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Análise: Baldo: The Guardian Owls (Multi) e os problemas da estética sem profundidade

Aventura da desenvolvedora Naps Team tem ambições interessantes, mas acaba sofrendo com alguns problemas em sua execução.

Lançado originalmente em agosto, Baldo: The Guardian Owls é um dos títulos mais únicos que tive a oportunidade de jogar recentemente. Ostentando visuais animados que lembram muito o trabalho do Studio Ghibli e carregando influências significativas de franquias como The Legend of Zelda, a aventura da Naps Team tinha tudo para ser um dos grandes games independentes deste ano. Porém, alguns deslizes significativos acabam por impedir uma recomendação mais ampla. Confira a seguir a nossa análise.

A lenda de baldo

Logo ao iniciar, Baldo: The Guardian Owls nos apresenta Baldo, o protagonista de nossa aventura, e sua amiga chamada Luna, que vem convocar o jovem para um encontro aparentemente importante com seu avô. Após as duas crianças se locomoverem até a residência do familiar de Baldo na vila em que vivem, o ancião relata acreditar ter encontrado aquilo que passou a vida inteira buscando: o túmulo do lendário Galeão Perdido.

Tal Galeão supostamente conteria, além de outros tesouros, um importante item que revelaria o caminho para a sagrada aldeia das Corujas Guardiãs, mas o destino fez com que uma forte tempestade e uma vil criatura levassem o Galeão junto com sua tripulação para o fundo do mar. Segundo uma popular lenda, porém, o nascimento de uma criança de coração puro [sic] mudaria esse cenário, fazendo com que a criatura responsável pelo naufrágio despertasse e a criança a pudesse enfrentar.

Até aí tudo bem, mas sem nem  encerrar sua história, o avô de Baldo já o instrui das coordenadas do suposto acidente para investigação, antecipando a conclusão de que o jovem é a tal criança da lenda. Se esta breve descrição do início do jogo parece um pouco acelerada, não é uma coincidência: embora clichê, a narrativa do título como um todo sofre de problemas de ritmo e desenvolvimento, onde ora a narrativa parece parada demais, ora os acontecimentos transcorrem de modo quase forçado.

Sem entrar no mérito dos spoilers, digo que, embora a lenda das corujas guardiãs conte com personagens interessantes e numerosos — créditos à equipe de desenvolvimento —, a sensação é de que estes nunca são explorados ou aprofundados o suficiente. Sendo sincero, é fácil ter a sua imersão quebrada quando, para citar um breve exemplo, seu avô o deixa explorar o mesmo navio das tais lendas sozinho e desprotegido sem nem soltar um “ai” de preocupação. Oras, haja confiança no potencial do netinho.

Dungeons e puzzles

Na prática, Baldo: The Guardian Owls se comporta como um híbrido de aventura e RPG de ação, no qual você pode se movimentar livremente pelo mapa e a junção de quests e dungeons pontuam o progresso do jogador. A jogabilidade do game deixa bastante clara a notável influência da série The Legend of Zelda, de modo que ouso dizer que fãs da saga da Nintendo — especialmente de suas rendições em 2D, como The Legend of Zelda: Link’s Awakening (Switch) — se sentirão em casa ao começar a controlar o protagonista pelo mundo virtual criado pela Naps Team. 

Basicamente, Baldo tenta ser o Link de que seu mundo precisa, ajudando os necessitados e expurgando o mal do universo, mas não é preciso muito tempo de jogo para que se perceba a diferença de qualidade entre as duas sagas.e Na minha opinião, há um elemento em específico que é fundamental nessa discrepância: os puzzles/enigmas.

Explico: se você já jogou algum título da saga de Link, sabe que puzzles e enigmas são parte integral da aventura, especialmente nos calabouços. Baldo: The Guardian Owls tenta replicar essa característica, mas peca em dois pontos cruciais a meu ver: a qualidade e a quantidade.

Tamanha é a frequência de tais elementos aqui que, enquanto você não estiver indo de um ponto A ao B, há uma imensa chance de que você estará buscando soluções para algum entrave, como uma porta fechada com chave, ou uma grade que impede a passagem. 

Isso não seria exatamente um problema se os puzzles fossem criativos e envolventes, vide as shrines de The Legend of Zelda: Breath of the Wild (Wii U/Switch). Porém, particularmente acredito que carregar objetos de um lado pro outro e mover estátuas de lugar se torna cansativo a partir da quinta ou décima vez que está fazendo isso.

Para piorar, ao contrário do que seu visual amigável pode sugerir, Baldo: The Guardian Owls não “segura na mão do jogador”, mantendo as dicas escassas sempre que possível, podendo levar à frustração.

Baldo souls

À época de seu lançamento original, Baldo foi duramente criticado por sua dificuldade bisonha, na qual bastava cair de um morro ou tomar um ou dois golpes de um inimigo mais parrudo e o jogador seria contemplado com uma tela vermelha de Game Over.

Porém, desde o último grande patch, lançado no dia 24 de outubro, essa não é mais a realidade. Além disso, graças a um novo nível de dificuldade chamado de "balanceado", é possível aventurar-se sem se preocupar tanto com as possíveis falhas.

Honestamente, esse é um alento muito bem-vindo, posto que o sistema de combate de Baldo não é lá um dos pontos fortes do jogo. Similarmente, também não o são as suas boss battles, que por vezes parecem carecer de criatividade apesar do design carismático de cada personagem.

Nesse sentido, a certa altura, The Guardian Owls começa a se tornar um caso deveras curioso. endo em vista os pontos citados até agora nesta análise, seria fácil atribuir uma nota abaixo da média para o jogo e finalizar assim mesmo. Contudo,  mesmo com os problemas elencados (significativos a meu ver, ressalto), ainda é possível se divertir com o jogo, a depender principalmente do seu apreço pela proposta e a sua paciência com os eventuais deslizes.

É que, por debaixo de todos os percalços, dá para ver  certo carinho contagiante dos desenvolvedores com sua criação. Os cenários são grandes e convidativos, quase ao ponto de configurarem um mundo aberto de fato. Há conteúdo para mais de 25 horas de jogo contínuo, algo incomum em jogos independentes, e diversas localidades a explorar. Por fim, seu estilo transborda personalidade, o que ajuda a elevar a impressão final.

De certo, a verdade é que todos esses pontos terão um peso diferente para cada jogador, o que torna a avaliação deste jogo algo que deve ser ponderado com carinho individualmente. Meu palpite é que, mantido o suporte dos desenvolvedores, Baldo pode vir a se tornar uma fácil recomendação um dia. Por enquanto, o jogo ainda provavelmente dividirá opiniões, mesmo se apresentando em um estado bem melhor do que a sua versão de lançamento.

Fábula pitoresca

O grande destaque de Baldo, logicamente, é a sua apresentação. Como pode ser visto pelas capturas de tela que acompanham esta matéria, o título da Naps Team realmente é um espetáculo visual, capaz de agradar em cheio aos fãs das obras do Studio Ghibli e de animações japonesas em geral. Não raramente, confesso que parei por alguns momentos em frente ao meu monitor para admirar o que figurava na tela — um testemunho à qualidade do trabalho dos desenvolvedores.

Similarmente, a trilha sonora também merece elogios. Composta, arranjada e produzida pelo italiano Gianluca Cucchiara, suas faixas conseguem transmitir a correta sensação de estarmos vivendo uma aventura épica — particularmente, além da famosa saga da Nintendo, consegui distinguir influências de Final Fantasy e Ni No Kuni, e digo que o que há aqui vale uma inserção na playlist de games.

Já no tocante à performance do jogo, relato que não encontrei bugs e crashes durante minhas sessões para esta análise. Vale lembrar que Baldo sofreu com diversos problemas relacionados na época de seu lançamento, o que demonstra o bom trabalho de correção que vem sendo conduzido pelos desenvolvedores.

Também é sempre importante mencionar a presença do suporte a português brasileiro, o que demonstra carinho para com o nosso público e garante que mais jogadores podem desfrutar do jogo como um todo.

O fim da jornada

Baldo: The Guardian Owls é um caso curioso. A lenda da criança de coração puro tem seus méritos, mas conforme se passa tempo em seu mundo, fica claro que falta o requinte que faz justamente as suas maiores referências brilharem. Fãs de The Legend of Zelda e jogos de aventura que sejam pacientes vão encontrar diversão aqui, mas é difícil não pensar no que faltou para que esta obra alcançasse patamares maiores. Quem sabe em uma próxima vez?

Prós

  • Direção de arte destacada;
  • Trilha sonora consegue fornecer a ambiência necessária à aventura;
  • Personagens carismáticos;
  • Bastante conteúdo se comparado a outros jogos independentes;
  • Último patch melhorou aspectos significativos do jogo, como o game over instantâneo ao cair de uma grande altura;
  • Suporte a português brasileiro.

Contras

  • O desenrolar da narrativa é inconstante, provendo uma experiência ora lenta, ora movimentada;
  • Puzzles e enigmas obtusos;
  • Sistema de combate raso;
  • Ainda carece de polimento em aspectos como menus e mapas.
Baldo: The Guardian Owls — PC/PS4/XBO/Switch — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Naps Team

é bacharel em Produção Cultural pela UFF e estudante de Comunicação Social pela FSMA. Na infância, ganhou um Super Nintendo dos pais e, desde então, nunca mais deixou o mundo dos games. Ainda sonha em ser um Mestre Pokémon.
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