Civilization II prevê o futuro da humanidade, ou quase isso

Imagine um jogo que pode determinar o futuro inteiro que a humanidade pode vir a ter, dependendo somente das decisões do jogador. Parece s... (por Fellipe Camarossi em 28/07/2013, via GameBlast)

Imagine um jogo que pode determinar o futuro inteiro que a humanidade pode vir a ter, dependendo somente das decisões do jogador. Parece surreal, não? E se eu te dissesse que esse jogo existe desde 1996? Estou falando de Civilization II (PC), a segunda entrada da icônica série que permite criar sua nação desde os princípios e tentar conquistar o globo, seja através da força ou da diplomacia. Considerando a raça humana que conhecemos, qual acha que seria o caminho escolhido?


O renomado jogo conquistou uma legião de fãs ao redor do globo por sua jogabilidade única, e mesmo que com as mecânicas limitadas de sua data de lançamento, ainda surpreende por o quão longe é capaz de chegar. Recentemente a última entrada da série, Civilization V (PC), recebeu uma expansão notória de nome Brand New World, na qual a cultura se torna peça fundamental da jogatina e até o Brasil foi incluso na brincadeira. Entretanto, quem rouba a cena neste Especial vai ser um de seus antecessores primordiais que, com a ajuda de um jogador fissurado, chegou onde nenhum outro jamais alcançou; o futuro derradeiro da humanidade.

Você sabe que a coisa está feia quando Gandhi quer te ver em ruínas.

A partida da década, literalmente

Nossa história começa no conhecido portal social Reddit, rival do eternizado 4chan pelo título de “raiz da internet” quando se fala de onde todo o conteúdo popularizado na rede mundial provém. Pouco mais de um ano atrás, foi publicado pelo usuário Lycerius seu breve relato sobre a sua experiência com o jogo Civilization II. Segue a tradução literal do primeiro parágrafo do seu texto:
“Estive jogando a mesma partida de Civ II por 10 anos. Mesmo que já seja obsoleto, eu fiquei fascinado com este jogo em particular, pois, quando Civ III havia sido lançado, eu já estava em um futuro distante nesta partida. Pensei que talvez pudesse ser interessante ver o quão longe no futuro eu poderia chegar e ver qual ramificação que poderia acontecer. Naturalmente eu jogo outros games e tenho uma vida, mas costumo retornar para ele quando não estou fazendo nada e continuo-o.”
E você se achando o viciado com 500 horas de jogo.
É assim que esta aventura começa, com a mais longa partida de Civilization já jogada (até a data de hoje). O insistente Lycerius continuou em sua campanha até os limites que a humanidade poderia alcançar, tomando as decisões que supôs serem as melhores para o futuro de sua nação e de toda a raça humana. Bem, o que poderia dar errado se ele teve apenas boas intenções, não é?

Bem, boas intenções são uma questão de ponto de vista.

No ano de 3991, o mundo está completamente desolado e devastado pelas constantes guerras nucleares entre as três nações que ainda caminham sobre a terra: os Celtas, os Vikings e os Americanos. Lycerius controla a nação Celta, enquanto as outras duas são controladas pelo próprio jogo. Já devem haver alguns leitores reclamando que “não é o futuro da humanidade, duas dessas nações nem existem mais” e semelhantes, então peço paciência e que se atentem aos fatos que circundam essas nações antes de começar a atirar as pedras.

Ou atirar bombas nucleares, como eles preferem.

Droga Gandhi! De novo?!

Apenas mais um dia em 3991 d.C

90% do mundo está inabitável, tanto pela devastação das explosões como pela radiação das ogivas nucleares. Nenhum metro quadrado de terra está apto para plantação, as pessoas só conseguem se manter vivas graças a evolução da tecnologia, filtrando a água e o oxigênio para a pouca população que ainda consegue se manter de pé.

As calotas polares não resistiram às guerras e cederam, transformando qualquer ambiente que não fosse o topo de uma montanha em um mar ou em um pântano. Fica fácil definir com isso que já não existem mais cidades grandes. É difícil encontrar tempo para reparar as terras tomadas pela água contaminada pela radiação quando os engenheiros estão, a todo tempo, reparando e construindo estradas e rotas para os exércitos poderem ir para a linha de frente e lutar na interminável guerra.

Uma das imagens postadas pelo jogador, mostrando a situação de algumas partes do mundo.
As três últimas super nações que restaram no mundo – já que conquistaram todas as outras em seus arredores – estão guerreando incessantemente faz mais de 1700 anos. Alguns tratados de paz foram propostos, mas eventualmente os Vikings, os Americanos ou os Celtas acabam quebrando o pacto e iniciando um novo conflito, sempre com armamento nuclear. Parece que a paz só poderá ser atingida quando só houver uma nação na Terra.

Claro, isso não é exatamente fácil, visto que temos duas teocracias divergentes e um comunismo como os sistemas de governo das três potências, sendo os Celtas (comandados pelo jogador) os comunistas. A democracia durou bastante no domínio céltico, mas quando a guerra começou a se tornar frequente, o senado e sua burocracia passou a atrapalhar os objetivos do jogador e ameaçar o bem estar de toda a população.

A guerra incessante não dá pausa para restaurar o mundo, apenas destruindo ainda mais.
É um mundo que está além de qualquer salvação por meio de diplomacia, negociações pacíficas ou tratados de paz. Pelo bem maior, a força deve ser usada ao máximo para unificar as nações e torcer para que a humanidade resista a este confronto final, e somente então, começar a trabalhar na restauração da natureza e do nosso planeta.

E o que podemos tirar disso?

Se você não está impressionado até agora com o quão longe esse jogo foi capaz de chegar, dê-me uma última chance de abrir seus olhos; estamos falando de um título lançado em 1996, com recursos limitados e uma mecânica já ultrapassada há quase duas décadas, e ainda assim conseguiu ir tão longe no que diz respeito a natureza nociva do ser humano. É no mínimo um trabalho genial.

Não creio que esta suposição distópica do que possa vir a se tornar a humanidade seja de total fantasia; temos hoje mesmo diversos líderes políticos ao redor do nosso globo, comandando os mais diversos tipos de governos, todos numa corrida armamentista que pode estourar em uma guerra nuclear a qualquer instante. Algo parecido aconteceu há alguns meses com o impasse entre a Coréia do Norte e sua irmã do Sul, tendo como bônus a participação dos EUA.

Está na nossa natureza a luta pelo poder, seja nos jogos, seja na realidade.
A ganância e a sede por poder sempre foi a ruína do ser humano, hoje vemos o reflexo do que já fizemos no passado com o verde cada vez mais escasso ao dar espaço para as florestas de pedra e as espécies em extinção por ter seus habitats consumidos pela voraz sociedade. Pode soar poético, mas é um problema real e que foi plenamente representado na jogatina de Civilization II, e é algo que acompanha cada título da série.

Não deveríamos encarar isso como um aviso de que nossa natureza pode representar o fim da natureza? Vamos ter de chegar a um ponto onde apenas a violência pode chegar até a paz, por mais paradoxal que isso pareça?  Temos aqui uma verdadeira mensagem de aviso vindo direto do ano de 3991, um pedido de socorro de uma humanidade sufocada pela sua própria maldade. Tudo que podemos torcer é que esse exemplo surta efeito e possamos aprender algo dessa historia toda.

Afinal, é melhor receber uma lição de um jogo do que de uma bomba atômica.

E aí passamos de Civilization para Fallout.
Revisão: Ramon Oliveira de Souza
Capa: Sybellyus Paiva

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google