Discussão

Afinal, será que o servidor brasileiro de LoL é muito pior que outros?

Sempre ouvimos que os jogadores brasileiros de League of Legends são os mais tóxicos do globo. Mas será que isso é de fato verdade?

Quinta-feira. Depois de uma longa semana de trabalho, que infelizmente ainda não terminou, você senta em sua cadeira, e convida seu amigo para jogar aquela partida de League of Legends para começar bem a sexta-feira. Todos os jogadores da sala decidem uma posição, incluindo você que por sorte conseguira justamente aquela que desejava jogar ao abrir o client do game, a exceção de um outro player que então “trolla” a partida, pegando um campeão sem sentido, roubando sua posição e recusando-se a comunicar com seu time, exceto, é claro, de alguns xingamentos. “BR é ****”, você deve ter pensado, não? Pois saiba que o caso acima é verídico (aconteceu essa semana inclusive) e não se passa no servidor brasileiro, mas sim no servidor do oeste europeu (EUW). Com esse exemplo em mente eu levanto a questão: será que só os brasileiros são trolls? E se não, será que ao menos somos os piores?

A origem do HUE

Antes de começarmos a analisarmos a questão em si é preciso salientar uma coisa: os brasileiros de fato possuem uma fama muito ruim no exterior. Não foram poucas as vezes que fui ofendido de forma gratuita ao simplesmente citar minha nacionalidade nos servidores NA e EUW (joguei no NA antes do lançamento do servidor brasileiro e hoje jogo no EUW por residir na França). Essa fama de “HUE” como somos conhecidos lá fora, que já virou matéria da Folha de São Paulo inclusive, não começou no League of Legends, e de fato é muito mais antiga do que muitos pensam.

Como antigamente, nos anos áureos dos MMORPGs, o Brasil não tinha a atenção da indústria de jogos que dispõe hoje, era muito raro encontrar servidores para brasileiros em jogos online, o que, obviamente, obrigava-nos a jogar em servidores hospedados fora do Brasil, em especial na América do norte. Com isso em mente, muitos brasileiros se reuniam dentro desses jogos como forma de superar a barreira da língua, que para muitos era uma grande dificuldade. Acontece que alguns desses grupos, muitas vezes, apenas por diversão, não só resolviam roubar, atacar ou simplesmente azucrinar grupos ou jogadores estrangeiros (“gibe money pls” e outras expressões como essa surgiram nessa época).

E como os gringos são?

Eu gostaria de manter o suspense dessa discussão mas serei bem direto: tão ruins quanto os brasileiros. Surpreso? Duvidando? O exemplo dado na introdução desse texto, que aconteceu comigo e um amigo meu essa semana, é apenas um caso dentre vários que aconteceram no servidor europeu desde que eu resolvi criar uma conta nova e upa-la do zero. Desde ofensas gratuitas, passando por troll picks, tudo que consideramos “coisa de BR” é replicado com uma frequência que até eu mesmo me assustei (pois eu também tinha essa imagem errada de que nós somos “muito piores” que o resto do mundo) no servidor europeu.

Para vocês terem uma ideia, já cheguei a levar uma punição do LeaverBuster (o sistema automático de detecção de jogadores “fujões”) de 15 minutos por sair no meio de 3 seleções de campeões seguidas. O motivo? Não só minhas posições foram pegas (algo que não seria fundamental para minha saída prematura, pois tenho o hábito de pedir uma determinada role, mas nunca fechar o campeão, para, no caso de alguém não respeitar meu pedido, eu ser capaz de escolher o que falta para completar o time) como todos, repito, todos os jogadores do meu time começaram a discutir e se xingar. Tudo isso, lembrando, antes mesmo da partida começar.

Mas então… porque temos essa fama?

Uma pergunta que pode estar pairando sobre sua cabeça, em especial após ler meus relatos sobre os ocorridos no servidor europeu, é: mas se todos são igualmente trolls, porque os brasileiros mantém essa fama até hoje?

Existem dois grandes motivos para isso. O primeiro vai nos remeter mais uma vez aos áureos tempos do surgimento do “HUE”. Lembra quando eu disse que alguns brasileiros se reuniam em bandos (quase uma formação de quadrilha) para azucrinar os estrangeiros de toda e qualquer forma possível? Pois é, eles não só realizavam tais ações, como se orgulhavam delas, e para piorar, bradavam nos chats do jogo “BRASIL, BRASIL”.

OK, isso é o responsável pela criação dessa relação entre a nacionalidade brasileira e a toxicidade nos jogos, mas por que, mesmo depois de muitos perceberem que esse comportamento não é exclusividade tupiniquim, insistem com esse preconceito? Podemos apontar o fato de ser mais “confortável” caracterizar de forma ruim um grupo ao qual você não pertence (no caso a nacionalidade), mas para mim esse não é o mais marcante.

O grande problema é que nós brasileiros temos uma coisa que o escritor Nelson Rodrigues chamou de “Complexo de vira-lata” (essa expressão é muito usada na política, mas por motivos óbvios esse tópico não será discutido nesse texto). Esse complexo é, nas palavras do dramaturgo “o estado de inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”. Não entendeu? É simples. Quantos de vocês leitores abraçaram essa fama e não só a aceitam como usam disso para xingar os seus próprios compatriotas? A questão é que nós mesmos corroboramos com essa fama ao abraçarmos essa cultura do “HUE” e aceitarmos essa identidade de escória dos jogos online com tanta facilidade.

Diga não ao HUE

Não, nós não somos tão ruins quanto querem nos fazer acreditar. Todo servidor possui uma certa quantidade de jogadores tóxicos, e esse número não é tão diferente entre as regiões do mundo (algo que minha experiência em três desses servidores pode me mostrar). O que precisamos é não mais abraçar essa ideia de que nós somos a escória dos jogos online, e sim mostrar que somos tão dignos como qualquer outro servidor. Diga não ao HUE!
E você leitor, concorda comigo? Discorda? Passou por alguma experiência semelhante com gringos em outro servidor, ou outro jogo? Não deixe de comentar!
Revisão: Leonardo Nazareth
Capa: Felipe Fabricio 


Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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