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Análise: UnderMine (PC/XBO) — minerando em uma viciante e imprevisível aventura roguelite

A grande diversidade de possíveis situações é o maior destaque deste título indie de ação e exploração de calabouços.


UnderMine é um título indie de ação e exploração de calabouços que pega as melhores características de roguelites e os aplica em uma aventura charmosa. As mecânicas básicas são simples, mas muitos itens e modificadores trazem variedade às partidas, sendo constante a sensação de novidade. No início, as jornadas podem ser um pouco repetitivas por causa do desbloqueio lento de conteúdo, porém, depois de algumas horas, o potencial completo do jogo se revela em uma aventura viciante, mesmo que com alguns problemas. Lançado depois de um período de Acesso Antecipado, a versão final trouxe mais conteúdo e balanceamento.

Desbravando uma mina perigosa

No reino de Delvemore, há uma estranha caverna que, recentemente, passou a ser a origem de tremores de terra. Um mago foi designado para investigar a questão, mas o local está repleto de perigos e monstros. Para continuar seguro, o feiticeiro passa a enviar inúmeros camponeses mineradores para investigar a caverna. Não houve esforço em convencê-los a aceitar a tarefa, afinal há muitos tesouros no subterrâneo. Quando um deles eventualmente morre, outro é enviado para continuar o trabalho — o mago não se importa com a segurança ou a vida deles.

Na pele de um dos mineradores, exploramos o mundo subterrâneo de UnderMine em uma aventura de ação e exploração de calabouços. Em cada andar, o objetivo é encontrar a escada para o próximo pavimento. Cada sala tem diversos perigos, como monstros, armadilhas ou pequenos puzzles — às vezes, até mesmo uma combinação desses elementos. Os mapas dos estágios são gerados proceduralmente, oferecendo diferentes desafios a cada tentativa, e quanto mais fundo maior é a dificuldade.


Para enfrentar os inimigos, o camponês usa sua picareta, que também pode ser lançada para golpear à distância. Já as bombas permitem explodir obstáculos, além de funcionarem também como uma forma de ataque. O movimento de pulo tem usos diversos, pois com ele conseguimos escapar de investidas dos inimigos e atravessar obstáculos, por mais que ele seja um pouco desajeitado e difícil de controlar. Pelo caminho há também inúmeras poções que ativam feitiços variados quando consumidas, como aumentar atributos, prover resistência ao fogo, fazer chover dinheiro ou revelar segredos.

A presença de inúmeros recursos que modificam as características do personagem é o que torna UnderMine único. As relíquias têm poderes diversos: algumas oferecem efeitos simples, como aumentar força ou vida, já outras apresentam poderes mais distintos, como fazer com que a picareta rebata pelos inimigos ao ser lançada ou criar poças de óleo inflamáveis ao saltar. Além disso, os efeitos de muitas delas têm sinergias, o que permite criar combinações bem interessantes. Algumas das habilidades poderosas são acompanhadas de maldições que atrapalham o herói de alguma maneira, trazendo um aspecto de risco e recompensa às partidas.

O progresso que vem da morte

A aventura de UnderMine pertence ao gênero roguelike, o que significa que precisamos recomeçar a jornada do início após morrer. No entanto, ele se enquadra na variação lite e, por isso, progresso entre as partidas. Com o ouro coletado na mina, podemos liberar melhorias de atributos permanentes para os heróis, além de construir inúmeros novos itens que podem aparecer nas sessões futuras. Além disso, certos progressos se mantêm entre as tentativas, como os personagens resgatados e os chefes já derrotados. Sendo assim, aos poucos, fortalecemos o personagem, o que permite chegar cada vez mais longe — mesmo com a derrota constante, há sensação de progresso.

Fora isso, há o Othermine, um modo roguelike puro. Nele, as regras são bem diferentes: o herói sempre começa com suas características básicas zeradas e podemos escolher algumas melhorias em andares específicos, ou seja, vamos montando o personagem aos poucos pelo caminho. A estrutura da mina é aleatória, o que significa que áreas e chefes mais avançados podem aparecer cedo. Por causa de todas essas características, o modo Othermine oferece desafio acentuado focado em técnica e improvisação — achei bastante difícil, mas gostei de explorá-lo. Fora isso, há opções para deixar o jogo ainda mais difícil, ideal para aqueles que buscam maior desafio.


O mundo é construído com belo visual em pixel art repleto de elementos elaborados. Os cenários, em especial, contam com muitos detalhes, e o efeito não é puramente cosmético: fogo se alastra pela grama queimando inimigos, ataques elétricos afetam a água, tochas incendeiam projéteis. É uma pena que, tematicamente, sejam exploradas ideias batidas de localidades e monstros de fantasia medieval, o que faz com que a identidade de UnderMine não se destaque. Ao menos, há um pouco de personalidade nos itens (que apresentam diversas referências a outros títulos) e nos diálogos com personagens. O texto está completamente em português, em uma localização competente.


Uma jornada diversificada e inesperada

A grande variedade de situações nas partidas é a característica que mais apreciei em UnderMine. Suas mecânicas de ação são simples e funcionais (um ataque para curta distância, outro que funciona como projétil e um botão para pular), exploradas em mapas com boa diversidade de salas, em um competente misto de combate, puzzles de navegação e segredos. As fases geradas proceduralmente e os inúmeros modificadores fazem com que a experiência seja constantemente diferente.

As relíquias e outros itens afetam fortemente a progressão das partidas, sendo divertido começar com um camponês praticamente indefeso e terminar a jornada com um herói cheio de poderes malucos. Em uma das minhas partidas, o ataque de lançar a picareta queimava todos os inimigos e acertos críticos explodiam em flechas — detonei tudo com uma chuva de projéteis rebatendo pela tela. Já em outra tentativa, consegui muitos itens poderosos com a ajuda de relíquias e poções que aumentavam minha quantidade de chaves, o que permitia abrir baús e salas especiais. Também teve uma vez que saí rico da mina: um conjunto de relíquias multiplicava aleatoriamente o ouro que caía no chão, e, ao coletá-lo, minha vida era recuperada e raios eram lançados nos inimigos. Há muitas sinergias e com um pouco de estratégia (e sorte) é possível montar combinações devastadoras ou malucas.


O resultado de tantos efeitos juntos é um caos frenético e divertido. Particularmente, apreciei a imprevisibilidade das partidas, afinal qualquer coisa poderia aparecer pelo caminho. Por causa disso, fui constantemente forçado a me readaptar ou a tentar novas estratégias. A progressão permanente e o desbloqueio de itens e recursos me incentivou a continuar insistindo na jornada, mesmo com a frustração de ter morrido após encontrar relíquias boas, e é bem viciante o ciclo de explorar, morrer e melhorar. Só acho que faltou um pouco mais de personalidade aos sistemas de jogo, ainda mais em comparação com outros roguelikes, como Hades ou Enter the Gungeon, mas, mesmo assim, apreciei bastante meu tempo com o jogo.


Entre a derrota abrupta e a repetição

UnderMine, como qualquer roguelite, não é um jogo fácil e o camponês morre com alguns poucos golpes. Para complicar, as salas estão repletas de inimigos e armadilhas, demandando muita atenção e técnica para sobreviver. A intenção é justamente aprender com as derrotas.No entanto, mesmo essa sendo uma característica esperada, há alguns problemas pelo caminho.

A dificuldade, principalmente nos trechos mais avançados da jornada, é desbalanceada. O motivo disso é que o tempo de invencibilidade após ser atingido é muito curto e, muitas vezes, aparecem ataques inescapáveis de todos os lados, fazendo com que um único deslize resulte em dano absurdo e, consequentemente, em derrota. Somado a isso, a bagunça visual atrapalha às vezes e é difícil entender o que está acontecendo na tela com tantas partículas, monstros e elementos. É um pouco frustrante ser derrotado assim, mas a progressão entre as tentativas ameniza o sentimento.


UnderMine conta com extensa quantidade de conteúdo desbloqueável, o que expande as possibilidades constantemente. O porém é que estes elementos são liberados de forma muito lenta, tornando repetitivas as horas iniciais. Além disso, há necessidade de grind: o minerador é bem frágil no começo da aventura e o dinheiro coletado é pequeno. Sendo assim, só depois de muitas mortes conseguimos melhorar suficientemente seus atributos básicos para garantir a sobrevivência. A meu ver, esse recurso é uma maneira um pouco artificial de estender o tempo de jogo e acredito que o ritmo seria melhor se essa repetição inicial fosse abreviada. Após esse início, no entanto, o título se torna mais variado.


Mineração viciante

UnderMine aplica conceitos de roguelite em um ótimo jogo. O ciclo de explorar, coletar dinheiro, morrer, melhorar o personagem e tentar novamente é viciante, pois cada partida é única e há a constante sensação de que estamos progredindo. A variedade de poderes que podem ser obtidos pelo caminho, em especial, torna cada tentativa empolgante e imprevisível — parte da diversão é justamente ver qual combinação maluca de habilidades virá a seguir. Há muito conteúdo para explorar, embora a necessidade de fazer grind para liberar certos recursos deixem as coisas um pouco repetitivas, fora alguns outros problemas. No fim das contas, UnderMine é um dungeon crawler de ação sólido e polido capaz de prender por horas.

Prós

  • Mecânicas simples e versáteis de exploração e combate;
  • Grande variedade de itens e modificadores fazem com que as partidas sejam bem distintas entre si;
  • Extensa quantidade de conteúdo, com opções para aumentar o desafio ou alterar as regras;
  • Ambientação charmosa com visual em pixel art.

Contras

  • Grande necessidade de grind, principalmente nas primeiras horas, traz sensação de repetição;
  • Presença de picos de dificuldade irritantes capazes de acabar com uma partida em questão de segundos.
UnderMine — PC/XBO — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: PC
Revisão: João Pedro Boaventura
Análise produzida com cópia digital cedida pela Thorium Games

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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