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Análise: Gylt (Multi): uma jornada através da crueldade juvenil

Acompanhe Sally em uma incessante busca por sua prima desaparecida.

Desenvolvido e publicado pela Tequila Works originalmente para o antigo serviço de streaming Google Stadia, Gylt é um jogo que mescla elementos de aventura, terror e resolução de puzzles para contar uma interessante história que tem o bullying como pano de fundo.

Caindo em um mundo distorcido

O enredo começa acompanhando a protagonista Sally colando cartazes de sua prima desaparecida, Emily, pelos muros da cidade. Porém, ela é interrompida por valentões da escola e, após fugir, acaba sofrendo um acidente com sua bicicleta. Tentando voltar para casa, ela entra em um teleférico que a leva a uma realidade alternativa assustadora, na qual sua cidade está mergulhada na escuridão e infestada por terríveis monstros.

Explorando o estranho local, a garota avista sua prima dentro da escola e embarca em uma busca desesperada para resgatá-la. Nesse contexto, cabe a Sally desvendar o que aconteceu e encontrar uma maneira de escapar, salvando a Emily e a si mesma.

Sem entrar em spoilers, a ideia principal da trama gira em torno da intimidação e assédio que algumas pessoas infelizmente exercem sobre outras (neste caso, as envolvidas são crianças). Nesse sentido, o título é bastante eficaz em nos fazer refletir que em algumas situações a falta de ação ou prestação de ajuda é tão prejudicial quanto a própria violência.

O mais interessante é que essa discussão não é levantada apenas de forma expositiva durante os diálogos, mas também incorporada à própria ambientação por meio de elementos que compõem o cenário. Isso ocorre tanto através de manequins articulados cuidadosamente posicionados para recriar cenas de abuso quanto por meio de rabiscos, desenhos e frases insultantes espalhadas por toda a escola.

Nessa perspectiva, a forma como o mundo criado é capaz de refletir os terríveis maus-tratos enfrentados pelas vítimas torna essencial prestar uma atenção minuciosa à paisagem. É através desse olhar atento que conseguimos desvendar os segredos, os medos e os traumas que assombram as personagens envolvidas.

Criaturas estranhas, quebra-cabeças inventivos

A jogabilidade de Gylt acontece em um cenário 3D, focando principalmente em momentos de furtividade e resolução de puzzles. Ao explorar as áreas da escola e da cidade, o jogador se depara com criaturas sinistras capazes de derrotar a protagonista com muita facilidade.

Para enfrentar esses monstros, podemos utilizar a luz de uma lanterna em seus pontos fracos; porém, agir com furtividade se mostra uma tática mais efetiva, já que, ao surpreendê-los por trás, conseguimos derrotá-los com um único ataque e economizar a bateria do objeto. 

Nesse sentido, a inteligência artificial dos inimigos é satisfatória e nos permite confundi-los com o uso da iluminação ou lançando latas encontradas pelo caminho. Vale mencionar que as pilhas são um recurso importante durante toda a aventura e, apesar de as encontrarmos com certa frequência, utilizá-las sem cautela pode gerar momentos desnecessariamente difíceis.

Além do holofote, em determinado ponto da campanha, adquirimos um pequeno extintor de incêndio. Assim como o objeto de luz, esse instrumento também pode ser usado como arma, congelando os adversários. Além disso, ele é igualmente fundamental em muitos momentos da exploração. 

Quanto aos quebra-cabeças, Gylt também se destaca positivamente, pois eles exigem que os jogadores observem cuidadosamente os cenários para resolvê-los. Alguns exemplos incluem encontrar e destruir os olhos gigantes de um monstro para abrir uma passagem ou mover objetos corretamente para acessar novas áreas.

Durante nossas aventuras, ainda temos a oportunidade de descobrir e reunir alguns artigos opcionais que enriquecem a experiência. Alguns desses itens nos proporcionam um contexto mais profundo sobre o mundo ao nosso redor, enquanto outros são essenciais para desbloquear um final alternativo.

Esses detalhes conferem um fator replay considerável a Gylt, já que, além dos múltiplos desfechos, explorar cada canto desse universo revela camadas adicionais à história, o que é fundamental para os jogadores que queiram se aprofundar mais na trama. 

Outro aspecto que merece elogios é o mapa, que é eficiente em exibir os principais pontos de interesse e as rotas que a região possui. Além disso, ele revela as áreas onde segredos podem ser descobertos, tornando a exploração mais prática.

Finalmente, é importante destacar que Gylt é encantador em termos gráficos, lembrando os filmes infantis feitos pela Pixar ou Dreamworks. Adicionalmente, em alguns momentos o enredo é contado por meio de cutscenes criativas que adotam um aspecto similar a histórias em quadrinhos. 

Existem alguns detalhes que poderiam ter recebido mais cuidado

O fato de Gylt ter legendas em nosso idioma é louvável, mas a localização apresenta problemas, já que alguns textos parecem misturar o português do Brasil com o de Portugal. Além disso, outro ponto que deixa a desejar é a baixíssima variedade de monstros, com as poucas espécies presentes se repetindo durante toda a jornada.

Por fim, outro aspecto que pode incomodar é a troca de áudio, que ocorre de forma lenta. Explico: quando um monstro percebe Sally, a música se intensifica; porém, quando a criatura é derrotada rapidamente, a trilha de perigo demora a se dissipar, criando a falsa impressão de que há mais inimigos por perto.

Libertando-se das amarras do (nem tão) saudoso serviço de streaming

Gylt possui uma abordagem inteligente ao integrar a temática do bullying, uma questão importante e atual, a um jogo de aventura e terror. Por meio de uma jogabilidade divertida, ele consegue transmitir sua mensagem de forma envolvente sem prolongá-la desnecessariamente.

Embora possam existir alguns contratempos que talvez causem incômodos, é inegável o quão consistente e agradável é o conjunto geral da obra, tornando esses problemas pequenos quando comparados à experiência total que o título proporciona.

Prós:

  • Abordagem inteligente da temática do bullying;
  • A mecânica de furtividade funciona bem e gratifica o jogador com a economia de recursos;
  • Os múltiplos desfechos conferem um fator replay considerável;
  • A exploração recompensa os jogadores com artigos opcionais que enriquecem a história e possibilitam um dos diferentes finais;
  • Os gráficos são muito charmosos;
  • O mapa é eficiente em exibir os pontos de interesse, as rotas que compõem a região e as áreas com segredos a descobrir;
  • Legendado em português.

Contras:

  • Problemas na localização, com mistura de português brasileiro e português de Portugal;
  • Baixa variedade de monstros;
  • A troca de áudio é lenta após derrotarmos um inimigo, criando uma falsa sensação de perigo persistente.
Gylt — PC/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: PS4 
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Tequila Works

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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