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Análise: The Signifier (PC): uma viagem instigante, porém subdesenvolvida, por um complexo mistério sci-fi

Jogo de aventura apresenta uma excelente discussão, porém deixa a desejar no seu desenvolvimento.

Desenvolvido pela Playmestudio e publicado pela Raw Fury, The Signifier é um jogo de aventura em primeira pessoa lançado para PC no dia 15 de outubro. Na pele de Frederick Russell, um cientista com expertise em IA e psicologia, o jogador deve investigar uma misteriosa morte, explorando as memórias da vítima.

Em busca do significante-mestre

Johanna Kast, vice-presidente da Go-AT, uma pessoa bastante discreta e de forte influência, já que a empresa em que trabalhava é a maior megacorporação de tecnologia do mundo, com pesquisas em múltiplas áreas. Para investigar o que aconteceu, a TSB (em português, Escritório de Proteção em Tecnologia) decide exigir o auxílio do professor Russell, cujas pesquisas podem auxiliar a desvendar o mistério.

Especializado em inteligência artificial e em psicologia, o cientista trabalha no projeto Dreamwalker, que permite reconstituir memórias das pessoas em uma realidade simulada. No entanto, toda memória, assim como qualquer elemento relacionado à mente humana, carrega um tom de subjetividade. Frente a isso, o mundo simulado possui dois estados (objetivo e subjetivo) e é necessário alternar entre eles para investigar os múltiplos fragmentos que são reconstituídos a partir do cérebro da personagem.

Com essa premissa, a história se desenvolve em torno de múltiplos tópicos interessantes. Não apenas o que aconteceu com Johanna é misterioso, como há uma boa discussão sobre ética, tecnologia, privacidade, subjetividade, etc. Há inclusive a possibilidade de tomar determinadas escolhas no jogo que podem alterar o final e breves trechos de diálogo, mas, infelizmente, a narrativa é majoritariamente linear.

Vale destacar também que a história opta por um desenvolvimento aberto a múltiplas interpretações. Apesar da proposta de oferecer, como descrito na página do Steam, “momentos únicos sem preenchimentos supérfluos”, a sensação maior é que o jogo cortou explicações demais e deixou a história abaixo do seu real potencial, na tentativa de criar um mistério que provoca o jogador a desvendar as peças do enigma por conta própria, fora do jogo.

Esse subdesenvolvimento intencional também ocorre no gameplay, que acaba apresentando algumas formas interessantes de interação, mas usadas apenas de forma esporádica. Em resumo, cada área conta com determinados pontos de interesse que o jogador deve vasculhar, fazendo com que Russell os avalie. Em alguns poucos momentos, é possível obter dados brutos que funcionam como itens e devem ser usados em outros locais dentro das memórias. Há também trechos em que uma espécie de linha é visível no ar, sendo possível empurrar o vento para avançar ou retroceder por um curto período de tempo. Por conta disso, é possível observar em mais detalhes o movimento de determinado evento.

Outros puzzles envolvem soluções locais bem mais específicas, mas, mesmo que o jogador fique perdido em alguns momentos, a IA de Russell, Evee, oferece pistas simples do que fazer. O jogo evita dizer diretamente “faça isso”, mas ainda é simples saber o que fazer para avançar pelo mundo dos sonhos. Fora da simulação, o jogador não conta com esse auxílio, mas as possibilidades de interação são mais reduzidas.

A maior parte do tempo no mundo real também implica na exploração de cenários, como a casa em que Johanna vivia, mas há também uma mecânica exclusiva que é o celular. Graças a ele, é possível ligar para outros personagens, principalmente Tom (o agente da TSB) e Laura, a filha do protagonista, com a qual ele tem uma relação conturbada. Utilizá-lo também pode ser relevante na obtenção de finais diferentes.

Um aspecto fundamental de se mencionar é a atmosfera do jogo. O tom surreal das áreas mentais chama a atenção com geometrias abstratas, formas distorcidas, objetos voxelados (como se fossem pixelados, mas em 3D), entre outras coisas. Em termos sonoros, boa parte do jogo não tem uma trilha, priorizando sons ambiente, o que inclui, por exemplo, vozes distorcidas, adicionando mais tensão à exploração.


Durante a aventura também é possível ver criaturas surreais, cujas formas podem ser bastante perturbadoras. Não há cenas de susto, mas a presença dessas figuras abstratas adiciona um elemento de medo à exploração. Além disso, o jogo é classificado adequadamente como maduro, sendo possível ver múltiplas figuras humanóides em atos sexuais em uma determinada área.

Os erros da máquina

Gostaria também de destacar algumas questões mais técnicas que incomodam no jogo, em sua versão atual. Apesar de ser muito bom, devido ao seu caráter narrativo, que o jogo conte com adaptação para o português, o texto conta com erros grosseiros que atrapalham a experiência. Em alguns momentos, os verbos são conjugados em tempos errados e há escolhas muito estúpidas, como falar sobre as “janelas” da Microsoft ao se referir ao Windows. A recorrência desses eventos dá a impressão de que o jogo (ou parte dele) foi traduzido no Google Tradutor.

A tradução incorreta dá a ideia de que o personagem viu o artista.


Além disso, enfrentei vários bugs ao longo do jogo, incluindo falhas no carregamento de algumas áreas (em dois casos forçando o personagem a cair no abismo), borrões na exploração de cenas, loadings demorando acima do normal, alguns itens que não funcionavam, uma cena específica em que usar uma máscara travou o jogo com o personagem olhando para o chão, entre outros. Em determinadas cenas, Russell interage com outras pessoas no mundo real e é possível perceber que a animação delas possui alguns defeitos como pequenas travas (stutters). Espero que esses detalhes sejam corrigidos em futuras atualizações.

Também teria sido muito apreciado se o jogo contasse com alguma forma de pular o texto. Afinal, com as escolhas e os finais diferentes, o jogador que gostaria de testar outras possibilidades é forçado a repetir os mesmos puzzles e uma quantidade maior de texto repetido do que de eventos verdadeiramente novos. Como o gameplay e a maior parte da história é igual, não importa o que o jogador faça, o processo pode ser bastante tedioso.

Felizmente, a desenvolvedora colocou um sistema de salvamento automático que retêm saves anteriores, sendo possível escolher um arquivo e apenas clicar para a esquerda para voltar a uma cena anteriormente vista para tentar realizar outras escolhas. Isso acelera um pouco o processo caso o jogador tenha uma ideia do que poderia fazer diferente, mas ainda será necessário refazer tudo após o ponto escolhido para recomeçar.

Abaixo do seu verdadeiro potencial

De forma geral, The Signifier é um jogo de investigação bastante interessante devido à sua forte atmosfera de suspense e ambientação sci-fi. Com vários elementos instigantes na história, fãs de títulos de aventura de forma geral podem se sentir verdadeiramente recompensados pelo jogo caso gostem de obras mais abertas, que evocam reflexão. No entanto, os vários pequenos equívocos fazem com que o jogo não alcance o seu potencial.

Prós

  • Atmosfera imersiva de suspense;
  • Cenários das memórias representam bem a subjetividade da mente humana;
  • História conta com vários elementos instigantes envolvendo tecnologia e psicologia;
  • Sons ambiente adicionam tensão aos eventos.

Contras

  • Mesmo com múltiplas escolhas, o jogo é majoritariamente linear;
  • Tanto a história quanto o gameplay são subdesenvolvidos;
  • Rejogar acaba sendo bem tedioso por causa da linearidade;
  • Bugs que podem impedir o progresso e defeitos na animação de personagens;
  • Tradução para o português conta com erros grosseiros.

 The Signifier – PC – Nota: 7.5

 Revisão: José Carlos Alves
Análise produzida com cópia digital cedida pela Raw Fury


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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