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Análise: Coromon (PC) oferece uma aventura familiar, mas não menos divertida por isso

RPG de coleção de monstros da TRAGsoft faz jus às suas influências e entrega uma obra coesa aos fãs do estilo.

Há um ditado em inglês que diz que imitar é a forma mais pura de tecer um elogio a algo ou alguém. De fato, o ato de reproduzir ou tentar reproduzir fielmente um feito de outrem é normalmente imbuído de uma admiração bem característica, que acaba se tornando um testemunho à qualidade daquilo que um dia foi pensado, realizado ou alcançado primeiro de outra forma.


É assim na música, no cinema, na fotografia e, claro, nos games. Como o seu próprio nome indica, Coromon é um RPG de monstrinhos que carrega múltiplas influências da longeva série Pokémon. Mas, ao contrário do que um olhar despretensioso poderia indicar, há consistência suficiente aqui para garantir uma recomendação aos fãs do estilo, especialmente aqueles que sentem falta de certo passado em 32-bit.

Nasce uma aventura

Em Coromon, você é um jovem que está deixando a casa de sua mãe para se dedicar à vida de pesquisador de batalhas na Lux Solis, uma abrangente organização dedicada ao compartilhamento de conhecimento e desenvolvimento de tecnologias — como a manopla que os pesquisadores usam para transportar os monstrinhos.

Logo ao concluir uma breve viagem de trem e se apresentar à corporação, você poderá receber o seu coromon inicial, escolhendo entre três opções: Toruga (fogo), Nibblegar (água) e Cubzero (gelo). Uma vez certificado e com seu devido companheiro, a grande surpresa é que você também será recrutado para a Força-Tarefa Titã, dedicada a reunir as misteriosas Essências de Titã espalhadas pelo continente de Velua. Assim, com as missões bem definidas, começará a sua jornada por este misterioso continente.

Apesar das variações no roteiro, na prática Coromon mostra logo cedo a sua reverência por Pokémon, especialmente pelos títulos da era Game Boy Advance da saga. Da jogabilidade à apresentação, as semelhanças são tantas que caso você tenha aproveitado Pokémon Ruby & Sapphire (GBA) ou Pokémon FireRed & LeafGreen (GBA), por exemplo, se sentirá em casa instantaneamente apesar da mudança de cenário e personagens.

Confesso inclusive que minha impressão inicial com o game foi a de estar jogando um título “perdido” do início dos anos 2000 — a última vez que experimentei algo similar foi com Shovel Knight (Multi) e suas brilhantes referências aos jogos de plataforma das décadas de 1980 e 1990. A boa notícia é que esse sentimento nunca se esvaiu ao longo das 30 horas de jogo que a aventura da TRAGsoft oferece, e, para um nostálgico fã do gênero como eu, isso equivale a um prato bem cheio.

Desafio na medida

Isso não quer dizer que Coromon não tente coisas novas. Se, por um lado, temos aqui incorporado todo o template que consagrou a série da Nintendo, como batalhas em turno, sistema de fraquezas e resistências, encontros aleatórios e leves puzzles durante a exploração, por outro, temos uma série de adições pontuais que tornam a experiência mais prazerosa e digna dos dias atuais.

De longe a mais marcante é a possibilidade de escolher a dificuldade para a aventura — há quatro níveis distintos (fácil, normal, difícil e insano), que permitem ao jogador personalizar sua experiência como preferir. No nível difícil, por exemplo, se seu coromon desmaiar em batalha, ele deixará seu esquadrão e não retornará. No insano, você só poderá capturar a primeira criaturinha encontrada em cada área, e por aí vai. Caso os “presets” não sejam o bastante, é possível até personalizar elementos individuais, como randomizar o habitat natural dos monstrinhos.

Cada um dos mais de 100 Coromon disponíveis no jogo também possui variações biológicas, podendo aparecer em espécimes padrão, potentes e perfeitos. Além do potencial diferente em batalha, esses espécimes possuem leves mudanças visuais, o que é um ponto realmente interessante para os jogadores que querem de fato pegar todos — inclusive as variações.

Também há uma série de melhorias de qualidade de vida em relação a Pokémon. É possível pular tutoriais, definir a corrida automática para seu personagem ou mesmo aproveitar um sistema de marcos com suas próprias recompensas. Ver elementos básicos presentes aqui e ausentes nas obras da Game Freak são sintomas preocupantes da evolução glacial de Pokémon.

Os únicos pontos negativos aqui a meu ver são a ausência de trocas entre jogadores e de um aprofundamento na história — coletar as essências dos seis Titãs espalhados pelo continente é o fio que conduz a aventura, mas o grosso dos acontecimentos acaba acontecendo à parte disso, tirando boa parte do peso que teoricamente a narrativa teria. Uma pena.

Arte em pixel

Falando da parte técnica, Coromon se destaca em mais de uma frente, o que ajuda a elevar o patamar da obra como um todo. Começando pela apresentação, há uma mescla bem interessante de pixel art com cores vibrantes, que faz com que o jogo mantenha sempre uma atmosfera aconchegante.

Também há uma notável riqueza de detalhes nas cenas — ao descer de seu quarto, você verá o seu irmão caçula jogando um adorável console pixelado. Uma vez na Lux Solis, olhe para os lados e você poderá ver a fumaça saindo de uma xícara de café ou algumas manoplas diferentes espalhadas na área de um cientista. São alguns de vários pequenos toques que evidenciam carinho dos desenvolvedores com o seu produto e auxiliam na imersão.

O mesmo se pode dizer da trilha sonora, que acabou me pegando desprevenido. Com temas enérgicos e empolgantes que alternam rapidamente com composições mais leves,  ditando o ritmo da aventura, é difícil não se empolgar com o set assinado pelo brasileiro Davi Vasc. Vale a inserção na playlist.

Por fim, também vale elogiar a adaptação para o nosso idioma. Ao contrário da franquia da Nintendo, Coromon conta com suporte completo à nossa língua pátria, fazendo com que não seja preciso saber de um outro idioma para desfrutar completamente do jogo. Ponto muito positivo.

Brilhe como o sol

Algumas de minhas melhores memórias em relação aos videogames vêm do período em que eu passava horas e horas jogando os jogos da série Pokémon no meu Game Boy Advance SP. Independentemente das condições externas, adentrar aqueles cenários coloridos e pixelizados era o suficiente para encher o meu coração infantil de alegria e desejo de aventura. Como eu, entendo que muitos jogadores e desenvolvedores foram marcados por aqueles jogos.

Por isso, compreendo as aspirações de Coromon e admiro sua capacidade de definir seus objetivos e executá-los com precisão. Seguir à risca o feito de suas inspirações pode-se provar uma faca de dois gumes, mas neste caso a mistura de fórmula nostálgica com adições pontuais funciona bem demais para ser ignorada. No fim, a realidade é que a aventura por Velua pode não ser tão brilhante como o sol (ou sua grande referência), mas nem por isso ela deixa de ser divertida. E isso não pode ser menosprezado.

Prós

  • Bela estética em pixel art que evoca os melhores trabalhos das eras 16 e 32-bit;
  • Universo e personagens carismáticos;
  • Trilha sonora marcante;
  • Múltiplas opções de dificuldade provém o desafio que a sua maior inspiração se nega veementemente a oferecer;
  • Localizado para português brasileiro.

Contras

  • Por vezes, a sensação de familiaridade ofusca a originalidade da obra;
  • A história do jogo poderia ser melhor desenvolvida;
  • Sem recurso de troca entre jogadores.
Coromon — PC — Nota: 8.0
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Freedom Games

é bacharel em Produção Cultural pela UFF e estudante de Comunicação Social pela FSMA. Na infância, ganhou um Super Nintendo dos pais e, desde então, nunca mais deixou o mundo dos games. Ainda sonha em ser um Mestre Pokémon.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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