SPJam: conheça a maratona paulista de desenvolvimento de jogos

Sou uma criança dos anos 90. Amparado pelo amor de meu pai, dinheiro da mesada e muito troco de pão, consegui acompanhar de perto o surgim... (por Unknown em 07/09/2013, via GameBlast)

Sou uma criança dos anos 90. Amparado pelo amor de meu pai, dinheiro da mesada e muito troco de pão, consegui acompanhar de perto o surgimento de muitos dos grandes clássicos, e como toda criança que teve como babá o Super Mario, eu também sempre sonhei em desenvolver meus próprios jogos. Quem nunca? O sonho de dar vida às suas criações, ver aquilo que existia no fundo da sua mente tomar forma e ser exposto a milhares de outras crianças do mundo todo, um verdadeiro Icarus moderno (ok, quase lá…).

Um aglomerado de sonhadores

Sim, eu sei, você é como eu. Para muitos daquela época, fazer os próprios jogos era uma das maiores ambições de um garoto. Do Power Point, passando pelo RPG Maker e até o Flash, quantos, nessa jornada por um ideal, não aprenderam a desenhar, programar, compor e fazer tudo que acreditavam ser necessário para desenvolverem um jogo sozinhos, entretanto, para a grande maioria, a vontade própria não era o suficiente… Quantos projetos de jogos não abandonamos? Personagens que até hoje habitam no fundo de nossas mentes, esperando uma oportunidade para se mostrarem ao mundo… As coisas são difíceis, se apenas tivéssemos colegas, um grupo disposto a trabalhar em prol da obra.

Nós tentamos, falamos com desenhistas, músicos, programadores, discursamos sobre nossas ideias, mas não encontramos retorno. Pouco a pouco, nosso sonho de desenvolver o jogo foi arquivado no fundo de nossas cabeças, não mais como um projeto, mas uma lembrança nostálgica. Crescemos, seguimos por diferentes caminhos. Alguns viraram advogados, outros arquitetos, médicos e cozinheiros. O sonho ficou lá, nos faltou oportunidade, mas… e se pudéssemos tentar novamente? Desenvolver pequenos jogos? O mercado certamente cresceu, temos uma enorme gama de plataformas e ferramentas, mas e colegas, onde arranjar? Pois é, amigos, hoje eu vos apresento, o que para mim e tantos outros foi um verdadeiro salva-vidas para esta melodramática jornada, o modelo de Game Jams.

Felicidade estampada em cada participante
Em uma breve explicação, o modelo de jams consiste na formação de pequenos grupos para maratonas de desenvolvimento. Além de eventos virtuais, organizadas por sites especializados onde as equipes são montadas em fóruns e chats, existem também maratonas organizadas em diversas cidades ao redor do mundo e do Brasil, como a Global Game Jam, presente em São Paulo, Curitiba e Rio de Janeiro e outras. Tradicionalmente, tais maratonas apresentam um tema central, a partir do qual cada grupo dispõe de 48 horas para desenvolver um jogo ou protótipo, e nisso, depois de muito brainstorm, esforço, pane no pc e latinhas de energético, cada equipe dispõe de um pequeno tempo para apresentar seu jogo a outros jogadores, um espaço para expor e uma ótima situação para a elaboração de contatos.

SPJam - Uma maratona paulista

Dentre as maratonas realizadas mundo a fora, existem também maratonas menores, organizadas por equipes locais com o intuito de fomentar o desenvolvimento e a ampliação da cultura de jogos nacional. Nessa linha, podemos, além de comentar sobre diversos eventos universitários de menor porte, destacar a importância ímpar da SPJam, organizada pela equipe Vortex de São Paulo, com o apoio da Unity, da Nokia e outros grandes parceiros. Contando com mais de 300 pessoas trabalhando em jogos analógicos e digitais em sua última edição, o evento já supera em número de participantes a atual maratona recordista no Guiness Book.

Abertura da SPJam 2013, realizada na PUC
Qual a sacada? Nenhuma. Basta se cadastrar, falar o que você sabe fazer e tentar se encaixar em uma equipe. Além de equipes já formadas que acolhem novos integrantes todos os anos, existem também equipes montadas inteiramente na hora. Achou um programador, um desenhista e alguém pra buscar a coca no mercado? Game on! Durante o evento são também realizados diversos sorteios e promoções por parte dos parceiros, tudo pra garantir que a maratona colabore com o crescimento do cenário como um todo.

Ao final do evento, ficam expostos os jogos, tanto no site das desenvolvedoras como no site da própria Jam, que serve como um verdadeiro catálogo virtual para jogadores. Não bastasse tudo isso, o evento é um ótimo lugar pra fazer amigos, tirar uma partida de Counter Strike ou ainda arranjar novos amigos pelo Street Pass de seu 3DS (sem maldade, devo dizer que não vi ninguém com um PS Vita…).

Como é desenvolver?

O desenvolvimento de jogos é uma coisa verdadeiramente curiosa. Cada jam possui um tema próprio, desde coisas concretas como objetos, a coisas abstratas como batidas do coração, ou até mesmo conceitos como Plot Twist (a exemplo da última SPJam). Em um primeiro momento, cada grupo gasta um tempo razoável discutindo o conceito, elaborando idéias e tentando imaginar algo que seja legal e ressoe com o contexto. Acredite, essa é a parte mais difícil.

A exemplo do tema Plot Twist, em um primeiro momento pensamos no conceito tradicional, a subversão de uma expectativa em uma narrativa, entretanto, desenvolver uma narrativa com alguma carga emocional em apenas 48 horas e uma inversão de roteiro significativa é um tanto complicada, portanto muitas equipes optaram por abordar a ideia de plot twist na jogabilidade. Deste modo, o tema não serve apenas para centralizar os participantes, mas também como uma tentativa de promover novas idéias e novos conceitos. A respeito desta jam, vimos jogos onde você era mudado constantemente de time, jogos onde morrer te levava a outro aspecto do jogo, jogos onde o caminho certo era o caminho errado e afins, tudo puxando os limites do conceito para dentro de padrões de jogabilidade.

Um roteiro simples de design
Passada a fase inicial de planejamento, chega então o escopo do jogo. Trezentas armas, sete finais, New Game +, DLC e multiplayer 32x32? Esqueça. Temos a péssima tendência de super estimar nossa habilidade de produção, portanto, atenha-se ao conceito e crie ideias simples, que possam ser exploradas e desenvolvidas com folga. 

Garanta que seu programador consiga realizar o que foi proposto e que seus artistas tenham o tempo hábil necessário para criar tudo que for pedido. Uma equipe com alto número de desenhistas pode focar-se mais em aspectos estéticos, enquanto equipes menores devem focar-se mais no principal aspecto de seu jogo, seja ele a diversão ou a apresentação de um conceito de jogabilidade. Vale lembrar que os jogos aqui são protótipos, alguns como o Surgeon Simulator podem ser posteriormente desenvolvidos e vendidos no Steam, outros, como Narbacular Drop (que mais tarde viria a se tornar Portal), podem vir a servir de case para que sua equipe receba uma boa visibilidade.

Xerox Holmes foi o resultado do planejamento acima
Por fim, cabe às equipes se organizarem para separar tarefas eficientemente de modo a garantir que todos os envolvidos estejam sempre ocupados produtivamente. Acredite, no final de uma jam é bem provável que metade das funcionalidades planejadas não esteja funcionando. É provável que Murphy use de seus raios cósmicos para que bugs surjam durante as últimas horas do prazo, portanto, cabe a cada equipe determinar deadlines e tentar seguir essas para que o último dia seja mais voltado ao acabamento que ao desenvolvimento, evitando assim problemas maiores (acredite, já passei por isso várias vezes).

Dicas para marinheiros de primeira viagem

Em eventos como a Global Game Jam ou a SPJam, é comum para os participantes dormir em salas de aula. A não ser que você more próximo ao local, é impraticável ficar saindo e voltando, portanto é altamente aconselhado que você leve um colchão de ar, ou isolante, bem como um saco de dormir, travesseiro e cobertas. Uma noite bem dormida pode fazer toda diferença, só lembre de ligar o despertador para não acordar cinco da tarde, uma hora antes do prazo de entrega.

Isso é uma noite confortável
Leve também material de higiene, escova de dentes, escova de cabelo, toalha de banho e afins. Por mais ocupado que você esteja, é sempre ruim ficar se sentindo grudento. Além disso, réguas, extensões, cadernos, canetas, lápis e naturalmente seu próprio computador são essenciais. Não esqueça de abastecer o carro com garrafas de água, chá, sacos de bisnaguinha, bolacha (nada de biscoito) e outras guloseimas para enganar o estômago até a hora de pedir comida.

Ta esperando o quê?

Ficou com vontade? Pois é, mal passou a última jam e eu já espero pela próxima. Para quem tiver interesse, aguardo vocês lá, seja em uma Global Game Jam, em uma SPJam ou qualquer outro evento semelhante, seria um enorme prazer trabalhar em um jogo com vocês, pupilos Gameblastianos. Quer conhecer os jogos dessa Jam? Tem ideias pra um jogo? Tá procurando equipe? Quer organizar uma jam? O espaço abaixo é de vocês.

Capa: Douglas Fernandes
Revisão: Bruno Nominato

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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