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Análise: Gerda: A Flame in Winter (PC) traz um lado da II Guerra Mundial pouco contada nos livros de História

Baseado em fatos históricos, o jogo se apoia em elementos de RPGs tradicionais e desenvolve uma emocionante narrativa.



Desenvolvido pelo estúdio dinamarquês PortaPlay e publicado pela Dontnod Entertainment, Gerda: A Flame in Winter se baseia em fatos históricos durante a II Guerra Mundial para trazer ao jogador um pouco da experiência vivida pelos dinamarqueses durante a ocupação alemã no país. Apoiando-se em elementos de RPGs tradicionais, o jogo proporciona uma verdadeira aula de História imersiva e tocante.

Aula de História estilo RPG

A trama se passa em 1945 na pequena Tinglev, cidade ao sul da Dinamarca, ocupada por tropas alemãs. De um lado, dinamarqueses que se opõem ao III Reich são brutalmente confrontados pelos nazistas, do outro, pessoas se submetem à Alemanha na esperança de viver com o mínimo de dignidade.

Gerda Larsen, a protagonista, é uma jovem enfermeira de 25 anos, filha de pai alemão e mãe dinamarquesa. Devido à sua origem, a guerra lhe traz marcas mais profundas: nem todos os alemães são nazistas e nem todos os dinamarqueses são rebeldes, algo que a deixa em cima do muro, ainda mais por exercer a profissão de enfermeira.


Porém, sua vida muda drasticamente quando seu marido, Anders, é capturado pela Gestapo por ter sido apontado como um dos principais suspeitos de sabotagem em uma fábrica local. Decidida a libertar seu amado, Gerda precisa ser ainda mais cuidadosa com a forma como se envolve com as pessoas: ser colaborativa demais com os alemães pode fazer com ela seja mal-vista pelos dinamarqueses, mas recusar ajuda a soldados nazistas feridos pode colocá-la no radar da Gestapo.

Esse é o ponto-chave de Gerda: A Flame in Winter: dependendo das interações feitas durante a campanha, a enfermeira pode ganhar e perder confiança das pessoas, impactando drasticamente no decorrer da aventura. Mesmo que anunciado como um RPG, o jogo lembra uma aventura narrativa em que as ações determinam o próximo passo de Gerda.


A essa fórmula, soma-se ainda a inserção de "atributos", que também são importantes para determinar o sucesso de uma determinada ação e, ao todo, temos três, Compassion, Insight e Wit, que são aumentados conforme nossas respostas para os diálogos. Ao fim de cada dia, Gerda anota em seu diário tudo o que experienciou; nesse momento, podemos escolher uma de três continuações ao relato inicial, que nos garante um ponto em um dos atributos mencionados.

De início, posso estar parecendo repetitiva, mas quem tem familiaridade com RPGs tradicionais sabe quão importante é um rolar de dados. No entanto, em vez de números, as chances são baseadas nas relações que Gerda alimenta ao longo de seu dia a dia e também na postura que adota perante as mais diversas situações.


A grande surpresa aqui: mesmo escolhas ditas como possíveis podem falhar, e as impossíveis, dar certo. Ainda, algumas ações necessitam têm um tempo limite para serem completadas, alterando o acontecimento seguinte. 

Trata-se de uma combinação inusitada de fato, mas que se prova funcional neste caso. À primeira vista, pode parecer um sistema complexo, mas, com apenas alguns minutos de jogo, é possível entendê-lo por completo — especialmente com tutoriais que sempre aparecem nas horas em que mais precisamos deles.

Por ser um jogo baseado em fatos, diversas explicações históricas são apresentadas ao longo da campanha; muitas delas, inclusive, não me lembro de ter visto durante meus anos na escola, justamente por serem eventos pontualmente europeus.

Ou seja, mais do que uma narrativa baseada em escolhas, a aventura de Gerda é, sobretudo, uma viagem interativa no tempo. Na minha opinião, esse é o maior atrativo do jogo — e acredito que fãs de História hão de concordar comigo —, já que é um tanto quanto difícil encontrar títulos que situam o jogador de maneira tão didática em seu contexto.

Uma produção digna de grandes títulos

Os diálogos em Gerda: A Flame in Winter, durante a aventura, não são dublados, mas todas as outras passagens, como os relatos no diário da protagonista e a contextualização histórica, contam com dublagem em inglês. A arte do jogo, de acordo com os desenvolvedores, segue o estilo impressionista dinamarquês e, por mais que não seja de saltar os olhos para alguns, confesso que achei-a particularmente charmosa e pertinente à proposta do jogo.

Os controles são responsivos, seja jogando com teclado, mouse ou um controle. Outro fator no quesito jogabilidade que me surpreendeu positivamente foi a mudança automática de ângulo de visão e zoom, ainda mais pelo indie apresentar uma visão isométrica. Para traçar um comparativo, eu teria aproveitado mais Agatha Christie - Hercule Poirot: The First Cases (Multi) se eu não precisasse me preocupar tanto com essas questões.


Infelizmente, Gerda: A Flame in Winter não conta com interface em português. Por ser um jogo pautado em leitura, quem não domina um dos idiomas disponíveis pode ter grande dificuldade para aproveitar o jogo.

Outro fator que me incomodou foi a falta de trilha sonora em boa parte do jogo. Existem efeitos sonoros em momentos específicos, como a vitrola tocando músicas tradicionais dinamarquesas em uma sala, mas a pouca música durante a aventura a deixa, na minha opinião, insossa.

Por fim, o jogo conta com salvamento automático, porém ele só ocorre quando terminamos um capítulo. A falta da possibilidade de salvar o progresso manualmente pode comprometê-lo, como aconteceu comigo duas vezes.

Uma aventura única durante a II Guerra Mundial

Gerda: A Flame in Winter, além de trazer uma história riquíssima que explora em detalhes o impacto da ocupação nazista em território dinamarquês, nos coloca em situações em que precisamos deixar a lógica de lado e seguir nossa intuição, garantindo uma imersão certeira.

A apresentação visual do jogo é condizente com sua proposta e possui um charme único e, apesar de escassa, a sonoplastia, quando presente, consegue nos transportar para o período da II Guerra Mundial. Infelizmente, por mais que conte com dublagem em momentos-chave e bons controles, a falta de uma interface em português pode minar a experiência de quem não domina um dos idiomas disponíveis.

Prós

  • Ótima ambientação no contexto da II Guerra Mundial;
  • Diversas explicações de acontecimentos reais complementam a imersão;
  • Apresentação visual agradável e charmosa;
  • Jogabilidade agradável e acessível, com tutoriais sempre que necessário;
  • Dublagem em pontos-chave da narrativa;
  • Boa mescla entre elementos de RPGs tradicionais e aventura textual.

Contras

  • Sonoplastia quase inexistente, deixando a aventura insossa;
  • Sem interface em português;
  • Sem opção de salvamento manual, que pode prejudicar o progresso na campanha.
Gerda: A Flame in Winter — PC/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela Dontnod Entertainment

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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