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Análise: The Knight Witch (Multi) mescla shoot ‘em up e feitiços em uma frenética aventura

Flutue por um mundo fantástico no controle de uma bruxa neste competente título indie.


Em The Knight Witch, uma feiticeira usa seus talentos para proteger o povo de uma ameaça perigosa. Em sua essência, este título indie é um shoot ‘em up bem acessível, pois a heroína flutua livremente pelos cenários, lança magias poderosas e mira automaticamente no inimigo mais próximo. No entanto, isso não significa que a jornada é banal, pelo contrário: o desafio é intenso, contando até mesmo com momentos em que a tela é tomada por projéteis. 

Além de contar com mecânicas de tiro, o jogo oferece um mundo elaborado com progressão metroidvania, sistemas de evolução flexíveis e até mesmo uma mecânica na qual a protagonista se fortalece de acordo com a gratidão da população. Essas ideias, em conjunto com uma ambientação bem construída, resultam em uma aventura razoável, mesmo com alguns problemas pelo caminho.  

Uma cavaleira-bruxa enfrentando uma invasão

Tempos atrás, a Casa Daigadai desenvolveu tecnologias que revolucionaram o mundo ao custo de recursos naturais. A ganância do grupo resultou em um grande conflito liderado por golens mecânicos implacáveis. As únicas capazes de se opor a essa ameaça eram as Knight Witches, feiticeiras poderosas cuja magia vinha da confiança de seus apoiadores. As garotas conseguiram derrotar a casa Daigadai, mas já era tarde demais: o céu se rompeu e a superfície deixou de ser habitável.


A única opção que restou aos sobreviventes foi fugir para o subterrâneo e todas as raças passaram a viver em paz. Porém, a quietude não durou: alguns anos após o fim da guerra, os golens reapareceram promovendo o caos. No meio disso, acompanhamos Rayne, uma garota que, no passado, treinou para ser uma feiticeira, mas acabou se casando e tendo uma vida pacata. Diante uma nova ameaça, a garota se torna uma Knight Witch e vai tentar descobrir as origens da invasão.

O jogo utiliza essa premissa em uma aventura que mescla exploração 2D e shoot ‘em up. Por ser uma bruxa, Rayne é capaz de voar livremente pelos cenários e enfrentar os inimigos lançando esferas mágicas. Por instinto, a garota atira automaticamente no oponente mais próximo, mas também é possível mirar livremente com a alavanca direita — a precisão diminui, mas esses tiros são um pouco mais fortes. Além disso, a heroína conta com um teletransporte de curta distância que a permite atravessar obstáculos e evitar tiros dos inimigos.


Além dos tiros, Rayne tem à disposição inúmeros feitiços armazenados em cartas mágicas. Alguns alteram sua arma principal temporariamente, como uma metralhadora ou bumerangues que atravessam paredes. Já outros têm usos diversos: uma explosão que destrói projéteis, uma espada de energia capaz de atordoar inimigos, um canhão portátil que atira em monstros próximos e muito mais. Cada carta tem um custo distinto de mana e só podemos escolher um pequeno conjunto por vez — o baralho pode ser alterado nos pontos de descanso.

Em uma jornada repleta de tiros e feitiços

Agilidade e frenesi resumem a experiência de jogar The Knight Witch. A aventura de Rayne é pontuada por inúmeros confrontos bem intensos, com alguns momentos de bullet hell. Há boa variedade de inimigos, cada qual com suas particularidades, e as coisas ficam bem interessantes quando há uma combinação de oponentes diferentes e armadilhas.

Apreciei a versatilidade da heroína, em especial os feitiços. Estão disponíveis diferentes categorias de magias, o que nos traz muitas opções na hora dos embates. Há também características de construção de baralhos: só podemos equipar algumas cartas de magia, então é importante fazer uma seleção equilibrada levando em conta o custo de mana e o poder de cada encantamento. Gostei de experimentar as possibilidades e até consegui fazer algumas combinações poderosas.


Dominar os sistemas e agir com perícia são essenciais, pois The Knight Witch tem dificuldade acentuada. É muito comum ser cercado por inimigos e projéteis, que acertam a heroína com facilidade. Além disso, os momentos de bullet hell são complicados, exigindo muita atenção e destreza. Por fim, recuperar a vida é custoso, então qualquer deslize pode ser fatal. A dificuldade é crescente e os trechos finais da aventura são bem complexos, nos forçando a enfrentar ondas de inimigos sem descanso.

Pode parecer desagradável, mas a dificuldade é balanceada, apesar de intensa. Nas inúmeras vezes em que morri, foi por não me mover rápido o bastante ou por priorizar os inimigos errados — reajustar meu comportamento ou alterar a seleção de cartas de magia normalmente foi o suficiente para superar os pontos problemáticos. Apreciei, em especial, a facilidade de alternar entre os tipos de mira: apontei os tiros manualmente na maior parte do tempo, afinal eles ficam mais fortes ao fazer isso, no entanto utilizei o modo automático quando as coisas ficavam tensas demais. Códigos especiais permitem ativar “trapaças” para aumentar ou diminuir a dificuldade.


A clareza da ação é uma característica essencial em shoot ‘em ups, especialmente aqueles com elementos de bullet hell. Infelizmente, The Knight Witch peca um pouco nesse aspecto. O jogo é repleto de efeitos, como explosões e brilhos, que deixam os embates visualmente apelativos. No entanto, isso cria uma confusão gráfica, principalmente nos momentos mais intensos, o que torna difícil distinguir com precisão o que é perigo ou não — foram inúmeras as vezes em que fui atingido por algo que não consegui ver. Faltou um maior equilíbrio nesse aspecto.

Flutuando e desbravando uma metrópole debaixo da terra

Fora dos combates, Rayne explora o mundo subterrâneo de Dungeonidas. O mapa é vasto e muitos trechos só podem ser acessados após adquirir habilidades específicas. Me surpreendi com a diversidade de situações, que variam de puzzles simples a desafios de navegação: em uma área repleta de árvores e vinhas, o desafio é navegar por áreas repletas de lasers em movimento; em um lago, precisamos usar um submarino para explorar partes submersas; já em uma forja, é necessário se esconder atrás de paredes para não ser acertado por torres de sentinela.


O jogo se autointitula metroidvania, mas acredito que é uma definição equivocada. A progressão é completamente linear, a heroína adquire pouquíssimas habilidades durante a jornada e o mundo é dividido em mapas contidos. Há alguns caminhos alternativos, missões paralelas e segredos que só podem ser acessados depois de obter certos poderes, mas o impacto desses recursos é bem tímido. Essa estrutura funciona, pois há bom equilíbrio e diversidade de situações, porém eu apreciaria a presença de mais partes abertas e de mais conteúdo opcional significativo.

Um ponto que me incomodou foi o backtracking, ou seja, a tradicional ação de revisitar áreas anteriores em busca de segredos. No jogo, uma série de decisões deixam essa ação bem custosa. Para começar, só há um único ponto de teletransporte em todo o mundo — ou seja, para ir até outras áreas, precisamos primeiro atravessar inúmeras salas até alcançar o castelo. Complicando a tarefa, temos o fato de que Rayne se movimenta lentamente, o que torna a exploração um pouco arrastada. Por fim, é muito difícil conseguir lembrar com clareza os pontos que precisam de habilidades específicas para serem atravessados, pois o mapa é básico demais. Alguns recursos simples, como pontos de viagem rápida, deixariam a exploração mais prazerosa.



Envolvida em um conflito repleto de impasses

Uma característica notável de The Knight Witch é seu universo, que tem algumas ideias bem interessantes. Um deles é o Link: a protagonista se fortalece ao conquistar a confiança dos outros. Aumentamos esse laço ao resgatar pessoas e ao conhecer novos personagens — alguns indivíduos até liberam habilidades passivas. Conforme aumentamos o Link, liberamos benefícios diversos, como maior cadência de tiro ou aumento da força das magias.

Após certas missões da história, Rayne dá uma entrevista e podemos aumentar o Link de acordo com nossas respostas. Nesses momentos, sempre há um dilema: podemos mentir para aumentar a popularidade da heroína (e, por consequência, seu poder), ou então é possível reivindicar a força e ser honesto dizendo a verdade. O problema é que, no fim das contas, as escolhas não fazem tanta diferença, pois podemos gastar dinheiro para adquirir o Link perdido ao ser sincero.


A história tenta abordar algumas questões singulares, como o controle de informações dentro de um conflito, o uso de propaganda para manipular a população e os dilemas morais de um herói. Contudo, a execução é bastante falha e nossas ações praticamente não têm consequência — falar a verdade muda alguns poucos diálogos e só. Além disso, a trama tem muitos aspectos questionáveis e risíveis, em especial os trechos finais, que são subdesenvolvidos e corridos. Chegou um momento que eu não me importei mais com a história, mas ao menos o texto em português está competente.

Fora isso, o mundo do jogo encanta com sua atmosfera colorida e elaborada que mescla fantasia e tecnologia. Destaco os excelentes gráficos 2D: os cenários são belamente desenhados e repletos de camadas de elementos, já os personagens esbanjam carisma com suas animações vibrantes. É impressionante também a criatividade de localidades do mundo subterrâneo, que conta com belas cachoeiras, selvas deslumbrantes, regiões tomadas por lava e laboratórios abandonados.



Tiros e feitiçaria em uma aventura vertiginosa

The Knight Witch é um shoot ‘em up ágil e agradável. Seu maior trunfo é o combate ágil que usa tiros, feitiços e uma pitada de bullet hell para criar embates variados e eletrizantes. A dificuldade é intensa e justa na maior parte do tempo, e poder alternar entre mira automática e manual a qualquer momento traz flexibilidade à ação.

Além das batalhas, há um mundo vibrante e repleto de situações a ser desbravado. O jogo conta com características de metroidvania, porém elas são bem tímidas: revisitar áreas é custoso e a progressão é majoritariamente linear. Fora isso, o universo encanta com sua beleza elaborada, mas a história não empolga e algumas mecânicas são subdesenvolvidas.

No mais, The Knight Witch é uma experiência shoot ‘em up divertida e veloz.

Prós

  • Sistema de jogo que combina tiro e exploração de forma ágil;
  • Mundo vasto com vários segredos a serem descobertos;
  • Dificuldade intensa e justa, com opções para aumentar ou diminuir o desafio;
  • Ambientação notável com visual elaborado.

Contras

  • Progressão linear demais e com backtracking lento e custoso;
  • Algumas mecânicas são subdesenvolvidas, como os elementos de metroidvania e as entrevistas;
  • Excesso de efeitos visuais compromete a clareza da ação em alguns momentos;
  • Trama mal desenvolvida e com alguns pontos questionáveis.
The Knight Witch — PC/PS4/XBO/Switch — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Team17

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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