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Análise: 9 Years of Shadows (PC) nos desafia a recolorir o mundo em um metroidvania básico

O título de estreia do estúdio indie Halberd Studios esbanja estilo, mas não tem ideias impactantes.


No mundo de 9 Years of Shadows, toda a cor foi drenada por uma maldição, e uma guerreira e um espírito são os únicos capazes de reverter a situação. Para isso, exploramos um castelo repleto de perigos em uma veloz aventura de ação 2D, utilizando armaduras elementais para ganhar habilidades e acessar novas partes do mapa. O primeiro jogo do estúdio mexicano Halberd Studios é competente e bem-acabado, porém, a interpretação morna de conceitos consagrados o impede de se destacar.

Em busca das cores do mundo após anos soturnos

Depois de um estranho evento, as cores desapareceram, resultando em desespero. Criaturas malignas surgiram, as sombras corromperam as pessoas e os poucos que resistiram vivem em constante tensão. Uma das sobreviventes é Europa, uma jovem que perdeu os pais para essa maldição terrível. Ela treina diligentemente para, um dia, adentrar o castelo de Talos, que supostamente é a fonte da maldição — até hoje, ninguém voltou de lá.

Depois de nove anos de treinamento, Europa decide resolver a situação e adentra o castelo de Talos. Lá, ela é atacada por uma estranha criatura, que aparenta ser imortal. No último segundo ela é salva por Apino, um espírito na forma de ursinho de pelúcia que tem o poder peculiar de restaurar a cor do mundo. Juntos, a dupla decide explorar o castelo a fim de encontrar uma maneira de purificar a maldição e também de entender o que a desencadeou.


A jornada dos dois heróis se desenrola na forma de um jogo de ação e plataforma 2D. Para dar conta dos monstros, Europa usa uma alabarda para desferir sequências de ataques. Já Apino dispara projéteis de energia, que são uma ótima maneira de acertar oponentes e dispositivos distantes. Os tiros consomem uma barra, que também funciona como defesa da protagonista, e esse medidor só é preenchido ao derrotar inimigos ou ao abraçar o ursinho. Por causa disso, é importante saber dosar o uso dessa habilidade para não ficar completamente desprotegido.

Pelo caminho, a dupla adquire poderes que permitem explorar novas partes do castelo. Europa encontra armaduras com habilidades de locomoção, como flutuar por correntes de ar quente ou nadar velozmente pela água. Além disso, os conjuntos têm propriedades elementais pensadas para explorar as fraquezas de inimigos — podemos alternar livremente entre as armaduras. Apino também se fortalece e seus tiros ganham mais propriedades, o que abre novos caminhos.



Alternando entre armaduras elementais para superar desafios

9 Years of Shadows é, em sua essência, um metroidvania bem tradicional, mesclando momentos de combate, exploração e plataforma. O mapa do castelo de Talos é complexo, com muitos pontos que só podem ser acessados após obter habilidades específicas. Mas, mesmo assim, a progressão é bem linear: na maior parte do tempo, há um único caminho para seguir, com eventuais rotas opcionais com itens.


O grande destaque está na fluidez da ação, proporcionada pelas várias habilidades de locomoção. Cada armadura adquirida por Europa tem uma especialidade, e os cenários demandam utilizá-las com frequência em bons trechos de plataforma. Em uma área aquática, precisamos nadar com cuidado por minas explosivas enquanto saltamos entre cachoeiras. Já na caldeira do castelo, o desafio é flutuar por salas de configuração complicada. Os melhores momentos da jornada são aqueles que misturam os conceitos, exigindo mudanças frequentes de armaduras para utilizar seus poderes corretamente.

O resultado dessas decisões é um jogo ágil, rápido e focado, sem deixar de lado um pouco de conteúdo opcional. Porém, ao meu ver, faltou ousadia e criatividade na aventura. Para começar, os desafios de plataforma são muito parecidos entre si, contando somente com algumas variações simples, trazendo sensação de mais do mesmo. As habilidades dos protagonistas são familiares demais e têm pouco impacto, e algumas são mal aproveitadas — assim que as adquirimos, as utilizamos muito, mas depois elas não são mais necessárias. Por fim, o mundo tem poucos elementos que nos instigam a explorá-lo, pois o mapa é básico demais.



Na agilidade e na frustração da batalha

Um elemento constante em 9 Years of Shadows é o combate que mescla ataques físicos com a alabarda e tiros de energia. O ritmo é bem direto, bastando golpear rapidamente para criar combos, mas também é necessário observação para entender os padrões de ataque dos inimigos. Alguns monstros, inclusive, são vulneráveis a elementos específicos, o que adiciona uma camada estratégica aos embates.

Nesse aspecto, me impressionei com as batalhas contra os chefes. Esses encontros são bem interessantes, principalmente por contarem com elementos que lembram puzzles: normalmente, precisamos escapar de vários perigos e atacar o mestre nos poucos momentos de vulnerabilidade. Além disso, eles são também visualmente estonteantes, pois, em sua maioria, precisamos enfrentar criaturas imensas e imponentes. Curiosamente, o jogo tem inúmeros chefes, cada qual com combates com ideias bem únicas — variedade é o que não falta.


Mas, assim como a exploração, o combate tem alguns pontos negativos. O principal deles é o sistema de vida, com sua barra de defesa que também é consumida pelos tiros lançados por Apino. Eu entendo a intenção por trás dessa ideia que tenta trazer um elemento de risco ao jogo, mas a dificuldade de recuperar essa energia deixa as coisas desnecessariamente difíceis. Foi muito comum, por exemplo, encontrar um inimigo que só é vulnerável a tiros e acabar morrendo por besteira por ter gastado toda a energia tentando acertá-lo. Habilitar a recarga a qualquer momento, ao custo de ficar momentaneamente vulnerável, era uma alternativa para resolver o problema.

A outra questão é a simplicidade das mecânicas. Os oponentes comuns têm um único ataque, que é repetido infinitamente. Já os chefes, quando muito, têm três ou quatro movimentos. Como boa parte dos inimigos tem muita vida, às vezes o combate se torna desnecessariamente longo e enfadonho. O sistema de fraquezas elementais, na teoria, parece interessante, mas na prática tem pouco impacto, bastando usar qualquer armadura na maior parte do tempo. Há alguns momentos em que a escolha faz diferença, mas eles são raros.



Em uma aventura pautada em música e estilo

De longe, minha característica preferida de 9 Years of Shadows é sua ambientação. Esse universo está dominado pela tristeza, mas o castelo de Talos é estonteante, principalmente por causa do elaborado e colorido visual em pixel art. As localidades são belas e repletas de detalhes e Europa se move de uma maneira graciosa, o que deixa a atmosfera bem estilosa. Só não sou fã do contorno colorido em volta dos inimigos, pois acaba destoando um pouco do resto do estilo.


A trama é simples, porém é contada de forma envolvente e intimista. Pelo caminho, conhecemos a história trágica de Europa por meio de reflexões mentais da garota enquanto usa algum dos vários elevadores do local: ela lembra de sua família e das dificuldades do mundo sem cor. Ilustrações belíssimas dos personagens ajudam na caracterização, mesmo que a maior parte deles não tenha desenvolvimento algum. E, claro, é impossível não lembrar de um certo grupo de cavaleiros ao olhar para as armaduras de Europa.

Uma trilha sonora suave e marcante embala a jornada. Produzida por Michiru Amane (Castlevania) e Norihiko Hibino (Metal Gear Solid), a música do jogo usa piano, baixo, sax e elementos eletrônicos para criar uma atmosfera que remete ao estilo jazz big band. Fiquei impressionado com a versatilidade das faixas, que consegue simultaneamente ser eclética e dentro de um mesmo tema. Um detalhe curioso é que a música é um elemento central da temática: Europa salva o progresso ao tocar piano, musicistas oferecem missões paralelas e os próprios Michiru e Norihiko são personagens dentro do jogo.



Uma experiência que aposta no seguro

9 Years of Shadows usa música e cor para criar uma aventura singular. A exploração ágil é seu maior trunfo, em especial a troca de armaduras de Europa para superar os vários desafios espalhados pelo castelo de Talos. Tecnicamente o jogo é competente, porém, como metroidvania, ele ousa pouco: a progressão é deveras linear e boa parte dos elementos são simples demais. Para compensar, há muito capricho na atmosfera com o estiloso visual colorido e a trilha sonora notável. Essas características tornam 9 Years of Shadows agradável, apesar de não ser muito marcante.

Prós

  • Ação ágil, com localidades que apresentam bom equilíbrio entre plataforma, exploração e combates;
  • Mundo com bons desafios que exigem alternar entre armaduras elementais;
  • Batalhas contra chefes conceitualmente interessantes e desafiadoras;
  • Ambientação ímpar com trilha sonora marcante e elaborado visual repleto de cor e estilo.

Contras

  • Progressão linear demais, mesmo sendo um metroidvania;
  • Muitas ideias e habilidades subdesenvolvidas;
  • Combate limitado e repetitivo.
9 Years of Shadows — PC — Nota: 7.5
Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela Freedom Games

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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