter estudado melhor o estilo de gameplay proposto.

Talvez pessoas muito fissuradas no contexto e em qualquer jogo tático ainda consigam aproveitar bastante Banchou Tactics. Eu mesmo confesso que me diverti em alguns momentos e minha sensação foi mais de pena mesmo porque é um conceito bem agradável que poderia ser utilizado para fazer um jogo de nível bem alto. Torço que os próximos jogos da equipe possam oferecer mais polimento e quiçá alçar voos mais ambiciosos.

Prós

  • O sistema de combate baseado em forças elementais de sangue ajuda a valorizar o planejamento da equipe e sua movimentação pelo campo de batalha;
  • Boa variedade de equipamentos desbloqueados e compráveis ao longo do tempo;
  • Embora seja difícil de notar, as escolhas trazem impactos significativos no desenrolar da trama, nos combates e nos recursos disponíveis;
  • Menu Fight Club permite rejogar as fases para treinar os personagens quando quiser;
  • O estilo de personagens 2D em ambientes 3D e a trilha sonora que tende ao rock formam uma atmosfera bem charmosa.

Contras

  • Fases com design simples e repetitivo;
  • O balanceamento dos personagens é bastante questionável, com alguns aliados que ficam demasiadamente poderosos com pouco esforço;
  • As informações importantes para as batalhas só aparecem em submenus, dificultando a inteligibilidade do campo;
  • Algumas escolhas de pequeno orçamento como fazer os personagens atravessar portas sem animação de abertura são bem nítidas e dão a sensação de falta de polimento ao jogo;
  • A trama e os personagens infelizmente acabam soando muito genéricos e pouco criativos dentro do que obras de delinquentes tradicionalmente oferecem;
  • A trilha sonora poderia ser mais rica em quantidade de músicas;
  • O jogador não pode cancelar o Wait, potencialmente perdendo o turno por um pequeno erro;
  • Bugs de graus variados, incluindo crashes, ainda estão presentes no jogo no presente momento desta análise;
  • Impossibilidade de ajustar posicionamentos dos personagens antes do combate impacta o controle estratégico inicial do jogador;
  • Alguns errinhos textuais ocasionais.

Banchou Tactics — PC — Nota: 5.0

Revisão: Heloísa D’Assumpção Ballaminut
Análise produzida com cópia digital cedida pela Flyhigh Works


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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