Análise: Itorah (Multi) pinta um belo metroidvania de fantasia da América Central

Mais atraente para os amantes de encantadores gráficos pintados do que aos que esperam desafios profundos.

em 12/05/2023

Itorah
foi lançado primeiramente em 2022 e levou um ano para chegar aos consoles, o que aconteceu em abril. Trazendo a proposta de um metroidvania desenhado à mão com influência de culturas da América Central, o jogo foi desenvolvido por um estúdio alemão, Grimbart Tales, que caprichou nos visuais e músicas, ainda que outros aspectos tenham sido menos inspirados.


Uma fábula sobre ecos do passado

No início, você desperta como uma jovem sem memórias. Sim, já vimos o recurso da amnésia muitas vezes, mas aqui é pela boa causa de criar o mistério de ser a última humana em um mundo habitado por seres que se assemelham a animais. Você não lembra quem é, embora a descrição do jogo já revele que seu nome é o mesmo do título: Itorah.

Ela conhece um machado falante, também amnésico, que diz ser um grande guerreiro e se torna a arma de Itorah na busca por respostas para ambos. A dupla esbarra em Ahui, uma exploradora parecida com uma lêmure, que os leva ao seu vilarejo de Chimali, onde são orientados a procurar Dahlia, a guardiã da Árvore do Mundo, e, de quebra, investigar a Praga que tem se espalhado e contaminado a fauna e a flora da região.




Sim, a Praga sintomática de que há algo errado acontecendo é outro lugar-comum em aventuras desse tipo, mas funciona como motivação para a trama e sua única ofensa é não surpreender os jogadores. A apresentação cuida bem do enredo ao contá-lo por meio de diálogos em português brasileiro acompanhados de belos sprites desenhados e animados para os personagens, assim como vozes minimalistas sem palavras, pequenos grunhidos que dão os tons das falas.

A ambientação de fantasia centroamericana é linda no estilo de pintura, o que pode ser facilmente conferido nas imagens desta análise e no trailer ao final. Podemos ver as referências na arquitetura de pirâmides de pedra, no design das máscaras dos habitantes locais, nas vestimentas e adornos emplumados, na exuberante flora tropical, nos nomes e referências.




Por exemplo, a história se passa em uma terra chamada Nahucan, que em nahuatl, a língua asteca, quer dizer "nos quatro lugares". Esse significado combina com a estrutura do mundo e seus quatro locais sagrados protegidos por guardiões. Um deles é a divindade Quetzalcoatl, a serpente emplumada; outra é Dahlia, cujo nome não é nativo, mas a flor que o carrega vem de lá. O nome da vila Chimali significa “escudo” e… deu para entender, não?




Outro dos pontos fortes de Itorah é a trilha musical de inspiração folk. Cada nova área traz consigo uma nova música, que sempre me fazia admirar a melodia e o clima proporcionado pelos instrumentos de cordas, como violino, alaúde e bandolim, misturados a elementos sintéticos. Até quando retornava a uma das áreas centrais, eu era impactado pelas melodias já conhecidas.



A gameplay balança, mas não chega a cair

Infelizmente, a gameplay não alcança a mesma elevação do audiovisual. É perceptível que os devs se esforçaram e conseguiram manter o design geral segundo os padrões do gênero. Isso bastaria uns sete ou cinco anos atrás, mas, no contexto de hoje, em que os metroidvanias proliferaram em várias formas, Itorah não se sobressai nem contribui para a evolução de ideias desse meio.

Podem esperar o design de níveis que dá voltas em si mesmo, abrindo atalhos e cruzando caminhos de forma a conectar-se a outras áreas, mas isso é guiado de forma linear, com um caminho a cumprir.

Quase não há estímulo para exploração; na verdade, quase não há motivo para sair da trilha, uma vez que os segredos são poucos e a maior parte dos tesouros é encontrada em bifurcações simples de intuir. A falta de sistema de viagem rápida também não incentiva a retornar longos caminhos em busca de eventuais baús deixados para trás.




A penúltima dungeon foge a essa lógica fechada e deixa o jogador percorrer os caminhos que preferir, atingindo um dos pontos altos do level design que, de resto, configura estruturas mornas do tipo que descrevemos dizendo “não é exatamente ruim, mas…”.

Os tesouros em si são poucos, correspondendo às melhorias de personagem: Itorah precisa de ecos para aumentar a capacidade de cura e plumas para aumentar saúde e vigor. Adicionalmente, essas melhorias exigem pagar um preço em cristais coletados às centenas em baús. Logo vemos que não é um sistema profundo, mas dá margem para escolher o que você prefere aumentar e tentar runs concentradas em aumentar o vigor, ou a cura ou até sobreviver sem upgrades, para quem curte desafios.




O combate certamente é a parte menos apurada do jogo e o principal motivo está na baixa variedade de inimigos e na passividade com que muitos deles se comportam, seguindo loops que parecem ignorar a presença de Itorah. Mesmo perto do fim, quando é palpável a evolução do poder da protagonista, o design das lutas não encaixa no bom uso do modesto repertório aprendido.

Altos muito altos e baixos moderados

É fácil perceber que Itorah é uma experiência estética muito esmerada e, pela execução mediana do design de níveis e, principalmente, do combate, é também fácil se indagar se a desenvolvedora Grimbart Tales colocou seu maior empenho no lugar errado. Penso que essas forças não se anulam e a beleza de imagens e sons são o bastante para recomendar o jogo aos que procuram por esse tipo de apreciação, mesmo que a gameplay não esteja no mesmo patamar e fique apenas no razoável.






Apesar de apresentar um mais do mesmo tímido na gameplay, a aventura da última humana chama a atenção de imediato pela arte e entrega o que promete. Itorah aproxima-se de jogos como Ori and the Blind Forest e o recente Afterimage, entre outros, para representar o sublime da pintura e mostrar que nem só de pixel art vivem os metroidvanias.

Prós

  • O visual pintado tem beleza excepcional;
  • As músicas instrumentais são marcantes e se erguem acima da média;
  • Os sprites detalhados e o design de som dão vida às personagens;
  • Ambientação ímpar de uma fantasia da América Central.
  • Textos em português brasileiro.

Contras

  • Movimentação de pouca agilidade em boa parte da campanha;
  • O combate simples até melhora no decorrer das horas, mas os inimigos inexpressivos não empolgam;
  • Pouca exploração fora do caminho definido;
  • Alguns segmentos são mais retilíneos ou extensos que o necessário;
  • Ausência de mecânica de viagem rápida.
Itorah – PS4/XBO/PC/Switch – Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PS4 (jogada no PS5)
 
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
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Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies. Veja minhas análises no OpenCritic.
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