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Análise: Loopers (PC/Switch): uma bonita história sobre encarar o amanhã

Mesmo com um desenrolar um tanto quanto previsível, a trama desta visual novel nos lembra da importância de aceitar o fluxo do tempo.

Em algum momento das nossas vidas, nós desejamos que o tempo congelasse por algum motivo. No entanto, esse fluxo não para e, quando menos percebemos, já é um novo dia — e às vezes, sentimos que não fomos capazes de agarrar as oportunidades que o ontem nos deu.


Loopers, uma visual novel cinética (linear) escrita por Ryukishi07 e publicada pela Key, traz em sua narrativa um tema já muito explorado na ficção científica: a ideia de ficar preso em um loop temporal e repetir o mesmo dia de novo e de novo, sem as consequências de um amanhã que nunca vai chegar.

Uma caça ao tesouro interminável

Desde pequeno, o jovem Akira Taira (Tyler) é fascinado por caças ao tesouro. Agora em sua adolescência, o rapaz se considera um exímio Geohunter, título dado aos caçadores de tesouros que utilizam o aplicativo em escala mundial de mesmo nome para esconder e procurar os mais variados tipos de relíquias com a ajuda do GPS para indicar suas localizações.

Certa noite, durante uma de suas caçadas, Tyler encontra duas garotas com quem estudou quando mais novo, Kiriko Hiruda (Hilda) e Reona Machimura (Leona). Conversa vai, conversa vem e o protagonista as convence a participar de uma caçada ao tesouro noturna. Contudo, enquanto procuram pelo objeto escondido em um parque local, Hilda, a medrosa do trio, afirma ter visto Sagashi-Onna, uma lenda urbana sobre uma mulher em busca de seu coração.


Obviamente, os outros dois não acreditam na garota e a busca continua até que finalmente os amigos encontram o tesouro perdido: um broche de coração. Hilda, tentando se fazer de durona frente às provocações de Leona, faz o oposto do que é sugerido na lenda de Sagashi-Onna e profere que o coração do espírito errante não foi encontrado.

No entanto, a partir daí, as coisas começam a dar muito errado e logo Tyler e Hilda descobrem que eles estão revivendo o mesmo 1 de agosto de novo e de novo. Sendo assim, eles se juntam a um grupo chamado Loopers, composto por outras cinco pessoas — Takaaki Saimon (Simon), Jou Kirishima (Joe), Sana Horii (Holly), Misaki Rita (Ritapon) e Mia Fujikawa (Mia) — que também estão presas dentro desse loop espaçotemporal.


Infelizmente, não é difícil perceber que reviver o mesmo dia acaba trazendo consequências mentais nos Loopers, que cada vez mais desejam voltar para casa. Tyler se aproveita disso para transformar o 1 de agosto interminável em uma grande caçada ao tesouro e logo os integrantes do grupo se veem renovados, especialmente Mia, que acaba compartilhando um vínculo especial com o Geohunter.

Vou encerrar a sinopse do jogo por aqui para não entrar no campo dos spoilers, porém quero enfatizar que a visual novel aborda, mesmo que de modo sutil, vários temas sensíveis, em especial a saúde mental. Embora alguns aspectos pudessem, na minha opinião, ser melhor explicados e explorados para evitar a previsibilidade do lugar-comum narrativo, Loopers consegue trazer uma trama consistente do começo ao fim, não sendo tão afetada pela curta duração da campanha  que leva de 5 a 10 horas para ser concluída, a depender da velocidade de leitura individual de quem estiver no controle.

Uma combinação inusitada e esteticamente agradável

Para quem não tem tanta familiaridade com o cenário de visual novels, Ryukishi07 (r07) é a mente por trás da série When They Cry, cuja popularidade se deu principalmente com Higurashi e Umineko; por outro lado, a Key é uma empresa que lançou jogos como Kanon, Air e o aclamado Clannad.

Juntar uma pessoa conhecida por escrever roteiros cheios de elementos de terror psicológico e violência explícita e uma empresa focada em histórias que apelam para o drama do cotidiano é, de fato, uma combinação inusitada, mas, como comentado, Loopers consegue abordar um pouco de tudo — drama, comédia, suspense e até mesmo elementos psicológicos — de maneira satisfatória. Inclusive, durante a leitura, foi difícil não chorar com certas passagens da visual novel, mesmo que um tanto clichês em alguns momentos, tamanha a competência narrativa de r07.


O ponto alto, no entanto (e muitos hão de concordar), é a estética do jogo: eu mesma me senti vendida pelas belíssimas ilustrações de Kei Mochizuka, que trazem um estilo único e cheio de personalidade com seus contornos acentuados e cores vibrantes. O design de cenário, mesmo que simples, é detalhado e colorido o suficiente para contrastar com a arte dos personagens, deixando a leitura extravagantemente bela, mas sem agredir o bom senso estético.

A trilha sonora também tem um importante papel na construção da atmosfera descrita em texto. Soma-se a isso a excelente dublagem integral em japonês e temos uma visual novel curta, porém extremamente competente no âmbito audiovisual.


Porém, não são apenas esses aspectos que contribuem para a apresentação de Loopers como um todo. A interface é completamente customizável, da cor da borda da janela de diálogo à fonte usada no texto, passando pela velocidade de texto e comandos in-game, de modo a deixar o jogador confortável o suficiente para aproveitar a leitura.

Pode-se notar um cuidado enorme por parte da Key para tornar a visual novel acessível a vários públicos nesse aspecto Além disso, pessoas que possuem PC ou notebook com tela sensível ao toque podem aproveitar os comandos táteis, deixando a jogatina mais próxima à experiência proporcionada pelo Switch.


Se eu tenho alguma reclamação em relação à performance como um todo, ela está relacionada ao pequeno "engasgo" no início das aberturas do jogo, na transição do estático para o animado; no entanto, durante minha jogatina, tudo rodou relativamente bem, sem lags ou congelamentos, e até mesmo o texto em inglês traz uma qualidade ímpar, de fácil entendimento até mesmo para aqueles que não têm muito domínio da língua.

Talvez jogadores mais exigentes sintam falta de mais expressões faciais e poses para os personagens, mas, em termos gerais, temos aqui uma obra narrativa cheia de carisma e personalidade.

Não tenha medo de viver o amanhã

Mesmo com alguns clichês narrativos e elementos que poderiam ser melhor explorados ao longo da trama, Loopers é uma visual novel extremamente bela e competente, tanto no âmbito audiovisual quanto no textual, e que conta com uma vasta gama de configurações para deixar o jogador confortável durante a leitura. É difícil não se emocionar com a história que, apesar de curta, consegue ressoar — e muito — com elementos do nosso dia a dia.

Prós

  • Belíssima apresentação audiovisual;
  • Embora curta, a história é coerente e envolvente;
  • Grande variedade de customização de interface e comandos;
  • A versão de PC é compatível com monitores que possuem suporte à tela de toque;
  • Texto de fácil entendimento até mesmo para quem não domina tanto o inglês;
  • A arte de Kei Mochizuki traz bastante personalidade e carisma aos personagens;
  • As músicas e a dublagem integral em japonês trazem ainda mais sentimento ao texto.

Contras

  • Alguns elementos narrativos mereciam ser melhor explorados e explicados;
  • Alguns clichês e furos de roteiro eventuais;
  • Os personagens poderiam ter mais poses e expressões faciais.
Loopers — PC/Switch — Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Visual Arts

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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