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Análise: PARANORMASIGHT: The Seven Mysteries of Honjo (Multi): uma montanha-russa de mistério sobrenatural

Uma obra imperdível de mistério com doses de terror.

Originalmente anunciado na apresentação japonesa do Nintendo Direct em 8 de fevereiro, PARANORMASIGHT: The Seven Mysteries of Honjo é um jogo de mistério que segue o formato de visual novel. Brincando com o conceito de maldições em uma narrativa surpreendentemente bem escrita, a obra é um enorme acerto da Square Enix.

Os sete mistérios

O conceito de PARANORMASIGHT gira em torno de lendas que circulam pela região de Honjo, em Tóquio, há gerações. Ao todo, elas são conhecidas como “Os Sete Mistérios de Honjo”, embora o seu número exato varie de acordo com o contador, podendo chegar a nove no total. Todas elas parecem ter relação com casos estranhos que ocorreram durante o período Edo e acabaram deixando para trás algum tipo de remorso.

Curiosamente, há mais por trás dessas histórias do que pode parecer a princípio; mais especificamente, elas parecem estar conectadas de alguma forma com um ritual de ressurreição. Uma vez que a obra revela que esses elementos sobrenaturais realmente existem, cabe ao jogador entender como os personagens se relacionam com essa proposta de trazer os mortos de volta à vida.

Nesse sentido, PARANORMASIGHT é uma aventura sombria vista pelo ponto de vista de múltiplos personagens. Começamos a trama com um rapaz chamado Shogo Okiie e depois temos a chance de vivenciar as perspectivas de outras pessoas, cada uma com suas próprias motivações para se envolver com esse contexto sobrenatural.

Vou evitar comentar mais a fundo o enredo, pois este é um ponto muito importante da experiência, mas vale destacar que o grande mistério é bem conduzido, explorando elementos históricos e o próprio sobrenatural de forma lógica e instigante. Junto aos personagens carismáticos e de personalidades sólidas, o resultado é uma obra envolvente e bem escrita.

Um outro olhar para as maldições

PARANORMASIGHT gira em torno de um grupo de indivíduos que acabam se envolvendo com maldições relacionadas aos Sete Mistérios. Mais especificamente, em vez de sofrerem os seus efeitos, essas pessoas são vistas como seus portadores, capazes de usá-las como se fossem poderes especiais mediante condições específicas.

Para poder ativar a Ressurreição, é necessário coletar as almas de outras pessoas, tendo especial valor aquelas de outros usuários das maldições. O resultado é que temos alguns conflitos diretos entre esses indivíduos que funcionam como desafios mentais para evitar as condições dos adversários e ativar a sua própria. Por exemplo, um personagem pode precisar se esconder enquanto outro pode eliminar quem foge.

Esses detalhes relacionados a como as maldições são ativadas e a ligação delas a eventos do passado atiçam a curiosidade e são um dos pontos altos da trama. Esses detalhes, assim como várias informações sobre a ambientação e os personagens, podem ser lidos em menus próprios com bastante riqueza de detalhes.

Entrando no nível meta

Embora a trama seja bem interessante em seu trabalho de mistério, personagens bem desenvolvidos e no conceito de maldição, há outro elemento que faz com que o jogo seja especialmente engenhoso: a metanarrativa. Como em várias obras do escritor e diretor Kotaro Uchikoshi ou em jogos de gêneros variados como a série Metal Gear Solid, PARANORMASIGHT brinca com a perspectiva do jogador quebrando o conforto do distanciamento da obra ficcional.

Para resolver vários enigmas do jogo, há determinados elementos que exigem que o jogador explore mais a fundo a proposta e pense por conta própria em resoluções que só fazem sentido pela experiência ter uma determinada estrutura. Em vez de simples escolhas, pode ser necessário, por exemplo, ajustar as configurações do menu para que a solução se apresente.

A relação do jogador com a interface e o seu entendimento para além de seguir uma linha narrativa simples são pontos importantes da experiência. Esses elementos metalinguísticos ajudam a dar mais camadas à experiência e deixar alguns enigmas bem interessantes.

Imersão

Como um jogo de mistério com elementos sobrenaturais, uma parte muito importante da experiência é fazer com que o jogador se sinta imerso naquele mundo. Elementos audiovisuais precisam reforçar de alguma forma essa sensação de presença, fazendo com que os detalhes mais sombrios tenham um impacto muito mais pessoal e íntimo do que um conjunto de eventos genéricos.

Nesse sentido, a primeira coisa que chama a atenção em PARANORMASIGHT é o trabalho de câmera, que é bastante expressivo. Temos closes que reforçam a sensação de estranheza, deixando o jogador cada vez mais próximo de detalhes como os olhos dos outros personagens e uma disposição bem realista de indivíduos e objetos nas cenas. É o extremo oposto do usual do gênero que costuma favorecer uma perspectiva mais abstrata, colocando os personagens em um mesmo plano bidimensional para que o jogador foque apenas nos diálogos e use os elementos visuais como uma espécie de guia.

Junta-se a isso o uso de tons escuros, iluminação precária, fundos borrados e linhas mais escuras nos personagens. Em determinados momentos, é possível ver palavras tomarem a tela toda e os sons mais sinistros reforçam o senso de sobrenatural sinistro, assim como a trilha sonora que varia entre trechos mais próximos do jazz para momentos mais calmos e outros toques mais soturnos que parecem emular o contexto japonês de terror.

Ainda no aspecto visual, temos momentos de exploração em estilo point-and-click, mas a perspectiva dos cenários é de 360º. Esse estilo de visão já havia sido empregado em Alternate Jake Hunter: Daedalus: The Awakening of Golden Jazz (Multi), da Arc System Works, mas aqui ganha mais uma forte motivação: reforçar o medo do que pode estar escondido.

Vale destacar, porém, que há dois pequenos fatores que podem ser negativos para alguns jogadores. O primeiro deles é a ausência de dublagens: embora seja possível escutar os fantasmas, nenhum humano emite vozes. Essa ausência é particularmente sentida por se tratar de um elemento que já é bem habitual na indústria e é considerado muitas vezes fundamental para transmitir as emoções das cenas. Pessoalmente, sinto que as personalidades claras dos personagens e o texto muito bem escrito reduzem o peso dessa ausência.

Além disso, o sistema de fluxograma do jogo acaba tendo alguns momentos em que a sua efetividade é reduzida. Basicamente, a partir de certo ponto do jogo, é possível explorar os vários momentos da narrativa já liberados em um Story Chart. A divisão de cenas, porém, nem sempre é ideal, fazendo com que revisitar um trecho possa demandar muito mais tempo do que outros.

Um mistério instigante

PARANORMASIGHT: The Seven Mysteries of Honjo
é uma das obras mais interessantes do seu gênero, destacando-se especialmente pelo uso sagaz dos enquadramentos de câmera e por brincar com a percepção do jogador através de múltiplas perspectivas e elementos metalinguísticos. Este título é uma fácil recomendação para qualquer jogador interessado em obras narrativas e mostra como há várias formas engenhosas de repensar o conceito de adventure e, mais especificamente, visual novels.

Prós

  • Narrativa de mistério com elementos sobrenaturais bem conduzida;
  • Belo trabalho de câmera que ajuda a aumentar a sensação de presença e estranheza das cenas;
  • Elementos metalinguísticos bem trabalhados para a resolução dos enigmas;
  • Personagens carismáticos com traços claros de personalidade e boas nuances para o seu envolvimento com as maldições;
  • O conceito das maldições, ligando-as com eventos do passado e com “métodos de ativação” específicos atiça a curiosidade para os momentos de conflito direto;
  • Trilha sonora e efeitos ajudam na imersão das cenas, reforçando a sensação de mergulhar em um mundo sombrio sobrenatural.

Contras

  • Ausência de dublagem pode reduzir um pouco a imersão para algumas pessoas;
  • Algumas cenas poderiam ter mais divisões para o jogador explorar mais rapidamente os eventos ao rejogá-las.
PARANORMASIGHT: The Seven Mysteries of Honjo — PC/Switch/Android/iOS — Nota: 9.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Square Enix

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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